Fanfics Brasil - Capítulo 20 - Andarilhos O Trono Sem Rei

Fanfic: O Trono Sem Rei | Tema: Vondy - Adaptada


Capítulo: Capítulo 20 - Andarilhos

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Não demoraram muito para chegar no Castelo de Frabato.

Felizmente para Dulce, que tinha horror a assombrações, o castelo parecia

normal. Não havia pedaços de corpos caindo do nada nem barulhos

sinistros.

 

 Era um lugar iluminado e repleto de quadros de belezas naturais.

Assim que chegou com o rapaz sangrando e desacordado nos braços,

Frabato foi recebido por duas mulheres e um homem que pareciam

serviçais. Ele mandou que eles pegassem certas ervas e unguentos que ele

tinha estocado. 

 

Dulce não sentiu urgência na voz do mago que sempre

parecia calmo e confiante, mas sentiu urgência no homem e na mulher que

correram para buscar o que ele pediu. A segunda mulher o guiou até o

quarto que Dulce só reconheceu ao entrar. Era o mesmo quarto em que

tinham ficado da primeira vez.

 

Colocaram Chris na cama e Frabato cortou sua camisa com uma

tesoura que a mulher lhe dera. No ombro, quase chegando ao peito, havia

uma horrível marca de dentada de onde vertia sangue abundantemente. A

mulher pegou uma bacia de água e Frabato começou a retirar o sangue com

uma toalha que tingia a água da bacia de vermelho. 

 

O casal que havia ido

buscar o material voltava correndo carregando algumas coisas.

Dulce olhava atentamente a movimentação. Frabato passou um

unguento escuro no ferimento, estancando o sangue. Por cima, ele colocou

grandes folhas frescas de um verde profundo, até cobrir o ombro e parte

das costas do garoto, sempre com a ajuda da mulher que tinha a precisão

de uma enfermeira bem treinada. 

 

Então, ele colocou as mãos sobre o

ferimento e ficou em silêncio por alguns minutos. Ninguém se movia na

sala e nada era ouvido. Dulce temeu que sua respiração nervosa

atrapalhasse, então tentou se controlar.

 

Quando Frabato terminou, deu um suspiro e um olhar para a mulher

que o ajudava. Então ele se levantou e ela assumiu seu lugar, enfaixando o

ombro de Chris. Frabato foi até Dulce, limpando as mãos em uma outra

toalha.

 

– Não foi tão ruim!... – disse ele. – É como uma picada de mosquito!

 

Dulce ficou olhando para ele, incrédula.

 

– Bem, um mosquito bem grande... E com dentes enormes... –

continuou ele, olhando para o rapaz na cama.

 

– Ele vai ficar bom?

 

– Vai, sim. Você precisa de um banho. Está horrível!

 

Só então Dulce se lembrou de olhar para si mesma. Estava suja de

terra e de sangue de Chris e das vítimas desconhecidas do kelpie, além de

muito molhada. Ela se virou para Chris e viu que estavam tirando todas as

roupas dele. Virou o rosto, querendo lhe dar privacidade.

 

– Vá tomar um banho – disse o mago, apontando com o queixo a

porta da sala de banhos que ela já conhecia, contigua ao quarto. – Annete

vai levar toalhas e uma camisola para você.

 

Dulce anuiu com a cabeça e foi, deixando que assim cuidassem de

Chris. Na sala de banhos – pois não havia banheiros no mundo das fadas,

apenas aposentos para se tomar banho. Aparentemente, seus corpos

consumiam totalmente alimentos e líquidos ingeridos, – Dulce se olhou no

espelho por um minuto. Então respirou fundo e começou a tirar a roupa. Se

Frabato não tivesse aparecido, estariam mortos, não tinha a menor dúvida

disso.

 

O banho renovou suas forças. Annete levou-lhe toalhas, uma

camisola e um penhoar, levando suas roupas sujas embora. Quando voltou

ao quarto, Chris parecia dormir pesadamente na cama, com curativos bem

feitos e um pijama de flanela branca. As três pessoas que cuidaram dele não

estavam mais ali. 

