Fanfic: Destinado - As Memórias Secretas do Sr. Uckermann (Vondy) [TERMINADA] | Tema: Vondy [Adaptada]
A casa estava tomada. Todos os nossos conhecidos vieram comemorar o aniversário de Maite. Até padre Antônio estava ali, mas manteve-se perto da mesa, repleta de todo tipo de guloseimas que Madalena conseguira preparar. Os cristais dançavam sob as chamas das velas no mesmo ritmo dos acordes do quarteto de cordas. O aroma de assado, ponche, charuto e perfume impregnava cada canto do salão.
Minha irmã estava radiante em seu vestido branco, falando com todos os convidados e rindo de algo espirituoso que alguém lhe dizia. Infelizmente, eu não era o único a observá-la. E não gostava nada da maneira como aqueles rapazotes olhavam para ela. Sobretudo o senhor William Levy. O garoto era amigo de Júlio, sobrinho de meu bom amigo Almeida. Havia concluído seus estudos já tinha alguns meses e agora era um médico, à procura de pacientes na vila. O doutor Almeida o estava ajudando com isso. Não que eu tivesse algum problema com o rapaz. Ele era até agradável... quando não estava correndo atrás de minha
irmã. O senhor William a visitava com frequência, e descobri que enviava cartas para Elisa enquanto esteve fora. Eu queria socá-lo pelo atrevimento, naturalmente, mas havia prometido a Dulce que não faria isso. Então, tudo o que eu podia fazer era ficar carrancudo e observá-lo acompanhar minha irmã com os olhos, esperando o momento de se aproximar.
Eu não entendia como é que os pais suportavam aquilo. Quer dizer, Maite era minha irmã e já era ruim o bastante e... meu bom Deus, em duas décadas seria a vez de Marina se tornar alvo de interesse dos rapazes!
Não, não, não. Minha filha não iria gostar daquela atenção. Eu estava certo de que Marina não teria qualquer interesse pelo sexo oposto antes de completar trinta... quarenta anos. Certamente quarenta.
Ora, mas que praga. Marina tinha o gênio da mãe. Faria o que lhe desse na telha.
Esfreguei a testa, ponderando se seria melhor comprar uma nova pistola ou se deveria voltar a praticar esgrima. Nunca me saí muito bem com o florete. Em contrapartida, tinha uma mira excepcional. Uma pistola de maior calibre seria o ideal...
O olhar de Maite encontrou o meu do outro lado do salão. Ela abriu um sorriso que era puro contentamento. Anahí lhe disse alguma coisa, tocando a barriga proeminente, e minha irmã voltou a atenção para a amiga.
— Qual o motivo desta carranca, primo? — Alfonso surgiu diante de mim, obstruindo minha visão. Tinha um prato muito bem abastecido em uma das mãos. — Agora que está casado, não há razão para não apreciar um baile.
Cocei a cabeça.
— Estava apenas refletindo sobre assuntos que, espero, levarão muito tempo para me perturbar.
— Um baile não é o melhor lugar para refletir sobre assuntos sérios. Aliás, ainda não descobri um bom lugar para fazer isso. — E levou um naco de assado à boca.
— Como está Anahí? — perguntei, querendo mudar de assunto.
— Se sentindo cansada, desajeitada e muito irritada comigo, embora eu desconheça o motivo.
Ah, eu me lembrava disso muito bem.
— Apenas seja paciente e nunca, nunca mesmo, diga a ela que está imensa. — Acabei sorrindo e inconscientemente levei a mão à cabeça, ao local exato onde Dulce me acertara com um livro. — Não entendo por quê, mas parece que mulheres grávidas não pensam que isso seja um elogio nem percebem o orgulho de um homem ao dizê-lo.
— E eu não sei? — Alfonso se encolheu, esfregando o cotovelo nas costelas, como se lhe doessem. — Onde está sua esposa?
— Colocando Marina na cama. A senhora Madalena não conseguiu acalmá-la.
Ele deu risada.
— Marina jamais aceita ser ludibriada. Se quer uma coisa, ela a consegue, de um jeito ou de outro. É ainda mais pertinaz que sua esposa, primo. Uma Uckermann, sem dúvida. Será divertido um dia ver os cavalheiros fazendo fila para cortejar uma jovem tão espirituosa.
Uma espingarda, decidi. Com toda certeza, eu compraria uma espingarda.
