Fanfic: Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.) | Tema: Série Divergente
Atravesso a multidão ao lado do abismo. O Fosso está barulhento, e não apenas por causa do ronco do rio. Quero encontrar um pouco de silêncio, então escapo para o corredor que leva aos dormitórios. Não quero ouvir o discurso que Maite fará em homenagem a Marlene, nem estar por perto dos brindes e dos gritos quando os membros da Audácia celebrarem sua vida e sua coragem.
Esta manhã, Lauren disse que havíamos esquecido algumas das câmeras nos dormitórios dos iniciandos, onde Anahí, Zeke, Lauren, Marlene, Hector e Kee, a menina da mecha verde, estavam dormindo. É assim que Jeanine descobriu quem estava sendo controlado pela simulação. Não tenho a menor dúvida de que Jeanine escolheu membros jovens da Audácia porque sabia que suas mortes nos afetariam mais.
Paro em um corredor que não reconheço e encosto a testa na parede. A pedra é fria e áspera. Consigo ouvir os gritos dos membros da Audácia atrás de mim, abafados pelas camadas de pedra.
Ouço alguém se aproximando e olho para o lado. Anahí, ainda vestida com as mesmas roupas de ontem à noite, está a alguns metros de mim.
– Oi – diz ela.
– Não estou em condições de me sentir ainda mais culpada agora. Então, por favor, vá embora.
– Só quero dizer uma coisa, depois eu saio.
Seus olhos estão inchados e sua voz, sonolenta não sei se pela exaustão, por ela ter bebido um pouco, ou por causa dos dois. Mas seu olhar é tão direto que eu imagino que ela deve saber o que está dizendo. Afasto-me da parede.
– Nunca tinha visto uma simulação como aquela. Sabe, de fora. Mas ontem... –
Ela balança a cabeça. – Você tinha razão. Eles não conseguiam ouvir você, não
conseguiam ver você. Assim como Afonso...
Anahí engasga ao falar o nome dele. Ela para, respira fundo, engole em seco e pisca algumas vezes. Depois, volta a olhar para mim.
– Você disse que precisou fazer aquilo, ou ele teria atirado em você, e eu não acreditei. Agora acredito, e... Vou tentar perdoar você. É... é só isso o que eu queria dizer.
Uma parte de mim fica aliviada. Ela acredita em mim e está tentando me perdoar, mesmo que não seja fácil.
Mas uma parte maior de mim sente raiva. O que ela pensava antes de agora?
Que eu queria atirar em Afonso, um dos meus melhores amigos? Ela deveria ter confiado em mim desde o princípio, deveria saber que eu não teria feito aquilo se tivesse conseguido enxergar outra opção na hora.
– Que sorte a minha você finalmente ter conseguido uma prova de que não sou
uma assassina de sangue-frio. Quer dizer, além da minha palavra. Por que você acreditaria em mim, não é mesmo? – Forço uma risada, tentando permanecer indiferente. Ela abre a boca, mas eu continuo falando, sem conseguir me conter: – É melhor você se apressar com essa história de me perdoar, porque não temos muito tempo...
Minha voz falha, e eu não consigo mais me controlar. Começo a soluçar. Apoiome na parede e sinto meu corpo deslizando para o chão, à medida que minhas pernas enfraquecem.
Minha visão está tão borrada que não consigo vê-la, mas sinto quando ela me envolve em seus braços e me aperta até doer. Ela cheira a óleo de coco e é forte, exatamente como era durante a iniciação da Audácia, quando ficou pendurada sobre o abismo pelas pontas dos dedos. Naquela época, que não faz tanto tempo assim, ela fazia com que eu me sentisse fraca, mas agora sua força faz com que eu sinta que posso ser mais forte também.
Nós nos ajoelhamos juntas no chão de pedra, e eu a agarro com a mesma força com que ela está me agarrando.
– Já foi – diz ela. – É isso o que eu queria dizer. Que eu já perdoei você.
+++
Todos os membros da Audácia se calam quando entro no refeitório aquela noite. Eu não os culpo. Como uma Divergente, tenho o poder de permitir que Jeanine mate um deles. A maioria deles provavelmente quer que eu me sacrifique por eles. Ou estão morrendo de medo de que eu não faça isso.
Se estivéssemos na Abnegação, não haveria um único Divergente sentado aqui agora.
