Fanfic: Perdida, Encontrada - (Vondy) [TERMINADA] | Tema: Vondy (Adaptada)
O seu Claudionor Pereira não era lá o melhor dos fornecedores. Toda entrega era a mesma história. Discutia sobre o preço das frutas, e, por eu ser mulher, achava que podia me engambelar. Nunca dava certo. Ainda assim, ele não deixava de tentar.
— Mas entenda, senhora. O preço do abacate está pela hora da morte. O que oferece é muito pouco. Foi o mesmo que pagou no Natal, e o preço praticamente triplicou desde então!
— Sem aumento, seu Claudionor. Do contrário, pode levar os abacates de volta.
— A senhora vai me levar à falência!
— Não vou, não, e o senhor sabe muito bem disso. Oito meses atrás, antes de eu começar a comprar todas essas caixas, a fruta apodrecia na sua barraca.
Uma carroça diferente surgiu na estrada. Eu a observei com curiosidade. As rodas traseiras eram maiores que as dianteiras e havia uma capota recolhida logo atrás do pequeno estofado verde-musgo. Reconheci o condutor instantaneamente. Christopher comandava um cavalo dourado atrelado ao que quer que fosse aquilo, e, mesmo de longe, consegui vislumbrar um sorriso quase infantil em seu rosto perfeito. O que é que ele estava aprontando?
Seu Claudionor seguiu meu olhar e soltou um suspiro de alívio ao ver Christopher se aproximando. O homem ainda tinha esperanças de que meu marido assumisse as rédeas e negociasse diretamente com ele. Christopher nunca se envolvia, sobretudo quando era eu quem acertava os preços da matéria-prima, mas ele gostava de estar presente. Achava excitante me ver discutindo com os fornecedores. E fazendo discursos sobre os riscos da
crinolina de cima de um caixote pelas ruas da vila.
Minha campanha contra a crinolina ainda não tinha surtido tanto efeito, e eu desconfiava de que muito se devia ao início do meu discurso. “E aí, gente boa do século dezenove...” me parecia um bom começo, mas as pessoas me olhavam de um jeito estranho e logo saíam andando.
Entretanto, às vezes uma pessoa ou outra acabava me ouvindo, e, sempre que eu avistava uma garota com as saias murchas andando pelas ruelas da vila, o orgulho me invadia. Madame Georgette relutou em acreditar na letalidade do aparato, mas, assim que vislumbrou a possibilidade de vender novos acessórios a todas as mulheres das redondezas — ideia de Christopher para tentar convencê-la a nos ajudar —, se engajou na luta como uma ativista ferrenha. Era ela quem descolava o caixote. E o dr. Almeida se tornara crucial nessa batalha — sempre que podia visitava diversas famílias, na tentativa de convencê-las por meio da lógica científica.
E Christopher... Bem, meu bravo cavalheiro elaborara um tipo de panfleto explicando os perigos da crinolina, com desenhos tão assustadores quanto realistas que teriam deixado até o Stephen King assombrado. Por iniciativa própria, ele os distribuíra em todos os comércios da vila e, assim que eu encerrava o discurso sobre o caixote, era sempre o primeiro a gritar:
— Nossas mulheres merecem viver em segurança!
E, toda vez que ele fazia aquilo, eu queria me atirar sobre ele.
Tudo bem, eu sempre queria me atirar sobre Christopher, mesmo sem que ele lutasse ao meu lado por uma causa.
— Senhora Uckermann? — chamou seu Claudionor, me tirando do devaneio.
— Ah, sim. Vai me vender pelo preço de sempre, ou terei de procurar um novo fornecedor? — perguntei enquanto observava Christopher parar atrás da carroça de abacates e saltar.
O homem franzino olhou para Christopher, suplicando.
— Não olhe para mim, senhor Pereira. — Christopher se divertia com a careta do sujeito. — É ela quem está no comando. Sou apenas o marido.
Resmungando alguma coisa ininteligível — eu desconfiava de que fossem palavrões —, o homem bufou e assentiu uma vez, selando nosso acordo.
— É difícil dobrar sua esposa, senhor Uckermann.
