Fanfic: Divergente, Insurgente, Convergente (Vondy adp.) | Tema: Série Divergente
O dormitório da Erudição é um dos maiores da sede da Amizade. Há doze camas ao todo: uma fileira de oito, apertadas contra a parede dos fundos, e duas coladas em cada lado, deixando um espaço enorme no centro. Uma grande mesa ocupa esse espaço, coberta por ferramentas, pedaços de metal, engrenagens, peças usadas de computador e fios.
Eu e Anahí acabamos de explicar o nosso plano, que pareceu muito mais idiota com doze membros da Erudição nos encarando.
– Seu plano é falho – diz Cara. Ela é a primeira a se pronunciar.
– É por isso que procuramos vocês – falo. – Para vocês nos mostrarem como consertá-lo.
– Bem, em primeiro lugar, esses dados importantes que vocês querem resgatar – diz ela. – Salvá-los em um disco é uma péssima ideia. Discos acabam quebrando ou caindo nas mãos erradas, como qualquer outro objeto físico. Sugiro que vocês usem a rede de dados.
– A... o quê?
Ela olha para os outros membros da Erudição. Um dos outros, um jovem rapaz moreno, de óculos, diz:
– Pode contar para elas. Não faz mais sentido guardarmos segredos.
Cara olha novamente para mim.
– Muitos dos computadores do complexo da Erudição são programados para receber dados dos computadores de outras facções. É por isso que foi tão fácil para Jeanine administrar a simulação de ataque de um computador da Audácia, e não de um da Erudição.
– O quê? – pergunta Anahí. – Quer dizer que eles podem dar uma voltinha pelos dados das outras facções sempre que quiserem?
– Ninguém pode dar uma voltinha por dados – diz o jovem. – Isso é ilógico.
– É uma metáfora – diz Anahí. Ela franze a testa. – Certo?
– Uma metáfora ou simplesmente uma figura de linguagem? – pergunta ele, também franzindo a testa. – Ou seria uma metáfora uma categoria definitiva sob o título “figura de linguagem”?
– Fernando – diz Cara. – Concentre-se.
Ele assente com a cabeça.
– A questão – continua Cara – é que a rede de dados existe e, apesar de ela ser algo eticamente questionável, pode funcionar a nosso favor. Da mesma maneira que podem acessar dados das outras facções, os computadores são capazes de enviar dados para outras facções. Se nós enviarmos os dados que você pretende resgatar para todas as outras facções, destruir todos eles seria impossível.
– Quando você diz “nós”, está sugerindo que...
– Que nós iríamos com vocês? – pergunta ela. – É claro que nem todos iríamos, mas alguns precisam ir. Como vocês esperam se locomover dentro da sede da Erudição sozinhas?
– Espero que vocês entendam que, se forem com a gente, correm o risco de levar um tiro – diz Anahí. Ela sorri. – E nada de se esconder atrás de nós para não quebrarem os óculos, ou algo assim.
Cara tira os óculos e quebra-os na metade.
– Arriscamos nossas vidas ao desertarmos da nossa facção – diz Cara. – E nós as arriscaremos novamente para salvar nossa facção de si mesma.
– Além disso – diz uma voz fina, vinda de trás de Cara. Uma menininha que não deve ter mais do que dez ou onze anos surge de trás do ombro dela. Seu cabelo preto é curto, como o meu, e um halo de fios crespos circunda sua cabeça. – Temos aparelhos úteis.
Eu e Anahí trocamos olhares.
– Que tipo de aparelhos? – pergunto.
– São apenas protótipos – diz Fernando. – Portanto, não há por que analisá-los.
– Não somos muito de analisar – retruca Anahí.
– Então, como vocês aprimoram as coisas? – pergunta a menininha.
– Na verdade, não aprimoramos – diz Anahí. – As coisas meio que só pioram.
A menininha assente com a cabeça.
– Entropia – diz ela.
– Como?
– Entropia – repete ela, com sua voz aguda. – É a teoria que afirma que toda a matéria do universo está gradualmente alcançando a mesma temperatura. Ela também é conhecida como “morte térmica”.
– Elia – diz Cara. – Você está simplificando demais algo que é muito mais complexo.
Elia mostra a língua para Cara. Não consigo segurar o riso. É a primeira vez que vejo alguém da Erudição mostrando a língua. Mas também nunca interagi muito com membros jovens de lá. Apenas com Jeanine e as pessoas que trabalham para ela. Incluindo meu irmão.
Fernando se abaixa ao lado de uma das camas e pega uma caixa. Ele a vasculha por alguns segundos, depois pega um disco pequeno e redondo. É feito do metal pálido que vi várias vezes na sede da Erudição, mas nunca em nenhum outro lugar.
