Fanfic: O Trono Sem Rei | Tema: Vondy - Adaptada
A noite era fria na cela, o que fez com que Chris e Dulce se
aninhassem juntinhos num monte de feno. Ele esfregava os braços dela,
tentando aquecê-la um pouco. Ela estava com a cabeça recostada em seu
ombro quando se lembrou.
– E o seu ombro?
Ele nem se lembrava disso. Dulce se virou para ele e abriu sua
camisa, preocupada.
– É melhor ver isso! Como você não está sentindo nada?
– Não sinto dor nenhuma há algum tempo, na verdade...
Dulce retirou com cuidado as bandagens que haviam sido
colocadas esperando ver uma cena horrível, talvez pior do que quando vira
o ferimento antes de ser tratado, quando a carne perfurada grotescamente
exibia buracos enegrecidos de dentes enquanto o sangue rubro ainda
vertia. Apertou os olhos, tentando ver melhor.
A única iluminação vinha do
corredor, onde chamas em tochas tremulavam a noite toda.
– Está muito ruim? – perguntou Chris, já se preocupando com o olhar
surpreso dela.
– Está curado! – respondeu ela.
– O quê?
Ele se curvou para tentar ver. Tateou o lugar e sentiu, assombrado,
que havia apenas algumas cicatrizes.
– Que fantástico! – comemorou ele. – Frabato é mesmo incrível!
– Ele me contou que, quando vivo, trabalhou curando pessoas
através da magia! – disse Dulce, igualmente animada em ver o amigo bem.
Eles riram e o momento mudou. Momentos fazem isso. Eles passam,
mudam, crescem, flutuam e por vezes pousam em algum lugar, apenas
observando o desenrolar dos acontecimentos.
Chris estava com a camisa semiaberta a alguns centímetros dela e eles
estavam sozinhos. Dulce não conseguiu disfarçar que aquilo mexeu com
ela. Mexeu mesmo.
– Está quente hoje... – murmurou ela, se aproximando um
pouquinho mais, sentindo as bochechas arderem.
– É, está mesmo... – respondeu ele, sem tirar os olhos dela, e
inclinando o rosto para um beijo.
Seus lábios se uniram, eles sentiram o gosto um do outro, de olhos
fechados e corações abertos. Quando seus lábios se separaram, ela tocou o
peito dele, sentindo o desejo que a estava deixando ofegante. Ele baixou
levemente a blusa dela, acariciando delicadamente a curva perfeita do
ombro. Dulce, que nunca fora tocada daquela maneira, arrepiou-se e
sentiu o coração disparar enlouquecidamente.
E então, ele parou.
Empurrou-a levemente para longe, recostando-se na parede da cela.
– Não podemos – disse.
– Por que não?! – perguntou ela.
Ele olhou para ela, um sorriso desenhado no rosto também de
bochechas coradas.
– Quer uma lista? Porque nos conhecemos há menos de três meses.
Porque você é menor de idade. Porque eu não quero que seu pai me mate.
Porque um guarda pode aparecer a qualquer momento e estragar tudo. E,
principalmente, porque será nossa primeira vez e não quero que seja numa
cela fria.
Ele a tocou gentilmente no rosto numa carícia sincera.
– A vida é uma coleção de lembranças... E você merece lembranças
melhores...
Dulce poderia estar frustrada. Mas não estava. Sorriu, imaginando
que tipo de rapaz do mundo dela se preocuparia com sua idade, com seu
pai ou com suas lembranças. Sabia que ele tinha razão. Não era assim que
queria se lembrar de um momento tão importante.
Então ela o beijou ternamente e voltou a se recostar no ombro dele.
– Obrigada...
Ele a beijou na testa e fecharam os olhos, dormindo um pouco na
cela que, afinal, já não estava tão fria.
Dormiram pesadamente e acordaram com sons metálicos na grade
da prisão. Chris e Dulce se levantaram atordoados, com feno na boca e nos
cabelos desgrenhados e viram um guarda elfo abrindo a cela para eles.
– A rainha quer falar com vocês.
Eles se entreolharam e saíram da cela, imaginando qual seria o
humor da rainha naquela manhã. Foram guiados pelos corredores escuros
das masmorras e por escadas de pedra, até que estavam finalmente fora do
castelo. Caminharam mais um pouco, seguindo o guarda, até um imenso
jardim de flores de tantas cores que eles pareciam uma criação de um
quadro surreal.
No meio das flores, a rainha Belinda observava um pássaro
nas mãos. Seus cabelos esvoaçavam levemente com o vento, e seu vestido
parecia dançar. Era uma visão pura da beleza.