 

Apenas Frabato estava sentado em uma cadeira

aguardando com um sorriso, tomando uma xícara de chá. Dulce foi até a

cama, ao lado de Chris, e o olhou longamente. Então, acariciou seus cabelos e

virou-se para o mago.

 

– Obrigada... – disse.

 

– Não tem de quê – respondeu prontamente Frabato.

 

Dulce se aproximou dele, intrigada.

 

– Como... Como soube que estávamos com problemas? – perguntou

ela, que não acreditava que ele estava simplesmente passando por ali

quando eram estripados pelo cavalo do demônio.

 

– Eu estava com meus espelhos mágicos e vi quando foram

abordados pelo kelpie. Tentei chegar antes, mas...

 

– Espelhos?

 

– Venha comigo, eu vou lhe mostrar!

 

Ele pousou a xícara sobre uma mesinha de madeira com gavetas e se

levantou. Ela o seguiu por um corredor e subiram uma escada acarpetada.

 

– O kelpie é muito perigoso – continuou ele. – Vocês deram muita

sorte!

 

– O que é um kelpie, exatamente? – perguntou Dulce, enquanto

subiam os degraus.

 

– É um ser muito mau. Ele toma a forma de um pônei inofensivo ou

de um cavalo bonito e tenta convencer alguém a montá-lo. Uma vez que o

consegue, leva a presa para seu ninho da morte, onde abate e devora suas

vítimas.– Ele come as pessoas??!!!

 

– Come! Menos o coração e o fígado. De resto, não sobra nada.

 

Dulce se lembrou que, além de ossos e crânios, havia corações e

fígados pelo chão.

 

– Por que ele não come coração e fígado? – perguntou ela.

 

– Sei lá – respondeu Frabato com um movimento de ombros. – Vai

ver que ele está preocupado com o colesterol. Pronto, chegamos.

 

Frabato abriu uma porta e acendeu uma luz que iluminou um

aposento de bom tamanho repleto de espelhos. Dulce queria perguntar

como ele conseguia eletricidade, mas acabou se distraindo com a visão dos

espelhos. 

 

Havia espelhos com molduras de madeira, com molduras

prateadas e até um grande espelho com moldura de ouro. Estavam

pendurados nas paredes, de maneira que de qualquer lugar onde você

estivesse, poderia ver seu reflexo em vários espelhos de uma vez.

 

– Eles são mágicos? – perguntou Dulce.

 

– Claro que são!

 

E então Frabato fez um movimento de mãos e disse algumas

palavras. Imediatamente, os espelhos esfumaçaram e começaram a

aparecer imagens de pessoas que Dulce não conhecia, em vários lugares.

 

– Que fantástico! – balbuciou ela, caminhando pelos espelhos. –

 

Quem são essas pessoas.

 

– Gente que conheci. Gente que me conheceu. Gente de quem eu

gosto. Gente de quem eu não gosto.

 

– Foi assim que você nos viu?

 

– Sim. Vocês pipocaram na minha programação de TV sem que eu

esperasse.

 

A moça continuou andando pela sala, quando se virou de repente.

 

– Você pode ver qualquer pessoa nesses espelhos?

 

– Não qualquer pessoa... Mas posso ver alguém que eu conheço ou

que já tenha visto.

 

Dulce murchou os ombros, voltando a olhar para os espelhos.

 

– Gostaria de ver onde estão meus pais e meu tio Marcos...

 

O mago pensou um pouco e então se aproximou dela.

 

– Talvez você possa ver ao menos um deles – ele a segurou

gentilmente pelos ombros e então a instruiu. – Escolha uma dessas pessoas

e feche seus olhos.

 

Dulce pensou que entre os três, seu pai era um assunto mais

premente. Bem ou mal, sua mãe e tio Marcos estavam em segurança na Vila

da última vez que os viu.

 

– Esvazie sua mente... Ouça a minha voz...

 

Ela se sentiu em alguma sessão de hipnose, dessas que acontecem

em filmes, mas queria muito ver se Fernando e Eileen estava bem e não se

importava se Frabato a hipnotizasse e a fizesse agir como uma galinha num

palco, desde que pudesse vê-los nos espelhos.

 

– Pense nas pessoas que deseja ver. Concentre-se em uma.