Por um instante, não sei para onde ir, nem como chegar lá. Mas Zeke acena para mim, convidando-me para sua mesa com uma aparência triste, e eu guio meus passos em sua direção. Mas, antes que consiga chegar lá, sou abordada por Lynn.
É uma Lynn diferente da que conheço. O brilho de ferocidade em seu olhar se foi.
Agora ela está pálida e morde o lábio para fingir que ele não está tremendo.
– É... – diz ela. Ela olha para a esquerda, para a direita, para qualquer direção que não a minha cara. – Eu realmente... Sinto falta de Marlene. Eu a conhecia há muito tempo, e eu... – Ela balança a cabeça. – A questão é: não pense que o fato de eu falar isso tenha qualquer coisa a ver com Marlene – continua ela, como se estivesse me dando uma bronca. – Mas... obrigada por salvar Hec.
Lynn desloca seu peso de um pé para o outro, movendo rapidamente os olhos por todo o refeitório. Depois, ela me abraça com um braço, agarrando minha camisa. Sinto uma pontada de dor no ombro, mas não falo nada.
Ela me solta, funga, depois começa a caminhar em direção à sua mesa, como se nada tivesse acontecido. Olho para ela por alguns segundos enquanto ela volta para a mesa e se senta.
Zeke e Uriah estão sentados um ao lado do outro, e o restante dos assentos da mesa estão vazios. O rosto de Uriah está abatido, e ele nem parece estar completamente acordado. Há uma garrafa marrom-escura na frente dele, e ele dá um gole de vez em quando.
Sinto-me cautelosa perto dele. Salvei Hec, e isso significa que deixei de salvar
Marlene. Mas Uriah não olha para mim. Puxo a cadeira na frente dele e me sento na ponta.
– Onde está Shauna? – pergunto. – Ela ainda está no hospital?
– Não, ela está ali – diz Zeke, acenando com a cabeça em direção à mesa onde
Lynn foi se sentar. Vejo-a lá, tão pálida que parece translúcida, sentada em uma
cadeira de rodas. – Shauna não deveria ter saído da cama, mas Lynn está muito mal, e ela resolveu lhe fazer companhia.
– Mas, caso você esteja se perguntando por que elas estão tão longe de nós... é
porque Shauna descobriu que sou Divergente – explica Uriah, com a voz arrastada.
– E não quer que eu a contagie.
– Ah.
– Ela também está esquisita comigo – diz Zeke, suspirando. – Ela me perguntou
como posso saber que meu irmão não está trabalhando contra nós e se eu o tenho observado. Eu daria tudo para poder socar a pessoa que envenenou a mente dela.
– Você não precisa dar nada a ninguém – diz Uriah. – A mãe dela está sentada logo ali. Vá lá e bata nela.
Sigo seu olhar até uma mulher de meia-idade com mechas azuis no cabelo e orelhas cobertas de brincos até os lóbulos. Ela é bonita, assim como Lynn.
Christopher entra no refeitório um pouco depois, seguido por Maite e Harrison. Tenho evitado-o. Não conversamos desde a nossa discussão, antes do incidente com
Marlene...
– Olá, Dul – diz Christopher, quando está perto o bastante para que eu consiga ouvi-lo.
Sua voz é grave e áspera. Ela me transporta para lugares tranquilos.
– Olá – respondo, com uma voz travada que não me pertence.
Ele se senta ao meu lado e apoia o braço no encosto da minha cadeira,
inclinando-se para perto de mim. Não olho para ele. Eu me recuso a olhar para ele.
Olho para ele.
Seus olhos são escuros, com um tom peculiar de azul, capazes de fazer sumir todo o restante do refeitório, de me confortar, mas também de me lembrar de que estamos mais distantes um do outro do que eu gostaria que estivés semos.
– Você não vai me perguntar se estou bem?
– Não. Tenho certeza de que você não está. – Ele balança a cabeça. – Vou apenas pedir que você não tome nenhuma decisão até que tenhamos conversado a respeito disso.
Tarde demais, penso. A decisão já foi tomada.
– Você quer dizer até que tenhamos todos conversado a respeito disso, porque isso envolve todos nós – acrescenta Uriah. – Acho que ninguém deve se entregar.
– Ninguém? – pergunto.
– Não! – diz Uriah, irritado. – Acho que devemos contra-atacar.
– Boa ideia – digo, secamente. – Vamos provocar a mulher capaz de forçar metade deste complexo a se suicidar. É uma ótima ideia.
