Fanfic: Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.) | Tema: Série Divergente
Depois docafé da manhã, falo para Christopher que vou dar uma caminhada, mas sigo Víctor. Achava que ele iria para o dormitório de hóspedes, mas atravessa o campoatrás do refeitório e entra no edifício de filtragem de água. Paro no primeiro degrau que leva à porta. Será que realmente quero fazer isso?
Subo os degraus e atravesso a porta que Víctor acabou de fechar.
O edifício de filtragem é pequeno, um ambiente único com algumas máquinas grandes dentro. Até onde sei, algumas das máquinas recebem a água suja do restante do complexo, outras a purificam, outras a testam e as últimas bombeiam a água limpa de volta para o complexo. Todos os sistemas de encanamento são subterrâneos, exceto um, que passa sobre o chão e leva água até a usina de energia.
Víctor fica parado ao lado das máquinas que filtram a água. Algumas têm canos transparentes. Dá para ver a água entrar, amarronzada, desaparecer dentro da máquina e sair limpa. Nós dois assistimos o processo de purificação, e eu me pergunto se ele está pensando a mesma coisa que eu. Como seria bom se a vida funcionasse assim, livrando-nos da nossa sujeira e nos devolvendo, limpos, para o mundo. Mas certas sujeiras parecem destinadas a durar.
Encaro a parte de trás da cabeça de Víctor. Preciso fazer isso agora.
Agora.
– Ouvi o que você disse outro dia.
Víctor vira a cabeça rapidamente.
– O que você está fazendo, Dulce?
– Segui você até aqui. – Cruzo os braços. – Ouvi você falando com a Johanna sobre o que motivou Jeanine a atacar a Abnegação.
– A Audácia lhe ensinou a invadir a privacidade das pessoas assim, ou você aprendeu isso sozinha?
– Sou uma pessoa naturalmente curiosa. Não mude de assunto.
Vícitor franze a testa, especialmente entre as sobrancelhas, e há marcas fortes nos lados de sua boca. Ele parece ser uma pessoa que passou a maior parte da vida franzindo a testa. Talvez tenha sido bonito quando era mais jovem, e pode até ainda ser para mulheres da sua idade, como Johanna, mas tudo o que vejo quando olho para ele são os olhos vazados e escuros da paisagem do medo de Christopher.
– Se você me ouviu conversando com Johanna, sabe que não revelei isso nem para ela. Então, o que a leva a acreditar que eu compartilharia essa informação com você?
A princípio, não sei o que dizer. Mas subitamente a resposta me vem à cabeça.
– Meu pai. Meu pai está morto.
É a primeira vez que verbalizo isso desde que contei para Christopher, no caminho de trem até aqui, que meus pais morreram por mim. A palavra “morreram” era só um fato então, desvinculado de qualquer emoção. Mas agora a palavra “morto”, misturada aos sons da água mexendo e borbulhando na sala, me atinge como uma marreta no peito, e o monstro da tristeza acorda, cravando suas garras nos meus olhos e na minha garganta.
Forço-me a continuar:
– Talvez ele não tenha morrido pela informação a qual você se refere, mas quero saber se ele arriscou a vida por ela.
A boca de Víctor treme.
– Sim – diz ele. – Ele arriscou.
Meus olhos se enchem de lágrimas, e eu pisco para contê-las.
– Bem – continuo, quase engasgando. – Então, que diabo de informação era essa? Era algo que vocês estavam tentando proteger? Ou roubar? Ou o quê?
– Era... – Víctor balança a cabeça. – Não vou contar.
Caminho em sua direção.
– Mas você a quer de volta. E Jeanine está com ela.
Víctor realmente é um bom mentiroso. Ou, no mínimo, uma pessoa boa em esconder segredos. Ele não reage. Gostaria de poder enxergá-lo como Johanna o enxerga; como a Franqueza o enxerga. Gostaria de poder ler as suas expressões.
Ele pode estar perto de revelar a verdade. Se eu o pressionar o suficiente, talvez ele ceda.
– Eu poderia ajudá-lo – digo.
O lábio superior de Marcus se contorce.
– Você não tem a menor ideia do quão ridículo é o que está falando. – Ele cospe as palavras contra mim. – Você pode ter conseguido desligar a simulação de ataque, garota, mas foi por pura sorte, e não por suas habilidades. Eu morreria de surpresa se você conseguisse fazer qualquer outra coisa de útil por um bom tempo.
Esse é o Víctor que Christopher conhece. O Víctor que sabe exatamente onde atingir uma pessoa para causar o máximo de dano possível.
Meu corpo treme de raiva.
– Christopher tem razão sobre você – respondo. – Você não passa de um monte de lixo, arrogante e mentiroso.
