Fanfics Brasil - 8 - A morte do rei Artur Rei Arthur

Fanfic: Rei Arthur | Tema: Rei Arthur, clássicos, época, magia, guerra,


Capítulo: 8 - A morte do rei Artur

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   Depois da partida de Lancelote, Artur teve de lidar com o crescente descontentamento entre seus condes e barões. Mal ele tinha apagado as chamas de uma revolta em seu vasto reino e já outra se levantava no outro extremo. E logo outra e mais outra.
   Alguns cavaleiros eram partidários de Sir Lancelote. Eles acreditavam que Artur, tendo envelhecido, estava fraco demais para governar a irmandade. Outros censuravam o rei por ter tratado a rainha Guinevere com injustiça e ter dado ouvido às calúnias de Mordred. Muitos estavam ávidos por tirar proveito da agitação para expandir suas propriedades.
   Não demorou muito para que o reino de Artur ficasse dividido pela guerra civil. Agora imperava o ódio onde antes havia amor e confiança.
   A essa altura, o poder de Artur se estendera para o outro lado do mar, mas a revolta também se levantava por lá. Assim, ele agora tinha de preparar um exército para esmagar os rebeldes na Gália. Mas quem ia governar depois que ele tivesse partido?
   Lancelote estava no exílio, só Deus sabia onde. O leal Sir Gawain se recuperava de ferimentos de guerra. E muitos, como o camareiro do rei, Sir Kay, já não eram homens jovens. De qualquer modo, Artur tinha passado a desconfiar de quase todos, com exceção de um punhado de cavaleiros mais chegados a ele. Por fim, o rei se decidiu por um membro de sua própria família.
   Ora, Artur sempre sentira certa culpa pela morte do pai de Morgana — apesar dos transtornos que ela tinha causado. E ele tinha feito do filho dela, Sir Mordred, seu conselheiro mais próximo, chegando mesmo a acreditar em sua calúnia sobre a infidelidade de Guinevere. Foi assim que ele escolheu Mordred para governar enquanto estivesse fora.
   Mordred era um homem ambicioso que havia ficado à espera de uma oportunidade na corte de Artur, fazendo tudo o que podia para cair nas graças do rei. Mas tão logo Artur deixou a Bretanha com seus cavaleiros, ele viu sua chance de tomar o poder: convocou todos os barões mais graduados do reino, fartou-os de presentes caros e bajulou-os com promessas de novas conquistas e novas terras. Mas sua traição não parou por aí.
   Ele escreveu uma falsa carta com o selo de Artur e a leu para uma assembléia de barões. As palavras que ele alegava serem de Artur eram as seguintes:


       Meu querido sobrinho, amado Mordred. Estou jazendo, mortalmente ferido, golpeado por esse traidor            Lancelote. Todos os meus homens foram mortos. É agora que sinto por você um amor maior do que por            qualquer outro, por causa da grande lealdade que tem demonstrado. Portanto, estou nomeando-o rei em            meu lugar. Meu último desejo antes de morrer é que você se case com minha rainha. Se não o fizer,                Lancelote está decidido a atacar e a tomá-la como esposa.


                                                                                                                          Seu tio amoroso,
                                                                                                                                        Artur


