Fanfics Brasil - Capítulo 17 Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.)

Fanfic: Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.) | Tema: Série Divergente


Capítulo: Capítulo 17

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Meio-dia. hora do almoço.
Estou sentada em um corredor que não conhecia. Andei até aqui porque precisava sair do dormitório. Talvez, se trouxesse as minhas roupas de cama até aqui, nunca mais precisaria ver o dormitório. Talvez seja a minha imaginação, mas acho que o lugar continua cheirando a sangue, embora eu tenha esfregado o chão até minhas mãos doerem e alguém tenha passado água sanitária nele hoje de manhã.
Belisco o dorso do meu nariz. Esfregar o chão quando ninguém mais queria limpá-lo é algo que minha mãe teria feito. Se não posso estar com ela, o mínimo que posso fazer é agir como ela de vez em quando.
Ouço ruídos de pessoas se aproximando, de suas pegadas ecoando no chão de pedra, e olho para baixo, para meus pés. Troquei meu par de tênis cinza por um preto há uma semana, mas guardei-o no fundo de uma das minhas gavetas. Não consigo me desfazer dele, embora eu saiba que é besteira se apegar tanto a um par de tênis, como se tivesse o poder de me guiar até minha casa.
– Dul?
Levanto a cabeça. Uriah para na minha frente. Ele faz um sinal para que os outros iniciandos nascidos na Audácia continuem sem eles. Eles trocam olhares, mas continuam andando.
– Você está bem? – ele diz.
– Tive uma noite difícil.
– É, eu fiquei sabendo o que aconteceu com aquele cara, o Edward. – Uriah olha para o corredor. Os dois iniciandos da Audácia desaparecem depois de uma curva. Ele esboça um sorriso. – Você quer dar o fora daqui?
– O quê? – pergunto. – Aonde você está indo?
– Para um pequeno ritual de iniciação – diz ele. – Vamos. Temos que correr.
Considero rapidamente minhas opções. Posso ficar parada aqui. Ou posso sair do complexo da Audácia.
– Os únicos iniciandos que eles costumam deixar participar são os que têm irmãos mais velhos dentro da Audácia – diz ele. – Mas talvez eles nem percebam. Apenas aja como uma de nós.
– O que exatamente vamos fazer?
– Algo perigoso – diz ele. Seus olhos brilham com algo que eu só poderia descrever como Audaciamania, mas em vez de fugir de seu olhar, como eu talvez fizesse há algumas semanas, sou cativada por ele, como se fosse contagioso. A excitação substitui o sentimento pesado dentro de mim. Começamos a correr mais devagar ao alcançarmos os outros iniciandos.
– O que a Careta está fazendo aqui? – pergunta um garoto com uma argola de metal entre suas narinas.
– Ela acabou de ver aquele cara levar uma facada no olho, Gabe – diz Uriah. – Deixe ela em paz, ok?
Gabe dá de ombros e vira-se para o outro lado. Ninguém diz nada, embora alguns deles me olhem de relance, como se estivessem me julgando. Os iniciandos nascidos na Audácia são como uma matilha de cães. Se eu agir da forma errada, não permitirão que eu ande com eles.
Mas, por enquanto, estou segura.
Viramos em outra curva e vemos um grupo de membros parados no final do próximo corredor. Há um número grande demais deles para que sejam todos parentes de algum iniciando, mas percebo certas semelhanças entre alguns dos rostos.
– Vamos nessa – diz um dos membros. Ele gira o corpo e se atira para dentro de uma porta escura. Os outros membros seguem-no, e nós os seguimos. Mantenho-me na cola de Uriah ao adentrar a escuridão, e os dedos do meu pé esbarram em um degrau. Eu me apoio antes de cair para a frente e começo a subir.
