Fanfic: Destinado - As Memórias Secretas do Sr. Uckermann (Vondy) [TERMINADA] | Tema: Vondy [Adaptada]
O amanhecer já se insinuava no horizonte quando voltamos para casa, sem notícia alguma sobre o paradeiro de Maite. Dulce se manteve calada durante quase todo o trajeto, irritada com quão perto estivemos. E falhamos.
Meus pensamentos seguiam o mesmo rumo, porém havia a adição de algo em que eu não queria acreditar. Um pesadelo onde cada volta do ponteiro do relógio se tornava mais e mais real. Se minhas suposições estivessem corretas, estávamos ficando sem tempo. Eu sabia disso porque, na última vez em que as memórias me abandonaram, quase me esqueci de Dulce por completo.
Eu me sentia meio morto por dentro quando ela encaixou a chave na porta de seu apartamento.
Talvez houvesse uma saída. Em algum lugar, talvez existisse uma solução que até então eu falhara em ver, além da óbvia: encontrar minha irmã. Sim, eu estava desesperado para revê-la, abraçá-la e garantir que estivesse em segurança, mas e se minhas suspeitas estivessem certas? Então a busca por Maite ganharia outro sentido. Do resultado disso dependeria todo o meu futuro. Todo o meu passado.
— Você está tão quieto — comentou Dulce assim que entramos.
— Estou apenas cansado.
Não. Não pode ser isso, eu repetia sem parar, tentando controlar o temor.
— Não acho que seja só isso — ela disse, jogando a bolsa sobre a mesa bagunçada. — Sei que é muito frustrante ter chegado tão perto e acabar de mãos vazias, Christopher. Eu sei que é duro, e, meu Deus, ficar tanto tempo longe da nossa Nina... É tão doloroso que às vezes acho que não vou conseguir respirar. Mas não vamos perder a fé, está bem? Não podemos!
Esfreguei o rosto, tentando desembaralhar os pensamentos.
— O que foi, Christopher? Fala comigo.
— Eu... — Soltei uma lufada de ar, balançando a cabeça. Eu só podia estar perdendo o juízo. E de que adiantaria deixá-la apavorada com suposições feitas por uma mente que chegara ao limite da exaustão? — Acordei e pensei que você pertencia a outro homem, descobri que estamos no futuro, que minha irmã está perdida, depois que você era minha esposa e que eu sou pai de uma garotinha.
Então o Rafael contraiu uma doença que me apavora até a alma, encontramos minha irmã e a perdemos de novo. E você brigou comigo porque eu não permiti que pagasse pelo remédio de Rafael — tentei brincar.
— Eu não briguei, só reclamei. É muito diferente!
Logo que as ruas nos arredores da casa de espetáculos tinham ficado completamente vazias, Dulce e eu acabamos desistindo e decidimos retornar para casa. Enquanto ela dirigia, flagrei-me pensando que Rafael jamais teria imaginado que seu presente quase nos tinha levado de volta para casa. Então, a promessa que tínhamos feito para Nina me viera à cabeça.
— Temos que comprar o remédio para o Rafael — eu lembrara a Dulce.
— Ah, é mesmo.
Ela parara o carro na primeira farmácia que encontramos no caminho. Uma espécie de botica onde se vendia de quase tudo e que cheirava a éter. Havia milhares de caixinhas coloridas, como a que eu tinha visto na casa de Rafael.
— São para todo tipo de doença — Dulce me explicara.
— Inacreditável. — Eu ainda não podia crer que aqueles pequenos estojos continham a cura para algo tão tenebroso como a pneumonia. Era um milagre.
Um milagre que vinha dentro de uma caixa.
Dulce se dirigira ao balcão e conseguira o remédio. Naturalmente, ela reclamara ao chegar o momento de acertar a compra e me vira enfiar a mão no bolso.
— Que saco, Christopher! — E fora esperar do lado de fora.
Eu deixara a farmácia pouco depois, fitando a caixinha, esperando sentir algum tipo de poder emanando dela, mas tudo o que eu sentia eram suas pontas duras cutucando minha palma.