E possivelmente uma pá.
— Ah, diabos — ele resmungou ao perceber que sua esposa o fitava do outro lado da sala com as sobrancelhas unidas. — É melhor eu ir descobrir por que a irritei agora.
Assenti uma vez.
Ele se virou para partir, deu dois passos, então se aproximou de novo.
— Quando é que elas voltam ao normal? Quanto tempo mais esse mau humor vai durar?
Tentei não rir.
— Ora, Alfonso, há um bebê sendo gerado dentro dela. Seu corpo está criando uma nova pessoa, e tudo o que nós, maridos, fazemos é ficar olhando. Lidar com um pouco de mau humor me parece justo. Nos dá o que fazer.
Ele franziu o cenho.
— É... Acho que você tem razão.
— Além disso, depois do mau humor vem a choradeira, e isso, meu primo, é muito pior. Logo depois do parto, Dulce chorava porque o dia estava ensolarado.
Se chovia, ela chorava porque sentia falta do sol. Se eu tentava animá-la, ela chorava porque não queria estar chorando. Se eu a deixava chorar, ela soluçava porque eu não a entendia. Foi assim por semanas.
— Se-semanas?! — Seus olhos quase saltaram das órbitas e caíram no prato que ele segurava.
— Três longas semanas que eu pensei que jamais chegariam ao fim. — Soltei um longo suspiro. — Então aproveite enquanto pode, Alfonso. Você vai sentir falta do mau humor de Anahí. Eu prefiro que Dulce grite comigo, me acerte a cabeça com um livro, a vê-la chorar por cinco minutos que seja.
— Diabos, Christopher! — Então ele saiu arrastando os pés em direção a sua mulher. Maite, que ainda estava ao lado da melhor amiga, apenas um ano mais velha, foi abordada por um cavalheiro.
Ora, mas que surpresa ver William lhe pedir uma dança.
Maite aceitou com um meneio de cabeça e ele lhe ofereceu o braço. E lá estava ele, guiando-a pela sala, olhando para minha irmã como se ela fosse... bem... o seu mundo.
Os dois se posicionaram ao lado de outros casais à espera de uma nova quadrilha.
— Você não deveria estar com essa cara. William é um bom rapaz — o doutor Alberto Almeida disse ao se aproximar e parar ao meu lado, também observando os dois.
— É melhor que ele seja.
Meu amigo deu risada, oferecendo-me uma taça de vinho.
— Sossegue, meu caro. Sua irmã não é mais uma menina e sabe o que é melhor para ela. Não conheço nenhuma outra jovem tão ajuizada quanto a senhorita Maite. E William é... Bem, se eu e Letícia tivéssemos sido abençoados com um filho, eu ficaria muito satisfeito se fosse parecido com ele. É um ótimo rapaz, realmente brilhante, e será um grande médico um dia.
— Humm — foi tudo o que me ocorreu enquanto sorvia o vinho.
— É incrível olhar para sua irmã agora. Está cada dia mais parecida com Alexandra.
Voltei a admirar Maite. De fato, não fosse pela cor dos cabelos, eu quase poderia ver minha mãe naquela sala. Ela teria adorado aquele baile. Diferentemente de meu pai, ela sempre gostou de festas, e foi assim que os bailes da família Uckermann ganharam fama na região. Todos a amavam. Era educada e doce. Exceto quando me flagrava voltando do riacho.
Uma vez, eu tinha uns dez anos, meu pai viajou por alguns dias a fim de comprar uma nova matriz para o estábulo. Minha mãe sempre sentia sua falta e ficava andando pela casa aos suspiros. Aquilo me deixava maluco, então resolvi sair.
Encontrei alguns garotos da vila no caminho e decidimos pescar no riacho perto de casa. A pescaria não rendeu muito — a menos que contássemos o sapo que consegui pegar —, e imagino que a culpa tenha sido nossa, já que entramos na água e demos início a uma guerra de lama.
O sol já estava baixo quando voltei para casa com o sapo no bolso e as roupas duras de lama. Naturalmente, esquivei-me das entradas principais, correndo para a lateral do edifício. O alçapão que havia na adega dava sobre a sala de música e tinha o tamanho exato para que eu pudesse passar por ele.
— Ora, mas vejam só — exclamou a voz de minha mãe assim que levantei a portinhola. Eu só podia ver seus sapatos e a barra de seu vestido amarelo. — Parece que temos um ratinho aqui.