– A escada dos fundos – diz Uriah, quase sussurrando. – Ela costuma ficar trancada.
Eu concordo com a cabeça, embora saiba que ele não consegue me ver, e subo até que os degraus terminem. A essa altura, uma porta no final da escada já foi aberta, permitindo que a luz do sol invada o espaço. Saímos a algumas centenas de metros de distância do edifício de vidro sobre o Fosso, perto da linha do trem.
Sinto-me como se já tivesse feito isso um milhão de vezes. Ouço o apito do trem. Sinto a vibração no chão. Vejo a luz da locomotiva. Estalo os dedos da mão e dou um salto com a ponta dos pés.
Corremos em um único grupo ao lado do trem e, em ondas, membros e iniciandos saltam juntos para dentro do vagão. Uriah entra antes, e as pessoas se apertam atrás de mim. Não posso cometer nenhum erro; jogo meu corpo para o lado, agarrando a barra na lateral do vagão, e me puxo para dentro. Uriah segura meu braço para me ajudar a me equilibrar.
O trem acelera. Uriah e eu nos sentamos, encostados em uma das paredes.
Eu grito para ser ouvida em meio ao ruído do vento:
– Aonde estamos indo?
Uriah ergue os ombros.
– Zeke não me disse.
– Zeke?
– Meu irmão mais velho – diz ele. Ele aponta para o outro lado do vagão, para um garoto sentado na porta, com as pernas penduradas para o lado de fora. Ele é franzino e baixo e não se parece em nada com Uriah, a não ser pela cor da pele.
– Não é para vocês saberem. Estragaria a surpresa! – grita a garota à minha esquerda. Ela me oferece a mão. – Meu nome é Shauna.
Aperto sua mão, mas não imprimo força o suficiente e solto-a rápido demais. Duvido que um dia consiga melhorar meu aperto de mão. Dar a mão a um estranho não me parece natural.
– Meu nome é... – começo a dizer.
– Eu sei quem você é – diz ela. – Você é a Careta. Quatro me falou de você.
Eu espero que o calor que sobe para o meu rosto não seja visível.
– Ah, é? E o que ele disse?
Ela sorri debochadamente.
– Ele disse que você é uma Careta. Por que pergunta?
– Se o meu instrutor está falando de mim – digo, com o máximo de firmeza que consigo –, quero saber o que ele está dizendo. – Espero que a minha mentira tenha sido convincente o bastante. – Ele não vem conosco, né?
– Não, ele nunca vem conosco – responde ela. – Já deve ter perdido a graça para ele. Não há muitas coisas que o assustem, sabe?
Ele não vem. Algo dentro de mim se esvazia como um balão furado. Eu ignoro o sentimento e faço que sim com a cabeça. Sei muito bem que Quatro não é um covarde. Mas também sei que pelo menos uma coisa ainda o assusta: alturas. O que quer que seja que vamos fazer, deve ter alguma coisa a ver com alturas, se é algo que ele evita. Ela não deve saber disso, se fala dele com tanto respeito.
– Você o conhece bem? – pergunto. Sou curiosa demais; sempre fui.
– Todos conhecem o Quatro – diz ela. – Fomos iniciandos juntos. Eu não sabia lutar muito bem, então ele me dava aulas particulares todas as noites, depois que todos já estavam dormindo. – Ela coça a nunca, com a expressão repentinamente séria. – Foi legal da parte dele.
Ela se levanta e fica em pé atrás dos membros que estão na porta. Em uma questão de segundos, sua expressão séria se desfaz, mas continuo abalada pelo que ela disse. Por um lado, acho estranho pensar em Quatro como alguém “legal” e, por outro, quero socar Shauna sem entender exatamente por quê.