Fernando o carrega até mim na palma da mão. Quando estico o braço para tocá-lo, ele o afasta rapidamente.
– Cuidado! Trouxe isto da nossa sede. Não inventamos isto aqui. Você estava lá
quando eles atacaram a Franqueza?
– Sim – respondo. – Estava exatamente lá.
– Lembra-se de quando o vidro estilhaçou?
– Você estava lá? – pergunto, com os olhos entrecer rados.
– Não. Mas eles gravaram tudo e me mostraram as imagens na sede da Erudição. Bem, você deve achar que o vidro estilhaçou porque atiraram contra ele, mas não foi isso o que aconteceu. Um dos soldados da Audácia lançou um destes perto das janelas. O aparelho emite um sinal que não conseguimos ouvir, mas que faz com que vidros quebrem.
– Entendo. Mas por que isso seria útil para nós?
– Estilhaçar todas as janelas de um lugar ao mesmo tempo é algo que pode distrair muito as pessoas ao redor – diz ele, com um pequeno sorriso. – Especialmente na sede da Erudição, onde há muitas janelas.
– Entendi.
– O que mais vocês têm? – pergunta Anahí.
– O pessoal da Amizade vai gostar disso – diz Cara. – Onde está? Ah. Aqui.
Ela pega uma caixa preta feita de plástico, pequena o bastante para envolver com os dedos de uma mão. Em cima da caixa há dois pedaços de metal que parecem dentes. Ela liga um interruptor embaixo da caixa, e um feixe de luz azul se estende no espaço entre os dois dentes.
– Fernando – diz Cara. – Quer demonstrar como funciona?
– Está maluca? – pergunta ele, com os olhos arregalados. – Nunca mais farei
isso. Você fica perigosa com isso.
Cara sorri para ele e explica:
– Se eu encostasse este atordoador em você agora, seria extremamente doloroso, e você ficaria incapacitada. Fernando descobriu isso na própria pele ontem. Construí isto para que os membros da Amizade possam se defender sem precisar atirar em ninguém.
– Isso... – Franzo a testa. – É muita consideração da sua parte.
– Bem, o objetivo da tecnologia é tornar a vida melhor. Independente da sua crença, há sempre uma tecnologia que se encaixa nela.
O que minha mãe disse mesmo naquela simulação? Temo que toda a reprovação do seu pai a respeito da Erudição tenha sido prejudicial a você. E se ela estivesse certa, mesmo sendo apenas parte de uma simulação? Meu pai me ensinou a ver a Erudição de uma maneira específica. Ele nunca me ensinou que eles não julgam as crenças das pessoas, mas que projetam coisas que se encaixam nessas crenças.
Nunca me disse que eles podiam ser engraçados, ou que pudessem criticar sua própria facção.
Cara joga-se contra Fernando com o atordoador, rindo quando ele pula para fora do caminho.
Ele nunca me disse que alguém da Erudição poderia me oferecer ajuda, mesmo depois de eu ter matado seu irmão.
+++
O ataque começará de tarde, antes que fique escuro demais para conseguirmos enxergar as faixas azuis que marcam alguns dos traidores da Audácia. Assim que finalizamos nossos planos, atravessamos o pomar até a clareira onde as caminhonetes ficam estacionadas. Quando saio do meio das árvores, vejo que Johanna Reyes está sentada em cima do capô de uma das caminhonetes com as chaves penduradas nos dedos.
Atrás dela encontra-se um pequeno comboio de veículos cheios de membros da Amizade. Mas não apenas da Amizade, porque consigo ver alguns da Abnegação, com seus cortes sérios de cabelo e suas bocas imóveis. Robert, o irmão de Susan, está entre eles.
Johanna desce do capô com um salto. Atrás da caminhonete em que ela estava sentada há vários caixotes marcados com as palavras MAÇÃS, FARINHA e MILHO. Ainda bem que só precisamos carregar duas pessoas ali.
– Olá, Johanna – cumprimenta Víctor.
– Víctor – diz Johanna. – Espero que você não se importe se nós os acompanharmos até a cidade.
– De maneira alguma – diz Víctor. – Podem ir na frente.
Johanna entrega as chaves para Víctor e sobe na carroceria de uma das outras caminhonetes. Anahí segue para a cabine da caminhonete, e eu vou para a carroceria, junto com Fernando.
– Não quer ir na frente? – pergunta Anahí. – E você tem a cara de pau* de dizer que é da Audácia...