Dulce sempre me falara de muitas coisas sobre o seu tempo, mas nunca havia mencionado os milagres que ocorriam nele. Claro que para ela uma pneumonia não devia ser tão assustadora quanto era para mim. Ela crescera sabendo que havia uma chance de cura. Uma cura que cabia na palma da mão.
O suspiro suave de Dulce me tirou do devaneio.
— Eu sinto muito, Christopher. — Ela me abraçou pela cintura, comprimindo o rosto de encontro ao meu peito. — Sinto muito por tudo o que você passou hoje.
Toquei seu queixo, inclinando-o para cima. Aqueles grandes olhos de topázio questionavam. Mas eu não sabia o que dizer a ela, então mantive a mão em seu rosto, acariciando a pele suave de seu maxilar. A conjectura a respeito de minha falta de memória estar diretamente relacionada ao desaparecimento de Maite não podia estar certa. O destino não podia ser tão cruel assim.
— Por que você tá me olhando desse jeito? — Franzindo a sobrancelha, ela afastou com os dedos os cabelos que me caíam na testa.
— Desse jeito como?
— Como se fosse me perder. Já te vi assim antes. Na época em que a maldição ainda te perturbava. O que foi, Christopher?
Balancei a cabeça e busquei sua boca. O contato com seus lábios quentes aos poucos calou o ruído em meu cérebro. Porém despertou algo, um rugido que reverberou por todo o meu corpo e fez minhas mãos viajarem pela silhueta dela até encontrarem descanso na curva de sua coluna.
— Isso não é justo — ela murmurou em minha boca.
— O que não é justo? — Deslizei a boca por seu queixo.
— Você sempre me distrai! Sabe que eu não penso direito quando você me toca e usa isso quando não quer conversar sobre alguma coisa!
Acabei rindo de encontro à pele macia de seu pescoço.
— Se você ainda é capaz de pensar nisso... — Mordisquei aquela deliciosa curva onde o pescoço se juntava ao ombro. Ela estremeceu de leve, enroscando os dedos na frente de minha camisa de mangas curtas. — Então não estou fazendo minha parte da maneira que deveria. Permita-me tentar de novo. — E a beijei novamente. Desta vez, sem reprimir o caos emocional no qual eu sufocava, deixando a fome que eu sentia dela extravasar e amortecer qualquer outro sentimento.
Eu teria parado se pudesse. Teria de algum modo me afastado dela e a deixado em paz. Em vez disso, inclinei-me um pouco mais, os dedos afagando seu delicioso traseiro. Dulce comprimiu o corpo contra o meu, as mãos se infiltrando por dentro de minha camisa. Eu a puxei para cima. Ela não hesitou em enrolar as pernas ao redor de minha cintura.
Minhas mãos suavam quando eu a levei para o quarto e nós caímos no colchão.
Tentei ser gentil, tentei amá-la sem pressa, mas aquele temor que eu tentava manter sob controle me deixou afoito, ansioso, bruto. Dulce puxou minha camisa pela parte de trás, passando-a por minha cabeça de qualquer jeito, e então se dedicou aos botões de minha calça. Naturalmente, eu a deixei nua em questão de segundos. O animal em que ela me transformava a devorou, a engoliu, se embebedou dela. Era como se eu a amasse pela primeira vez. E temi que também fosse a última.
* * *
Dulce acabou adormecendo sobre meu peito. Eu me mantive quieto, brincando com a ponta de seus cabelos e lutando contra o cansaço. Apesar de absolutamente esgotado, tive medo de fechar os olhos. Então ainda estava muito desperto quando os primeiros raios de sol invadiram o quarto.
Eu poderia escrever uma carta, pensei. Poderia relatar tudo o que acontecera e colocá-la em algum lugar onde eu a encontrasse, caso a amnésia retornasse.
Havia papel e caneta na sala.
Não, era provável que eu nunca a encontrasse, levando em conta a bagunça de Dulce. O melhor era me manter acordado até descobrir o paradeiro de Maite, decidi.
Entretanto, sem aviso, um entorpecimento se apoderou de meus músculos e pensamentos, como se eu tivesse bebido a noite toda. Sacudi a cabeça e pisquei, tentando fazer a visão voltar ao normal. A desorientação se intensificou, porém, a ponto de o quarto começar a rodar.