Fugir estava fora de questão. Eu tinha dez anos, já cavalgava sozinho e até havia tomado pontos na cabeça uns meses antes. Era um homem! E homens não fogem da mãe.
Prendendo a respiração, saí de meu esconderijo, mas mantive o olhar no chão, onde os nacos de argila que se desprendiam de minha roupa caíam e explodiam, sujando o assoalho.
— Oh, Christopher... — ela suspirou.
— Eu fui pescar com os garotos. — Cruzei as mãos nas costas.
— Estou vendo. Imagino que o peixe tenha lhe dado uma canseira danada e arrastado você pela margem do rio por muitos metros, para justificar toda esta imundície.
— Humm... Foi quase isso.
Ela estalou a língua.
— Quantas vezes eu já disse que não quero você naquele riacho, Christopher? Há buracos
profundos e raízes. Você pode enroscar o pé em uma delas e se afogar!
— Mas eu nado muito bem! O papai disse que eu sou quase um peixe.
— Um peixinho coberto de lama até a raiz dos cabelos. — Ela pegou minha mão e a examinou. — Vá para o banho e se livre de toda esta sujeira. Vou conferir suas orelhas e unhas mais tarde.
— Sim, senhora.
Fiz a volta, o olhar em minhas botas sujas, mas ela me impediu de ir para o quarto colocando um dedo sob meu queixo, obrigando-me a encontrar seu olhar azul. Seus cabelos pálidos estavam presos em um penteado repleto de caracóis.
— Prometa que não voltará ao riacho sozinho.
— Mas, mãe...
— Prometa, Christopher.
— Está bem! Não voltarei lá sem uma babá!
Ela riu, fazendo aparecer duas covinhas em suas bochechas.
— Quando fica zangado assim, lembra-me tanto o seu pai. Ele tem essa mesma expressão quando eu o expulso do quarto por estar emporcalhando o piso. Parece que toda a areia do estábulo volta para casa com ele. Com vocês dois! — Ela observou o chão cheio de terra.
Acabei sorrindo, o peito estufado. Se havia alguém neste mundo a quem eu queria me assemelhar, esse homem era Víctor Uckermann.
Minha mãe depositou um beijo em minha testa.
— Vá se lavar.
Eu estava quase na porta quando ela disse:
— E livre-se do sapo que está no seu bolso antes que Madalena o veja e desmaie como da outra vez.
Resmungando, fui até o jardim e deixei o sapo sob uma das roseiras. Por um infortúnio do destino, Madalena escolheu justo aquela tarde para colher flores e fazer um novo arranjo para o quarto de minha mãe, já que esta fora acometida por uma de suas crises de enxaqueca. E foi uma infeliz coincidência que o sapo tenha gostado da governanta e pulado em suas saias. Naturalmente, ela desmaiou e eu tive de ajudar Gomes a carregá-la para dentro.
Era um milagre que Madalena ainda trabalhasse para mim.
— Onde está sua adorável esposa? — Almeida inquiriu, tirando-me do devaneio.
— Não a vejo faz mais de um quarto de hora.
— Marina — eu disse apenas, fazendo-o rir outra vez.
Almeida tinha verdadeira afeição por Sofia. E seu fascínio ia muito além da descoberta de que Dulce tinha vindo do futuro. É claro que o cientista dentro dele ainda buscava respostas, tentava encaixar em uma lógica todos os fatos ilógicos acerca da viagem no tempo. Tivemos longas conversas sobre o tema desde que ele me informara que estava a par da verdade. O deslumbramento de Almeida por Dulce provinha, antes, da admiração por seu caráter firme, por sua mente ímpar.
— É espantoso quanto sua filha e sua esposa se assemelham, Christopher. Nunca vi dois gênios tão idênticos.
— Sim, e isso é extraordinário. Na maior parte do tempo, pelo menos. — Tomei um bom gole de vinho. — Quando Dulce teima com alguma coisa, é difícil demovê-la de tal ideia. Eu diria impossível, Almeida. E, se continuar assim, Marina será ainda pior. Não sei se estou pronto para lidar com duas.
Ele escondeu o riso atrás da taça, antes de esvaziá-la. Quando voltou a falar, estava sério.
