Fanfic: Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.) | Tema: Série Divergente
Quando todos os iniciandos já estão novamente em terra firme, Lauren e Quatro nos guiam por um túnel estreito. As paredes são de pedra e o teto é em declive, fazendo com que eu sinta como se estivesse descendo para o centro da terra. Há longos intervalos entre as áreas iluminadas do túnel, e nas áreas escuras entre a luz fraca de uma lâmpada e outra, sinto que perdi o caminho, até que um ombro esbarra contra o meu. Nos locais iluminados, sinto-me segura novamente.
O garoto da Erudição à minha frente para de repente, e esbarro nele, batendo com o nariz em seu ombro. Recuo um pouco e esfrego a mão no nariz, recuperando-me da pancada. Todo mundo parou, e nossos três líderes se voltam para nós com os braços cruzados.
– É aqui que nos separamos – diz Lauren. – Os iniciandos nascidos na Audácia vêm comigo.
Acho que vocês não precisam de um tour do local.
Ela sorri e acena na direção dos iniciandos nascidos na Audácia. Eles se separam do grupo e partem em meio às sombras. Vejo o último deles sumir na escuridão e olho para os que restaram. A maior parte dos iniciandos era da Audácia, portanto só restam nove pessoas.
Destas, sou a única que era da Abnegação, e não há ninguém da Amizade. O resto do grupo é da Erudição e, por incrível que pareça, da Franqueza. Ser honesto o tempo todo deve exigir coragem. Eu não saberia dizer.
Quatro fala conosco em seguida.
– Eu geralmente trabalho na sala de controle, mas durante as próximas semanas, serei seu instrutor – diz ele. – Meu nome é Quatro.
– Quatro? Como o número? – pergunta Anahí.
– Sim – responde ele. – Você tem algum problema com isso?
– Não.
– Ótimo. Nós estamos prestes a entrar no Fosso, que vocês um dia irão aprender a amar. Ele...
Anahí ri jocosamente.
– Fosso? Que ótimo nome.
Quatro caminha até Anahí e aproxima o rosto do dela. Seus olhos se estreitam e por um instante ele simplesmente a encara.
– Qual é o seu nome? – pergunta ele calmamente.
– Anahí – responde ela baixinho.
– Bem, Anahí, se eu quisesse aguentar os espertinhos da Franqueza, teria me juntado à sua facção – diz ele, irritado. – A primeira lição que você aprenderá de mim é como manter sua boca calada. Entendeu bem?
Ela acena que sim com a cabeça.
Quatro se dirige às sombras no fim do túnel. O grupo de iniciandos segue-o em silêncio.
– Que canalha! – resmunga ela.
– Acho que ele não gosta que riam dele – respondo.
Percebo que é melhor eu tomar cuidado com Quatro. Ele me pareceu tranquilo quando estávamos na plataforma, mas há algo no seu jeito calmo que me inquieta agora.
Quatro empurra uma porta dupla e entramos no lugar que ele chamou de “Fosso”.
– Ah – sussurra Anahí. – Agora entendi.
“Fosso” é realmente a melhor maneira de descrever o lugar. É uma caverna subterrânea tão grande que, do fundo, onde estou, não consigo ver o outro lado. Paredes de rochas desniveladas se agigantam por vários andares sobre minha cabeça. Há espaços reservados para comida, roupas, acessórios e atividades de lazer, construídos nas paredes de pedra. Caminhos estreitos e degraus entalhados nas rochas conectam esses espaços. Não há qualquer barreira para impedir que pessoas despenquem das passagens.
Uma área inclinada de luz laranja estende-se por uma das paredes de pedra. O teto do Fosso é composto de painéis de vidro e, sobre eles, há um edifício que permite a entrada da luz solar. O prédio deve ter parecido apenas mais uma construção urbana quando passamos por ele de trem.
Luminárias azuis estão penduradas em intervalos aleatórios sobre os caminhos de pedra e se parecem com as que iluminavam o Salão de Escolha. À medida que a luz do sol se torna mais fraca, elas se tornam mais fortes.
Há pessoas por todo lado, todas vestidas de preto, e todas falando, gritando e gesticulando expressivamente. Não vejo nenhum idoso em meio à multidão de pessoas. Será que existe alguém velho na Audácia? Será que eles não duram tanto tempo ou são simplesmente mandados embora quando não conseguem mais saltar de trens em movimento?
Um grupo de crianças corre tão rápido por um caminho estreito, sem qualquer grade de proteção, que meu coração acelera, e quase grito para que corram mais devagar, para que não se machuquem. Lembro-me das ruas ordenadas da Abnegação: uma fileira de pessoas na direita passando por uma fileira de pessoas na esquerda, sorrisos contidos, cabeças inclinadas para baixo e silêncio. Meu estômago aperta. Mas há algo de maravilhoso no caos da Audácia.