Não. Por favor, não!, implorei, apertando o corpo quente e macio de Dulce, lutando para manter os olhos abertos e a consciência. Eu precisava ficar acordado. Precisava deixar uma mensagem que eu pudesse encontrar. Precisava alertar a mim mesmo sobre o risco de perder Dulce, caso Maite não fosse localizada. Mas não houve tempo. A desorientação se tornou forte demais, a dor que me apunhalou as têmporas me fez ver estrelas.
E então eu não estava mais ali, naquela cama com Dulce.
Estava em meu quarto, no casarão, refestelado na cama, ainda vestido. Eu encarava o teto já fazia certo tempo. Parecia que tudo que poderia dar errado naquele dia havia acontecido. Dulce tinha algo importante a me dizer. Algo relacionado a sua origem. Havia tempos eu queria entender melhor aquela mulher, e talvez, se eu soubesse de onde ela vinha, poderia compreender seus atos e suas maneiras tão peculiares. Só teria de suportar aquela noite e então poderia encontrá-la e ouvir o que ela tinha para me contar.
O perfume de flores noturnas entrava pela janela aberta e impregnava o ambiente. A lua estava cheia, um perfeito círculo rechonchudo e reluzente que clareava a noite, mas fazia muito pouco por meus pensamentos. Desisti da cama e joguei o paletó na poltrona, livrando-me da gravata e já enrolando as mangas da camisa.
O retrato de Dulce estava longe de ser finalizado e havia muito trabalho pela frente. Um pouco de distração me ajudaria a enfrentar a noite. Abrindo as bisnagas e depositando a tinta sobre a caixa onde eu guardava os pincéis, continuei de onde havia parado.
Não sei por quanto tempo fiquei ali, absorto em cada pincelada, mas deve ter sido longo, pois, quando ouvi uma suave batida na porta, a vela sobre o aparador já se ia pela metade e a lua tinha desaparecido da janela.
Temendo que alguma tragédia pudesse ter ocorrido na casa, abri a porta.
E me deparei com Dulce. Ela ainda usava o mesmo vestido do jantar, os cabelos soltos caindo em cascatas por suas costas e ombros.
Por que ela estava ali, em meu quarto, àquela hora da noite? Não sabia os riscos que corria? Não se importava? Não percebia que, por mais que eu me esforçasse para me comportar como um cavalheiro, havia atingido o limite?
— Ainda está acordado — disse ela. — Que bom! Vamos conversar? Agora!
— O que está fazendo aqui a essa hora?
— Eu te esperei até agora, mas, como você não me procurou, resolvi te encontrar, e te encontrei. Agora, vai me deixar entrar ou vamos conversar no corredor e acabar acordando a casa toda?
— Dulce, eu não posso deixá-la entrar! Você enlouqueceu?
— Tem alguém aí dentro com você? — Ela esticou o pescoço para dar uma olhada no quarto.
— É claro que não! — Por que espécie de homem ela me tomava? — O que você está pensando?
— Não estou! Agora me deixe passar. — E, sem esperar por um convite, espremeu-se entre mim e o batente e entrou.
Verifiquei se não havia ninguém no corredor e fechei a porta, desejando, e não pela primeira vez, que ela fosse um pouco mais prudente.
Tentei convencê-la a ir embora, a adiar a conversa, mas ela estava irredutível.
— Não saio daqui até que você me escute!
— Não pode esperar até amanhã?
— Não!
Eu queria gritar com ela. Queria beijá-la. Queria colocá-la porta afora. Queria deitá-la na cama e me enfiar entre suas saias. Seguramente aquilo não terminaria bem.
— Muito bem, então. — Reprimi um grunhido. — Vamos conversar.
— Vamos. — Mas Dulce se deteve. Suas mãos se retorciam em frente ao corpo, e ela fez algumas tentativas de dar início à conversa.
Obrigando-me a ficar onde estava para não correr o risco de perder a cabeça, foquei a atenção em suas reações. Ela estava ansiosa e inquieta. Assustada. Por quê? O que tinha de tão grave no que ela precisava me contar?