   Ao terminar de ler, Mordred fingiu estar fora de si de tanta dor. Por todo o castelo as pessoas se lamentavam tão alto que teria sido impossível ouvir os trovões de Deus nos céus. E quando a notícia de que o rei e seu exército tinham sido destruídos se espalhou, pobres e ricos choraram — pois ele era o mais amado de todos os reis do mundo.
   No entanto, tão logo findou o luto, Mordred se dirigiu aos mais poderosos dos barões e perguntou o que iriam fazer em relação à última vontade do rei. Os barões debateram muito entre si antes de decidir coroar Mordred rei, de fazer da rainha viúva sua esposa e de jurar lealdade a ele. Mordred parecia ser a última esperança de manter a paz. Artur não afirmou isso em seu derradeiro suspiro?
   — Uma vez que todos vocês concordam — disse Mordred ao ouvir a decisão deles —, vou pedir ao arcebispo que realize a cerimônia de casamento.
   No entanto, quando os cavaleiros foram buscar a rainha, ela rejeitou o pedido, dizendo que preferia morrer a se casar com outro homem.
   — Eu jamais conseguiria ter um marido tão nobre quanto o rei Artur — disse ela com firmeza.
   Mas os cavaleiros insistiram.
   — Mas, senhora, não pode recusar. É seu dever agir como ordenamos.
   É claro que eles estavam certos: ela não tinha poder algum agora que o rei tinha desaparecido. Mas já se decidira a fugir e a encontrar refúgio em algum lugar onde Mordred não a alcançasse. Por isso, assim falou aos cavaleiros:
   — Dêem-me tempo para refletir. Darei minha resposta amanhã ao meio-dia.
   Quando o grupo se foi, Guinevere se trancou em seus aposentos, chorando e apertando as mãos. O que ela podia fazer? Após várias horas, mandou sua camareira chamar o único cavaleiro em quem podia confiar — seu primo, Sir Labor. Quando ficou a sós com ele, pediu-lhe conselho.
   — Minha senhora — disse ele, comovido pelo tormento da rainha —, vou providenciar sua fuga para o convento de Almesbury, onde a abadessa lhe dará abrigo. Nem mesmo o ímpio Mordred se atreverá a profanar um lugar santo. A senhora tem de enviar uma mensagem a Sir Lancelote. Quando souber dessa traição, ele virá imediatamente. Além disso, se o rei Artur estiver vivo (pois não acredito que ele esteja morto), um mensageiro o encontrará na Gália e ele retornará com seus homens para massacrar Sir Mordred, esse cavaleiro traidor.
   Guinevere concordou prontamente com este plano e, na calada da noite, tomou o caminho rumo a Almesbury. No dia seguinte, quando Mordred e seus barões foram ouvir a resposta da rainha, ficaram enfurecidos ao descobrir sua fuga.
   Mordred ordenou a seus homens que saíssem ao encalço da rainha fugitiva. Não demoraram a descobrir que ela tinha ido para o convento, e Mordred se dirigiu ao mosteiro com todo o seu exército. No entanto, apesar de suas horrendas ameaças, a abadessa se recusou a entregar-lhe a rainha. E a própria Guinevere exclamou:
   — Eu mesma me mataria antes de me entregar a você!
   Ouvindo falar do assédio, o velho arcebispo foi para lá e alertou Sir Mordred:
   — Não teme a vingança de Deus? Como ousa profanar Seu santuário? O senhor causa enorme dano à rainha e a todo este reino.
   Isso só serviu para enfurecer Mordred ainda mais.
   — Silêncio, falso sacerdote — gritou ele —, senão lhe mando cortar a cabeça!
   Mas o ancião não se deixou intimidar pelo usurpador.
   — Se o senhor não for embora, eu o excomungarei com sino, livro e vela!
   Mordred teria dado cabo do arcebispo ali mesmo se os barões não tivessem intervindo. E o arcebispo fugiu para Glastonbury, onde se tornou um eremita, recitando preces pelo rei Artur.
   De todo modo, Sir Mordred regressou a Camelote: havia assuntos mais prementes a enfrentar. Só ele em toda a bretanha sabia que devia preparar um exército para aguardar o retorno de Artur.
   Enquanto isso, a rainha Guinevere tinha enviado um mensageiro à procura de Artur na Gália, caso ainda estivesse vivo. E Artur logo soube que Mordred tinha se coroado rei pelas próprias mãos e pretendia fazer de Guinevere sua esposa. Na mesma hora, Artur fez um voto solene:
   — Mordred, seu traidor, farei todo o mundo saber da sua traição. Deus não permita que você morra pelas mãos de qualquer outro que não eu!
   Sem demora, Artur instruiu seu exército para que partisse ao amanhecer: iam voltar para casa para cuidar de Mordred.
   Pela manhã, assim que se fez dia, as tendas e os pavilhões foram desmontados e macas foram atadas a cavalos para transportar os feridos de volta ao lar. Cavalgaram sem parar até alcançar as costas da Gália, onde se prepararam para atravessar o mar numa frota de galés.
   Ora, Sir Mordred tinha dado duro para seduzir os barões: oferecera a eles presentes tão suntuosos que muitos tomaram o seu partido. Mesmo quando chegaram as notícias de que o exército do rei estava prestes a desembarcar, os barões desleais afiançaram seu apoio a Mordred.
   Embora Artur tivesse sido sempre um rei bom e justo, trazendo paz e ordem a seu reino, muitos agora esqueciam suas virtudes. Ele, que era o mais nobre de todos os reis, senhor da maior irmandade de cavaleiros a quem a Bretanha devia toda a sua glória, era agora tão facilmente descartado. Mordred tinha espalhado bostos de que Artur só tinha causado guerra e insegurança, enquanto ele, Mordred, traria a paz e a fartura ao reino.
   Assim, quando Artur chegou a Dover, lá estava o exército de Sir Mordred à espera dele na praia. E, mesmo antes que os homens de Artur pudessem pisar em terra firme, Mordred atacou os barcos cheios de homens armados.
   Houve um verdadeiro massacre de nobres cavaleiros de ambos os lados. Mas Artur era tão bravo e ousado que nenhuma hoste de cavaleiros poderia impedi-lo de desembarcar. Assim, finalmente ele ganhou a praia com a maioria de seus homens, fazendo Mordred bater em retirada.
   Com a notícia da vitória do rei Artur, muitos homens se reuniram sob seu estandarte. Ficou decidido que uma última batalha decisiva entre os dois exércitos seria travada na segunda-feira depois da festa da Trindade. O campo de batalha seria a planície de Camlann, no vale de Avalon.
   Artur mal podia esperar para se vingar daquele adversário traiçoeiro.
   Enquanto esperava o dia marcado, o rei Artur teve o mais estranho dos sonhos. Sonhou que uma mulher se chegava a ele, a mais bela que jamais vira. Ela o ergueu e o levou pelos ares até a montanha mais alta que ele já tinha visto. Lá, ela o colocou numa rocha cheia de assentos, uns que subiam, outros que desciam. O assento dele ficava no topo da roda.
   — Esta é a roda da fortuna da vida — disse ela. — Diga-me o que vê.
   — O mundo inteiro — disse Artur, arregalando os olhos.
   — Pouca coisa do mundo está além de seu controle — disse ela. — Você tem sido o mais poderoso rei de toda a história. Mas tamanho é o orgulho dos mortais que ninguém se senta tão alto que não possa cair mais tarde.
   Então, ela o sacudiu com violência e o empurrou para fora de seu assento, de modo que ele desabou até o chão, aterrissando num monte. Sentia como se todos os ossos de seu corpo tivessem se partido.
   Foi quando despertou. No mesmo instante, convocou Sir Lucan e Sir Belvedere e lhes contou o sonho.
   — É um presságio. Temos de fazer um acordo com Sir Mordred, oferecer-lhe terras e troféus, como vocês acharem adequado. A todo custo, precisamos fazer um armistício, pois meu sonho é um aviso de minha morte e da ruína da Bretanha, se a batalha começar.
   Lucan e Belvedere foram até Sir Mordred, acampado com um grande exército na planície de Camlann. Por longo tempo barganharam até que, por fim, Mordred consentiu em ficar com a Cornualha e com Kent de imediato, e com toda a Bretanha depois da morte de Artur. Para selar o armistício, combinou-se um encontro entre Sir Mordred e o rei Artur a meio caminho entre os dois exércitos.
   Na véspera do encontro, o rei Artur sai para uma volta a cavalo com o arcebispo, que viera da sua ermida juntar-se a ele. Quando cavalgavam morro acima sobre a planície de Camlann, toparam com um rochedo que tinha uma inscrição gasta gravada na face. Quando conseguiu decifrar as palavras à luz mortiça, o rei leu:


ABAIXO DESTE ROCHEDO
UMA BATALHA PODEROSA
DEIXARÁ ÓRFÃ A BRETANHA


   — Meu senhor — disse o arcebispo —, o próprio Merlim escreveu estas palavras, e havia verdade em tudo o que ele dizia. Só ele sabia o que estava por vir. Se o senhor lutar com Mordred, seu povo ficará órfão com sua morte.
   Mas Artur simplesmente sorriu.
   — Bem, pela primeira vez Merlim se enganou. Não haverá batalha, pois pretendo assinar um tratado de paz. Está tudo combinado.
   O arcebispo permaneceu calado enquanto ambos regressavam ao acampamento. Cedo na manhã daquele dia fatídico, a segunda-feira depois da Trindade, dois grupos de catorze homens a cavalo partiram para assinar a trégua: um era chefiado pelo rei Artur, ladeado por Sir Lucan, o outro era chefiado por Sir Mordred, ladeado pelo rei Lot da Lotiânia.
   Foi um momento de tensão. Ambos tinham todas as razões para suspeitar de traição por parte do outro, e seus auxiliares mantinham uma mão nervosa sobre o punho de suas espadas. As fileiras de cavaleiros e homens armados observavam em silêncio enquanto Artur e Mordred desmontavam e se abraçavam. Cada soldado prendeu o fôlego, desconfiando de algum ardil.
   Antes de sair, o rei Artur tinha avisado a seus homens para que iniciassem a batalha ao primeiro sinal de uma espada desembainhada. Mordred tinha feito o mesmo.
   Ninguém suspeitava do trágico capricho do destino.
   Quando Artur foi desmontar, seu cavalo perturbou uma víbora enrolada numa moita. Antes que ela pudesse atacar, Sir Lucan sacou da espada e cortou a cabeça da cobra, sem pensar no que fazia.
   Ora, quando os dois exércitos viram o metal faiscante, o reflexo dos raios de sol na espada nua, julgaram que ali havia tramóia.
   As bandeiras brancas se agitaram, as trombetas soaram o alarme, os clarins ecoaram, os tambores rufaram e os cavaleiros se prepararam para atacar. Nada agora poderia deter a batalha.
   Enquanto cavalgava de volta até seus homens, Artur lançou um grito desesperado:
   — Toda a Bretanha vai lamentar este dia fatídico!
   De fato, nunca tinha havido batalha mais cruel em terra cristã. Nem jamais houve campo tão inundado de sangue.
   A batalha prosseguiu o dia todo. Os exércitos se engalfinharam num contato tão próximo que as lanças e os arcos não tinham serventia alguma. Os homens lutavam corpo a corpo com espadas e punhais. E nenhum homem se deixava abater enquanto algum ferimento letal não o derrubasse. Artur estava por toda parte no campo de batalha, inspirando, liderando seus homens.
   Mas, ao cair da noite, quase ninguém permanecia vivo no campo apinhado de corpos. Artur só conseguiu encontrar dois de seus bons cavaleiros, Lucan e seu irmão, Belvedere — e ambos perdiam muito sangue por causa de suas feridas. Em meio aos cadáveres empapados de sangue, porém, ele de repente avistou o traidor Mordred a se levantar do chão.
   Ali estava sua chance de matar o homem responsável por tanta desgraça. Agarrando uma lança, Artur correu até seu inimigo, mas Lucan tentou impedi-lo.
   — Senhor, ele é mais desgraçado vivo do que morto. Espere, lembre-se de seu sonho: se o senhor sobreviver a este dia, seu tempo retornará e o senhor poderá liquidá-lo mais tarde.
   Mas Artur estava cego de fúria. Com a lança em riste, investiu contra Mordred por sobre o solo ensanguentado. Ao correr, porém, sua bainha se afrouxou e caiu no chão com a Excalibur. Tamanha era a raiva de Artur que ele nem percebeu sua perda.
   — Traidor, seu fim chegou! — exclamou ele.
   Ao ouvir esse grito, Mordred olhou para cima e ergueu sua espada para se defender. Tarde demais. Artur transpassou-o com tanta força que metade da lança saiu pelo outro lado do corpo de Mordred. Dizem alguns que quando Artur puxou a lança de volta, um raio de sol brilhante atravessou a ferida de lado a lado.