 

Dulce pensou logo em seu pai. Será que eles teriam conseguido

despistar os trolls que os perseguiam?

 

– Abra os olhos.

 

Dulce abriu os olhos e, num espelho diante dela, uma fumaça

espessa começou a rodopiar. Como se um vento tivesse passado, a fumaça

se dissipou, dando lugar à imagem de Fernando caminhando numa floresta

escura de mãos dadas com a menina fada ao seu lado. O coração de Dulce

se aliviou. Estavam vivos.

 

 Percebeu que seu pai ainda tinha uma marca

perto do olho de seu encontro com os trolls no dia anterior e alguns

arranhões de seu encontro com os trolls pela manhã. Ele também parecia

cansado, quase tão mal quanto ela quando se viu no espelho antes do

banho. Eileen parecia exausta. Estavam andando numa floresta escura. Mas

estavam vivos. E isso era tudo o que tinha e teria que ser o bastante por

hora.

 

Fernando caminhava pela floresta escura, a mãozinha quente apertada

na sua. Estavam andando por horas e quando nuvens encobriam a lua, ele

não enxergava nada a sua frente. Não havia um lugar para parar, então ele

simplesmente continuava. Até que Eileen começou a diminuir o passo.

Quando tentou puxá-la gentilmente, a fadinha se revoltou. Puxou sua mão

da dele e gritou.

 

– Eileen com fome! E cansada! E com sono! E com frio!

 

E começou a chorar.

 

– Eileen quer ir pra casa!

 

Fernando se ajoelhou rapidamente ao lado dela, tentando fazê-la parar

de chorar antes que alguma coisa naquela floresta a ouvisse e encarasse

isso como uma sineta para o jantar.

 

– Shhh, está bem, está bem! – disse ele. – Está tudo bem, nós vamos

achar um lugar! Um lugar com comida e roupas quentes!

 

– Vamos mesmo? – perguntou a criança, ainda chorosa.

 

Fernando sorriu seu melhor sorriso, aquele que convenceria você a

comprar ações da Betamax e da Eurodisney (hoje!).

 

– Vamos, sim, querida. Venha!

 

Ele a pegou no colo e a carregou. Ele também estava úmido e com

frio, e com fome, e cansado, e dolorido. Mas não sentia nada disso porque

estava preocupado demais com a menina em seus braços.

 

Continuou andando por mais alguns minutos, fazendo orações

silenciosas para que alguém o orientasse naquele estranho mundo, com

dúvidas se seu Deus o ouviria ou poderia intervir, mesmo se ouvisse. Foi

quando viu um brilho por trás das árvores a sua frente.

 

 Apurou os olhos e

continuou na mesma direção, percebendo que mais luzes apareciam. Abriu

um sorriso de alívio quando discerniu as luzes de uma taverna.

Apertou o passo, o vento batendo em suas costas, deixando-o gelado.

Apertou a menina em seus braços, tentando aquecê-la um pouco mais e

prosseguiu, animado com a perspectiva de encontrar um lugar aquecido

para passar a noite.

 

Quando a porta da Taberna Andarilhos se abriu, uma lufada de

vento frio fez com que as pessoas lá dentro se virassem para ver quem

tinha entrado. A figura do homem vestido de preto espantou alguns. 

 

O fato

dele estar com uma menina fada no colo espantou os restantes.

Fernando fechou a porta atrás de si e, assim que o fez, pôde sentir o

calor do lugar. Havia um aroma de comida, algo que ele identificou como

carne assada ou algo parecido. Havia também cheiro de bebida. Numa

rápida olhada para o recinto, ele viu que o lugar, não muito grande, estava

cheio. 

 

Quase todas as mesas rústicas de madeira estavam ocupadas. Havia

homens fortes de cujo olhar ele não gostou. Eram grandes e fortes, talvez

lenhadores ou trabalhadores braçais. 

 

Havia também outros homens,

menores, esguios, com cabelos ruivos quase laranja e um sorriso de dentes

amarelados malicioso. No canto mais à esquerda, viu um pequeno grupo de

anões jogando cartas com grandes canecas de cerveja. Mais ao fundo, um

tipo estranho de anão atarracado de pernas finas observava o visitante e

sua inesperada acompanhante.