— Talvez... Talvez queira se sentar para ouvir tudo o... — Ela indicou a cama. E congelou ao reparar na tela inacabada.
Inferno. Eu havia me esquecido dela. Não queria que Dulce a visse, nem mesmo quando estivesse finalizada. Era apenas para mim. Uma prova de que aquela mulher existia, um meio de apaziguar meu coração quando ela se fosse. Porque ela iria embora. Dulce estava irredutível quanto a isso. Não havia nada que eu pudesse dizer que a fizesse mudar de ideia.
Exceto por uma coisa, eu rezava. Uma que eu estava cada vez mais resolvido a lhe propor. Mas não ali, em meu quarto, no meio da madrugada, como se ela fosse uma meretriz de cais de porto se esquivando pelas sombras. Ela merecia mais que isso. Eu precisava encontrar o momento certo e rezar para a divina providência colocar algum juízo na cabeça daquela mulher.
Dulce se aproximou da tela devagar. E arfou ao reconhecer seu rosto no tecido, muito embora ele não lhe fizesse justiça. Nenhuma justiça. Eu poderia tentar desenhá-la um milhão de vezes e jamais conseguiria reproduzir a vivacidade de seu olhar, a petulância sempre presente no desenho de sua boca, a aura de mistério que a cercava. Aquele retrato não passava de um rascunho malfeito.
Vi sua mão se erguer, os dedos trêmulos.
— Não toque! A tinta ainda está úmida. Vai... borrar — falei, sem jeito.
— Christopher, por que me pintou? — Sua voz estava embargada. Se devido à emoção ou à mortificação, não pude ter certeza. — Pensei que não gostasse de retratar pessoas.
O que eu poderia dizer a ela? Que não sabia como viver o resto de meus dias depois que ela partisse, já que todos os meus pensamentos eram dela? Que não conseguia nem sequer imaginar acordar e nunca mais vê-la? Que desejava mais do que qualquer coisa que ela pudesse ficar comigo, pouco me importava que tivesse uma vida a esperando?
Dulce se virou, os olhos castanhos brilhantes como eu nunca tinha visto, e, diante daquele olhar, tudo o que pude fazer foi lhe dar a verdade.
— Porque... não posso perdê-la, Dulce! Porque, se tudo que posso ter é este retrato... — Parei quando senti um aperto na garganta.
— Ah, Christopher.
Dulce abandonou no aparador a vela que segurava e se atirou em meus braços.
Surpreso, não consegui me desvencilhar dela a tempo, e, quando sua boca colidiu com a minha e suas mãos se prenderam em minha nuca, eu não quis mais me afastar. Pelo contrário, a abracei pela cintura, seus seios comprimidos de encontro a meu peito, tentando inutilmente me aproximar mais, pois me parecia que nunca estaria junto dela o suficiente. Eu sentia seu coração bater unido ao meu, ambos em ritmo acelerado e urgente. O desejo se apoderou de mim, assim como um sentimento de posse primitivo, e tudo o que me ocorria era rasgar sua roupa para poder sentir aqueles seios colados em mim sem nenhum tecido entre nós.
E dessa forma ela acabaria no chão, comigo entre suas coxas. Diabos, não era assim que eu tinha planejado que acontecesse.
Juntando toda a força de vontade que provinha unicamente do senso de dever para com a mulher que eu amava, eu a segurei pelos ombros e me afastei. Meu corpo tremeu com rebeldia.
— Christopher?
— Não posso fazer isso com você! Não posso desonrá-la dessa maneira. — A pulsação em minha virilha me fazia querer dobrar ao meio. Mas a dor era bem-vinda.
Uma pequena punição, um lembrete do que eu teria feito se minha consciência tivesse me abandonado. — Não podemos!
— Podemos, Christopher. Podemos sim!
Sacudi a cabeça, tentando desanuviar os pensamentos. Sim, eu sabia que ela estivera com outros homens, mas isso não significava nada. Apenas me fazia querer pegar a pistola e correr atrás daqueles malditos. Eu ainda a desonraria se me permitisse ser dominado pela paixão agora. Eu a desonraria em qualquer outro momento se um anel não pendesse de seu dedo anular da mão esquerda.
