Fanfic: C'est La Vie | Tema: Digimon
C’est La Vie
Kimi to Boku
By Misako Ishida
Estava prestes a dormir quando recebeu o telefonema de sua esposa. Ouviu atentamente cada palavra. Por fora, sua expressão completamente relaxada e sua voz firme apenas expressaram a sua indiferença, mas por dentro seu coração batia descompassado. Sua irmã. Ela era seu maior tesouro. Sua família.
Respirou fundo e jogou o telefone na parede. Se ele não tivesse mandado ela para outro país. Se ela não tivesse conhecido aquela pessoa. Se ela não tivesse desobedecido a suas ordens. Tantos ‘se’ inundavam seus pensamentos. Teve impulsos de se levantar e correr para o hospital. Precisava vê-la. Tinha que ver com seus próprios olhos para poder acreditar que sua pequena irmã não voltaria mais a sorrir. Levantou-se e foi até a janela. Precisa colocar seus pensamentos em ordem.
Sabia que não poderia amolecer. Afinal, havia tomado uma decisão. E não voltaria atrás. Havia prometido a si mesmo. Ela já não era mais sua irmã. Já não era mais sua família. Voltou para a cama, deitou-se e foi dormir.
XxXxX
Não havia palavras no mundo que pudessem descrever aquele momento. Sora estava parada em frente ao berçário. Viu aquele pequeno embrulho rosa que envolvia suavemente aquele pequeno bebê. A filha de Hikari. A filha preciosa de Hikari. A filha amada que não conheceria seus pais. Ela mal havia chegado ao mundo e sua vida já era digna daqueles filmes trágicos.
Seu coração estava dividido. Chorar pela morte daquela menina que havia cuidado como se fosse sua filha ou sorrir pelo nascimento de sua primeira (e a única que teria). Estava à beira das lágrimas quando sentiu uma mão tocar seu ombro. Ao se virar encontrou-se com Joe.
- Já está tarde. Por que você não vai para casa descansar? Você irá precisar...
- Você tem razão. Obrigado, Joe.
Pegou a bolsa no chão e deu meia volta. Deu uma última olhada para o berço e prosseguiu. Antes que pudesse dar mais um passo, Joe voltou a falar.
- Sora... Venha comigo.
A ruiva seguiu o jovem médico até estar dentro do berçário. Joe pediu algo para a enfermeira e logo a mesma voltou segurando um bebê, entregando-o para Sora. Se a mulher estava tentando se segurar para não chorar agora se tornara impossível.
Ver o rostinho doce e delicado a emocionou. Em meio às lágrimas percebeu o quanto Hikari havia amado aquele ser desde o primeiro instante. Era uma menina tão linda, tão calma. Tinha uma expressão tranquila e inocente. Seus fios de cabelo eram castanhos, o mesmo tom de caramelo de Hikari. Ela era tão pequena, tão frágil e delicada. Precisava de tantos cuidados, precisava de tanto amor.
Acariciou delicadamente o rostinho macio enquanto sua visão ficava borrada pelas lágrimas. E sorriu. Uma dicotomia. Um paradigma. Sorrir e chorar. Tristeza e alegria. Medo e esperança.
- Obrigado por ter nascido... – sussurrou para a bebê. – Natsuko, obrigado por ter nascido!
E como se pudesse entender as preces da ruiva, a menina abriu os olhinhos. Azuis. Um azul intenso, tão profundo quanto o céu. Tão cálido e aconchegante quanto o sorriso de Hikari.
XxXxX
Era madrugada. Havia acertado a documentação do hospital e apesar de não ter sono queria tentar dormir um pouco. Pela manhã seria realizado o funeral de sua cunhada. Não conseguia acreditar. Era demais para sua cabeça. A todo instante pensava que chegaria ao hospital no dia seguinte e a encontraria num quarto segurando sua filha, feliz e orgulhosa em ter dado vida à uma criança tão linda e saudável.
