Fanfic: A colecionadora de cicatrizes | Tema: Once upon a time
“Mas eu sou só humana
E eu sangro quando caio”
-Human, Christina Perri
❤ ❤ ❤
Ele caminhou em minha direção enquanto eu continuava ereta sem ousar piscar um olho. Como se o simples ato de inspirar fosse resultar em outro belo machucado.
-Até que não ficou tão mal. Antes estava parecendo um defunto, agora parece mais uma garota desarrumada.
Senti um arrepio percorrer meu corpo ao ouvir suas palavras, lembrando que meu pai havia dito algo parecido algum tempo atrás: “Precisa melhorar sua aparência a tempo do casamento, está parecendo um defunto em decomposição.”.
-Obrigada. Eu acho. –Falei olhando fixamente em seus olhos azuis. Um ato extremamente corajoso para uma covarde como eu.
Ele riu.
-Swan, Swan, você sabe ser engraçada quando quer.
Provavelmente devo ter feito minha cara de “Não entendi nada.”, pois killian gargalhou novamente apontando para mim como se eu fosse a coisa mais engraçada que ele já viu.
Não gostei daquela sensação de ser ridicularizada.
Tive vontade de rir de mim mesma, daquela situação estranha e da risada daquele pirata sem escrúpulos.
-Perdoe-me Killian, mas posso saber do que tanto está rindo?
Imediatamente seu sorriso sumiu. Ele me agarrou apertando meu braço com uma força absurda. Não havia necessidade de fazer aquilo.
Tive vontade de gritar enquanto ele praticamente espremia meu ferimento, porém me mantive séria e olhando em seus olhos desafiadoramente.
-É capitão Jones para você.
Dei um sorrisinho sarcástico sem mostrar os dentes e me soltei de seu braço.
-Você é insano!
Acarinhei meu braço machucado, como se isso fosse fazer com que ele parasse de doer.
-Eu tinha vindo aqui – Começou o pirata fazendo biquinho.- para dizer que você pode sair deste lugar, todavia diante de seu comportamento serei obrigado a mantê-la aqui por mais alguns dias.
Aquela notícia não me abalou nem um pouco, na verdade eu já imaginava que passaria o resto dos meus dias ali.
Então o capitão abriu seu conhecido sorriso para mim, virou-se e me deixou ali sozinha novamente.
Fui até a cadeira, que ainda estava embaixo da janelinha, puxei-a um pouco mais para frente e me sentei.
Deixei que os poucos raios de sol iluminassem meu rosto. Imaginei como seria sair daquele quarto e ter que conviver com piratas rudes e imundos como Killian. Talvez continuar aqui até seja uma vantagem.
Com a luz morna do sol em minha pele, o balanço do navio e o som do mar; não demorou muito para que eu caísse no sono.
Levantei da cadeira assustando-me com a presença de killian.
-O que faz aqui? –Perguntei ao me levantar em um salto.
Ele não disse nada, apenas deu um passou em minha direção com seu sorriso irritante no rosto.
Dei um passo para trás sentindo alguém segurar meus braços com força.
-Olá filha, senti saudades das nossas brincadeirinhas. –A voz de meu pai invadiu meus ouvidos fazendo meu desespero aumentar.
Eu tentava, em prantos, me soltar incessantemente.
-Não! Por favor! Eu não fiz nada! Eu não fiz nada!
Senti algo me atingir nas costas. Gritei.
Killian então parou de me olhar, vindo em minha direção.
-NÃO! –Gritei, no entanto era tarde demais. Ele já tinha fincado seu gancho em meu peito.
Cai de joelhos sentindo a dor absurdamente insuportável.
Agora eu estava sozinha no quarto. Não havia qualquer sinal de ferimentos em mim, porém meu peito ainda doía. Eu usava o mesmo vestido vermelho que usara no baile.
Levantei do chão vendo uma cachoeira começar a entrar pela janelinha minúscula do lugar. Desesperada eu corri e subi na cadeira tentando tampá-la com meu vestido. Como se um pedaço de pano fosse impedir aquela enxurrada. Quando finalmente percebi que meu ato era completamente idiota desci da cadeira e comecei a bater forte na porta enquanto gritava desesperadamente por socorro.
A água já batia em minhas canelas e ninguém parecia me escutar. Meu coração batia tão forte que tive medo de que saísse por minha boca. Dizer que eu estava apavorada seria um ridículo eufemismo.
-Alguém, por favor, me ajude! Socorro! Estou trancada! Por favor!