– Sigam-me – diz Quatro –, e lhes mostrarei o abismo.
Ele faz um sinal para que sigamos em frente. A aparência de Quatro parece mansa, se comparada à da maioria dos integrantes da Audácia, mas, quando ele se vira, vejo o trecho de uma tatuagem saindo de trás da gola de sua camiseta. Ele nos guia para o lado direito do Fosso, que está completamente escuro. Forço os olhos e vejo que o chão em que estou pisando
termina em uma grade de metal. Ao nos aproximarmos dela, ouço um ruído alto: água, água correndo rapidamente, chocando-se contra as rochas.
Olho para baixo. O chão termina em um desfiladeiro íngreme, e vários metros abaixo de nós há um rio. A água se choca violentamente contra a parede abaixo de mim e uma nuvem de gotículas é lançada para o alto. À minha esquerda a água é mais calma, mas à direita ela se torna branca em sua batalha contra as rochas.
– O abismo serve para nos lembrar que há um limite tênue entre a coragem e a estupidez! – grita Quatro. – Um salto intrépido para dentro dele tomaria a sua vida. Isso já ocorreu antes e ocorrerá novamente. Que isso lhes sirva de aviso.
– Isso é incrível – diz Anahí, enquanto nos afastamos da grade.
– É realmente incrível – respondo, assentindo com cabeça.
Quatro guia o grupo de iniciandos pelo Fosso, em direção a um enorme buraco na parede. O aposento que se encontra além do buraco é iluminado o bastante para que eu perceba para onde estamos nos dirigindo: um refeitório repleto de pessoas e ruídos de talheres. Ao entrarmos, os integrantes da Audácia se levantam. Eles nos aplaudem. Batem os pés no chão. Gritam. O barulho me cerca e me preenche. Anahí sorri e, logo depois, também sorrio.
Procuramos assentos livres. Anahí e eu encontramos uma mesa praticamente vazia em um dos cantos do salão, e acabo me sentando entre ela e Quatro. No centro da mesa, há uma bandeja com uma comida que não conheço: pedaços circulares de carne entre fatias redondas de pão. Seguro um deles entre meus dedos, sem saber ao certo o que fazer.
Quatro me cutuca com o cotovelo.
– Isto é carne – diz ele. – Coloque isto dentro. – Ele me passa um pequeno pote que está cheio de um molho vermelho.
– Você nunca comeu hambúrguer? – pergunta Anahí, com os olhos arregalados.
– Não – respondo. – É assim que se chama?
– Os Caretas comem comida simples – diz Quatro, acenando para Anahí.
– Por quê? – pergunta ela.
Dou de ombros.
– A extravagância é considerada autocomplacente e desnecessária.
Ela solta uma risadinha.
– Não me admira que você tenha partido.
– Claro – digo, girando os olhos para cima. – Foi só por causa da comida.
Quatro contorce o canto da boca.
As portas do refeitório se abrem e o silêncio domina o espaço. Eu olho para trás. Um jovem entra, e o salão fica tão silencioso que consigo ouvir seus passos. Seu rosto é perfurado por tantos piercings que eu mal consigo contá-los, e seu cabelo é longo, escuro e ensebado. Mas não é isso o que faz com que ele pareça ameaçador, e sim a expressão fria em seus olhos, que varrem o refeitório.
– Quem é esse? – sussurra Anahí.
– Seu nome é Eric – Quatro responde. – Ele é um de nossos líderes.
– Sério? Mas ele é tão jovem.
Quatro a encara severamente.
– A idade não importa aqui.
Percebo que ela está prestes a perguntar algo que eu também gostaria de saber: Então o que importa? Mas os olhos de Eric param de vagar pelo refeitório e ele começa a se dirigir a uma mesa. Começa a se dirigir à nossa mesa, sentando-se ao lado de Quatro. Não nos cumprimenta, e por isso também não o cumprimentamos.
– E então, não vai me apresentar? – pergunta, acenando a cabeça para mim e para Anahí.
– Essas são Dul e Anahí – diz Quatro.
– Olha só, uma Careta – diz Eric, rindo de mim. Seu riso puxa os piercings de seus lábios, esticando as perfurações que eles ocupam e fazendo com que eu me contraia de nervoso. – Vamos ver quanto tempo você vai durar.
Penso em responder algo, talvez para convencê-lo de que vou durar, sim; mas as palavras me escapam. Não sei por que, mas não quero que Eric olhe para mim mais do que já olhou. Na verdade, não quero que olhe para mim nunca mais.