Meu marido me abraçou pelos ombros e beijou minha testa.
— Eu diria impossível. — Christopher riu.
— Descarregue na cozinha, por favor, seu Claudionor — pedi ao sujeito mal-humorado.
A carroça sumiu de vista pouco depois, e Christopher me girou nos braços.
— Eu devia ter aceitado sua ajuda com a contabilidade quando tive a chance — brincou.
— Posso dar uma olhada nisso mais tarde, depois de conferir se a entrega está de acordo.
Christopher coçou a cabeça.
— Dulce, não há mais espaço na cozinha para suas frutas. Vamos ter de arranjar outro lugar para preparar seu condicionador.
— Eu sei — suspirei. — Só queria esperar mais um pouco.
Christopher espalmou a mão grande no alto de minha barriga inchada. O dr. Almeida não conseguia precisar o meu tempo de gestação, mas acreditava que eu estivesse entre o sétimo e oitavo mês pela circunferência de minha cintura. Eu estava imensa! Meus pés incharam tanto que Christopher precisou mandar fazer sapatos novos para mim. E os vestidos de cintura alta ficavam só um pouquinho mais confortáveis que os outros, e, com todo aquele volume, era difícil me locomover. Apesar disso, Christopher vivia dizendo que eu estava linda.
Não só dizia isso uma dúzia de vezes por dia como também provava todas as noites — e eu me senti um pouco enganada, pois ninguém nunca me contou que toda aquela ebulição de hormônios da gravidez resultava em outras ebulições, por assim dizer.
E, por sinal, minha pequena empresa estava indo muito bem, e, além do acordo com o boticário, fechei com outros dois estabelecimentos, sendo um deles na cidade! E ainda tinha Suelen e Najla, que sempre me escreviam pedindo grandes quantidades de produto. As garotas se tornaram o sucesso da temporada (o que quer que isso significasse), e, segundo as cartas que Suelen me enviava com frequência, os cavalheiros não poupavam elogios à cabeleira reluzente de ambas.
Claro que ficou impossível preparar todo aquele creme sozinha, não só por causa do inchaço, que me deixou ainda mais desastrada, derrubando quase tudo que eu via pela frente, mas porque era abacate e banana demais para amassar, muito coco para furar. Então duas senhoras agora cuidavam do creme, e Madalena se dividia entre a casa e seu próprio negócio: compotas de coco que Isaac vendia na frente da igreja nas manhãs de domingos. Ele sempre voltava para casa com os caixotes vazios.
— Uma de minhas propriedades ficará vaga e é bem perto daqui — meu marido comentou enquanto me guiava para perto daquela carruagem esquisita. — A família Silveira decidiu ir para o Sul cultivar arroz. A casa é boa, mas creio que precisaremos fazer uma reforma para instalar sua fábrica.
— Fábrica? — perguntei, atordoada.
Christopher fez que sim.
— Já falei com o tabelião. Vou providenciar a papelada necessária.
Vamos precisar de um nome. Já pensou em algum?
— Hããã... não. Nem pensei no do bebê ainda. — Paramos e examinei a carroça por um instante, que mais parecia uma carruagem aberta. Talvez fosse o cupê da época. — O que é isso?
Os lábios de Christopher se esticaram tanto que temi que seu rosto se partisse ao meio.
— É o fim de uma longa discussão. Como disse, a família Silveira está indo para o Sul e não poderia levar o faetonte. É pouco confortável para uma viagem tão longa, mas excelente para curtos percursos. Partirão em uma diligência. Então eu o comprei para você.
— Pra mim?
— Não pensou realmente que eu a deixaria cavalgar com as pernas escarranchadas feito um cavalheiro, pensou? — Ele arqueou apenas uma sobrancelha.
— Você não me deixa montar de jeito nenhum. — Desde que soubera da gravidez, Christopher interrompeu as aulas de equitação. No entanto, eu ainda tentava convencê-lo a me deixar montar da maneira certa sempre que podia.
— Não é seguro — explicou outra vez. — Poderemos retomar as aulas depois que o nosso bebê chegar... e o resguardo terminar. Mas sei como preza sua independência. Então o faetonte será perfeito para se locomover até a vila ou até sua fábrica, caso eu não esteja por perto.