Ela precisava entender isso.
— Devemos esperar um pouco mais. Eu pretendia lhe dizer isso de forma mais...
— Mas nós não temos mais tempo! — ela atalhou, fora de si, segurando-me pelos ombros. — Você não entende? Eu... eu não sei quanto tempo eu tenho. Mas tenho certeza que não é muito. Eu nem sei se ainda estarei aqui amanhã, Christopher!
Eu queria chorar, e não apenas por causa da agonia em que meu corpo excitado se encontrava. Ouvi-la dizer que nosso tempo estava se esgotando fez meu peito silenciar. Deixei a cabeça pender para a frente, unindo a testa à dela, e fechei os olhos.
— Mas é errado, Dulce! Tão errado! Você mesma disse!
— Não é errado. O que sinto quando estou com você é... é a coisa mais certa que já senti na vida! Christopher, pela primeira vez eu sei a qual lugar pertenço.
— Pertence a este lugar? — perguntei, fitando-a.
— Não. Pertenço a este lugar. — Sorrindo, ela deixou as mãos escorregarem por meu pescoço e percorrerem toda a extensão de meus braços. A excitação ameaçou sair de controle, mas eu a obriguei a retroceder. O que Dulce estava me dizendo ia além de saciar a carne faminta. Talvez pudesse saciar meu coração.
Com a franqueza estampada em seu lindo rosto, ela repousou a mão direita sobre meu peito. Sobre meu coração, que imediatamente despertou e se apressou em lhe mostrar que era todo dela.
— Pertenço a este lugar. Como pode ser errado?
Maldição, Dulce!
Ela não devia me dizer aquilo. Não quando sabia que ia partir. Era um dos motivos pelos quais eu não podia me render. Não podia simplesmente me deleitar com seu corpo e deixá-la ir. Eu queria mais, queria seu coração, sua alma e sua mão esquerda. E, exceto pela mão, ela agora me oferecia tudo o que eu sempre desejara, dificultando ainda mais as coisas. Eu não podia ceder. De maneira alguma. Não podia tratá-la de maneira tão abominável, como se fosse uma mulher qualquer, quando eu seria dela à mera menção da palavra “sim”. Eu me arrependeria pelo resto de meus dias se cedesse agora. E no entanto...
E no entanto me arrependeria por toda a eternidade se nem ao menos tentasse lutar por ela.
Então eu a trouxe para perto e tomei sua boca, rendendo-me ao desejo. E eu soube. Simplesmente soube que tudo o que eu vivera me levara até aquele momento, até Dulce...
A imagem tremulou.
Espere! Não, por favor!
Lutei para manter a cena, para prosseguir com os acontecimentos daquela noite na qual Dulce se entregara a mim e eu a ela, mas tudo ficou fora de foco, começou a desvanecer.
Por favor, não. Por favor!, implorei em vão, assistindo impotente à lembrança se dissolver até se tornar apenas um borrão indistinto e, por fim, se apagar.
Tentei acordar, lutar contra o que quer que estivesse acontecendo, mas outra cena me jogou para uma direção diferente.
Era a noite do baile.
Minha cabeça zumbia, eu não conseguia pensar direito. Meu corpo tremia, tremia muito, e eu não parava de ouvir a voz de Sofia me dizendo aquelas coisas.
Ela não estava brincando, eu vi isso em seu rosto. Falara sério. Acreditava mesmo que tinha vindo do futuro.
Meu coração estava acelerado, minha respiração rápida e curta. Dulce sempre foi diferente, era uma de suas adoráveis qualidades, mas estaria eu tão cego de amor que não notei sua loucura?
Entrei na sala onde o baile acontecia ainda atordoado. Ah! Lá estava o homem que eu procurava.
— Doutor Almeida, poderia me acompanhar?
— Aconteceu alguma coisa, senhor Uckermann? — ele inquiriu, sobressaltado.
— Apenas me acompanhe, por favor.
Sua esposa me observou, atenta, buscando entender o que se passava comigo.