Fui dura demais. Uriah vira o conteúdo de sua garrafa na boca. Ele bate com a garrafa na mesa com tanta força que acho que ela vai quebrar.
– Não fale sobre isso dessa maneira – diz ele, rugindo.
– Desculpe, mas você sabe que tenho razão. A melhor maneira de evitar a morte de metade da nossa facção é sacrificando uma única vida.
Não sei o que esperar. Talvez que Uriah, que sabe muito bem o que acontecerá se um de nós não se entregar, se voluntarie. Mas ele abaixa a cabeça. Não quer fazer isso.
– Eu, Maite e Harrison decidimos aumentar a segurança. Esperamos que, se todos estiverem mais cientes desses ataques, conseguiremos evitá-los – diz Christopher. – Se isso não funcionar, pensaremos em outra solução. Fim de papo. Mas ninguém fará nada por enquanto. Certo?
Ele olha para mim ao falar isso, erguendo as sobrancelhas.
– Está bem – concordo, sem encará-lo de volta.
+++
Depois do jantar, tento voltar para o dormitório onde tenho dormido, mas não consigo passar pela porta. Então ando pelos corredores, roçando os dedos pelas paredes de pedra, ouvindo os ecos dos meus passos.
Sem querer, passo pelo bebedouro onde Peter, Drew e Al me atacaram. Descobri
que era o Al por causa do seu perfume. Até hoje me lembro do cheiro de erva-cidreira.
Hoje, não o associo mais ao meu amigo, mas à impotência que senti quando eles me arrastaram até o abismo.
Caminho mais rápido, mantendo os olhos bem abertos, para tentar evitar que a cena do ataque volte à minha mente. Preciso sair daqui, me afastar dos lugares
onde meu amigo me atacou, onde Peter esfaqueou Edward, onde um exército inconsciente de amigos meus começou sua marcha em direção ao setor da Abnegação, dando início a toda essa loucura.
Vou direto ao último lugar onde me senti segura: o pequeno apartamento de
Chistopher. Assim que alcanço a porta, sinto-me mais calma.
A porta não está completamente fechada. Empurro-a com o pé. Ele não está lá, mas não vou embora. Sento-me na cama dele e seguro a colcha, mergulhando o rosto no tecido e respirando fundo. O antigo cheiro da colcha quase não existe mais; faz muito tempo que ele não dorme aqui.
A porta se abre e Chistopher entra. Meu braço amolece e a colcha cai no meu colo.
Como explicarei minha presença aqui? Eu deveria estar irritada com ele.
Ele não está carrancudo, mas sua boca está tão tensa que dá para ver que está
com raiva de mim.
– Não seja idiota – diz ele.
– Idiota?
– Você mentiu. Você disse que não iria para a Erudição, mas mentiu, e ir para a
Erudição faria de você uma idiota. Portanto, não vá.
Coloco a colcha na cama e me levanto.
– Não tente simplificar a situação – digo. – Ela não é simples. Você sabe muito bem que essa é a coisa certa a se fazer.
– Você escolheu esse momento para agir como alguém da Abnegação? – Sua voz preenche o quarto e faz meu peito formigar de medo. Sua raiva parece repentina demais. Estranha demais. – Você passou aquele tempo todo insistindo que era egoísta demais para eles, e agora que sua vida está em jogo, você resolve agir como uma heroína? Qual é o seu problema?
– Qual é o seu problema? Uma pessoa morreu. Ela se jogou do telhado! E eu posso impedir que isso ocorra novamente!
– Você é importante demais para simplesmente... morrer. – Ele balança a cabeça. Não consegue nem olhar para mim. Seus olhos ficam se desviando do meu rosto para a parede atrás de mim, ou para o teto, para tudo que não seja eu. Estou atordoada demais para sentir raiva.
– Não sou importante. Todos vão se sair bem sem mim.
– Quem se importa com os outros? E quanto a mim?
Ele abaixa a cabeça e a apoia em sua mão, cobrindo os olhos. Seus dedos estão tremendo.
Depois, atravessa o quarto a passos largos e encosta os lábios nos meus. A pressão delicada dos seus lábios apaga os últimos meses da minha vida, e eu me torno a menina sentada sobre as pedras do abismo, com gotículas da água do rio nas canelas, quando o beijei pela primeira vez. Sou a menina que segurou a mão dele no corredor só porque sentiu vontade de fazê-lo.