Meus olhos se arregalaram em êxtase.
— Sem Isaac pilotando?
— Sem Isaac pilotando. É claro que antes teremos de treiná-la, mas os comandos são simples. Vai se sair bem.
Eu me atirei nele, passando os braços em seu pescoço. A barriga pontuda não me permitia chegar muito perto, mas Christopher dava um jeito, se curvando e abaixando os ombros.
— Valeu, Christopher! É lindo demais! Não acredito que tá me dando um carro!
Vamos logo testar meu panetone.
Ele riu com gosto, depositando um beijo delicado em meu pescoço.
— Faetonte. — E me ajudou a subir na carruagem baixinha.
Eu me acomodei bem na ponta para que Christopher coubesse ao meu lado. O faetonte sacolejou de leve sobre seu peso. A lateral do meu corpo se colou à dele, e Christopher parecia mais do que feliz espremido ao lado de uma mulher tão redonda como eu. Eu me inclinei para pegar as rédeas, mas Christopher se antecipou.
— Lamento, mas não posso permitir que conduza nessas condições.
— Como é? Você me dá um carro, mas não vai me deixar dirigir?
— Vou sim, mas depois. — Ao ver minha expressão petulante, ele se apressou:
— Se estivéssemos em seu tempo, você poderia conduzir um veículo?
— Eu... — Não fazia a menor ideia, mas desconfiava de que não, tendo em vista o tamanho da minha barriga. Não tenho certeza se caberia atrás do volante.
— Eu imaginei — comentou quando não continuei, como se soubesse das coisas. — Apenas mais um pouco de paciência, meu amor.
— Tudo bem — cedi. — Então me mostra do que essa coisa é capaz.
Christopher ergueu os braços, sacudindo as guias, e Princesa — reconheci ao me deparar com seu traseiro — se agitou. Não fomos muito depressa, e desconfiei de que Christopher queria que permanecêssemos assim. No entanto, o faetonte era leve, muito menor que a carruagem, e, mesmo com Christopher nos atrasando de propósito, pude perceber que o veículo era bastante rápido.
Eu me divertiria muito com ele.
Percorremos alguns trechos, mas Christopher logo achou que era hora de voltar para casa. Passamos pelo estábulo na volta. Lua estava solta no cercado e trotava calmamente quando uma comoção de dentro de uma das baias chamou a atenção de Christopher, que rapidamente puxou as rédeas e deteve Princesa. Storm surgiu empinando sobre as duas patas seguido por Isaac, que esfregava o traseiro.
— Bicho dos infernos — resmungou.
Temi que Storm fosse atacar Lua, mas tudo o que fez foi parar ao lado dela, esticar bem o pescoço e... exibir os dentes.
— Ele tá sorrindo? — perguntei a Christopher, abismada.
Meu marido riu.
— Ora, quem diria! Parece que Storm venceu a timidez. — Ele segurou as rédeas de Princesa com firmeza. — É melhor voltarmos para casa agora.
— Por quê? — Storm recuou um pouco e então se lançou sobre a minha égua. — Ah, meu Deus! Storm, para com isso! Christopher, ele vai matá-la! — Eu estiquei os braços como se pudesse alcançar Lua.
Christopher me segurou pela cintura inchada e me fez sentar.
— Storm não machucará sua égua, mas acho melhor lhes darmos um pouco de privacidade.
— O quê? Por quê? — Confusa, olhei para os cavalos, e Storm estava...
—... Ah! Oh! — Corei, desviando os olhos da cena.
Christopher nos conduziu de volta para casa com comandos curtos e rápidos.
Cuidadoso, ele me ajudou a descer do faetonte, se detendo uma vez para colar os lábios aos meus sob a luz quente do entardecer. Foi quando subíamos as escadas da frente que seu Domingos apareceu cavalgandocomo louco. Havia meses que não tínhamos notícias dele e,
consequentemente, do projeto do meu banheiro.
— Senhora Uckermann! Senhora Uckermann! — gritava ele, acenando.