– Majestade? – disse o guarda.
– Sshhh! – pediu a rainha, voltando sua atenção para o pássaro cor
de terra pousado em sua mão. – Continue, querido, então, o que aconteceu
depois?
O pássaro cantou, agitou as asinhas, contanto sua história com um
certo ar de indignação. A rainha o ouviu com ar sério. Quando ele terminou,
ela o tocou. Ele brilhou por alguns segundos e então voltou a ser um
pássaro comum.
– Vá, querido! Vá e leve a sorte e a inspiração de Belinda para os que
cuidam de você e seus irmãos!
E então ele voou, misturando-se a outros pássaros e borboletas que
coloriam o jardim. A rainha se voltou para os visitantes. Fez um movimento
com a mão, dispensando o guarda, e se aproximou do casal ligeiramente
amarrotado.
– Sabe o que ele me contou? – perguntou a rainha.
Os dois balançaram a cabeça lentamente.
– Que um casal de humanos sempre os alimentava em suas janelas,
mas uma vizinha deles reclamou com o condomínio e agora eles não podem
mais fazer isso! A vizinha disse que os passarinhos estavam invadindo sua
casa e atacando sua família! Quem inventa uma história dessas? Quem se
diverte dificultando a vida de passarinhos?!
A rainha os olhou com mais atenção.
– Vocês estão horríveis!
Dulce tentou se ajeitar e Chris passou a mão nos cabelos, tirando
algum feno dele.
– Desculpe, não tinha espelho na cela... – murmurou Dulce, que
levou um cutucão de Chris, que não estava muito disposto a voltar pra prisão.
– É pra evitar suicídios! – explicou a rainha.
Ela começou a andar pelos jardins, e os dois jovens a
acompanharam.
– Meu mundo está em crise, sabiam? – disse ela.
– Ouvimos dizer – respondeu Chris.
– Temos dois reis muito zangados doidos para começar uma guerra
e nenhum dos dois quer me ouvir. Que tipo de rainha eu sou, se eles não
querem me ouvir?
– A senhora não pode depô-los? – perguntou Dulce, buscando uma
solução simples, removendo o problema.
– Se eu pudesse, já teria feito! – resmungou a rainha. – Mas não
posso. Não posso impor coisas ao mundo. Posso guiar, orientar,
aconselhar... Mas não posso impor. Mas sabe de quem é a culpa disso tudo?
A rainha se virou para eles com olhos acusadores, fazendo-os
pararem de repente.
– De vocês!
– Nossa?! – perguntaram os dois em uníssono.
– Sua! Dos seus pais! E dos pais dos seus pais! E dos seus vizinhos,
amigos, inimigos! Enfim, da sua espécie inteira!
A rainha se pôs a caminhar novamente, e eles sentiram o vento se
agitar, retirando algumas flores de seus galhos e levando suas pétalas para
longe. Mesmo assim, continuaram seguindo Belinda.
– Tudo o que vocês fazem no seu mundo afeta outros mundos,
inclusive o meu! Quando imbecis matam milhões de peixes com um
vazamento, nossos rios do reino encantado entram em desequilíbrio.
Quando um retardado maltrata um animal, nossos habitantes mais
inclinados à violência se tornam ainda mais violentos! Seu povo está
completamente desequilibrado, vivendo de consumo desnecessário, dando
mais valor ao dinheiro do que a si mesmos, julgando as pessoas pelo que
elas possuem, tratando coisas como pessoas e pessoas como coisas! E, junto
com isso, vocês têm o instinto, o impulso, a energia criadora voltada apenas
para conquistar uma casa mais cara, num bairro da moda, um carro melhor
e roupas mais caras, tudo que faça com que os outros lhes deem valor pelo
que vocês têm e não pelo que vocês realmente valem!
O vento jogava os cabelos deles para todos os lados. Belinda então
suspirou e pegou uma flor caída aos seus pés. Somente então Chris e Dulce
perceberam que estavam na beira de um jardim suspenso.
Dali, podiam ver
todo o reino, até as montanhas cobertas de neve ao longe, onde um dragão
voava entre as nuvens. Eram planícies e rios brilhantes, florestas, colinas,
sendo cobertos pelas nuvens e descobertos pelo Sol numa visão
estonteante.
Belinda soprou a flor e suas pétalas-sementes voaram para longe.
Ela se virou novamente para eles, o semblante conformado quase
transformando-a em outra pessoa.