   Contudo, quando Mordred desabou para a frente, sua espada desceu sobre a cabeça de Artur e lhe feriu o crânio.
   Mordred agora jazia morto sobre o solo, com Artur por cima dele.
   Lucan e Belvedere correram em auxílio de Artur e o carregaram até uma pequena capela junto do lago próximo. O esforço foi demasiado para o infeliz Lucan: ele desabou e caiu morto dentro da capela, com as entranhas a se espalharem sobre o piso. Agora só restava Belvedere, e ele chorou por seu rei desfalecido.
   Mas Artur não estava morto. Algum tempo se passou até que ele abrisse os olhos e dissesse:
   — Não chore, nobre Belvedere. Tenho obrigações a cumprir antes de morrer. Escute com atenção e obedeça às minhas palavras. Vá pegar minha espada e sua bainha, leve-as até a beira do lago e atire-as na água. Em seguida, volte logo até aqui para me contar o que viu.
   — Majestade — disse Belvedere —, farei isso imediatamente.
   No entanto, ao caminhar rumo ao lago com a espada e a bainha, Sir Belvedere contemplou a nobre lâmina, seu punho reluzente de pedras preciosas, sua bainha cintilante ao sol. E pensou consigo mesmo: "Se eu jogar fora esta espada, ela se perderá para sempre".
   Assim, escondeu Excalibur sob uma árvore e correu de volta até Artur, dizendo que a missão estava cumprida.
   — E o que foi que você viu? — perguntou o rei.
   — Ora, nada, majestade — disse ele —, nada senão ondas na superfície.
   — Está mentindo — disse Artur, num suspiro. — Vá, faça como lhe peço. Se, de alguma forma você me quer bem, não poupe a espada, mas lance-a nas águas!
   Assim, Belvedere retornou mais uma vez ao lago com a espada na mão. Mas, novamente, achou uma pena se desfazer de uma lâmina tão nobre. E escondeu-a debaixo de uma tojeira antes de voltar até o rei e jurar que o dever fora cumprido.
   — E o que você viu? — perguntou Artur.
   — Nada, majestade, a não ser círculos de água e ondas desdobradas.
   — Você me traiu pela segunda vez — disse Artur, com voz fraca. — Quem imaginaria que você, um nobre cavaleiro e amigo leal, me trairia agora, no leito de morte! Vá de novo, rápido, pois meu tempo está se esgotando depressa. Já sinto a mão gelada da morte sobre meu peito.
   Sir Belvedere ficou profundamente envergonhado. Pegou a espada e correu para o lago. Ali, girou-a pelo punho e a lançou junto com a bainha o mais longe que pôde. E enquanto ela voava pelo ar, um braço emergiu para fora do lago para agarrar a espada antes que ela tocasse a água. Três vezes o braço vestido de branço brandiu a espada no ar. Em seguida, desapareceu sob as águas do lago.
   Quando Belvedere contou ao rei o que tinha acontecido, um sorriso iluminou o rosto de Artur e ele pediu ao cavaleiro que o ajudasse a chegar à beira do lago. Enquanto Belvedere assim fazia, uma barcaça negra subitamente apareceu, deslizando através da névoa, carregando três mulheres usando coroas. Elas soluçavam como se seus corações estivessem se partindo.
   Quando a barcaça avançou pela margem, as três rainhas carregaram Artur a bordo e o deitaram na proa.
   — Oh, Artur — disse uma delas, e era Nimue, a Dama do Lago —, por que esperou tanto tempo? Já perdeu sangue demais!
   Enquanto Belvedere observava, a barcaça negra se afastou lentamente da margem, e ele gritou:
   — Majestade, o que será de nós?
   — Console-se tanto quanto puder — disse a voz de Artur em meio às ondas. — Quanto a mim, vou agora para o vale de Avalon para que meus ferimentos sejam tratados. Reze por minha alma e leve estas palavras aos cavaleiros e sobreviventes: eu retornarei quando a Bretanha mais precisar de mim; então, o reino se erguerá mais uma vez das trevas.
   A barcaça negra zarpou para dentro das brumas do tempo. O marulho das águas, o suspiro do vento e o pranto das rainhas, tudo se fundiu num cântico tão pesaroso que encheu de mágoa os corações que o ouviram.