Tudo bem, não tinha jeito. Eu era mesmo a senhora Uckermann e pontofinal.
E, quer saber, eu gostava disso. Gostava de ser vista como a mulher de Christopher. De pertencer a ele.
Seu Domingos apeou do cavalo numa empolgação desvairada e subiu correndo os degraus para me encontrar. Seu sorriso era genuíno e as bochechas estavam coradas. Se pela cavalgada ou pela animação, eu não sabia.
— Encontrei! Enfim encontrei o que a senhora deseja! Olhe! Realmente existe! — Ele retirou um papel amassado do bolso do paletó verde e me entregou.
No alto da folha lia-se “Alexander Cumming’s Invention” e, logo abaixo, havia uma gravura de uma espécie de máquina com base de madeira e uma torre estreita, que sustentava algo muito parecido com uma bacia funda, um grande s sob ela. Alguns ferros e chaves também faziam parte da geringonça.
— O senhor Cumming patenteou este invento. É revolucionário!
Chama-se sifão e é preso à.... — ele clareou a garganta — bacia receptora. O formato inovador permite que os... — corando, ele prosseguiu — detritos não retornem. É tudo muito simples, na verdade. Algumas famílias europeias já aderiram ao invento, pois facilita a vida das damas, já que pode ser instalado dentro das residências. Claro que teremos de elaborar a
captação de água, onde despejaremos os...
Eu o interrompi lançando meus braços ao redor de seus ombros e o apertando com força.
— Obrigada, seu Domingos!
— Bem... — ele engasgou, dando tapinhas em meus ombros. — Fico feliz em poder atendê-la.
— Viu isso? — Soltei o homem e mostrei o folheto a Christopher. — É a minha privada! — Que mais parecia um Frankenstein, mas aparência não é tudo, não é mesmo?
— Sim, estou vendo. — Um meio sorriso esticou sua boca perfeita. E, se dirigindo ao mestre de obras, acrescentou: — Quando tudo ficará pronto?
— Creio que em pouco tempo. Com esses novos navios a vapor, a Europa não parece tão longe assim. Se concordarem, farei a encomenda e acredito que em sete ou oito meses deva estar aqui.
Sete ou oito meses?
Abri a boca para protestar, mas mudei de ideia. Eu teria meu banheiro, com descarga e tudo, sim, eu podia esperar mais sete ou oito meses.
— Pode fazer a encomenda — Christopher concordou. — O quanto antes, senhor Domingos.
— Isso, e talvez o senhor poss... Ai! — Senti um beliscão na barriga.
— O que foi? — Preocupado, Christopher se curvou, colocando a mão em minhas costas.
— Nada, acho que foi só um... Aaaaai!
Ah, não! O dr. Almeida ainda não dera notícias sobre a minha peridural.
O bebê não podia nascer antes disso. Mas, droga, havia algo muito errado acontecendo dentro de mim.
— Dulce! — Christopherchamou.
— Christopher, eu acho que... — Outra onda de dor me fez perder o fôlego. — Put/a que pari/u, isso dói pra cacete!
— Se-senhora Uckermann! — censurou Domingos, mas eu já não ouvia mais nada. A dor que já era insuportável dobrou de intensidade e eu vi estrelas.
— Ouvi Dulce gritar! O que está acontecendo? — Maite perguntou ao longe.
— A-acho que chegou a hora — Christopher gaguejou com a voz trêmula, tentando me amparar.
— Mas ainda falta um mês! Oh, meu bom Deus! Madalena! Madalenaaaaa! — a menina gritou e saiu correndo.
A dor foi cedendo, e eu consegui relaxar um pouco. Ofegante, olhei para Christopher. Ele estava sem cor.
— Tenho que buscar o dr. Almeida! — falou em pânico. — Não, primeiro tenho que levar você para o quarto! Creio que precisaremos de água quente. Vamos precisar, não vamos? — ele perguntou ao Domingos.
— Talvez levá-la para dentro seja o mais aconselhável. Eu chamarei o médico para o senhor. Seguirei à vila o mais rápido que puder. Tenha uma boa hora, senhora Uckermann.