– Ele disse isso, é? – Víctor ergue uma das sobrancelhas.
– Não – respondo. – Ele não fala sobre você o bastante para dizer algo assim. Descobri isso por conta própria. – Cerro os dentes. – Você não significa
praticamente nada para ele, sabia? E, com o passar do tempo, significará cada vez
menos.
Víctor não responde, mas apenas se vira novamente para o filtro de água. Fico parada por um instante, absorvendo a minha própria vitória, enquanto o som da água corrente se mistura ao do batimento cardíaco em meus ouvidos. Em seguida, deixo o edifício e, apenas quando já atravessei metade do campo, me dou conta de que não venci a discussão. Víctor venceu.
Seja lá qual for a verdade, vou ter que descobri-la de outra maneira, porque não vou perguntar novamente.
+++
Naquela noite, sonho que estou em um campo e que encontro um bando de corvos no chão. Quando afasto alguns deles, percebo que estão sobre um homem, bicando as suas roupas cinzentas como as da Abnegação. Subitamente, os corvos voam, e eu percebo que o homem é Afonso.
De repente, acordo.
Aperto o rosto contra o travesseiro e solto, não o seu nome, mas um soluço que lança o meu corpo contra o colchão. Sinto o monstro da tristeza novamente, contorcendo-se no espaço vazio onde meu coração e estômago costumavam ficar.
Puxo o ar com força, as duas mãos sobre o peito. Agora, a criatura monstruosa está com as garras presas na minha garganta, impedindo a passagem de ar. Viro o corpo e encaixo a cabeça entre meus joelhos, respirando até que a sensação de estrangulamento tenha desaparecido.
O ar está quente, mas meu corpo treme. Levanto-me da cama e me arrasto pelo corredor até o quarto de Christopher. Minhas pernas nuas quase brilham no escuro. A porta range quando eu a abro, e ele acorda. Ele me encara por um segundo.
– Vem aqui – diz ele, lento de sono, e se ajeita na cama para abrir espaço para
mim.
Eu deveria ter pensado melhor sobre isso. Durmo com uma camiseta comprida
que a Amizade me emprestou. Ela não chega a cobrir as minhas coxas, e eu não
pensei em colocar um short antes de vir aqui. Christopher passa os olhos pelas minhas pernas nuas, e meu rosto esquenta. Deito-me ao seu lado, virada para ele.
– Teve um pesadelo? – pergunta ele.
Concordo com a cabeça.
– O que houve?
Balanço a cabeça. Não posso revelar que estou tendo pesadelos com Afonso, ou teria que explicar o motivo. O que ele pensaria de mim se soubesse o que fiz?
Como será que me olharia?
Ele mantém a mão sobre a minha bochecha, movendo lentamente o polegar sobre a maçã do meu rosto.
– Nós estamos bem, sabia? Eu e você. Está bem?
Meu peito dói, e eu concordo com a cabeça.
– Tudo o mais está errado. – Seu sussurro faz cócegas na minha bochecha. – Mas
nós estamos bem.
– Christopher – digo. Mas o que quer que eu fosse dizer se perde na minha cabeça, e aperto os lábios contra os dele, porque sei que beijá-lo vai me distrair de todo o resto.
Ele me beija de volta. Sua mão começa a acariciar a minha bochecha, depois desce pela lateral do meu corpo, passando pela dobra da minha cintura, cobrindo a curva do meu quadril e deslizando pela minha perna nua, fazendo-me estremecer.
Eu me aproximo mais e o envolvo com as pernas. Minha cabeça zune com o nervosismo, mas o restante do meu corpo parece saber exatamente o que está fazendo, pulsando em um único ritmo e desejando a mesma coisa: escapar de si mesmo e tornar-se parte do corpo dele.
Sua boca move-se contra a minha, e sua mão desliza sob a barra da minha camiseta, e eu não tento impedi-lo, embora saiba que deveria. Solto um pequeno suspiro, e a vergonha faz o meu rosto esquentar. Christopher não me ouviu, ou não se importou, porque pressiona a palma da mão contra a parte inferior das minhas costas, me aproximando mais ainda. Seus dedos movem-se lentamente para cima das minhas costas, seguindo a minha coluna. Minha camiseta desliza para cima, e eu não a abaixo, mesmo quando sinto o ar frio contra a minha barriga.
Ele beija o meu pescoço e eu seguro o seu ombro para me estabilizar, agarrando a sua camiseta. Sua mão alcança o topo das minhas costas e se enrosca no meu pescoço. Minha camiseta está enrolada em seu braço e nós nos beijamos desesperadamente. Sei que minhas mãos estão tremendo com toda a energia e o nervosismo que há dentro de mim, portanto aperto ainda mais o seu ombro, para disfarçar.