   Quando a notícia do destino do rei Artur chegou ao convento de Almesbury, a rainha Guinevere se vestiu de preto e fez os votos de monja. Desde então, passou seus dias em oração, jejuando e prestando oferendas. Ninguém poderia consolá-la em seu sofrimento.
   Enquanto isso, bem longe dali, na cidade de Gaunes, um mensageiro finalmente encontrou Sir Lancelote e lhe deu as notícias da traição de Mordred e do tormento de Guinevere. Lancelote partiu incontinenti rumo à Bretanha e, ao chegar em Dover, soube da história da batalha final de Artur, da morte de Mordred e dos votos monásticos de Guinevere.
   Tinha chegado tarde demais.
   Cavalgou sozinho até o convento de Almesbury e pediu abrigo para pernoitar. A abadessa o recebeu polidamente e lhe ofereceu hospedagem numa cela de monge. Porém, enquanto o levava pelos claustros, eles passaram por uma monja que, ao ver Sir Lancelote, soltou um grito sufocado e caiu desmaiada. Ao se ajoelhar ao lado dela, Sir Lancelote viu que era Guinevere. Ela foi levada até o salão do convento e deixada a sós com o desalentado cavaleiro.
   Ao abrir os olhos e reconhecer seu amado, ela murmurou tristemente:
   — Querido Lancelote, eu lhe imploro, por todo o amor que houve entre nós: nunca mais torne a olhar meu rosto. Deixe-me para sempre. Pois, assim como eu amei você, meu coração não me permitirá revê-lo. Tudo o que lhe peço é que se lembre de mim vez por outra e que reze para que possamos ser perdoados.
   — Querida Guinevere — disse ele, com lágrimas nos olhos —, não posso ser infiel ao meu voto de amar você para sempre. Seguirei a mesma trilha que você tomou e passarei meus dias em oração. Antes de partir, rogo-lhe que me beije uma última vez.
   Mas Guinevere se recusou a quebrar seu voto. E eles se separaram. Nunca houve homem ou mulher tão duro de coração que não chorasse ao ver a dor e a aflição daqueles dois.
   Lancelote cavalgou dia e noite em meio a uma floresta escura e densa, para que ninguém visse suas lágrimas. E passou a viver como eremita na Capela Negra, no fundo da floresta perto de Glastonbury. Certa noite, uns doze meses depois, teve um sonho em que era convocado de volta a Almesbury.
   — Quando tiver chegado lá — disse-lhe a visão —, encontrará a pobre Guinevere morta.
   Assim que despertou, Lancelote correu para Almesbury, onde a abadessa foi encontrá-lo nos portões do convento.
   — Meu nobre senhor — disse ela —, tenho tristes notícias: nossa irmã Guinevere faleceu há exatamente meia hora. Ela tinha perdido a vontade de viver. Mas tenho uma mensagem para o senhor.
   Lancelote chorou abertamente enquanto lia:


         Querido Lancelote,
       Rezo para que não volte a vê-lo. Foi por causa de nosso amor que o leão da Bretanha morreu. Por favor,            tome meu corpo e enterre-o junto ao lago de Avalon. Serei fiel a Artur na morte como lhe fui em vida.
                                                                                                                         Guinevere