– Lá vamos nós! – grita ela. O trem não desacelera, mas Shauna se lança para fora do vagão mesmo assim. Os outros membros seguem-na, em uma onda de pessoas de roupas pretas e cheias de piercings, não muito mais velhas do que eu. Fico parada diante da porta, ao lado de Uriah. O trem está andando muito mais rápido do que jamais esteve nas outras vezes em que pulei, mas não posso perder a coragem agora, na frente de todos esses membros da Audácia.
Então, pulo, aterrissando com força no chão e pisando em falso por alguns passos antes de recuperar o equilíbrio.
Uriah e eu corremos para alcançar os membros junto com os outros iniciandos, que mal olham para mim.
Ao andar, olho ao redor. O Eixo está atrás de nós. Sua silhueta negra contrasta com as nuvens ao fundo. Os prédios ao nosso redor, no entanto, são escuros e silenciosos. Isso significa que devemos estar ao norte da ponte, onde a cidade está abandonada.
Viramos uma esquina e nos espalhamos ao caminharmos pela Michigan Avenue. Ao sul da ponte, a Michigan Avenue é uma rua movimentada e cheia de pessoas, mas aqui ela é completamente vazia.
Assim que levanto os olhos para observar os prédios, sei aonde estamos indo: o
abandonado edifício Hancock, um pilar negro de vigas entrelaçadas, o mais alto edifício ao norte da ponte.
Mas o que será que faremos? Será que o escalaremos?
Ao nos aproximarmos, os membros começam a correr, e Uriah e eu disparamos para tentar alcançá-los. Esbarrando os ombros uns contra os outros, eles se espremem por um conjunto de portas na base do edifício. O vidro em uma das portas está quebrado, e tudo o que sobrou foi uma moldura vazia. Eu a atravesso sem precisar abri-la e sigo os membros por um saguão de entrada macabro e escuro, esmagando pedaços de vidro sob meus pés.
Eu achava que íamos subir pelas escadas, mas paramos no saguão de elevadores.
– Os elevadores funcionam? – pergunta Uriah, o mais baixo possível.
– Claro que eles funcionam – diz Zeke, girando os olhos para cima. – Você acha que sou burro o bastante para esquecer de vir aqui mais cedo e ligar o gerador de emergência?
– O pior é que eu acho, sim – diz Uriah.
Zeke encara o irmão, depois dá uma gravata em seu pescoço e esfrega o punho em sua cabeça. Zeke pode até ser menor que Uriah, mas ele deve ser mais forte. Ou mais rápido.
Uriah dá um tapa na lateral do seu corpo e ele o solta.
Eu sorrio ao ver o cabelo desarrumado de Uriah, e as portas dos elevadores se abrem.
Amontoamo-nos no interior dos elevadores, os membros em um e os iniciandos em outro. Uma menina com a cabeça raspada pisa os dedos do meu pé e não se desculpa. Seguro o pé, fazendo uma careta de dor, e penso em chutar sua canela de volta. Uriah olha para o próprio reflexo na porta do elevador e ajeita o cabelo.
– Qual será o andar? – diz a garota com a cabeça raspada.
– Cem – digo.
– E como é que você sabe?
– Lynn, vamos – diz Uriah. – Seja simpática.
– Estamos em um edifício abandonado de cem andares com membros da Audácia –
respondo. – Como é que você não sabe?
Ela não responde. Apenas aperta o botão certo com força.
O elevador dispara para o alto tão rápido que meu estômago afunda e meus ouvidos entopem. Seguro uma barra na lateral do elevador, vendo os números aumentarem no monitor.
Passamos do vinte, do trinta, e Uriah termina de arrumar seu cabelo. Cinquenta, sessenta, e os dedos do meu pé param de doer. Noventa e oito, noventa e nove, e o elevador para no cem.
Ainda bem que não fomos de escada.
– Como será que chegaremos até o telhado da... – Uriah interrompe a frase no meio.