Presumi que Letícia não conseguiria ir muito longe, já que eu mesmo não sabia o que sentir ou pensar.
— Claro, claro — Almeida concordou, já me seguindo.
Caminhamos em silêncio até meu escritório. Entrei e presumi ter fechado a porta. Não estava prestando muita atenção em nada.
— Christopher, meu caro, está tudo bem?
— Não, não está! Aconteceu tanta coisa esta noite. — Esfreguei a testa, caminhando de um lado para o outro, sentindo-me tão velho e cansado como o próprio mundo. — Eu preciso de sua ajuda, doutor. De seus conselhos médicos, na verdade.
— Alguém está ferido?
— Certamente sim, mas ninguém que valha a sua preocupação. Graças a Deus eu cheguei a tempo e pude impedir que o pior acontecesse. Aquele... — trinquei a mandíbula — ... bastardo do Santiago tentou atacar Dulce.
— Meu Deus, Christopher!
— Não quero nem pensar no que teria acontecido seu eu não... — Puxei uma grande quantidade de ar. — Mas não o chamei até aqui por causa disso, doutor. Estou preocupado com Dulce. Já deve ter notado que ela é diferente, suponho. — Continuei zanzando pela sala, sem saber como começar.
— Sim. Sua hóspede é um tanto... peculiar. Embora seja adorável.
— Até esta noite eu pensava que se tratasse apenas de uma diferença cultural.
Mas então... — Como dizer a ele? Como explicar o que ela havia dito minutos antes?
— Mas então... — ele incitou.
— Então agora há pouco ela me disse algumas coisas sobre sua origem. Coisas que me perturbaram muito.
Alberto apenas assentiu, então continuei:
— Dulce me disse que nasceu quase duzentos anos à nossa frente. Ela acredita que veio do futuro. — Soltei uma grande lufada de ar. Como, em nome de Deus, eu poderia crer no que me fora dito? Eu tentava desesperadamente encontrar uma explicação, qualquer uma, por mais ordinária que fosse, para que o que
Dulce me dissera pudesse fazer algum sentido. Qualquer um mesmo.
— Do futuro? — ele indagou de olhos arregalados.
— Sim, Almeida. Do ano 2010, para ser mais específico. Ela me disse, com muita convicção, que viajou no tempo. — Meu coração se apertou, assim como o nó na garganta, que tornou uma tarefa árdua articular qualquer sílaba.
— Ah! — Ele cruzou os braços atrás das costas. — Entendo.
— Entende? — Senti uma pontada de esperança. Ele era um médico, um cientista. Talvez soubesse alguma coisa secreta que o restante de nós não sabia.
— Eu já ouvi falar sobre isso. Sobre pessoas que, depois de sofrerem um trauma, perdem a percepção da realidade... Acho melhor se sentar um pouco, Christopher. Sua cor não está boa. — Ele alcançou meu ombro e me guiou até o sofá. Deixei meu corpo cair ali.
— Acha que ela... que ela... — Ah, inferno!
— Veja bem, Christopher, ela sofreu um trauma quando chegou aqui. Eu a vi logo que você a encontrou. Estava assustada e não dizia coisa com coisa. E o ataque desta noite... Bem, talvez a violência que sofreu tenha sido grande o bastante para que seu cérebro esteja tentando se proteger agora.
— Fugindo da realidade — completei quando ele não o fez.
— Precisamente. Percebo que se afeiçoou a ela, meu caro. E entendo seus motivos. A senhorita Dulce tem algo especial, vai além da beleza e do sorriso encantador. Mas, meu amigo, peço que ignore seus sentimentos e reflita um pouco. Há quanto tempo conhece essa jovem?
— Eu a conheço. Isso é o suficiente — retruquei. — Tem que ser o bastante. Ela é doce e leal. É solitária, mas nutre um apreço imenso pelos poucos amigos que tem. Eu a conheço, Alberto! E sei quem ela é.
Ele assentiu e se levantou, indo até a minha mesa e se recostando no tampo.
— Sendo assim, o que vou lhe dizer é apenas minha opinião médica. Creio que a senhorita Dulce foi acometida por uma neurose. Talvez com o tratamento adequado...