Ele batuca com os dedos na mesa. As juntas da sua mão têm cicatrizes, exatamente onde elas se abririam se ele socasse algo com muita força.
– O que você tem feito, Quatro? – pergunta ele.
Quatro ergue um dos ombros.
– Nada demais – responde.
Será que eles são amigos? Meu olhar se alterna entre Eric e Quatro. Tudo o que Eric fez, desde sentar ali e perguntar a Quatro a respeito de sua vida, sugere que eles sejam amigos, mas a maneira como Quatro está sentado, tenso como uma corda esticada, sugere algo diferente. Talvez sejam rivais, mas como isso poderia ser possível, se Eric é um líder e Quatro, não?
– Max me disse que ele está tentando falar com você há tempos, mas que você nunca aparece – diz Eric. – Ele pediu para eu descobrir o que está acontecendo.
Quatro encara Eric por alguns segundos antes de dizer:
– Diga a ele que estou satisfeito no cargo em que me encontro.
– Então, ele quer oferecer-lhe um emprego.
Os anéis na sobrancelha de Eric refletem a luz da sala. Talvez Eric enxergue Quatro como uma possível ameaça ao seu cargo. Meu pai costuma dizer que aqueles que desejam o poder e o alcançam vivem com medo de perdê-lo. É por isso que devemos entregar o poder àqueles que não o desejam.
– Parece que sim – afirma Quatro.
– E você não está interessado?
– Há dois anos que não estou interessado.
– Bem – diz Eric. – Vamos esperar que ele se toque, então.
Ele dá um tapa no ombro de Quatro, um pouco forte demais, e se levanta. Quando faz isso, eu imediatamente relaxo o corpo. Não havia percebido que estava tão tensa.
– Vocês dois são... amigos? – digo, incapaz de conter minha curiosidade.
– Fomos da mesma turma de iniciandos – diz ele. – Ele se transferiu da Erudição.
Esqueço completamente de tomar cuidado com Quatro.
– Você também é um transferido?
– Pensei que teria problemas com a garota da Franqueza perguntando demais – afirma ele friamente. – Agora tenho uma Careta na minha cola também?
– Deve ser porque você é tão acolhedor – digo diretamente. – Sabe? Quase como uma cama de pregos.
Ele me encara e não desvio o olhar. Ele não é um cachorro, mas valem as mesmas regras. Desviar o olhar é sinal de submissão. Encará-lo é sinal de desafio. É uma escolha minha.
Meu rosto esquenta. O que acontecerá quando a tensão estourar?
No entanto, ele apenas fala:
– Cuidado, Dul.
Meu estômago pesa como se eu tivesse acabado de engolir uma pedra. Um membro da Audácia sentado em outra mesa convida Quatro a juntar-se a eles, e volto-me para Anahí.
Ela ergue as duas sobrancelhas.
– O que foi? – pergunto.
– Estou desenvolvendo uma teoria.
– E o que diz a sua teoria?
Ela segura o hambúrguer, sorri, e diz:
– Que você está pedindo para morrer.
+++
Depois do jantar, Quatro desaparece sem nos dar qualquer satisfação. Eric guia-nos por uma série de corredores sem dizer aonde estamos indo. Não entendo por que um líder da Audácia ficaria responsável por um grupo de iniciandos, mas talvez seja só por esta noite.
No final de cada corredor há uma lâmpada azul, mas entre uma e outra o caminho é escuro, e eu preciso tomar cuidado para não tropeçar no chão desnivelado. Anahí caminha ao meu lado em silêncio. Ninguém nos mandou ficar calados, mas não se ouve uma palavra.
Eric para em frente a uma porta de madeira e cruza os braços. Nos aglomeramos a seu redor.
– Para quem não sabe ainda, meu nome é Eric – diz. – Sou um dos cinco líderes da Audácia. Levamos o processo de iniciação muito a sério aqui, por isso me voluntariei para supervisionar a maior parte do seu treinamento.
Só de imaginar isso, sinto náuseas. Um líder da Audácia supervisionando a nossa iniciação já é ruim o bastante, mas o fato de ser o Eric apenas piora a situação.
– Existem algumas regras básicas aqui – diz ele. – Vocês devem estar na sala de
treinamento às oito da manhã todo dia. O treinamento acontecerá todos os dias, das oito da manhã às seis da tarde, com um intervalo para o almoço. Vocês estarão livres para fazer o que quiserem depois das seis. Vocês também terão direito a um intervalo entre cada estágio da iniciação.