Um forte vento atinge meu corpo, fazendo com que meu cabelo voe sobre meu rosto. Há um buraco enorme no teto do centésimo andar. Zeke apoia uma escada de alumínio na beirada do buraco e começa a subir. A escada estala e balança sob seus pés, mas ele continua subindo e assobiando. Ao chegar ao telhado, vira-se e segura o topo da escada para a pessoa seguinte.
Começo a me perguntar se isso não é uma missão suicida disfarçada de brincadeira.
Não é a primeira vez que me pergunto isso desde a Cerimônia de Escolha.
Subo a escada depois de Uriah. Isso me lembra da escada que subi na roda-gigante, com Quatro vindo atrás de mim. Lembro-me mais uma vez dos seus dedos em meu quadril, me segurando, e quase erro um dos degraus da escada. Idiota.
Mordendo o lábio, chego ao final da escada e fico em pé sobre o telhado do edifício
Hancock.
O vento é tão possante que não consigo ouvir ou sentir mais nada além dele. Sou obrigada a me apoiar em Uriah para impedir que o vento me derrube. A princípio, tudo o que vejo é o pântano, vasto e marrom por todos os lados, tocando o horizonte, sem vida. Do outro lado, fica a cidade, que não difere muito do pântano, inanimada e com limites que desconheço.
Uriah aponta para algo. Ligado a um dos mastros sobre a torre, há um cabo de aço da grossura do meu pulso. No chão, há uma pilha de arneses de tecido grosso, grandes o bastante para segurar uma pessoa. Zeke pega um deles e prende-o a uma roldana pendurada no cabo de aço.
Sigo o cabo com os olhos, passando pela aglomeração de edifícios e pela Lake Shore Drive. Não consigo ver onde ele termina, mas tenho certeza de uma coisa: se eu realmente encarar isso, vou descobrir.
Vamos descer em uma tirolesa, em um cabo de aço, apoiados por um arnês preto, de uma altura de trezentos metros.
– Meu Deus do céu! – diz Uriah.
A única coisa que consigo fazer é acenar com a cabeça.
Shauna é a primeira a vestir o arnês. Ela se contorce para a frente, de barriga para baixo, até que a maior parte de seu corpo esteja apoiada no tecido escuro. Em seguida, Zeke prende uma cinta ao redor dos seus ombros, outra na parte mais estreita de suas costas e outras duas nas suas coxas. Então a puxa, no arnês, até a beirada do edifício, contando regressivamente a partir de cinco. Shauna levanta o polegar, sinalizando que está pronta, e ele a empurra para a frente, em direção ao nada.
Lynn fica sem ar enquanto Shauna voa de cabeça em direção ao chão, em um ângulo fechado de inclinação. Passo à sua frente para conseguir enxergar melhor. Ela permanece presa de maneira segura ao arnês até onde consigo ver, mas depois fica longe demais, tornando-se apenas um pontinho preto sobre a Lake Shore Drive.
Os membros comemoram, levantando os punhos no ar, e formam uma fila, ocasionalmente empurrando uns aos outros para conseguir um lugar melhor. Não sei como, mas acabo sendo a primeira entre os iniciandos da fila, logo à frente de Uriah. Apenas sete pessoas se encontram entre mim e o cabo.
Mesmo assim, algo dentro de mim reclama: ainda preciso esperar sete pessoas? É uma mistura estranha de terror e ansiedade, que eu nunca havia sentido até agora.
O próximo membro, um rapaz de aparência jovem e cabelo comprido até os ombros, prende-se ao arnês de costas, e não de barriga para baixo. Ele estica bem os braços à medida que Zeke o empurra pelo cabo de aço.
Nenhum dos membros demonstra qualquer sinal de medo. Eles agem como se já tivessem feito isso milhares de vezes, e talvez realmente tenham. Mas, quando olho para trás, vejo que a maioria dos iniciandos parece pálida e preocupada, mesmo conversando animadamente. O que
