Fanfic: Anjo Sedutor (Terminada)

Ela mal podia respirar; era como se o choque a tivesse
paralisado, enquanto tudo o que havia perdido no passado voltava à tona em sua
mente.

Ainda assim, por pior que se sentisse, não era nada em
comparação ao dilacerante desespero que via nos olhos de Herrera. Era tão
imenso, tão profundo que a fez esquecer da própria dor para ver que se tratava
do olhar de um homem que, do fundo de sua alma, desistira do que lhe era mais
caro. Para Anahí, uma sobrevivente ferrenha, aquilo era demasiado perturbador.

Tornou-se também intrigante no momento em que Herrera
piscou lentamente e todo traço de emoção, incluindo aquele instante de
reconhecimento, desapareceu de seu rosto. Como se o mesmo não tivesse existido,
ele virou-se devagar para o outro lado da cela e voltou a dormir.

- Anahí? - A voz preocupada de Eli a fez virar-se
rapidamente em sua direção. - Você está bem, querida? Está pálida como uma
cera.

Ela dirigiu um olhar vago ao velho delegado, enquanto
tentava organizar seus pensamentos. Não tinha certeza do que a perturbava mais,
o fato de Alfonso Herrera se encontrar ali em Mission, ou a própria reação
perante a total desesperança que vira em seus olhos verdes. Da mesma forma que
teria agido com seus dois filhos, sentiu uma premente necessidade de confortar
aquele homem.

O que era um completo, absoluto, pleno absurdo.

Herrera era a pessoa mais auto-confiante que jamais vira.
Apesar de admitir que não o conhecera no que se poderia chamar de
circunstâncias normais, o traço mais marcante daquele homem fora seu
desprovimento de emoção. Desde que o vira pela primeira vez e durante todo o
período conturbado do julgamento, capaz de afetar emocionalmente não só os
envolvidos como até os espectadores, a única demonstração de sentimentos que
ela presenciara fora a breve explosão de fúria de Alfonso ao praguejar em seu
apartamento depois do tiro que levara a vida de Daniel.

Exceto isso... mais nada. No tribunal, Herrera parecera
entediado, indiferente a própria sorte; apenas observando, silencioso e
superior, com aqueles seus enigmáticos olhos verdes.

- Anahí? - chamou-a Forster outra vez.

De repente, ela tinha que sair correndo dali. As paredes
pareciam se fechar ao seu redor, precisava de ar fresco.

- Lamento sobre o adiamento da sua viagem, Eli. Espero
que... que tudo dê certo. - desejou-lhe, empurrando a cadeira para trás e
pondo-se de pé. - Bem, tenho mesmo que ir. Você sabe como Michael fica
preocupado quando demoro muito. Carson está com os dois, é claro. Eu... já lhe
contei que... que seu neto tem tomado conta das crianças para mim?

Vagamente consciente do olhar perplexo que o velho homem
lhe lançava por estar nervosa e gaguejando sem razão aparente, ela recuou
desajeitada até a porta de saída e, com isso, prendeu o pé na alça da mochila
de Herrera, a qual Eli deixara ali junto à parede para devolvê-la quando
chegasse a ocasião. Anahí tropeçou, mas recuperou o equilíbrio e não chegou a
cair. Com seu movimento, porém, fez com que a pesada mochila virasse de lado,
derramando parte de seu conteúdo. Sem parar para pensar, ela abaixou-se e
começou a recolher os objetos dos chão, guardando-os de volta na mochila
surrada. Creme e aparelho de barbear. Uma camisade flanela vermelha. Um
canivete suíço. Uma lanterna. Um livro.

Num gesto automático, ela olhou de relance para o volume
aberto em suas mãos, e, em seguida, prestou melhor atenção às palavras que
haviam sido cuidadosamente sublinhadas no topo da página onde o livro estreito,
de encadernação de couro, caíra aberto.

"Os espinhos que colhi são da árvore que plantei... eles me
dilaceraram... e eu sangro."

Anahí fechou-o depressa, sabendo, sem olhar para o
título, que se tratava de uma obra de Lorde Byron, um dos seus

poetas românticos favoritos. Desconcertada, colocou o
volume com delicadeza de volta à mochila e endireitou-a outra vez de encontro à
parede. Corri um pequeno aceno destinado a Eli, desapareceu pela porta em
direção à rua.

Avançou até a caminhonete, entrou, sentando-se ao
volante, deu a partida.

Mas não engatou a primeira marcha. Descobriu que não
podia. Apenas permaneceu ah sentada, com o olhar perdido no vazio, incapaz de
continuar ignorando a pergunta que a estivera atormentando desde que descobrira
quem era o ocupante da cela.

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