Fanfic: 2 Pieces of heart | Tema: 2 Pieces
Não sei por quanto tempo passei à deriva depois do incidente que levou todas aquelas pessoas para o fundo do oceano naquela noite tempestuosa.
Já fazia quinze dias e noites que sobrevivia boiando em um pedaço de madeira. Havia mais duas pessoas comigo dias atrás. Desistiram. Deixaram-se levar para o fundo, ou talvez, algo tenha às agarrado à noite, e às levado. Fiquei só.
Segundo a crendice dos marinheiros e suas lendas, o oceano era a passagem entre esta vida e a outra. Ele era o mais monstruoso dos purgatórios. Era o mais terrível dos desertos. A veracidade de tais fatos fora constatada por mim. E eu, mal fazia ideia de como eu fora parar no meio daquilo tudo.
O mar te castiga de ambas as formas, física e psicológica. Tortura seu corpo de dia, quando o sol tenta arrancar de você sua pele. Te tortura a mente, quando sua boca seca se sente tentada a beber de toda aquela água que te cerca, mas a evita, porque sabe que se a beber, será o fim.
À noite, quando tudo esfria, você luta para não adormecer naquele frio infernal que faz seu corpo ficar dormente e tremer, porque sabe que, se fechar os olhos, não os abrirá novamente. As ondas te embalam em um carinho sádico.
Era difícil manter os olhos abertos à noite. Era uma luta covarde, e sempre que me encontrava prestes a desistir, elas vinham me visitar, as imagens de confusão e caos em minha cabeça, com explosões, fogo e corpos espalhados pelo chão.
A imagem daqueles corpos sem vida e queimados me pesavam a consciência. Eu não os reconhecia, mas sabia que tiveram aquele fim por minha culpa. O que eu fiz? Nem eu sabia. Mas sabia no fundo de meu coração, que fora eu, a responsável por suas mortes.
As imagens me atormentavam, mas me deixavam acordada, e quando desaceleravam e enfraqueciam em minha mente, me deparava com o dia.
Havia sobrevivido mais uma noite...
A princípio, a madeira que me sustentava mantinha meu corpo parcialmente fora d’água. Com os dias, havia perdido tanto peso, que meu corpo passou a ser sustentado completamente fora do mar.
Quinze dias havia se passado e sem ter do que me alimentar, meu corpo se tornou cadavérico. Não precisei de espelho para saber disso. Meus braços, pernas e dedos estavam ossudos.
Meu corpo já canibalizava meus músculos. Não tive coragem de tocar meu rosto. Sentia meus lábios feridos e rachados, e às vezes, por causa disto, sangravam, e quando provava de meu próprio sangue, aquilo me tentava ao extremo a provar de minha própria carne, mas, tendo meus lábios em meio aos meus dentes eu resistia.
No vigésimo dia, sentia que havia chegado ao meu limite e estava morrendo. E diferente do que imaginei, eu me senti feliz com aquilo. Ao relembrar da minha vontade de viver dias atrás e de toda a minha valentia, me senti uma tola. Como fui tola. Resistir para quê? Minha teimosia só prolongou meu sofrimento.
Lembro-me vividamente daquela noite, ela fora tão fria quanto às demais, eu aguardava ansiosamente que meu corpo sucumbisse ao desgaste físico e o mar me levasse para o fundo onde eu me juntaria aos demais, tal como deveria ter sido desde o começo. Não estaria mais só.
Poderia acelerar o processo, largando aquele pedaço de madeira, mas não conseguia. Aquilo me irritou. Aguardei que minhas forças se esvaíssem para que acontecesse. Naquela noite fria, eu tive uma visão. Eu a vi chegar. Pálida e silenciosa, caminhando sobre as águas, trazendo a escuridão em sua volta.
Vi uma caveira envolta em um manto negro chegar, porém, sem sua foice. Sorri com o resto de minhas forças para ela dando-lhe boas-vindas.
- Veio me levar? - Perguntei mal escutando minha própria voz.
- Sim, vou tira-la daqui – respondeu amavelmente me acolhendo em seus braços.
Senti meu corpo ser carregado. Espremi os olhos tentando focar seu rosto, mas era difícil ver algo com minha visão precária em meio àquela escuridão. Ainda sorrindo, tomada pelo alívio de minha libertação, brinquei:
- Achei... que você teria... uma foice.
- Não sou o anjo da morte. Sou seu anjo da salvação.
Um anjo? Então, me levou em seus braços e juro que o vi caminhar por sobre as águas. A minha frente, avistei algo. Talvez fosse sua carruagem. Fui coberta com algo macio que esquentou meu corpo. Meu anjo tinha o cheiro suave de tabaco. Meus olhos ficaram pesados, e logo, se fecharam. Deixei-me levar, aliviada com a certeza do término de meu sofrimento.
Autor(a): chrisamur
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
Ao abrir os olhos, notei estar em um quarto cuja madeira rangia e não demorou muito para que eu percebesse que estava dentro de uma das cabines de um barco, ou navio. Vi uma escada que possivelmente estava ligada ao convés e h ...
Próximo Capítulo