— Espero que nenhuma das duas precise de meus cuidados enquanto eu estiver fora. Vou acompanhar Júlio até a casa de meu irmão. Faz tempo que não o visito.
Devo retornar dentro de uma semana, mas deixarei Lucas encarregado de meu consultório.
Eu o fitei com divertimento.
— Naturalmente, isso nada tem a ver com o fato de seu pupilo não estar conseguindo conquistar a confiança dos pacientes com o senhor por perto.
— Naturalmente. — Ele sorriu de volta.
Uma comoção na porta da frente capturou minha atenção. Parada sob o batente, vestida de negro da cabeça aos pés, estava a viúva Miranda Mendoza. A mulher se mudara havia pouco de uma pequena província na Argentina para a vila, mas já causara grande estardalhaço. Sua beleza atraía a maioria dos homens, inclusive os casados. Corria à boca pequena que ela procurava um novo marido, pois o falecido lhe deixara apenas dívidas de jogo. No entanto, a história que se comentava nos recantos frequentados apenas pelos cavalheiros era outra. Ao que parecia, os problemas financeiros já não preocupavam a viúva, pois o senhor Albuquerque, um de meus vizinhos mais antigos, cuidara de tudo.
— Imagino que sua irmã não tenha ouvido os boatos quando convidou a senhora Mendoza para o baile — comentou Almeida.
— Sinceramente, espero que não, Alberto. Deve tê-la convidado por educação, sem saber a posição em que colocou a mãe de uma de suas mais queridas amigas. Presumo que eu deveria ter alertado Maite, mas como tocar nesse assunto com uma menina?
— Compreendo, meu amigo.
A senhora Albuquerque, do outro lado do salão, observava com uma fúria desmedida a recém-chegada receber a atenção de diversos cavalheiros. Seu marido também mantinha o olhar na jovem viúva, e pouco fazia para ocultar seu deslumbramento.
Peguei o relógio no bolso do meu paletó e olhei para o mostrador. Já fazia mais de meia hora que Dulce fora colocar Marina para dormir.
— Com licença, doutor. Vou verificar se está tudo bem com Marina.
Ele aquiesceu e eu me retirei da sala discretamente. No corredor, encontrei alguns empregados alvoroçados pelo caminho, mas passaram por mim quase sem me notar. A música ecoava por toda a casa, abafando os sons de meus passos.
Ao chegar ao quarto de nossa filha, conjugado ao nosso, notei a porta entreaberta e toquei a maçaneta, empurrando-a ligeiramente.
O quarto que inicialmente fora destinado a mim tão logo me casei — e Dulce se opôs veementemente à ideia — tinha sido redecorado. O papel de parede agora trazia delicados buquês em pálidos tons de rosa, e a colcha sobre a cama estreita recostada à parede tinha a mesma estampa. As cortinas combinavam com o dossel sobre o berço, no mesmo rosa suave das rendas que saíam por debaixo do colchão. Uma poltrona dourada fora disposta entre o berço e a cômoda de laca branca.
Dulce estava no centro do aposento, as saias de seu vestido azul-escuro chiando de encontro ao piso conforme ela embalava nossa filha.
— Não sei quanto o mundo é bom, mas ele está melhor desde que você chegou e explicou o mundo pra mim — cantarolava. — Não sei se esse mundo está são, mas pro mundo que eu vim já não era. Meu mundo não teria razão se não fosse a Marina...
Marina amava aquela canção. Sofia tinha me contado que era criação de um famoso músico de seu antigo tempo, e me ensinara a letra, substituindo o nome da filha do compositor pelo da nossa. Até mesmo Maite a aprendera. Tudo para fazer Marina dormir com mais facilidade. Fazia pouco tempo que ela finalmente se rendera ao sono durante a noite, em parte graças à descoberta de Dulce por se gosto musical, em parte pelas dezenas de chupetas.
Entrei e fechei a porta sem fazer barulho. Dulce ergueu os olhos e sorriu.
Aproximei-me dela, abraçando-a por trás, deixando a cabeça pender sobre seus cabelos perfumados, presos em um coque frouxo que lhe caía tão bem. Dessa posição pude acompanhar a luta da menininha contra o cansaço. Suas piscadas eram pesadas e desfocadas, mas ela tentava bravamente se manter acordada. O movimento da chupeta continuava frenético.
Começamos a balançar devagar, uma dança marcada pelo cantarolar de Dulce.