Eu apenas assenti. Uma boa hora? Sendo dilacerada ao meio?
— Muito obrigado, senhor Domingos. Fico-lhe muito grato. Venha, meu amor. — Christopher passou um braço por meus joelhos e me pegou no colo enquanto o seu Domingos corria para sua montaria. Lancei um braço por seu pescoço e o examinei atentamente. A palidez agora dava lugar a um tom esverdeado.
— Christopher, fica calmo — murmurei. — Respira fundo e solta devagar.
Ele apertou o passo e me fitou com as sobrancelhas tão comprimidas que se tornaram uma só.
— Estou calmo. Estou respirando. Acho. Está doendo muito? Diga que está suportando, Dulce... — implorou aflito.
— Tudo bem. Tá tudo bem. — Eu acariciei seu rosto. — Você precisa ficar calmo, e eu acho que posso andar.
— Não. Nada de andar.
A essa altura já estávamos no quarto, e delicadamente ele me colocou sobre a cama. Então endireitou a coluna e ficou me observando assustado.
— E agora? — perguntou.
— Não sei. Nunca fiz isso antes.
— Não brinque, meu amor. Talvez eu deva...
Uma nova contração me atingiu e eu saí do ar. Senti os dedos longos de Christopher agarrarem a minha mão. Quando consegui enxergar novamente, eu o encontrei ajoelhado ao meu lado, pálido, comprimindo os lábios até se tornarem uma linha reta, os olhos atormentados e cheios de agonia.
Madalena passou pela porta e imediatamente expulsou Christopher do quarto.
Ele não lhe deu a menor atenção. Eu queria que o meu marido ficasse ao meu lado o tempo todo, mas, ao ver seu desespero impotente, entendi que ele se afligiria muito mais se ficasse ali, me vendo sofrer. Também me dei conta de que os gritos o levariam à loucura.
Merda!
Quem sabe ainda há esperanças, me consolei. Àquela altura, o dr. Almeida podia ter encontrado a morfina!
Infelizmente, isso não tinha acontecido.
Quando o médico chegou, tratou de arrastar Ian para fora com a ajuda
de Gomes e mais dois empregados.
— Ela ficará bem, senhor Uckermann — o médico garantiu.
— Dulce! — Ele lutava contra as mãos que o dominavam, mas a porta foi logo trancada em sua cara.
— Pronto, querida — o dr. Almeida falou com ternura. — Agora vamos trazer essa nova vida ao mundo.
Bom, só que não foi tão simples assim. A noite caiu e eu continuava ali, gemendo baixinho, respirando e empurrando como Madalena e o médico ordenavam. Mas acho que o bebê mudou de ideia na metade do caminho e decidiu ficar onde estava.
— Vamos, Dulce, um pouco mais de força agora — instruiu o médico.
Eu tentei, mas não dava. Madalena bufou, secando minha testa.
— Essa criança já teria nascido se o teimoso do seu marido me ouvisse e estivesse agora mesmo rodeando a casa com a galinha nas mãos, em vez de tentar colocar a porta abaixo! — resmungou Madalena.
Olhei para ela sem entender.
— Que galinha? — perguntei.
— Agora, Dulce. Empurre! — comandou o dr. Almeida.
Eu fiz tanta força que senti uma veia em meu cérebro querendo se romper. Mas não aconteceu nada.
— Não dá pra deixar o bebê aí dentro? Eu não me importo — falei, esgotada.
— Não desista agora, querida. Está quase lá! — ele me incentivou.
Quando a nova onda de tortura me encontrou, quase perdi os sentidos.
Madalena alisava meu rosto com um pano úmido. Seus olhos estavam preocupados agora.
— Preciso do Christopher — falei atordoada.
— Imagine só! Um homem assistir ao parto do filho! — Madalena exclamou horrorizada.
— Ele estava comigo quando essa criança entrou — reclamei. — É justo que esteja quando ela sair. Não vou conseguir sem ele!
— Oh, pobrezinha. A agonia a está fazendo delirar! — choramingou ela.
Tentei convencer o médico.
— Doutor, ou o senhor me dá a morfina ou o Christopher. Preciso de um dos dois!