acontece entre a iniciação e o momento de se tornar um membro da facção que faz com que o pânico se transforme em diversão? Ou será que as pessoas simplesmente aprendem a esconder melhor seus medos?
Três pessoas na minha frente. Outro arnês; o membro entra com os pés primeiro e cruza os braços sobre o seu peito. Duas pessoas. Um rapaz alto e largo pula feito uma criança antes de prender-se no arnês e solta um grito agudo ao desaparecer no ar, fazendo a garota na minha frente rir. Uma pessoa.
Ela se prende ao arnês com a cabeça para a frente e mantém as mãos esticadas enquanto Zeke aperta as cintas. Depois, é minha vez.
Meu corpo estremece à medida que Zeke prende meu arnês no cabo. Tento colocá-lo em volta do meu corpo, mas tenho dificuldade; minhas mãos estão tremendo demais.
– Não se preocupe – diz Zeke, próximo ao meu ouvido. Ele segura o meu braço e me ajuda a me preparar, prendendo-me de barriga para baixo.
Zeke aperta as cintas no meio do meu corpo e me empurra para a frente, até a beirada do telhado. Olho para baixo, para as vigas de aço e as janelas escuras do edifício, até a calçada rachada. Sou uma idiota por fazer isso. E uma idiota por gostar de sentir meu coração batendo contra minha caixa torácica e o suor se acumulando nas linhas das minhas mãos.
– Está pronta, Careta? – Zeke sorri de maneira jocosa para mim. – Devo admitir que estou impressionado por você não estar gritando e chorando.
– Eu falei – Uriah diz. – Ela é cem por cento Audácia. Agora, vamos logo com isso!
– Cuidado, irmãozinho, ou eu talvez não aperte sua cinta forte o bastante – diz Zeke. Ele dá um tapa no próprio joelho. – E aí, ploft!
– Está bem, está bem – diz Uriah. – Mamãe cozinharia você vivo.
Ouvi-lo falar de sua mãe, de sua família intacta, faz meu peito doer por um instante, como se alguém tivesse enfiado uma agulha nele.
– Só se ela descobrisse. – Zeke dá um puxão na roldana ligada ao cabo de aço. Para minha sorte, ela aguenta o peso, porque, se tivesse partido, minha morte seria rápida e certa.
Ele olha para mim e diz:
– Um, dois, três e j...
Antes de terminar a palavra “já”, ele solta o arnês e me esqueço dele, esqueço-me do Uriah, da minha família e de todas as coisas que poderiam dar errado agora e causar minha morte.
Ouço o som de metal deslizando em metal e sinto um vento tão intenso que faz com que lágrimas brotem dos meus olhos à medida que voo em direção ao chão.
Sinto-me como se meu corpo estivesse sem substância, sem peso. À minha frente, o pântano parece gigantesco, com seus trechos marrons se estendendo até os limites da minha visão, mesmo desta altura. O vento é tão frio e tão veloz que machuca meu rosto. Eu acelero, e um grito de júbilo brota dentro de mim, mas é interrompido pelo vento que entra na minha boca assim que ela se abre.
Segura pelas cintas, estendo os braços para os lados e imagino que estou voando. Mergulho em direção à rua, que está rachada e depredada, e segue perfeitamente a curva do pântano.
Posso imaginar, daqui de cima, como o pântano deveria parecer quando ainda estava cheio de água, como aço derretido refletindo a cor do céu.
Meu coração bate tão forte que o peito dói, e não consigo gritar ou respirar, mas ao mesmo tempo sinto tudo, cada veia e cada fibra, cada osso e cada nervo, todos vivos e alertas em meu corpo, como se tivessem recebido uma carga elétrica. Eu sou pura adrenalina.