Não levou muito tempo para que minha menininha se rendesse. Minha esposa deixou a voz morrer pouco a pouco, mas continuamos a dançar. Os olhos de Marina permaneceram fechados, a chupeta amarela se movia para a frente e para trás em uma cadência suave agora. Soltei Dulce e a ajudei a colocar Marina no berço. Então ficamos ali, lado a lado, admirando nossa obra-prima. Passei um braço por sua cintura, trazendo-a para mais perto. Permanecemos assim até que Madalena bateu à porta de leve. Ela ficaria velando o sono de Marina, pois temia que a algazarra do baile pudesse acordá-la.
Dulce e eu deixamos o quarto na pontinha dos pés. Já no corredor, ela levou a mão à nuca, massageando-a.
— Essa correria do baile quase me deixa louca. Não sei como as pessoas daqui suportam isso várias vezes ao ano.
Eu me coloquei a suas costas e levei as mãos a seu pescoço, fazendo movimentos circulares com os polegares.
— Ah, meu Deus, isso é o céu, Christopher — ela gemeu, tombando a cabeça para o lado.
— Você está sobrecarregada. Precisa de descanso. O que acha de retomarmos nosso plano de uma lua de mel?
Dulce se virou, os olhos muito abertos.
— Você tá falando sério?
Logo após o casamento — e foi logo após mesmo —, fui informado sobre uma suposta maldição que estava matando as jovens recém-casadas. Na época, pareceu-me lógico adiar a viagem. Depois, quando tudo foi explicado e ficamos livres para ir aonde quiséssemos, Marina aconteceu, e mais uma vez a viagem foi adiada.
— Por que não? Acho que posso me ausentar por uma semana. Creio que você também consiga ficar longe da sua fábrica por uns dias. E Marina pode ficar aos cuidados de Madalena e Maite. Ela está maior agora — fui logo me apressando em dizer, pois no último outono, na noite de nosso primeiro aniversário de casamento, eu tinha levado Dulce para a cidade, onde jantamos e depois assistimos a um concerto. Nós dois estávamos exaustos da rotina de fraldas, mamadeiras e privação de sono, e aquela distração foi mais que bem-vinda.
Porém, como eu havia suspeitado, Dulce não conseguira se desligar totalmente de Marina e temia que a pequena fosse precisar dela.
— Ela está bem — eu dissera ao perceber que o segundo ato começava e Dulce ainda não tinha conseguido prestar atenção em absolutamente nada. — A senhora Madalena ajudou minha mãe quando eu e Maite nascemos. Ela sabe lidar com crianças.
— Eu sei disso, ou jamais teria deixado nossa filha com ela. Mas é a primeira vez que a deixamos com alguém e... E se a Nina...
— O quê? — Um sorriso de diversão me curvou a boca. — O que uma bebezinha de quatro meses pode fazer além de chorar, encher as fraldas e mamar?
Dulce soltou um longo suspiro.
— Eu sei, eu sei. Só... estou um pouco insegura. E... sentindo muita saudade dela.
— É por isso que eu lhe comprei isto. — Alcancei o colar no bolso do meu paletó e o depositei em sua palma enluvada.
Ela examinou o relicário que pendia da corrente e teve de aproximá-lo do rosto, pois as tochas do camarote não forneciam muita luminosidade. Ao abri-lo, Dulce se surpreendeu ao ver em seu interior um retrato minúsculo de Marina.
— Foi você quem pintou isto?
Fiz que sim, sem jeito.
— Mas não sou bom com miniaturas. Podemos falar com um especialista ou...
— Não! Eu amei, Christopher! É tão ela! Os olhinhos brilham! Obrigada! — E me agarrou pelo pescoço, colando a boca na minha. Quando se afastou, foi para girar na cadeira e me oferecer seu lindo pescoço. Alguns vizinhos de balcão nos lançaram olhares reprovadores, mas Dulce não percebeu e eu não me importei.
Tudo o que eu queria era vê-la feliz, e, se me beijar em público a deixava feliz, não seria eu a impedi-la.
Prendi o novo cordão ao redor de seu delicado pescoço, demorando-me um pouco mais que o necessário, pois meus dedos se recusavam a parar de tocá-la.