— Ela se curaria?
— Talvez sim. Talvez não. Dependerá dela. Não sabemos muito sobre os mistérios que habitam a mente humana, Ian. Há casos de pessoas que foram curadas. Também há relatos de mentes que se perderam para sempre. É claro que eu precisaria examiná-la, talvez consultar um amigo especialista nos segredos da mente para poder lhe dizer o grau de sua... de sua imaginação. Se preferir, leve-a a uma casa de saúde. Creio que lá ela receberia o tratamento adequado. Além disso, o repouso pode fazer bem a ela.
— Interná-la? Não. De modo algum. Não! Não posso fazer isso. Não posso deixar que... Não! Deve haver outro jeito.
— Não que eu conheça. Reflita um pouco. Ela poderia voltar à razão.
— Mas... interná-la? — Deixei a cabeça pender entre as mãos. Queria acordar e sair daquele pesadelo. — Então, não há outra forma?
— Não, senhor Uckermann. Sinto muito, mas não há outra forma. Pode ser apenas uma crise. Um surto. É normal acontecer isso depois de uma situação traumática. E, pelo que me contou, creio que seja este o caso. Sei que a estima muito, mas, se interná-la agora, antes que piore, talvez dentro de alguns meses ela possa recuperar a sanidade.
As palavras dele ainda ecoavam em minha cabeça quando a porta se abriu bruscamente. Dulce estava parada ali, com o rosto retorcido de dor.
— Você mentiu! Você mentiu pra mim! — Seus grandes olhos castanhos estavam inundados de dor, traição, medo. Vê-la daquela maneira era pior que imaginar que ela estivesse realmente doente da cabeça. Muito pior.
— Dulce, acalme-se, por favor! — implorei, ficando de pé. — Eu não menti.
Apenas escute o que o doutor Almeida tem a lhe dizer.
— Senhorita Dulce, o senhor Uckermann me contou o que lhe aconteceu esta noite.
Talvez você apenas precise descansar um pouco, minha jovem. Conheço um lugar muito discreto onde...
Seus olhos dispararam em minha direção. Havia muita coisa neles. Cólera, medo, dor, traição.
— Você vai me jogar num manicômio? — Seu peito subia e descia em passo acelerado. O medo a deixou pálida. Nem mesmo quando eu a salvei de Santiago vira seu rosto tão amedrontado.
— Não é isso! Apenas ouça o que o doutor Almeida tem a lhe dizer. — Ela precisava se acalmar e ver que eu não tinha a intenção de mandá-la para lugar algum. Como poderia? Eu não conseguia ficar longe daquela mulher nem por um quarto de hora.
Tentei me aproximar, mas ela me repeliu, erguendo os braços como se eu fosse um dos moleques da criadagem, pronta para me golpear.
— Não toque em mim!
— Dulce, amor, você prec...
— Cale a boca, Christopher! Só... cale a boca!
Ela continuou gritando comigo, proferindo uma porção de suposições tão ridículas quanto aquela situação. Como ela podia duvidar de meus sentimentos? É claro que eu a amava, é claro que não me importava que não agisse como as outras jovens. Mas ela não me deixou falar.
Olhei para o médico, suplicando ajuda, mas Almeida estava alarmado demais com o temperamento intempestivo de Dulce.
— Eu te odeio, Christopher! ODEIO!
— Está enganada! — Apressei-me, pois ela se aproximava da porta. — Você não está entendendo, ouça-me...
— NÃO! — E disparou para seu quarto.
— Dulce! — chamei, mas isso apenas fez com que ela corresse ainda mais.
Então eu a segui, com o peito doendo e sem ar nos pulmões. Não pude alcançá-la a tempo e, quando cheguei até sua porta, encontrei-a trancada.
— Dulce, perdoe-me. Eu... estou confuso. — Tentei raciocinar. Ela não era louca.
Era a minha Dulce, mas, mesmo que estivesse doente, eu ainda a amaria. Não a internaria em nenhum maldito manicômio. Se ela estava feliz inventando aquelas histórias que não faziam mal a ninguém, então tudo bem para mim. — Abra, por favor! Vamos conversar. Não vou deixar que a levem a parte alguma, eu prometo!