 

O silêncio que se fez permaneceu e Fernando não se sentiu bem-vindo.

Pelo contrário, seu faro para encrenca o alertou de que aquele poderia ser

um lugar ruim para eles. Bem ruim. O vento aumentou e sacolejou as

janelas. Imaginar o frio lá fora afastou seu primeiro pensamento de virar as

costas e sair dali.

 

Caminhou pelo lugar e seus passos fizeram barulho na madeira que

rangeu. Eillen dormia em seu ombro e ele a balançou levemente,

acordando-a. Colocou gentilmente a menina num banco diante da única

mesa vazia e sentou-se diante dela. 

 

Esperou que o silêncio preocupante que

se estabelecera desde que entrara, aquele silêncio que diz que você não

pertence àquele lugar e isso dá direito àquelas pessoas – ou fosse lá o que

fossem – de expulsá-lo ou fazer alguma coisa ruim com você, passasse. Mas

não passou. Ao invés disso, ouviu uma cadeira sendo arrastada e um dos

homens se levantou e caminhou pesadamente até ele.

 

Fernando tinha seu histórico de encrencas. E era um currículo bem

longo. Nunca fugira de uma briga. Pelo contrário, fazia questão de procurar

por elas. Era um ímã de encrencas, como dizia Blanca, e eles sabiam que ele

era ainda pior antes de se conhecerem. 

 

Em outra ocasião, Fernando adoraria

começar uma briga e jogar alguns daqueles homens janela afora. Mas agora,

ele olhava para Eileen, esfregando os olhos miúdos de sono, e rezava para

que simplesmente os deixassem em paz. As coisas mudam quando você

tem algo a perder.

 

O homem parou perto deles e colocou a mão no cinto de couro

marrom.

 

– Ouvi dizer que Feiticeiros da Lua Negra só andam em bandos... –

disse o homem. – Como corvos...

 

Fernando não ergueu os olhos para ele, mas retesou os músculos,

preparando-se para agir.

 

– Então, o que faz sozinho por essas bandas, feiticeiro?... Se perdeu

do seu bando?

 

Algumas risadas ecoaram pela taberna. A coisa não estava boa. Se

não se impusesse naquele momento, seria sua ruína. Não sabia do que

aquela gente era capaz, mas sabia que Eileen precisava dele.

Fernando colocou as mãos sobre a mesa e empurrou levemente a

cadeira para trás, levantando-se. 

 

Ficou de pé e encarou o homem, cerca de

vinte centímetros mais alto que ele. Ele tinha uma barba rala e um rosto

quadrado com olhos tortos que lhe davam um ar de pintura inacabada.

Uma cicatriz marcava seu rosto, feita provavelmente pela ponta de uma

espada. E era forte, disso não havia dúvida.

 

No passado, Fernando Espinoza havia sido um padre. Não um padre

qualquer. Um padre superstar. Ele atraía toda uma cidade e seus sermões

eram atração até para cidades vizinhas. Uma espécie de estrela do rock

religiosa da época, ele era capaz de conquistar quem ele quisesse com sua

forte presença. Isso lhe abriu muitas portas. E o livrou de muitas ciladas.

 

Algumas pessoas possuem esse carisma, esse brilho pessoal capaz de

passar um recado com um simples olhar. E era isso que ele esperava fazer

naquele minuto.

 

Seus olhos negros se cravaram no homem e imediatamente ele

sentiu que o sujeito diminuiu a pompa.

 

– Tem razão – respondeu ele em alto e bom tom, - nós andamos em

bando. E estamos por toda a parte, sempre observando, como a Lua. Por

isso sempre sabemos o que acontece com cada um de nós.

 

– Acha que tenho medo dos seus amigos? – perguntou o homem, se

aproximando de Fernando .

 

Fernando não se moveu. Ao invés disso, projetou o corpo para a frente

e rosnou em tom ameaçador.

 

– Não. Seria mais sábio ter medo de mim.

 

O homem sustentou o olhar por alguns instantes, até que uma voz

feminina interrompeu o concurso de testosterona.