O nível da água aumentava a cada segundo, assim como meu desespero.
Não posso morrer agora. Não desta forma! Tenho que me casar com August, ter filhos com ele. Eu pensava tentando destrancar a porta; girava a maçaneta inúmeras vezes como se ela fosse abrir num passe de mágica.
Comecei a chutar a porta. Nada mudou. Andei para trás e corri, me jogando na porta com toda força. Ouvi um estalo e uma dor forte no braço.
Acordei com um grito.
Olhei em volta, grata por ver o quartinho completamente seco. Sentei, dando-me conta de que tinha caído feio da cadeira: de peito na madeira e com meu braço bom por baixo de minha cara. Isso explicava meu estranho pesadelo.
O navio estava balançando tanto que eu já estava enjoada, e pelo barulho forte das trovoadas e da água batendo no teto desta cabine, com toda certeza estávamos passando por uma tempestade.
Encolhi-me diante do clarão que iluminou a escuridão em que eu estava. Eu sempre odiei tempestades, tão barulhentas e ameaçadoras que me assustavam mais que um ogro.
Elas me lembravam das noites em que eu passara presa no pequeno quarto debaixo da escada que dava para a sala de jantar. Meu pai sempre me trancava lá em noites de tempestade para que não pudesse me escutar quando eu chorava e gritava de medo. Ele dizia que estava impedindo-o de dormir.
Minha mãe esperava algum tempo até que ele dormisse e ia até lá me consolar. Lia minha história favorita e permanecia comigo até que eu me acalmasse.
Na manhã seguinte meu pai me tirava de lá, não antes de mais uma surra, claro.
Lembrei-me de como Belle sempre tentava amenizar o sofrimento que meu pai me causava. “Eu te amo mais que qualquer coisa.”, era o que ela sempre me dizia quando tentava me acalmar. E sempre funcionava.
Deixei que uma lágrima solitária descesse por minha bochecha. Era por minha mãe que eu levantava da cama toda manhã, era por ela que eu não usava a faca na mesa do jantar para matar a mim ou a meu pai. Ela era meu único motivo para viver.
É claro que eu tinha Ruby, que sempre estava lá comigo, me fazendo sorrir com suas ideias esquisitas. Porém ninguém jamais poderia ser comparada a minha mãe, que sempre dedicou sua vida a me manter esperançosa e feliz, mesmo nos piores momentos.
Como ela estaria agora? Será que se preocupava com meu bem estar? Será que estava chorando em sua cama? Ou talvez tentando convencer meu pai de que eu valia a pena? Será que algum dia eu a veria novamente?
Deitei no chão frio do navio tentando esquecer tudo aquilo e dormir mais uma vez. Talvez até os piores pesadelos sejam melhores que a realidade.
Deixei então que o balanço do navio me ninasse, e, quando estava prestes a dormir, tive a impressão de ouvir a voz de minha mãe cantando uma de suas canções de ninar.
❤
Acordei repentinamente. Não me pareceu haver qualquer motivo para eu ter acordado daquela forma, exceto o frio absurdo que eu estava sentindo. E o fato de que meu estômago roncava sem parar.
Onde estava Killian com minha comida?
Me levantei e caminhei até a porta, dando duas batidinhas fracas na mesma. Esperava que Killian me atendesse, porém nada aconteceu. Talvez ele não estivesse em sua cabine.
Caminhei até a cadeira no canto do cubículo e subi na mesma. Lá estava ele, deitado em sua cama como se não houvesse uma pobre coitada morrendo de fome e frio no cômodo ao lado.
-Sei que está aí, capitão. Posso vê-lo pela janela. –Falei um pouco indignada.
Não obtive qualquer atenção do pirata, que começou a brincar com seu gancho como se não pudesse me ouvir. Tive vontade de dar uns tapas nele para ver se parava de ser tão insensível.
-Também sei que está me ouvindo. –Completei, em seguida.
-Cale a boca Swan. –Ele resmungou. Sua voz soava abafada e distante.
-Quando você abrir a porta para me trazer comida eu calo.
Tinha certeza que eu estava parecendo uma princesinha mimada, mas naquele momento aquilo não era minha maior preocupação.
- Senhor. – Ele me corrigiu parecendo irritado ao me olhar através da janelinha. Killian pousou seus olhos em mim por um instante, talvez estranhando o fato de eu estar praticamente deitada no parapeito minúsculo da janela. - Mais respeito Swan, não sou seu amiguinho.
Suspirei alto e desci da cadeira com cuidado para não me machucar mais uma vez. Eu era mito boa em conseguir cicatrizes horrendas, isso deveria contar como uma qualidade. Ou não.