O chão cresce e se aproxima de mim, e consigo ver as pessoas, pequenininhas, na calçada abaixo. Eu deveria gritar de pavor, como qualquer pessoa normal faria, mas ao abrir a boca solto apenas um urro de alegria. Grito mais alto, e as pessoas no chão levantam os punhos e gritam de volta, mas elas estão tão distantes que mal consigo ouvi-las.
Olho para baixo, e o chão se torna um borrão cinza, branco e preto, de vidro, cimento e aço.
Cachos de vento, tão macios quanto se fossem feitos de cabelo, enroscam-se entre meus dedos e puxam meus braços para trás. Tento puxar os braços para a frente outra vez, mas não tenho força o suficiente. O chão se torna cada vez maior.
Antes de começar a desacelerar, cerca de um minuto depois, ainda voo em linha paralela ao chão, como um pássaro.
Quando começo a voar mais devagar, corro os dedos pelos cabelos. O vento o deixou completamente emaranhado. Ao parar, fico pendurada a cerca de cinco metros do chão, mas a altura parece insignificante agora. Estico os braços para trás e me esforço para desfazer as cintas que estão me sustentando. Meus dedos tremem, mas mesmo assim consigo afrouxá-las.
Uma multidão de membros da Audácia me espera no chão. Eles seguram os braços uns dos outros, formando uma rede humana sob meu corpo.
Para descer, preciso acreditar que vão me segurar. Preciso aceitar que essas pessoas são minhas e que sou delas. O ato exige mais coragem do que descer na tirolesa.
Eu contorço o corpo para a frente e caio. Meu corpo se choca violentamente contra seus braços. Ossos de mãos e antebraços pressionam minhas costas, até que algumas mãos seguram meus braços e me colocam de pé. Não sei de quem são as mãos que me seguram; vejo sorrisos e ouço risadas.
– O que você achou? – pergunta Shauna, dando um tapinha em meu ombro.
– É... – Todos os membros me encaram. Parecem tão excitados com a experiência quanto eu, com um brilho de adrenalina em seus olhos e os cabelos bagunçados. Eu entendo por que meu pai considerava a Audácia um bando de loucos. Ele não entendia, nem poderia entender, o tipo de camaradagem que se forma depois que um grupo de pessoas arriscou junto suas vidas.
– Quando posso ir de novo? – digo. Abro um sorriso grande o bastante para mostrar meus dentes e, quando eles riem, começo a rir junto. Lembro-me de subir as escadas com a Abnegação, onde todos os pés seguiam o mesmo ritmo e todas as pessoas eram iguais. Isto aqui é completamente diferente. Mas também somos, de alguma maneira, um só ser.
Olho para o edifício Hancock, que agora está tão longe que não consigo ver as pessoas no telhado.
– Olhem! Lá vem ele! – diz alguém, apontando o dedo sobre meu ombro. Sigo o dedo até uma pequena forma escura descendo pelo fio de aço. Alguns segundos depois, ouço um grito de gelar o coração.
– Aposto que ele vai chorar.
– O irmão do Zeke, chorar? Duvido. Ele apanharia muito.
– Ele está se debatendo!
– Parece um gato sendo estrangulado – digo. Todos riem novamente. Sinto um pouco de culpa por caçoar do Uriah pelas costas, mas eu teria dito a mesma coisa se ele estivesse aqui embaixo. Pelo menos, espero que sim.
Quando Uriah finalmente chega, junto-me aos membros para recebê-lo. Alinhamo-nos sob seu corpo e erguemos os braços no espaço entre nós. Shauna prende uma de suas mãos em meu cotovelo. Eu seguro outro braço, que já não sei a quem pertence em meio a tantas mãos entrelaçadas, e olho para ela.
– Acho que já não podemos mais chamar você de “Careta”, Dul – diz Shauna.