O termo “fazer o que quiser” fica marcado na minha mente. Em casa, eu nunca podia fazer o que queria, nem por uma única noite. Deveria antes pensar nas necessidades dos outros. Na verdade, nem sei o que gosto de fazer.
– Vocês só estão autorizados a sair do complexo acompanhados por alguém da Audácia – acrescenta Eric. – Atrás desta porta fica o quarto onde vocês irão dormir durante as próximas semanas. Vocês notarão que há dez camas, mas apenas nove de vocês. Imaginamos que uma proporção maior de iniciandos chegaria até aqui.
– Mas éramos doze no início – protesta Anahí. Fecho os olhos e espero ela ser
repreendida. Ela precisa aprender a ficar calada.
– Sempre há pelo menos um transferido que não consegue chegar ao complexo – diz Eric, cutucando as cutículas. Ele dá de ombros. – De qualquer maneira, no primeiro estágio da iniciação, nós mantemos os iniciandos transferidos e os nascidos na Audácia separados, mas isso não quer dizer que vocês serão avaliados separadamente. Ao final da iniciação, suas
classificações serão determinadas em comparação com as dos iniciandos nascidos na Audácia. E eles já estão em vantagem. Então, eu imagino que...
– Classificações? – pergunta a menina de cabelo castanho-claro à minha direita. – Para que seremos classificados?
Eric sorri e, na luz azulada, seu sorriso parece maléfico, como se tivesse sido talhado em seu rosto com uma faca.
– A classificação de vocês servirá a dois propósitos – diz. – Primeiramente, determinará a ordem pela qual vocês escolherão um emprego após a iniciação. Há um número limitado de cargos desejáveis à disposição.
Meu estômago aperta. Pelo seu sorriso, pressinto, assim como pressenti no instante em que entrei na sala do teste de aptidão, que algo ruim está prestes a acontecer.
– O segundo propósito – fala ele – é que apenas os dez iniciandos com os melhores
resultados se tornarão membros.
Sinto uma pontada de dor no estômago. Ficamos imóveis como estátuas. E então Anahí diz:
– O quê?
– Há onze nascidos na Audácia, e nove de vocês – conclui Eric. – Quatro iniciandos serão eliminados no início do primeiro estágio. Os outros serão eliminados depois do teste final.
Isso significa que, mesmo tendo passado por todos os estágios da iniciação, seis iniciandos serão eliminados no final e não se tornarão membros. Pelo canto do olho, percebo que Anahí está olhando para mim, mas não consigo encará-la de volta. Meus olhos estão grudados em Eric e não conseguem se mover.
Minhas chances, como a inicianda mais baixa e a única transferida da Abnegação, não são boas.
– O que faremos se formos eliminados? – pergunta Peter.
– Vocês deixarão o complexo da Audácia – diz Eric de maneira indiferente –, e passarão a viver com os sem-facção.
A menina com cabelo castanho-claro coloca as mãos sobre a boca e soluça, tentando reprimir o choro. Lembro-me do homem sem-facção com os dentes cinza, agarrando o pacote de maçãs das minhas mãos. Seu olhar vago me encarando. Mas, em vez de chorar como a garota da Erudição, sinto-me mais fria. Mais dura.
Eu me tornarei um membro. Eu conseguirei.
– Mas isso... não é justo! – diz Molly, a garota de ombros largos da Franqueza. Embora suas palavras soem raivosas, ela parece estar aterrorizada. – Se eu apenas soubesse...
– Você está dizendo que, se soubesse disso antes da Cerimônia de Escolha, não teria escolhido a Audácia? – grita Eric. – Por que se é isso que quer dizer, pode ir embora agora mesmo. Se você realmente é uma de nós, a possibilidade de fracassar não deveria importar para você. E, se importa, então você é covarde.
Eric empurra a porta do dormitório e ela se abre.
– Vocês nos escolheram – diz ele. – Agora nós escolheremos vocês.
+++
Deitada na cama, escuto a respiração de nove pessoas.
Eu nunca havia dividido um quarto com meninos antes, mas não tenho outra opção aqui, a não ser que queira dormir no corredor. Todos os outros iniciandos colocaram as roupas que a Audácia nos forneceu, mas eu resolvo dormir com as roupas da Abnegação, que ainda guardam o cheiro de sabão e de ar puro, o cheiro de casa.
Eu costumava ter meu próprio quarto. Da minha janela, via-se o gramado do jardim da minha casa e, depois disso, o horizonte enevoado da cidade. Estou acostumada a dormir em um ambiente silencioso.
O calor se acumula atrás dos meus olhos à medida que penso na minha casa, e, quando pisco, uma lágrima escorre sobre meu rosto. Cubro a boca para abafar o soluço de tristeza.