Será que era tão absurdo assim pedir um prato de comida? Infelizmente eu não conseguia sentir raiva, até conseguia, mas não na proporção que aquela situação merecia. Se é que me entende.
-Ó magnifico senhor capitão Killian Jones, poderia, por compaixão, trazer comida para essa garota esfomeada? –Debochei, com raiva.
-Não me faça ir até aí.
Bufei me cansando daquela discussão inútil.
-Tudo bem, então. Eu dou um jeito. Eu sempre dou mesmo. –Dei de ombros sentindo vontade de chorar.
Voltei a me sentar ao lado da cadeira, me encolhi, tentando aquecer meu corpo.
Como eu odiava passar por esse tipo de coisa.
❤
Talvez essa fosse a sensação que Dorothy experimentou quando a casa de seus avós foi erguida pelo furacão que levou-a para Oz.
Para mim o quarto no qual havia sido trancada girava sem parar. Eu sabia que era fome, porém Killian não me dera ouvidos e tudo indicava que eu não ia comer tão cedo.
Sentei na cadeira tentando me controlar. Eu já havia passado por essa situação diversas vezes, porém ela continuava sendo uma tortura para mim. Talvez a pior de todas. Meu pai já havia me deixado dois dias sem comida e água. Já fazia quase um dia que eu não bebia ou comia. Preferi não pensar no que poderia acontecer se eu ficasse muito mais tempo assim.
Quem sabe se eu conversasse com Killian? Talvez, se eu pedisse desculpas, ele me ouviria. Eu não acho que tenha feito algo errado, no entanto comer sempre ganhará de qualquer coisa, e isso inclui meu orgulho.
Eu me sentia extremamente fraca. Será que conseguiria subir na cadeira para vê-lo?
Achei melhor tentar chama-lo, se estivesse ali e aceitasse meu pedido de desculpas ele falaria algo. Pelo menos eu torcia para que sim.
Caminhei até a porta apoiando-me á parede.
-Capitão?
Não obtive resposta.
-Peço desculpas por ter lhe faltado com o respeito naquele momento.
Silêncio.
Revirei os olhos e esforcei-me para chegar até a cadeira novamente. Com cuidado subi na mesma. Tive medo de cair quando tudo voltou a girar, mas antes que qualquer coisa acontecesse me segurei no parapeito da janela.
Lá estava ele mexendo com seus mapas e livros na mesinha do canto do quarto. Tive raiva por um instante. Uma vontade de atear fogo nele vivo tomou conta de mim. Ele estava lá, calmamente estudando sei lá o que, com a barriga cheia e eu estava aqui quase desmaiando.
Brigadeiro. Unicórnios. Fadas.
Respirei fundo e pensei que minha vida era mais importante que minhas emoções quanto às atitudes daquele maldito capitão.
Dei três batidinhas no vidro. Ele olhou para mim.
-Será que o senhor poderia, por favor, não me ignorar? Eu estou pedindo desculpas! Não era minha intensão, juro.
Pisquei algumas vezes quando pontos pretos começaram a surgir em minha visão.
Killian bufou largando suas coisas e me olhando com certa raiva.
-Tudo bem, Swan. Está desculpada, mas isso não vai me fazer te levar comida. Sei que só pediu desculpas por causa disso, e não porque, realmente, admitiu que fez algo errado.
Fechei os olhos desistindo de afastar os pontos negros. Senti meu corpo ficando mole. Minhas mãos estavam mais frias.
-Me desculpe se o senhor se sentiu ofendido simplesmente por eu ter lhe chamado pelo seu nome.
Era para ser uma frase irônica, mas eu estava me sentindo tão fraca que minha voz soou mais como um sussurro triste.
-Você não aprende, não?
A voz de Killian soava distante e abafada. Senti como se o chão estivesse se movendo.
-Por favor, eu não sei quanto tempo consigo aguentar.
-Tudo bem, Swan. –Continuou o capitão após um suspiro. - Daqui a pouco levo sua comida, ok? Agora pare de me perturbar.
Aquela resposta era o suficiente. Ele ia trazer a comida, eu só tinha que aguentar mais um pouco.
Abri os olhos, todavia quando fui descer da cadeira os pontos negros ocuparam boa parte de minha visão, enquanto o chão se movia e tudo girava.
Em um instante senti meu corpo amolecer e tombar para o lado, no instante seguinte tudo o que existia era o nada.
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Autor(a): TrisDosAnjos
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