– Prefiro ir em um lugar onde eu tenha menos chances de vomitar – respondo. – Vomitar faz parte da vida.
Estou prestes a perguntar com qual frequência ela planeja vomitar no futuro quando a caminhonete dá a partida. Agarro-me à beirada da carroceria com as duas mãos para não ser lançada para fora, mas, depois de alguns minutos, quando me acostumo aos trancos e solavancos, solto-a. As outras caminhonetes seguem, sinuosamente, à nossa frente, seguindo o veículo de Johanna, que vai na frente.
Sinto-me calma até alcançarmos a cerca. Espero encontrar os mesmos guardas que tentaram impedir nossa passagem na vinda, mas o portão está abandonado, aberto. Um tremor começa no meu peito e se espalha para minhas mãos. Enquanto conhecia pessoas novas e organizava nosso plano, esqueci-me do fato de que ele consiste em entrar de cabeça numa batalha que poderia custar minha vida. E isso logo depois de me dar conta de que vale a pena viver.
O comboio desacelera ao passarmos pelo portão, como se esperássemos que alguém aparecesse do nada e nos impedisse de passar. Tudo está silencioso, exceto pelas cigarras que cantam nas árvores distantes e pelo ronco dos motores.
– Você acha que já começou? – pergunto a Fernando.
– Talvez. Mas talvez não. Jeanine conta com muitos informantes. Alguém provavelmente disse a ela que algo estava prestes a acontecer, e ela convocou todas as forças da Audácia de volta à sede da Erudição.
Aceno com a cabeça, mas a verdade é que estou pensando em Caleb. Ele era um desses informantes. Por que será que ele acreditou tanto que o mundo externo deveria permanecer escondido de nós que traiu todos com quem supostamente se importava e se aliou logo à Jeanine, que não se importa com ninguém?
– Você conhece uma pessoa chamada Caleb? – pergunto.
– Caleb – diz Fernando. – Sim, havia um Caleb na minha turma de iniciação. Ele era brilhante, mas também era... qual seria o termo coloquial para isso? Um puxa-saco. – Ele dá uma risadinha debochada. – Havia um tipo de divisão entre os iniciandos. Entre aqueles que acreditavam em tudo que Jeanine dizia e aqueles que não. É claro que eu pertencia ao grupo que não acreditava. Caleb pertencia ao
outro grupo. Por que você quer saber?
– Eu o conheci quando fui mantida prisioneira – respondo, e minha voz soa distante até para mim. – Só estava curiosa.
– Mas você não deve ser muito dura com ele – diz Fernando. – Jeanine tem o poder de ser extremamente convincente para qualquer um que não seja naturalmente desconfiado. Sempre fui naturalmente desconfiado.
Olho para trás, sobre meu ombro esquerdo, para a silhueta dos prédios, que fica cada vez mais nítida à medida que nos aproximamos da cidade. Procuro as duas hastes de cima do Eixo e, ao encontrá-las, sinto-me melhor e pior ao mesmo tempo. Melhor, porque o prédio me parece tão familiar, e pior, porque o fato de eu conseguir vê-lo significa que estamos quase chegando.
– É – digo. – Eu também.
Comentem!!!!
Autor(a): Fer Linhares
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Ao alcançarmos A cidade, todos na caminhonete param de conversar e contraem os lábios, com o rosto pálido. Víctor desvia de buracos no asfalto do tamanho de pessoas e pedaços de ônibus quebrados. O trajeto fica mais fácil quando deixamos o território dos sem-facção e entramos na parte mais li ...
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 13
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manoellaaguiar_ Postado em 09/10/2016 - 14:43:04
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 06/10/2016 - 22:22:23
Continua ❤️
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manoellaaguiar_ Postado em 04/10/2016 - 18:30:16
Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 21:14:21
Brigadaaa! Continuaaa
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manoellaaguiar_ Postado em 03/10/2016 - 15:53:35
Continuaaa! Faz maratonaaa!
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manoellaaguiar_ Postado em 02/10/2016 - 14:43:08
Eu nunca li o livro convergente pq eu N TO preparada pra aquele negocio que acontece hahahah! Já comprei a quase um ano e ainda tá guardado lá, um dia eu pego ele!
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manoellaaguiar_ Postado em 01/10/2016 - 19:20:24
Tá maravilhosaaa! Já vi esse filme e adorei! E tô amando a adaptação agora
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manoellaaguiar_ Postado em 28/09/2016 - 22:35:16
Cnttt
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manoellaaguiar_ Postado em 27/09/2016 - 20:38:10
Continuaaa
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Postado em 25/09/2016 - 21:24:21
Aaai deusss! Continuaaa