– Mas nosso mundo também muda o seu... – disse ela. – Se nossos
mares se enfurecem, vocês têm tsunamis. Se nossa violência aumenta,
vocês têm vulcões e incêndios. Se nos falta doçura, vocês têm secas e
morte.Terremotos, furacões, tornados, maremotos, secas, enchentes... No final, vocês sofrerão tanto quanto nós. A diferença é que vocês têm escolha.
Belinda se virou e passou por eles, retomando o caminho de volta ao
castelo.– Vou lhes ceder Ipso e Facto para irem até a cidade mais próxima.
Eles voltam assim que os deixarem lá, em troca de um pequeno favor.
– Nós achávamos que você poderia nos dizer onde estão meus pais...
– disse Dulce, num fiapo de voz.
Belinda se voltou novamente para eles.
– Eles vieram sequestrados para o meu mundo, como sua amiga
Anahí?
– Err... Não.
– Então não posso ajudá-los. Só tenho como saber o paradeiro de
humanos que vieram à força pra cá. Os que vêm por conta própria estão à
sua própria sorte.
– Eles foram raptados depois, serve? – perguntou Chris.
– Não.
Ficaram em silêncio por alguns segundos enquanto a rainha
continuava olhando para eles.
– Terminaram? Posso dizer o que quero em troca da carona nos
meus grifos?
Eles anuíram com a cabeça.
– Quando voltarem... SE voltarem para seu mundo, digam aos
humanos de lá para...
Belinda estufou o peito, seus olhos brilharam e seus cabelos
esvoaçaram, como se ela fosse falar uma longa lista de coisas que os
humanos precisassem fazer para evitar o fim inexorável de seu próprio
mundo e de vários outros interligados. Mas então, os olhos dela foram mais
longe, além das nuvens cor de ouro que cercavam e sustentavam o castelo,
além do azul do céu infinito, além das montanhas de gelo. Seus ombros
relaxaram e seus lábios se fecharam num sorriso.
– Digam a eles para serem gentis...
Foi o que ela disse, antes de se virar e continuar seu caminho.
– Com quem?
Belinda se virou para eles, como se tivesse saído de algum sonho
bonito. A pergunta viera de Dulce. A rainha sorriu de novo e respondeu
como se fosse óbvio.
– Com todos, ué! Com tudo! Em todo lugar, o tempo todo! Digam a
eles para serem gentis.
A manhã começou mais cedo para Blanca, Marcos e Marcel. Havia
pressa em todo mundo. Fergus tinha usado seu turno para pensar sobre
levar sozinho a princesa até seu destino, já que não podia contar com os
estranhos.
Não que ele não confiasse em si mesmo, mas... Havia algo errado,
ele podia sentir. De alguma forma, aqueles estranhos lhe passavam mais
confiança e gostaria de poder contar com eles. Não por sua segurança, que
não era importante, mas pela segurança de Maeve. Quer dizer, da princesa
Maeve. Ele não podia se esquecer disso...
Chegaram na Floresta Perdida. Era um pouco mais sombria do que
esperavam. As árvores eram juntas e pareciam observá-los. Eram enormes
e suas copas tapavam o Sol.
– Fiquem juntos... – mandou Marcel.
– Como vamos achar o tal do fauno? – perguntou Fergus.
– Podemos seguir as placas! – respondeu Marcos.
E quando Marcel já ia dar um passa-fora nele pela resposta cretina,
viu que Marcos olhava para uma placa de madeira onde se lia: “Morada do
Fauno”.– Não pode ser tão simples... – resmungou ele, enquanto seguia os
outros pelo caminho de árvores antigas. – Deve ser uma armadilha...
A desconfiança de Marcel não era absurda. Seguiram pelo caminho
cada vez mais escuro e úmido, prestando atenção em cada movimento, em
cada som, até chegarem num grande espaço de árvores milenares e colunas
de alguma construção mais antiga que o tempo até onde o conhecemos.
Eles pararam e Blanca saltou do seu cavalo. Passou a mão em uma das
colunas, retirando um pouco de hera, e se surpreendeu ao ver uma escrita
antiga gravada nas ruínas. Não parecia egípcio, ou celta, ou nada que ela
conhecesse. Marcel e Marcos desceram também. Em alguns minutos,
Fergus e Maeve fizeram o mesmo.
– Bem-vindos ao meu humilde lar!
A voz assustou os outros e a visão os apavorou. Não sabiam bem o
que esperar de um fauno, mas certamente não esperavam uma criatura de
mais quase três metros que parecia tão velha quanto aquelas árvores. Ele
tinha um rosto animalesco e patas de bode e se movia lentamente.