 

– Ninguém vai brigar na minha taberna! – disse uma senhora negra

acima do peso de cabelos que alternavam o grisalho com o preto presos

num coque frouxo. – Não quero meus pratos quebrados nem minhas mesas

destruídas!

 

Ela se interpôs entre Fernando e o grandalhão, dirigindo-se ao segundo

com as mãos na cintura.

 

– Se quer brigar, Cadman, brigue lá fora!

 

O homem levou alguns segundos para desviar o olhar de Fernando e

finalmente voltar ao seu lugar. Lentamente, as conversas voltaram, assim

como o som de canecas pousando sobre as mesas.

 

Espinoza sentou-se novamente, ainda com a adrenalina correndo em

seu corpo, fazendo-o tremer levemente. Percebeu que a mulher parou ao

lado deles.

 

– O que vão comer? – perguntou ela.

 

Fernando olhou para a fadinha, nitidamente faminta. Hesitou por um

instante, e então fez seu pedido.

 

– Uma coisa quente para a menina, por favor.

 

A mulher continuou esperando.

 

– E para você, bonitão?

 

Ele olhou a comida nas outras mesas e sentiu a boca se encher

d’água.

 

– Um copo d’água, por favor.

 

– Tem certeza?

 

– Tenho, eu não estou com fome, obrigado.

 

A mulher os deixou e desapareceu atrás do balcão. Eileen se inclinou

para a frente e sussurrou como se contasse um segredo.

 

– Você não está com fome?...

 

– Não querida, eu estou bem.

 

Passaram-se poucos minutos até que o pedido fosse atendido. A

mulher chegou com uma enorme bandeja. Colocou diante de Eileen uma

cuia com um creme fumegante com cheiro de queijo que a menina já ia se

precipitando em tomar. Fernando a impediu, avisando que estava muito

quente, para que ela soprasse primeiro.

 

Para sua surpresa, uma cuia de creme foi colocada diante dele

também e antes que pudesse dizer qualquer coisa, um prato foi colocado no

meio de sua mesa com pedaços de frango assado e pães quentinhos. Ele se

virou para a mulher que os servia.

 

– Desculpe, eu só pedi para a menina! – disse ele.

 

A mulher colocou dois copos sobre a mesa e uma jarra de barro de

água.

 

– Querido, eu criei oito filhos – respondeu a mulher com um sorriso

que esbanjava espontaneidade. – Acha que eu não sei reconhecer uma cara

faminta?

 

Ela se preparou para se afastar, mas Fernando a puxou discretamente

de volta pelo braço. Falou baixo, em tom de confidência, e com um pouco de

vergonha.

 

– Eu não tenho como pagar...

 

Ela o olhou nos olhos por alguns segundos. E então sorriu de novo,

dando tapinhas em sua mão como uma tia querida.

 

– Não se preocupe com isso, filho!

 

E saiu para atender outros clientes que pediram cerveja. Fernando 

observou Eileen pegando um pão quente com um bigodinho de creme. O

aroma do frango e do pão se misturaram e ele começou a comer também,

com as mãos, já que não havia talheres. Como nos velhos tempos.

 

Três horas se passaram e a mesa ficou vazia, assim como a taberna.

O homenzinho de cabelos vermelhos ainda dançava com sua caneca

sempre cheia, e anões discutiam de vez em quando, mas o homem que

enfrentara Fernando , assim como seus amigos, já tinham ido embora. 

 

Fernando 

esfregou os olhos, tentando afastar o sono. Ia pedir à boa senhora que os

deixasse pernoitar ali mesmo, naquela mesa, mas não queria atrapalhá-la.

Quando ela finalmente se aproximou deles, ele se preparou para o pedido.

Antes, porém, que ele dissesse qualquer palavra, ela perguntou:

 

– Vocês não tem pra onde ir, não é?

 

– Na verdade, temos pra onde ir... – respondeu Fernando com um

sorriso gentil. – Só não temos onde passar a noite!

 

A mulher riu e, com um movimento de mãos, falou para segui-la.

Fernando se levantou e pegou Eileen, que dormitava com a cabecinha sobre os

braços na mesa. Colocou-a no colo e seguiu a mulher.

 

– Não sei o seu nome...