Taichi estava dormindo. Profundamente. Sem fazer barulho, trocou de roupa e deitou-se. Ficou encarando o teto o restante da noite. A escuridão preenchia tudo. Até mesmo seus pensamentos e sentimentos. E, por um mínimo segundo, sentiu raiva. Uma raiva profunda. Nunca havia detestado uma única pessoa em sua vida. E agora fora invadida por uma raiva descontrolada. Naquele momento detestava seu marido. Àquele que havia amado durante tantos anos. Se ele não tivesse sido tão estúpido. Se ele não tivesse sido tão rígido. Se ele tivesse escutado o que Hikari tinha a dizer. Se ele tivesse deixado que Hikari tomasse suas próprias decisões. Se... Se... Se... Talvez ela estivesse viva. Talvez ela estivesse feliz. Talvez ela estivesse com sua filha nos braços. Talvez ela estivesse com ele ao seu lado...
Eram tantos ‘se’. Tantos que o sol já aparecia no horizonte timidamente. Apesar de ser verão, o sol estava frio. Até mesmo o calor o havia abandonado depois daquilo. Suspirou e levantou-se. Tomou um banho demorado e buscou esvaziar as lágrimas que a enchiam. Muitas coisas aconteceriam daquele momento em diante e, sabia, precisaria ser forte. Muito forte.
Ao voltar para o quarto, viu como seu marido terminava de se arrumar. Ele apenas a olhou sem lhe dirigir palavra alguma. Ao voltar do banheiro, Taichi pegou o paletó e a maleta. Encaminhou-se para a porta e estava com a mão na maçaneta quando Sora o puxou.
- Aonde você vai? – perguntou exasperada.
Taichi olhou para a mão em seu braço e a tirou de cima dele. – Para o trabalho. Para onde mais eu iria? – retrucou indiferente.
Estava incrédula. Não queria aceitar que estava ouvindo aquelas palavras. – Taichi... Sua irmã...
- Ela não era mais minha irmã. E te agradeceria se você pudesse parar de falar sobre ela.
Saiu do recinto batendo a porta ao passar. A ruiva desabou sobre a cama. Silenciosamente fechou os olhos enquanto era tomada por todas as lembranças de uma época que fora tão conturbada.
XxXxX
Hikari estava realizando um grande sonho: estudaria no exterior. Seu irmão providenciara que ela completasse sua educação na França. Estudaria em uma boa escola em Paris e moraria em um pequeno apartamento próximo. Tudo era maravilhoso. Apesar de ter algumas dificuldades para se adaptar ao idioma e à cultura no início, aos poucos fora se acostumando e se habituando.
Em seu primeiro ano, conhecera várias pessoas e acabara fazendo bons amigos. Mas um deles fora especial. Takeru Takaishi. Ele também era japonês. Ele havia lhe ajudado com inúmeras coisas, desde as mais básicas como a não deixá-las sozinha quando tinha um momento difícil. Ele havia lhe mostrado como era a vida na França, havia lhe ajudado com sua pronúncia, havia lhe feito companhia nos finais de semana.
Ela e Takeru se tornaram próximos. E era impossível não se apaixonar pelo loiro de olhos azuis. Takeru era uma pessoa alegre, otimista, atento, cuidadoso e carismático. Sua surpresa maior: ele também havia se apaixonado por ela. Então se fizeram namorados.
Hikari conhecera a família de Takeru. Sua mãe, Natsuko, e seu irmão mais velho, Yamato. Os pais dele haviam se separado quando eles eram crianças. Ele havia ido embora para França com sua mãe enquanto seu irmão havia ficado no Japão com seu pai. Porém, alguns anos mais tarde, após o falecimento de seu pai, Yamato fora para França. Takeru contava que a relação dele com seu irmão era ótima, os dois eram amigos e companheiros, mas, no inicio, a relação de sua mãe com seu irmão era distante. Com o passar do tempo os dois foram se aproximando e os três viviam perfeitamente.