Afasto-me, com a mão apoiada em seu peito para mantê-lo distante. O problema
é que também sou a menina que atirou em Afonso, depois mentiu a respeito disso,
que escolheu entre Hector e Marlene e que fez tantas outras coisas. E não posso apagar tudo isso.
– Você ficaria bem. – Não olho para ele. Encaro sua camiseta por entre meus dedos e a tinta preta na curva de seu pescoço, mas não olho para seu rosto. – A princípio, não. Mas você seguiria em frente e faria o que precisa ser feito.
Ele envolve a minha cintura com um dos braços e me puxa para perto.
– Isso é uma mentira – diz ele, antes de me beijar nova mente.
Isso é errado. É errado esquecer a pessoa que me tornei e deixar que ele me beije quando sei muito bem o que estou prestes a fazer.
Mas eu quero isso. Ah, eu quero.
Fico na ponta dos pés e o envolvo em meus braços. Apoio a mão entre as suas omoplatas e coloco a outra ao redor do seu pescoço. Consigo sentir sua respiração na palma da mão, enquanto seu corpo se expande e contrai, e sei que ele é forte, estável, irrefreável. Todas as coisas que preciso ser, mas não sou. Não sou.
Ele caminha para trás, puxando-me consigo, e eu tropeço. Tropeço e meus pés escapam dos sapatos. Quatro se senta na beirada da cama, e fico em pé diante dele, finalmente nos encarando olho no olho.
Ele toca meu rosto, cobrindo minhas bochechas com as mãos, deslizando as pontas dos dedos pelo meu pescoço, encaixando-os na curva tênue dos meus quadris.
Não consigo impedi-lo.
Encaixo minha boca na dele. Ele tem gosto de água e cheira a ar fresco. Deslizo a mão do seu pescoço até a parte inferior das suas costas, e a enfio sob sua camisa. Ele me beija com mais força.
Sabia que ele era forte, mas não sabia o quanto até sentir os músculos das suas costas contraindo-se entre meus dedos.
Pare, digo a mim mesma.
De repente é como se estivéssemos com pressa, seus dedos acariciando a lateral do meu corpo sob minha camisa, minhas mãos agarrando-o, enquanto nos esforçamos para chegar mais perto um do outro, embora seja impossível.
Ele se afasta apenas o suficiente para me olhar nos olhos, com as pálpebras semicerradas.
– Prometa-me que você não vai – sussurra ele. – Por mim. Faça apenas isso por mim.
Será que eu conseguiria fazer isso? Será que conseguiria ficar aqui, resolver as coisas com ele, deixar alguém morrer em meu lugar? Olhando para ele, acredito por um instante que eu conseguiria. De repente, vejo Afonso. A ruga entre suas sobrancelhas. Seus olhos vazios, dominados pela simulação. Seu corpo caído.
Faça apenas isso por mim. Os olhos escuros de Christopher imploram.
Mas, se eu não for à Erudição, quem irá? Christopher? É o tipo de coisa que ele faria.
Sinto uma pontada no peito ao mentir para ele.
– Está bem.
– Você promete? – pergunta ele, franzindo a testa.
A pontada vira uma dor, espalhando-se por todo o meu corpo, em uma mistura de culpa, medo e anseio.
– Prometo – respondo.
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Autor(a): Fer Linhares
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 13
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manoellaaguiar_ Postado em 09/10/2016 - 14:43:04
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 06/10/2016 - 22:22:23
Continua ❤️
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manoellaaguiar_ Postado em 04/10/2016 - 18:30:16
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 21:14:21
Brigadaaa! Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 15:53:35
Continuaaa! Faz maratonaaa!
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manoellaaguiar_ Postado em 02/10/2016 - 14:43:08
Eu nunca li o livro convergente pq eu N TO preparada pra aquele negocio que acontece hahahah! Já comprei a quase um ano e ainda tá guardado lá, um dia eu pego ele!
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manoellaaguiar_ Postado em 01/10/2016 - 19:20:24
Tá maravilhosaaa! Já vi esse filme e adorei! E tô amando a adaptação agora
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manoellaaguiar_ Postado em 28/09/2016 - 22:35:16
Cnttt
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manoellaaguiar_ Postado em 27/09/2016 - 20:38:10
Continuaaa
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Postado em 25/09/2016 - 21:24:21
Aaai deusss! Continuaaa