A cabeça careca do médico surgiu entre os meus joelhos, ele comprimiu os lábios finos até se tornarem apenas um risco.
— Não me parece boa ideia consentir que...
Ah, que se dane. O bebê era dele também.
— Christopher! CHRISTOPHERRRR! — comecei a gritar.
— Dulce! — veio a voz abafada através porta que ele esmurrara sem parar nas últimas seis horas ou mais. — Madalena, abra esta porta!
— Senhor Uckermann, faça sua parte e vá pegar a galinha!
Mas que raios de galinha era aquela? Mágica ou alguma coisa assim?
— Christopher! — chamei de novo.
Algo pesado investiu contra a porta. O dr. Almeida olhou espantado naquela direção e então suspirou.
— Ele vai entrar, senhora Madalena — constatou resignado. — De um jeito ou de outro. É melhor que não se machuque no processo. Abra a porta.
A mulher arfou pesadamente, e eu temi que seu queixo fosse se desprender do rosto.
— Mas, doutor...
— Vai logo Madalena! — gemi, me contorcendo na cama.
Ela bufou. Madalena mal teve tempo de abrir a tranca e Christopher estava lá, pálido,trêmulo, suado. Até parecia ter contrações também.
— Estou aqui! — Ele se juntou a mim na cama, segurando minha mão e beijando minha testa. — Estou aqui e não sairei do seu lado.
— Preciso de você.
Ele assentiu freneticamente.
— Basta me dizer como posso ajudar, meu amor.
— Quero que faça de conta que eu sou uma égua.
Um longo silêncio se abateu sobre o quarto, tudo o que eu ouvia era a minha respiração ofegante. Três pares de olhos se fixaram em mim.
— O quê? — os três perguntaram em uníssono.
— Faz de conta que sou uma égua — expliquei a Christopher. — Faz aquilo que vi você fazendo no estábulo. Com a Princesa.
Compreendendo o que eu queria, ele assentiu uma vez. Então me ajudou a erguer o tronco e se encaixou entre as minhas costas e a cabeceira da cama. Passou um braço sobre os meus ombros, me mantendo no lugar, e esticou a mão livre para tocar minha barriga. Christopher começou a fazer círculos firmes e precisos e, conforme seus movimentos cresciam, minha energia voltava.
— Assim? — ele sussurrou.
Eu ergui os olhos, a cabeça encostada em seu ombro, e encontrei suas íris negras brilhantes, sentindo a onda de tortura se avolumar dentro de mim.
— A gente já passou por um monte de coisas.
Respira.
— Muitas — ele concordou, continuando com sua mágica em minha barriga.
Respira. Respira. Respira.
— Não queria que você ficasse de fora dessa que, eu acho, vai ser a maior delas.
— Dulce... — Seus olhos ficaram úmidos, e tirei dali toda a força que me faltava.
Cerrando a mandíbula, eu aceitei a dor e a força de Ian, agarrando-o pelo antebraço, e empurrei com tudo. E continuei empurrando, até que por milagre a agonia desapareceu, e um choro agudo e estridente preencheu todo o quarto. O som fez meus olhos arderem e um nó se formou em minha garganta.
— Uma menina! — exclamou Madalena. — Oh, meu Deus, ela é tão linda!
Tentei vê-la, mas estava esgotada demais, não conseguia nem me mover. Busquei Christopher e o encontrei olhando para frente maravilhado, hipnotizado. Então, como se sentisse que eu o estava observando, ele abaixou a cabeça. Os olhos marejados brilhavam como nunca.
— Como ela é? — eu quis saber à meia-voz.
— Barulhenta, exigente, forte e enlouquecedoramente linda. Assim como a mãe.
Sorri para ele, exausta, perdida em um tipo de alívio que se parecia muito com êxtase. Madalena depositou o embrulho branco barulhento nos braços de Christopher. Ele se moveu de leve para recebê-la, de modo que seu corpo ainda sustentasse o meu. A menina parou de chorar no instante em que se aconchegou nos braços dele.
Essa é a minha filha, com toda certeza.