   A abadessa levou Lancelote até o pálido corpo frio de Guinevere. Ele a beijou uma vez no rosto. Após um minuto de silêncio, mandou que um esquife aberto fosse preparado para ela e posto sobre um féretro puxado a cavalo. Em seguida, com uma centena de tochas ardendo em torno dela, ele conduziu a procissão fúnebre, entoando e recitando orações, por todo o caminho até Camlann. E, quando chegaram à capela junto ao lago, ele mandou que o corpo fosse envolvido trinta vezes em tecido engomado e posto a repousar num caixão de chumbo dentro de um túmulo de mármore.
   Quando todos partiram, Sir Lancelote permaneceu sobre o túmulo por vários dias. Em seguida, tomou o caminho de volta a sua ermida, onde parou de comer e de beber. Ele logo definhou, passando frio, fome e sede; e sua sanidade foi-se embora com o vento. Embora muitos tenham ido procurá-lo, ninguém reconheceu naquela criatura seminua e selvagem o outrora belo Sir Lancelote.
   Seu último sonho atormentado foi consigo mesmo de pé entre uma sorridente Guinevere e o rei Artur, juntando suas mãos e oferecendo-lhes repouso eterno. Quando Sir Belvedere finalmente encontrou seu corpo, ficou surpreso ao ver um sorriso alegre e tranquilo em seus lábios.
   Depois de enterrado, estas palavras foram escritas em seu túmulo:


AQUI JAZ SIR LANCELOTE
O MELHOR DE TODOS OS CAVALEIROS DO REI ARTUR



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Autor(a): biiviegas

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 9



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  • grandeshistorias Postado em 24/07/2017 - 18:03:57

    Lido o epílogo. Linda história e um belo final, apesar de um tanto triste! Parabéns! Gostei muito dessa história e texto tão bonitos. Que venham mais histórias com textos tão bons assim, sejam eles originais ou adaptações. Abraço e boa sorte! Deus abençoe!

  • grandeshistorias Postado em 24/07/2017 - 17:48:29

    Muito triste o capítulo 8, mas também com mais um admirável desfecho. Os três provaram sua honra até o fim. Muito digno!

  • grandeshistorias Postado em 24/07/2017 - 17:03:56

    Lancelote provou realmente ser um honrado cavaleiro. Outro desfecho surpreendente de mais um episódio.

  • grandeshistorias Postado em 24/07/2017 - 14:50:02

    Essa feiticeira Morgana é muito cruel mesmo. Lamentei a morte de sir Accolon, fruto dessa vingança de Morgana de seu meio-irmão Artur. Artur é um cavaleiro muito nobre e piedoso, quase morre dessa vez pelas mãos da irmã através desse manto enfeitiçado. Agora que Artur viu de fato quem realmente é Morgana, resta saber quais serão as próximas armações de dela e como Artur fará para detê-la. A história está muito boa.

  • grandeshistorias Postado em 24/07/2017 - 14:48:51

    Foi incrível a aventura de Artur naquele reino desconhecido e na Capela Verde, fiquei muito surpreso com o desfecho desse episódio.

  • grandeshistorias Postado em 20/07/2017 - 15:51:27

    Sacanagem Merlim não alertar o rei Artur da futura traição de Guinevere que preveu em sua bola de cristal, cuja traição vai destruir o reinado de Artur... Vamos ver o que acontece agora.

  • grandeshistorias Postado em 15/07/2017 - 14:50:16

    Li o capítulo 1... Curioso para saber o q vai ser de Arthur agora... Garoto inteligente demais, e sábio. Os sábios de Vortigerno são mesmo muito ignorantes, era óbvio q tendo uma fundação como aquela, nunca iriam erguer um palácio ali. Mas esperar o q também daquela época de tão escassas informações e até mesmo nula tecnologia. Gostei de ver Vortigerno fugindo, e espero q não volte tramando outra. Adaptação muito boa e texto maravilhoso.

  • grandeshistorias Postado em 06/02/2017 - 21:27:35

    Adicionei aos meus favoritos. Me interessou muito a história! Já li o prólogo e vou continuar lendo os capítulos. Me lembro na sétima série a professora lendo para nós o livro Rei Arthur e a Távola Redonda. Ela o leu até o final ao longo de muitas aulas. Isso foi na época em que era exibida na tv a novela Pé na Jaca, do qual o enredo e os nomes dos personagens tinham uma livre inspiração na história do Rei Arthur. Boas lembranças!

  • fernandocordeiro93 Postado em 27/12/2016 - 13:10:13

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