Ela virou a cabeça, os olhos subitamente inflamados. Uma espécie de antecipação vibrou abaixo de meu umbigo. Deus do céu, como aquele maldito espetáculo custou a terminar. Deixamos o teatro antes de as cortinas se fecharem por completo e voamos para o hotel. Nunca duas quadras me pareceram tão distantes. Mas valeu a pena. Assim que nos vimos na privacidade do quarto, todo o acúmulo de desejo refreado pela interrupção de uma bebezinha exigente veio à tona, e a noite de amor se prolongou até a tarde seguinte.
Eu queria aquilo de novo, por isso a ideia de enfim termos uma lua de mel me parecia mais e mais tentadora.
— Você tá me dizendo que a gente finalmente pode ter uma lua de mel de verdade? Mesmo que seja curta? — Dulce não sabia se ria ou se ficava surpresa.
— Estou. Uma lua de mel sem interrupções. Sem empregados aparecendo do nada, sem problemas a serem resolvidos, parentes intrometidos ou bebezinhas exigentes que gostam de dormir no colo da mamãe ou do papai. Eu amo nossa garotinha mais que qualquer coisa neste mundo, Dulce. Ela tem meu coração em suas mãozinhas. Mas também amo você, e sinto falta de tê-la apenas para mim, mesmo que por uns poucos dias.
Sua resposta foi me empurrar de encontro à parede e enredar os dedos nas lapelas do meu paletó, o rosto muito próximo do meu.
— Também sinto falta de ter você só pra mim. — Seu olhar era puro fogo agora.
— Diga-me para onde deseja ir e eu a levarei. — Foi inevitável minhas mãos buscarem suas costas, sua cintura.
— Me leve pra onde você qui... — Ela espirrou. — Ah, saco. Só falta ter pegado a gripe da senhora Herbert.
— Está se sentindo bem?
— Não — respondeu Dulce. Abri a boca, subitamente preocupado, mas ela me impediu de perguntar qualquer coisa ao pousar um dedo sobre meus lábios. — Antes que você pire, eu estava só brincando! As pessoas vivem espirrando, Christopher. E agora, voltando ao assunto, tudo aqui é diferente pra mim, então qualquer lugar será ótimo. Se eu conhecesse melhor a região, até arriscaria te raptar. Se estivéssemos no meu... — Ela se deteve, então sacudiu a cabeça, a mão em meu rosto escorregando para o meu peito.
— No seu tempo — completei em voz baixa, colocando no lugar alguns fios que escaparam de seu penteado. — Não precisa fingir que não sente falta, Dulce.
Você sabe que eu sei que sente.
— Mas eu não sinto, Christopher. — Ela deslizou os dedos por meus ombros e os prendeu em minha nuca, fitando-me com franqueza.
— Mas...? — insisti.
— Por que você acha que tem um mas?
— Tem?
Ela se encolheu de leve.
— As cartas que eu escrevo para Nina ajudam muito. Mas ainda fico imaginando o que estará acontecendo com ela, se está bem, se o Rafa aprontou alguma e está fazendo minha amiga sofrer. Eu queria ter alguma notícia deles. Só isso.
E eu queria que ela pudesse ter tais notícias. Dulce tinha deixado muito para trás.
E tentava bravamente se adaptar ao meu mundo, enquanto a mim coube apenas a fácil tarefa de amá-la. Não me parecia justo.
Um estrondo ribombou pela casa. Dulce se assustou. Minha primeira reação foi espiar dentro do quarto. Madalena estava sentada ao lado do berço, bordando.
Marina dormia.
— Acho melhor voltarmos pra festa — disse Dulce. — Sua irmã vai ficar preocupada.
— Vamos. Mas, meu amor, você sabe que se eu pudesse moveria céus e terra para lhe trazer notícias dos amigos que deixou, não sabe?
— Eu sei. E essa é uma das razões pelas quais eu te amo tanto. — Dulce alisou as saias de cetim. — Como é que eu estou?
Examinei sua figura. O vestido azul tinha um decote amplo que ia de um ombro a outro, arrematado por pequenas mangas. O corpete se moldava a suas curvas de tal maneira que me perguntei se madame Georgette antecipara a bela visão que me proporcionaria. Três tranças delicadas finalizavam seu penteado despojado, alguns fios lhe caindo ao redor do rosto. Eu não precisava ver seus pés para saber o que ela calçava.
— Está tão linda que não tenho vontade alguma de levá-la para aquela sala e permitir que outro homem coloque os olhos em você.