 

A mulher se virou para ele subindo as escadas de madeira. Ela tinha

o rosto rechonchudo e um olhar que esbanjava sabedoria. Seu decote era

grande e o avental marcava uma cintura distante.

 

– Dana – disse ela. – Pode me chamar de Dana.

 

– Eu sou Fernando Espinoza, e essa é Eileen.

 

Ela olhou para a menina adormecida em seus braços com

curiosidade.

 

– Vocês formam uma família estranha...

 

E voltou-se para a porta que abria com uma chave que trazia num

molho.

 

– Você ainda não viu nada... – murmurou Fernando .

 

Ela deu passagem para eles e Fernando viu um quarto aconchegante

com duas camas, lençóis limpos, cobertores quentes e cheiro de madeira.

 

– O banheiro é ali e eu vou pegar toalhas.

 

Ela apertou o braço do homem e fez uma cara de espanto.

 

– Menino, você está molhado! Se dormir assim, vai acabar ficando

doente! Vou ver o que posso arrumar para vocês.

 

Ela os deixou no quarto e Fernando colocou Eileen numa das camas.

Sentou a menina delicadamente, mas ela estava mole de tanto sono. Retirou

o vestido molhado e secou-a com uma toalha que estava sobre a cama.

 

Lembrava muito Dulce quando era pequena e ele se viu invadido por uma

onda de nostalgia que o levou imediatamente à preocupação com a filha.

Teria ela conseguido escapar dos trolls? Claro que sim! Era sua filha! Ele

não criara nenhuma imbecil. Ela sabia se virar.

 

A porta voltou a se abrir depois de umas leves batidas e Dana estava

de volta com roupas dobradas e mais toalhas..

 

– Para você, consegui um velho pijama de meu filho mais novo. Para

a menina, só achei essa camisa de algodão de quando um deles, não lembro

mais qual, era criança. É o bastante para dormir. Amanhã suas roupas já

estarão secas!

 

Fernando recebeu as roupas e olhou-a com o peito cheio de gratidão.

 

– Dana... – disse ele. – Eu não sei como lhe pagar por isso tudo...

 

– Não se preocupe! – disse ela, dando-lhe tapinhas no braço. – Posso

ver que você é um bom homem num mau momento! Não precisa pagar por

nada.

 

Ela o deixou sozinho. Fernando ainda ficou parado alguns instantes

com as roupas nas mãos, então se virou e foi vestir Eileen. A menina nem

acordou e quando ele terminou de vesti-la, ela se virou para o lado e

continuou a dormir. Ele a cobriu com o cobertor e arrastou os pés para o

banheiro. No espelho, assustou-se consigo mesmo. 

 

O rosto ainda estava

ferido, embora ele não sentisse mais nada. Estava pálido demais em

contraste com os cabelos negros que agora estavam desgrenhados, caindo

pelo rosto formando caracóis. Molhou o rosto numa bacia e respirou

profundamente.

 

Alguns minutos depois, ele se arrastou de volta, depois de um banho

de gato e com as roupas do filho da boa senhora. Um filho que deveria ser

enorme, pois as roupas estavam tão grandes nele que se sentia uma criança

vestindo o pijama do pai.

 

 Fernando se deitou na outra cama e cobriu-se,

pensando que, se há alguns dias alguém lhe dissesse onde estaria naquele

momento, ele riria. Agora, não estava com muita vontade de rir...

 

 

 

 


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Autor(a): vondynatica

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 8



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  • vondy_170 Postado em 25/01/2017 - 05:22:26

    Livro 3 - https://fanfics.com.br/fanfic/55691/a-cancao-dos-quatro-ventos-finalizada-vondy- adaptada

  • vondy_170 Postado em 25/01/2017 - 05:20:31

    Livro 1 - https://fanfics.com.br/fanfic/48242/lua-das-fadas-vondy-adaptada

  • kaillany Postado em 21/12/2016 - 16:58:13

    Continua!!!!

  • kes_vondy Postado em 06/12/2016 - 02:26:44

    CONTINUA

  • candy1896 Postado em 04/12/2016 - 22:58:47

    CONTINUA

  • candy1896 Postado em 04/12/2016 - 19:50:14

    CONTINUA


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