O fauno ancião sorriu para eles. Ao menos, era o que achavam.
– Não tenham medo, viajantes! – disse ele, numa voz ligeiramente
sibilante. – Este velho fauno não lhes fará mal...
Essa última frase parecia imbuída de uma ironia perigosa. Blanca foi
a primeira a tomar coragem e se aproximar.
– Senhor, pedimos desculpas por invadir sua casa – disse ela, na voz
mais firme que podia. – Mas viemos de muito longe porque nos disseram
que sua sabedoria poderia nos ajudar.
O fauno ergueu-se um pouco mais, colocando uma das mãos no
queixo enquanto abria seu estranho sorriso.
– Sabedoria??? É isso que procuram?? – ele riu. – Isso é tão estranho!
Ninguém jamais veio até mim procurar sabedoria! Procuram riquezas,
ouro, amor, saúde, proteção... Mas nunca buscaram sabedoria!...
O fauno caminhou entre eles e fez uma reverência para a moça ruiva.
– Majestade... Espero que chegue bem ao seu destino e consiga viver
ao lado de um homem que não ama, especialmente depois que encontrar o
amor de verdade...
Ele olhou para cada um dos visitantes como se pudesse ver muito
além de suas aparências. Provavelmente, podia. Mas não disse nada. Virouse
para Blanca novamente.
– Minha bela dama, há tempos não recebo uma visita tão nobre e tão
formosa!... Me diga, o que este humilde fauno pode fazer por você?
Blanca temeu que ele estivesse brincando, que não fosse dizer o que
queria saber, que tudo fosse uma grande piada. Não era isso que faunos
faziam? Brincadeiras? Mas que escolha ela tinha?
– Estamos procurando por quatro pessoas – respondeu ela. –
Precisamos que nos digam onde elas estão.
O Fauno caminhou novamente pelo lugar como se pensasse
longamente, a pele áspera refletindo a pouca luz. Então, virou-se
novamente para ela.
– Lamento. Só posso lhe dizer onde está uma.
Eles se entreolharam.
– Por quê?
– Porque são as regras! – respondeu ele como se fosse óbvio. –
Escolha uma pessoa, e lhe direi onde ela está, sem lhe cobrar nada!
Marcel, Marcos e Blanca trocaram olhares e cochicharam.
– Fernando, Eileen e Dulce estavam juntos – disse Marcel. – É provável
que se localizarmos um, achemos os outros dois.
– E quanto a Chris? – perguntou Marcos. – Como o acharemos?
– Daremos um jeito! – respondeu Marcel. – Ficará mais fácil com
Fernando e Dulce do nosso lado.
Blanca não disse nada. Mordeu o lábio inferior enquanto pensava. O
Fauno continuava esperando pela decisão com seu sorriso enigmático.
– Diga-me onde está Fernando Grandier! – disse ela, em tom firme.
O Fauno caminhou até ela lentamente.
– Que bom! Temos um vencedor! Então, me diga, como é que ele é?
– Alto, arrogante, bonitão, cabeludo e estava com duas garotas com
ele – respondeu prontamente Marcos.
O Fauno parou pra pensar como se fizesse um esforço de memória.
– Hummm.... Pois eu lhes digo que ele está...
Eles arregalaram os olhos, vendo o dedo ossudo e comprido do
fauno girar no ar, até apontar numa direção.
– Bem ali!
Eles se viraram para onde ele apontou e se depararam com Fernando e
Eileen, se aproximando surpresos com a cena. Blanca correu e abraçou o
marido, sem conseguir conter as lágrimas de alegria.
– Essa até que foi fácil! – riu o Fauno.
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Autor(a): vondynatica
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 8
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-
vondy_170 Postado em 25/01/2017 - 05:22:26
Livro 3 - https://fanfics.com.br/fanfic/55691/a-cancao-dos-quatro-ventos-finalizada-vondy- adaptada
-
vondy_170 Postado em 25/01/2017 - 05:20:31
Livro 1 - https://fanfics.com.br/fanfic/48242/lua-das-fadas-vondy-adaptada
-
kaillany Postado em 21/12/2016 - 16:58:13
Continua!!!!
-
kes_vondy Postado em 06/12/2016 - 02:26:44
CONTINUA
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candy1896 Postado em 04/12/2016 - 22:58:47
CONTINUA
-
candy1896 Postado em 04/12/2016 - 19:50:14
CONTINUA