Ela sorriu, radiante, levando a mão ao pescoço. Longo e fino, com aquela curva tentadora que fazia meus pensamentos se embaralharem. Seus dedos resvalaram na ponta de sua orelha nua.
— Ah, droga, esqueci os brincos! Maite insistiu que eu deveria usá-los para não fazer feio.
— Isso seria impossível, Dulce. — Aproximei-me dela e abaixei a cabeça, beijando o local exato onde sua mão estivera. — Você é tão bonita que deixaria envergonhado até o mais vistoso diamante.
— Christopher...
— Sim? — Seu aroma era doce como uma manhã de primavera. Tão deliciosamente doce que não resisti e corri a língua por sua pele.
— O baile... — Suas mãos se prenderam em meus ombros. E não foi para me repelir.
— O que tem ele? — Continuei explorando a pele delicada com a ponta da língua.
Ela se agarrou a meu paletó, a cabeça inclinada para o lado, permitindo-me ir mais além. E eu teria ido, se a voz irritante — e muito inoportuna — de minha tia não me tivesse impedido. A mulher parecia estar sempre à espera do momento mais inconveniente para dar o ar da graça. Eu me perguntei como Alfonso tinha conseguido engravidar Anahí tendo a mãe por perto.
Dulce levou um pouco mais de tempo para perceber a intromissão, e pareceu confusa ao se deparar com a figura de Cassandra nos observando de cara fechada.
— Eu devia ter imaginado que ela o distraía — a mulher me disse. — Senhora Uckermann, não acredito que julgue adequado sair de fininho do baile em que é a anfitriã.
— Só vim colocar Marina na cama.
— Um dos criados podia ter feito isso. — Cassandra abanou o leque em frente ao rosto.
— Até podia, mas prefiro que seja eu a fazer isso.
— Há uma boa razão para a senhora vir procurar minha esposa? — atalhei, antes que aquela conversa acordasse Marina, a uma porta de distância.
— Ora, Christopher, é claro que um bom motivo me trouxe aqui. Alguém precisa fazer alguma coisa ou Maite terminará esta noite arruinada! Está dançando pela segunda vez com aquele aprendiz de curandeiro! A menina perdeu o juízo! Se ela dançar mais uma quadrilha com ele, amanhã todos estarão dando o noivado como certo!
Dulce me olhou, atônita. Ela ainda se chocava com algumas formalidades deste século. Assenti uma vez, para lhe assegurar que minha tia não havia perdido o juízo.
— Bom, então tá. — Dulce ergueu os ombros. — Vou falar com a Maite e proibi-la de dançar com o William de novo, porque... Por que mesmo? — Ela me encarou.
— Seria um escândalo se William não pedisse sua mão depois de dançar três quadrilhas consecutivas. Ela viraria motivo de chacota. Vou falar com ela.
— Não! — Dulce se colocou na minha frente, impedindo que eu avançasse. — Isso a deixaria muito envergonhada e acabaria com a diversão dela. Deixa que eu faço isso, Christopher. Vou falar com jeitinho.
Dulce provavelmente estava certa. Então, mesmo a contragosto, acabei assentindo.
— Eu só preciso pegar os brincos antes — explicou ela.
— Eu pego para você. — Se Maite pretendia aceitar uma terceira dança, Dulce tinha de falar com ela antes disso.
— Tudo bem. — Ela se agarrou às lapelas do meu paletó outra vez. — Até já. — E me beijou antes de sair correndo, o vestido erguido até os joelhos, exibindo os tênis vermelhos que ela tanto amava. Foi impossível não sorrir.
— Até que ela não é de todo ruim... — Cassandra também observava Dulce . — É como um diamante bruto. Talvez com alguma lapidação...
Olhei fixo para ela.
— Ela é perfeita como é. Fique longe dela. Com sua licença, senhora.
— Christopher, meu querido, espere. — Ela tocou meu braço, obrigando-me a parar. — Até quando pretende me tratar com tanta desconfiança? Já lhe disse muitas vezes que me arrependi do que fiz. Maite já me perdoou. Até sua esposa me perdoou!
— Ambas têm a memória curta e um coração bom demais para seu próprio bem.
— Anahpi logo dará à luz — ela murmurou. — E gostaria muito de ter a amiga por perto. Se você permitir, eu gostaria que Elisa passasse uma temporada conosco até o bebê nascer.