Com a cabeça ainda apoiada no ombro de Christopher, estiquei o pescoço ao mesmo tempo em que ele se inclinou de leve para que eu pudesse vê-la.
Afastei o tecido para o lado e perdi o fôlego quando de repente o mundo se tornou mais brilhante, mágico e encantado. O bebê mais perfeito do mundo tinha a pele rosada — ainda um pouco suja de sangue — e muito cabelo.
Preto como carvão. Não consegui ver seus olhos, ainda fechados, mas a boca era pequena, o lábio inferior ligeiramente farto, como um morango.
Christopher se moveu e, meio desajeitado, colocou aquele pacotinho precioso em meus braços, as mãos envolvendo as minhas para que eu pudesse segurá-lo. Foi estranho e maravilhoso. Era como segurar meu próprio coração.
Ao ver a garotinha piscar os olhinhos inchados, mover a mão pequenina meio descoordenada, meu coração quase parou, e então começou a bater rápido, num tipo de amor indissolúvel, imutável e incondicional, que se amalgamava com cada fibra do meu ser. Christopher sentia o
mesmo, eu podia ver a veneração, o instinto protetor, a ternura em seus olhos enquanto a admirava, gravando seus traços delicados na memória, esticando um dedo tímido para tocar sua bochecha gordinha.
Baixei a cabeça e pousei os lábios na testa macia e quente de minha filha.
— Bem-vinda a este mundo maluco, Nina.
Os olhos negros de Christopher se ergueram e se atrelaram aos meus. Sorri para ele.
— Aposto que você estava com medo de que eu fosse chamar nossa filha de Cocada.
Ele riu e se inclinou, beijando minha testa, depois meu nariz e por fim meus lábios secos. Quando voltou a me encarar, sua expressão tinha mudado. A diversão se fora.
— Meu amor, eu... — Sua voz falhou e senti que ele pretendia dizer que viveria, lutaria, morreria por mim, por nós duas se preciso, mas estava tão emocionado que não era capaz de emitir som algum.
Tudo bem, estava tudo ali, exposto naquelas íris escuras infinitas.
— Eu sei, Christopher— sussurrei com a voz embargada. — Eu também amo você.
Comentem!!!
Autor(a): Fer Linhares
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Querida Nina,Preciso dormir. Eu amo a minha filha, a Marina é tudo para mim, não me entenda mal. Eu só gostaria que ela dormisse de vez em quando. Ela é meio boêmia, segundo o dr. Almeida. Christopher adora brincar com ela de madrugada, mas até ele está exausto.Nina já tem quatro meses, não dev ...
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 90
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kaillany Postado em 17/01/2017 - 15:34:52
Parabéns amei do começo ao fim!!!!s2
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tahhvondy Postado em 16/01/2017 - 17:33:32
amei q lindo super amei e m ansiosa pro proximo livro
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Captain Swan Postado em 16/01/2017 - 14:45:03
Já ta postado o proximo livro o link ta nos agradecimentos bjss S2
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GrazihUckermann Postado em 16/01/2017 - 14:38:38
Ameii! estou muito ansiosa pelo próximo livro s2 posta logo PFV
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GrazihUckermann Postado em 15/01/2017 - 22:04:26
Sumi mas estou de volta! 10 capitulos novo e li tudo rapidinho. tá, talvez demorei tipo uma hora e meia, quase duas. amei de mais! Estou apaixonada por esse dois s2 continua logo
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Postado em 15/01/2017 - 20:30:45
ah ta acabando q triste mas to amando e o q o futuro deles??se for o q to pensando e mt legal continua
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tahhvondy Postado em 15/01/2017 - 17:27:14
ai o cometario abaixo e meu não vir q não tava longada
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Postado em 15/01/2017 - 17:24:53
amei e uma menina e amei q colocaram o nome dela de nina
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tahhvondy Postado em 15/01/2017 - 16:54:46
owts bebe vondy a caminho amando
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tahhvondy Postado em 15/01/2017 - 00:35:26
Ossa odiando essa tia do Christopher cm ela teve coragem de sequestrar a Maite sorte q acharam ela mas essa tia vai continuar causando problemas? ?e o Anfonso vai casar cm a Anahí??