Yamato era uma pessoa introvertida. Mas, Hikari descobriu com o tempo que ele era uma pessoa extremamente confiável. Ela os considerava como sua própria família. Fora a mãe de Takeru quem fizera o convite. Ela já estava morando em Paris há dois anos e Natsuko perguntou se ela não gostaria de morar com eles. Explicou que ficava preocupada pela menina ficar sozinha e insistiu até que a menina aceitasse. Hikari já havia passado vários finais de semana na casa da família e tinha até mesmo seu próprio quarto. Ficou receosa em contar para o irmão, por isso, decidiu fazer dessa mudança um segredo. Não estava mentindo, apenas omitindo.
Podia dizer que estava feliz. Vivendo em um conto de fadas. Até que o final de seu último ano estivesse próximo ao fim. Fora aquele telefonema. Fora aquela ordem. Fora ali que todo seu mundo virou de cabeça para baixo. Perdera todo o seu equilíbrio. Perdera toda a sua felicidade.
XxXxX
Após o velório, Sora estava exausta. Física, mental e emocionalmente. Dirigiu-se para o hospital. Precisava recobrar suas energias. Precisava recuperar suas forças. Precisava ter motivos suficientes para não desmoronar. Olhou para o berço. E sorriu. Em meio à toda aquela tristeza, esse era seu motivo de felicidade. Natsuko dormia tranquilamente. Ficou a admirá-la. Ficou ali tanto tempo, não sabia exatamente, mas pareceram horas. Já havia anoitecido.
Joe havia lhe informado que no dia seguinte ela poderia levar Natsuko. Por isso, decidira passar no apartamento para arrumar uma bolsa com algumas coisas necessárias. Abriu a porta do quarto e viu sobre a cama a roupinha que Hikari havia escolhido para o dia em que sua filha saísse da maternidade. Pegou cuidadosamente, como se ela pudesse rasgar se não fosse tocada delicadamente.
Ao lado a bolsa também estava arrumada. Hikari era caprichosa em tudo o que fazia. E estava tudo pronto, feito com esmero. Colocou a roupinha dentro da bolsa e saiu. Estava saindo do apartamento quando viu que a porta do escritório estava meio aberta. Entrou no cômodo e acendeu a luz. Estava tudo em ordem.
Iria sair do local, quando percebeu que havia algo em cima da mesa. Foi até lá e viu um envelope com seu nome. Sentou-se na cadeira e o abriu. Estava chocada. Lia e relia todos os papeis ali dentro continuamente. Impossível. Era a única palavra que lhe vinha ao pensamento. Estava tudo preparado. Estava tudo pronto. Toda a documentação acertada. Hikari realmente tinha medo de que algo pudesse lhe acontecer.
Mas fora a carta. A carta que ela deixou o que fez com que se emocionasse. Quanto mais lia, mais se emocionava. E no final, não podia conter as lágrimas. Chorou intensamente. Toda a dor sendo colocada para fora. Apertou a carta contra o peito enquanto fazia suas preces silenciosamente pela vida da pequena Yagami.
XxXxX
Estava sentado na mesa quando ouviu que Sora estava em casa. A mesma parou na porta com expressão vazia. Viu a bolsa rosa em sua mão.
- O que é isso? – perguntou apontando.
- A filha de Hikari sairá do hospital amanhã. – disse simplesmente.
Taichi bebeu a água no copo e continuou comendo, dando as costas para a ruiva. – O que você fará com ela?
- Como assim o que farei com ela? – questionou.
- Leve-a para um orfanato. Não quero saber nada dessa coisa.
Sora andou até ficar em frente para seu marido. – O que você disse? – sussurrou furiosa.
- O que você ouviu. Dê um jeito nisso. Não quero essa... Essa criança perto de mim.
Sora assentiu. – Tudo bem. Darei um jeito nessa situação. Não se preocupe.
O moreno continuou sua refeição enquanto a ruiva saía dali. Seu sangue ainda fervia com a simples lembrança do que ocorrera meses atrás. Jamais perdoaria sua irmã. Mesmo agora, era incapaz de deixar para trás o que ela fizera.
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Havia escutado aquelas palavras em silêncio. E elas ecoavam por sua cabeça. Sua irmã estava lhe dizendo que não voltaria para o Japão. Dizia que iria ficar em Paris. Disse com todas as letras. E, então, passou a não atender seus telefonemas e a não responder suas mensagens.