— A senhora tem um senso de humor muito peculiar.
— Seja racional, Christopher. O que eu poderia fazer? Alfonso está casado. Não há mais nada a ser feito a não ser lamentar.
Balancei a cabeça.
— Não impedirei que Maite visite a amiga sempre que quiser, mas isso é tudo. — Eu não confiava naquela mulher, e jamais poria minha irmã em risco outra vez por mero descuido. Apesar de suas vãs tentativas de se reaproximar de mim, Cassandra estava conseguindo se acercar de Dulce, mas nem sempre conseguia esconder sua insatisfação com algumas das atitudes de minha mulher. Não era tão descabido assim pensar que ela estivesse maquinando algum plano para afastar Maite da influência de Dulce, para então assumir sua educação.
Fiz uma curta reverência e entrei em meu quarto. Andei até a cômoda e abri a primeira gaveta, procurando pela caixa de joias de Dulce.
Um barulho sutil, quase um lamento, fez meu coração disparar. Eu tinha ouvido aquele som apenas uma vez na vida, mas jamais o havia esquecido nem haveria de esquecer. Ele precedera o pior pesadelo de minha vida: o dia em que Dulce desaparecera no ar.
Virei a cabeça, vasculhando o quarto, as mãos subitamente trêmulas. Uma dor apunhalou meu peito quando encontrei a fonte do ruído. Sobre a mesa de cabeceira de Dulce, o retângulo prateado que a trouxera para mim cintilava como uma estrela.
GrazihUckermann: Continuando linda bjss S2
kaillany: Continuando linda bjss
tahhvondy: é muito fofo, ainda mais ele com ciumes kk bjss
Comentem!!!
Autor(a): Fer Linhares
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Desde que Dulce tinha retornado, eu me sentia tão feliz que às vezes temia estar infringindo alguma lei. A felicidade era tanta e tão plena que eu me via constantemente ansioso, esperando algo ruim acontecer. E, olhando agora para aquela maldita máquina, tive certeza de que meus sentidos estiveram certos.Apesar de tê-la visto ...
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Comentários da Fanfic 63
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tahhvondy Postado em 14/02/2017 - 17:51:28
nossa simplismente amei!cada um dos livros maravilhosos essa historia e incrível que não tem como não ser apaixonar por ela o amor deles e lindo o Christopher e mt fofo vou sentir saudades dessas confussões deles
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GrazihUckermann Postado em 13/02/2017 - 19:10:55
Eu AMEI! não sei qual dos livros foi o melhor. obrigada por postar essa história incrível, essa história é muito linda. Christopher é muito fofo <3 O amor deles é incrível. Quando ele a esqueceu ele se apaixonou por ela de novo, e eu tive que me segurar pra não chorar nessa parte s2 Fiquei feliz com o final da Madelena e do Seu gomes. Espero que tenha outro Baby vondy no livro da Maite, dessa vez tem que ser menino kkjk e não terá um nome melhor que Alexander para dar ao menino neh?? Estarei na próxima fanfic com você, comentando em todos os capitulos. Tchau. um diaa eu volto para ler de novo. (Acho que não demora muito, por amei a história e quero muito ler de novo) s2
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tahhvondy Postado em 13/02/2017 - 10:57:28
ai já ta acabando que triste mas ainda bem q vx consequiu baixa o da Maite
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GrazihUckermann Postado em 10/02/2017 - 20:35:51
Continuaaaaaaaaaaaaa! s2
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tahhvondy Postado em 09/02/2017 - 11:28:34
chequei continua por favor
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GrazihUckermann Postado em 09/02/2017 - 09:49:37
Continuaaaaa! s2
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GrazihUckermann Postado em 07/02/2017 - 16:32:39
FINALMENTE! CONTINUAAAAAAAAAAAAAA s2
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GrazihUckermann Postado em 06/02/2017 - 21:08:32
T-T
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GrazihUckermann Postado em 06/02/2017 - 21:02:21
Caraca essa confusão me deixou confusa kkkjk quando ele esquecer ela, ele meio que vai sumir?? vai aparecer no século dezenove como se nada tivesse acontecido?? é isso? não entendi kkkjk Continue mulher, não me deixe ansiosa! s2
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GrazihUckermann Postado em 05/02/2017 - 22:21:37
ai me deus!!!! CONTINUAAAAAA T-T