 


 


 


 


                                                     +++


 


 


 


 


Ainda sinto o cheiro do vento ao entrar no refeitório à noite. Logo que entro, vejo que estou no meio de um grupo de pessoas da Audácia e me sinto uma delas. Shauna acena para mim e o grupo se dispersa, então caminho até a mesa onde Anahí, Al e Afonso estão sentados, me olhando, boquiabertos.
Não pensei neles quando aceitei o convite de Uriah. De certa maneira, é agradável ver seus olhares de estupefação. Mas também não quero que eles fiquem chateados comigo.
– Onde você esteve? – pergunta Anahí. – O que você estava fazendo com eles?
– Uriah... sabe, o iniciando da Audácia que estava na nossa equipe de caça-bandeira? – digo. – Ele estava saindo com alguns dos membros e implorou para que eu fosse com ele. Mas os outros não queriam muito a minha companhia. Uma garota chamada Lynn pisou em mim.
– Eles podiam até não querer que você fosse – diz Afonso calmamente –, mas parecem gostar de você agora.
– É – digo. Não há como negar. – Mas estou feliz em estar de volta.
Espero que eles não notem que estou mentindo, mas é difícil esconder. Vi meu reflexo em uma janela ao voltar para o complexo, e tanto minhas bochechas quanto meus olhos estavam brilhando, e meu cabelo estava bagunçado. Minha aparência é de quem acabou de passar por uma experiência poderosa.
– Bem, você perdeu Anahí quase socando um cara da Erudição – diz Al. Há um tom de ansiedade em sua voz. Sempre posso contar com Al para amenizar as tensões. – Ele veio aqui para perguntar a nossa opinião a respeito da liderança da Abnegação, e Anahí disse a ele que deveria se preocupar com coisas mais importantes.
– Ela tem toda a razão – afirma Afonso. – Mas ficou irritado com ela, o que não é uma boa ideia.
– De fato, é uma péssima ideia – digo, concordando com a cabeça. Se eu sorrir o bastante, talvez possa fazê-los esquecer a inveja, a mágoa ou o que quer que seja que está fervendo agora por trás dos olhos de Anahí.
– É – diz ela. – Enquanto você estava lá se divertindo, eu estava me encarregando do trabalho sujo de defender sua antiga facção, eliminando o conflito entre facções...
– Ah, fala sério! Você sabe que gostou de fazer aquilo – diz Afonso, cutucando-a com o cotovelo. – Se não for contar a história direito, deixa que eu conto. Ele estava parado...
Afonso começa a contar sua versão dos fatos, e eu mexo a cabeça como se estivesse ouvindo, mas a única coisa que consigo pensar é em estar no topo do edifício Hancock, olhando para baixo, e a imagem que passou pela minha cabeça do pântano cheio de água, de volta à sua antiga glória. Olho para os membros da Audácia, por trás dos ombros de Afonso, que agora estão lançando pedaços de comida uns nos outros com seus garfos.
É a primeira vez que me sinto realmente ansiosa para me tornar um deles.
Isso significa que terei que sobreviver ao próximo estágio da iniciação.



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Autor(a): Fer Linhares

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Ao que me parece, o segundo estágio da iniciação consiste em ficarmos sentados com outros iniciandos em um corredor escuro, imaginando o que irá acontecer por trás de uma porta fechada.Uriah senta-se de frente para mim, com Marlene à sua esquerda e Lynn à sua direita. Os iniciandos nascidos na Audácia e o ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 13



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  • manoellaaguiar_ Postado em 09/10/2016 - 14:43:04

    Continuaaa

  • manoellaaguiar_ Postado em 06/10/2016 - 22:22:23

    Continua ❤️

  • manoellaaguiar_ Postado em 04/10/2016 - 18:30:16

    Continuaaa

  • manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 21:14:21

    Brigadaaa! Continuaaa

  • manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 15:53:35

    Continuaaa! Faz maratonaaa!

  • manoellaaguiar_ Postado em 02/10/2016 - 14:43:08

    Eu nunca li o livro convergente pq eu N TO preparada pra aquele negocio que acontece hahahah! Já comprei a quase um ano e ainda tá guardado lá, um dia eu pego ele!

  • manoellaaguiar_ Postado em 01/10/2016 - 19:20:24

    Tá maravilhosaaa! Já vi esse filme e adorei! E tô amando a adaptação agora

  • manoellaaguiar_ Postado em 28/09/2016 - 22:35:16

    Cnttt

  • manoellaaguiar_ Postado em 27/09/2016 - 20:38:10

    Continuaaa

  • Postado em 25/09/2016 - 21:24:21

    Aaai deusss! Continuaaa


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