Conhecia aquela menina desde o dia em que ela chegara ao mundo. E ela estava se rebelando contra ele. Estava indignado. Quando as aulas acabaram, Hikari não retornou. E Taichi foi para Paris. Sua surpresa foi tamanha quando descobriu que ela não morava mais no apartamento. Ao chegar à casa em que ela estava descobriu o motivo de sua recusa em voltar para casa: Takeru Takaishi. Sua irmãzinha lhe desobedeceu por causa de um garoto.
Mandou que ela arrumasse suas coisas. Voltaria com ele para o Japão imediatamente. A briga fora intensa. Tão intensa que Taichi a levara a força. Estavam a caminho do aeroporto. Hikari estava apenas com uma bolsa e com seus documentos. Todos os seus pertences ficaram para trás. Implorava ao irmão, mas ele fazia ouvidos surdos para suas súplicas.
Estavam sentados próximos ao portão de embarque no aeroporto. Chamaram os passageiros do voo para o embarque e Taichi a puxou. Foi quando ela viu. Na televisão em uma lanchonete passava o noticiário. A notícia mostrava um acidente que havia ocorrido próximo ao aeroporto. Dois carros haviam se chocado, causando um grande tumulto para o trânsito local. E houve vítimas. E seus olhos não piscavam quando viu a foto de Takeru.
Ele e sua mãe estavam no carro que havia sido acertado por um motorista alcoolizado que passara pelo sinal vermelho. Takeru e Natsuko não mais pertenciam àquele mundo. O mundo caiu e levara embora a gravidade. Foi quando perdera a força e caiu no chão. E foi em meio ao choque que fora levada para dentro do avião. A viagem mais longa de sua vida. Estava num inferno que jamais acabaria. Nunca mais veria o rosto daquele que amou.
XxXxX
Subiu para o quarto e viu que havia três malas perto da porta e Sora estava empenhada em colocar mais coisas dentro de mais quatro caixas grandes que se encontravam em cima da cama.
- O que significa isso? – ao não obter nenhuma resposta se aproximou do guarda-roupa. As roupas de Sora não estavam mais lá. – Eu perguntei o que significa isso! – disse irritado quase gritando.
Sora parou no meio do caminho. Olhou para as caixas e depois para ele. – Não é obvio? Estou saindo dessa casa.
- Por quê?
Sora riu. – Eu te disse agora a pouco que resolveria essa situação. Estou indo embora. Não precisa se preocupar que eu não deixarei que aquela criança fique perto de você.
Taichi não conseguia acreditar. – Você está me deixando para ficar com aquela coisa?
Sora não respondeu nada. Continuou guardando suas coisas sem lhe dar atenção. Taichi se aproximou e a agarrou pelos braços, com força, sacudindo-a.
- ME RESPONDA. VOCÊ VAI ME DEIXAR? É ISSO QUE ESTOU ENTENDENDO?
- Sim. Estou te deixando. Não irei abandonar quem mais precisa de mim. Não abandonei Hikari-chan. E também não irei abandonar a filha dela.
- É uma família que você quer? É uma criança para cuidar que você quer? Tudo bem! Teremos nossos próprios filhos. Você não precisa ficar correndo atrás dessa criança infeliz.
A mão da ruiva encontrou com o rosto do moreno com brutalidade.
- O que você está pensando? Você é repugnante!
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No dia seguinte terminara de organizar suas coisas no apartamento. Não tinha sequer imaginado que um dia voltaria para seu lar. Ali recomeçaria uma nova fase de sua vida. Ali seria responsável em fazer crescer bem e feliz uma criança. Observou o quarto infantil que fora decorado com tanto amor.
Sim. Ali seria um novo começo. A partir daquele dia aprenderia a ser uma pessoa melhor. Devia isso para Hikari. Seria a mãe que Natsuko precisava. Hikari havia confiado nela para isso.
CONTINUA...
Autor(a): Misako Ishida
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