Não posso chorar, não aqui. Preciso me acalmar.
Vai ficar tudo bem aqui. Poderei contemplar meu reflexo no espelho sempre que desejar. Poderei me tornar amiga da Anahí e cortar meu cabelo curto e deixar que outras pessoas limpem suas próprias bagunças.
Minhas mãos tremem e as lágrimas se acumulam com mais rapidez em meus olhos, ofuscando minha visão.
Não importa se na próxima vez em que eu vir meus pais, no Dia da Visita, eles tenham dificuldade em me reconhecer, se é que vêm mesmo. Não importa que eu sinta uma dor no peito toda vez que me lembro dos seus rostos, mesmo que seja por apenas um segundo. Sofro até quando me lembro do rosto de Caleb, mesmo que suas mentiras tenham me machucado.
Sincronizo minha respiração com as dos outros iniciandos. Nada disso importa.
Um ruído sufocado interrompe o som das respirações, seguido por um forte soluço. Ouço o ranger das molas de um colchão e o movimento de um corpo pesado em uma das camas, seguido de mais soluços, abafados inutilmente por um travesseiro. Os soluços vêm do beliche ao lado do meu; eles pertencem a Al, um menino da Franqueza que é o maior e mais alto entre todos os iniciandos. Ele é a última pessoa que eu esperava ver desfalecer dessa maneira.
Seus pés estão a poucos centímetros da minha cabeça. Eu deveria consolá-lo; deveria querer consolá-lo, pois fui educada para isso. No entanto, sinto apenas nojo dele. Alguém com uma aparência tão forte não deveria se comportar de maneira tão fraca. Por que ele não chora em silêncio como todos nós?
Engulo em seco com força.
Se minha mãe soubesse o que estou pensando, sei o que faria comigo. Os cantos de sua boca iriam curvar-se para baixo. Suas sobrancelhas iriam franzir-se sobre seus olhos, não em uma careta de repreensão, mas quase de estafa. Esfrego a palma da mão sobre as minhas bochechas.
Al soluça outra vez. Quase posso sentir o som de seu soluço chiando em minha própria garganta. Ele está a apenas poucos centímetros de distância de mim, eu deveria tocá-lo. Não. Abaixo minha mão e me viro de lado, olhando para a parede. Ninguém precisa saber que não quero ajudá-lo. Posso manter isso em segredo. Meus olhos se fecham e sinto o peso do sono, mas sempre que chego perto de dormir ouço Al novamente.
Talvez meu problema não seja o fato de eu não poder ir para casa. Sentirei falta da minha mãe e do meu pai e de Caleb e da luz do fogo de noitinha e do estalar das agulhas de costura da minha mãe, mas essa não é a única razão para essa sensação de vazio em meu estômago.
Talvez meu problema seja que, mesmo que eu voltasse para casa, lá não seria meu lugar, em meio a pessoas que se doam sem pensar e se importam com os outros de maneira tão natural.
Pensar nisso me leva a ranger os dentes. Aperto o travesseiro contra meus ouvidos para bloquear o choro de Al e adormeço com uma poça úmida apertada contra a bochecha.
Autor(a): Fer Linhares
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+ Fanfics do autor(a)Prévia do próximo capítulo
– A primeira coisa que vocês vão aprender hoje é como atirar com uma arma. A segunda é como vencer uma briga. – Quatro coloca uma arma em minha mão sem olhar para mim e continua caminhando. – Felizmente, se vocês estão aqui é porque já sabem subir e descer de um trem em movimento, p ...
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 13
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manoellaaguiar_ Postado em 09/10/2016 - 14:43:04
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 06/10/2016 - 22:22:23
Continua ❤️
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manoellaaguiar_ Postado em 04/10/2016 - 18:30:16
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 21:14:21
Brigadaaa! Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 15:53:35
Continuaaa! Faz maratonaaa!
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manoellaaguiar_ Postado em 02/10/2016 - 14:43:08
Eu nunca li o livro convergente pq eu N TO preparada pra aquele negocio que acontece hahahah! Já comprei a quase um ano e ainda tá guardado lá, um dia eu pego ele!
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manoellaaguiar_ Postado em 01/10/2016 - 19:20:24
Tá maravilhosaaa! Já vi esse filme e adorei! E tô amando a adaptação agora
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manoellaaguiar_ Postado em 28/09/2016 - 22:35:16
Cnttt
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manoellaaguiar_ Postado em 27/09/2016 - 20:38:10
Continuaaa
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Postado em 25/09/2016 - 21:24:21
Aaai deusss! Continuaaa