Ela não respondeu. Eu apenas ouvia seus passos lá dentro.
— Dulce, abra, por favor.
Diabos! Como aquilo tinha acontecido? Como pude assustá-la ainda mais, justamente depois de ter sido atacada por aquele miserável Santiago? Por que não permaneci ao lado dela? Por que não deixei que inventasse suas histórias?
Que mal havia em pensar que tinha vindo do futuro?
O quarto ficou em silêncio. Grudei-me à porta, tentando ouvir alguma coisa. A ausência de ruído me fez pensar em todo tipo de coisa.
— Dulce! — Tentei a maçaneta. Ela tinha passado a trava.
Lancei-me contra o painel de madeira uma vez. E mais outra. Na terceira tentativa, eu a arrombei. Entrei no quarto com o coração aos pulos, vasculhando.
Mas Dulce não estava ali dentro. A janela estava escancarada. Corri até ela, debruçando-me sobre o parapeito, escrutinando a noite escura.
Ela já não estava mais à vista.
Soquei o peitoril com raiva.
— DULCE!
Autor(a): Fer Linhares
Este autor(a) escreve mais 10 Fanfics, você gostaria de conhecê-las?
+ Fanfics do autor(a)Prévia do próximo capítulo
Quando abri os olhos, meu coração batia rápido, a respiração estava curta.Meu corpo se portava como se eu estivesse em grande perigo. Esfreguei o rosto, tentando acalmar a pulsação e ajustar a vista. Um suave calor me envolvia o peito. Baixei o olhar e me deparei com o emaranhado ondulado de...Deus do céu!Cobr ...
Capítulo Anterior | Próximo Capítulo
Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 63
Para comentar, você deve estar logado no site.
-
tahhvondy Postado em 14/02/2017 - 17:51:28
nossa simplismente amei!cada um dos livros maravilhosos essa historia e incrível que não tem como não ser apaixonar por ela o amor deles e lindo o Christopher e mt fofo vou sentir saudades dessas confussões deles
-
GrazihUckermann Postado em 13/02/2017 - 19:10:55
Eu AMEI! não sei qual dos livros foi o melhor. obrigada por postar essa história incrível, essa história é muito linda. Christopher é muito fofo <3 O amor deles é incrível. Quando ele a esqueceu ele se apaixonou por ela de novo, e eu tive que me segurar pra não chorar nessa parte s2 Fiquei feliz com o final da Madelena e do Seu gomes. Espero que tenha outro Baby vondy no livro da Maite, dessa vez tem que ser menino kkjk e não terá um nome melhor que Alexander para dar ao menino neh?? Estarei na próxima fanfic com você, comentando em todos os capitulos. Tchau. um diaa eu volto para ler de novo. (Acho que não demora muito, por amei a história e quero muito ler de novo) s2
-
tahhvondy Postado em 13/02/2017 - 10:57:28
ai já ta acabando que triste mas ainda bem q vx consequiu baixa o da Maite
-
GrazihUckermann Postado em 10/02/2017 - 20:35:51
Continuaaaaaaaaaaaaa! s2
-
tahhvondy Postado em 09/02/2017 - 11:28:34
chequei continua por favor
-
GrazihUckermann Postado em 09/02/2017 - 09:49:37
Continuaaaaa! s2
-
GrazihUckermann Postado em 07/02/2017 - 16:32:39
FINALMENTE! CONTINUAAAAAAAAAAAAAA s2
-
GrazihUckermann Postado em 06/02/2017 - 21:08:32
T-T
-
GrazihUckermann Postado em 06/02/2017 - 21:02:21
Caraca essa confusão me deixou confusa kkkjk quando ele esquecer ela, ele meio que vai sumir?? vai aparecer no século dezenove como se nada tivesse acontecido?? é isso? não entendi kkkjk Continue mulher, não me deixe ansiosa! s2
-
GrazihUckermann Postado em 05/02/2017 - 22:21:37
ai me deus!!!! CONTINUAAAAAA T-T