Em seguida, seus dedos roçam o curativo sobre o meu ombro, e uma pontada de dor atravessa o meu corpo. Seu toque não doeu tanto, mas me trouxe de volta à realidade. Não posso ficar com ele dessa maneira, se um dos motivos do meu desejo é apenas a vontade de me distrair do meu sofrimento.
Inclino o corpo para trás e cuidadosamente abaixo a barra da minha camiseta para cobrir-me novamente. Por um instante, ficamos apenas deitados, misturando nossas respirações. Não quero chorar. Não, agora não é uma boa hora para chorar.
Preciso me segurar. Mas não consigo afastar as lágrimas, não importa o quanto
pisque.
– Desculpe.
– Não se desculpe – responde Christopher, quase severamente. Ele enxuga as lágrimas das minhas bochechas.
Sei que pareço um passarinho, estreita e pequena, e com a cintura reta e frágil, como que feita para voar. Mas, quando ele me toca desse jeito, como se não
conseguisse afastar a mão, não queria ser nem um pouco diferente.
– Não queria estar tão desequilibrada – digo, com a voz fraquejando. – Mas é que me sinto tão...
Balanço a cabeça.
– Isso é errado – afirma ele. – Não importa se seus pais estão em um lugar
melhor. Eles não estão aqui ao seu lado, e isso está errado, TDul. Isso não deveria
ter acontecido. Não deveria ter acontecido com você. E qualquer pessoa que diga que está tudo bem está mentindo.
Um soluço sacode o meu corpo novamente, e ele me envolve com seus braços com tanta força que tenho dificuldade em respirar, mas não importa. Se antes eu estava chorando com alguma dignidade, agora a coisa ficou feia. Minha boca se abre, meu rosto se contorce e sons parecidos com os de um animal morrendo escapam da minha garganta. Sinto que vou me despedaçar se continuar assim.
Talvez isso fosse até melhor. Talvez fosse melhor simplesmente me despedaçar e não precisar mais carregar esse peso.
Christopher passa um longo período em silêncio, até que eu também me calo.
– Durma – diz ele. – Eu vou protegê-la dos pesadelos, se eles vierem atrás de você.
– Com o quê?
– Com as minhas mãos, é claro.
Envolvo sua cintura com um braço e respiro fundo contra o seu ombro. Ele cheira a suor, ar puro e menta. O cheiro de menta é da pomada que usa às vezes para relaxar músculos doloridos. Ele também cheira a segurança, como uma caminhada por um pomar ensolarado ou um café da manhã silencioso no refeitório. Nos momentos antes de cair no sono, quase me esqueço da nossa cidade devastada pela guerra e do conflito que nos encontrará em breve, se nós não o encontrarmos primeiro.
Antes de dormir, ouço-o sussurrar:
– Eu te amo, Dul.
Eu poderia responder, mas já estou longe demais.
Comentem!!!
Autor(a): Fer Linhares
Este autor(a) escreve mais 10 Fanfics, você gostaria de conhecê-las?
+ Fanfics do autor(a)Prévia do próximo capítulo
Naquela manhã, acordo ao som de um barbeador elétrico. Christopher está diante do espelho, com a cabeça inclinada para conseguir enxergar o canto do queixo.Abraço os meus joelhos cobertos pelo lençol e o assisto.– Bom dia – diz ele. – Dormiu bem?– Dormi. – Eu me levanto e, enquanto ele inclina a cab ...
Capítulo Anterior | Próximo Capítulo
Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 13
Para comentar, você deve estar logado no site.
-
manoellaaguiar_ Postado em 09/10/2016 - 14:43:04
Continuaaa
-
manoellaaguiar_ Postado em 06/10/2016 - 22:22:23
Continua ❤️
-
manoellaaguiar_ Postado em 04/10/2016 - 18:30:16
Continuaaa
-
manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 21:14:21
Brigadaaa! Continuaaa
-
manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 15:53:35
Continuaaa! Faz maratonaaa!
-
manoellaaguiar_ Postado em 02/10/2016 - 14:43:08
Eu nunca li o livro convergente pq eu N TO preparada pra aquele negocio que acontece hahahah! Já comprei a quase um ano e ainda tá guardado lá, um dia eu pego ele!
-
manoellaaguiar_ Postado em 01/10/2016 - 19:20:24
Tá maravilhosaaa! Já vi esse filme e adorei! E tô amando a adaptação agora
-
manoellaaguiar_ Postado em 28/09/2016 - 22:35:16
Cnttt
-
manoellaaguiar_ Postado em 27/09/2016 - 20:38:10
Continuaaa
-
Postado em 25/09/2016 - 21:24:21
Aaai deusss! Continuaaa