Fanfic: 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA) | Tema: Cristianismo, Islamismo, Fé, Amor
Sentada à janela que dava para o jardim, onde Karim e eu
havíamos brincado em criança, sentia no rosto o vento que soprava
da Índia, dobrando os topos das árvores. Parecia-me perceber nele
uma mensagem extraordinária! Meus ouvidos recusavam-se a
acreditar no que ouviam.
— O Senhor não pode estar-me realmente dizendo isso —
disse sorrindo. — Estou simplesmente escutando vozes! O Senhor
não quer que eu vá ao funeral de Karim. Não ficaria bem. Eu
acabaria ofendendo pessoas enlutadas.
Ainda no meio da objeção, reconheci uma vez mais que o
sentimento de sua presença começava a diminuir. Imediatamente,
com esse sinal, comecei a perguntar a mim mesma se o Senhor
realmente estava-me dizendo que fizesse essa coisa extraordinária,
ir direto ao rosto das hostilidades do boicote.
Finalmente, suspirando profundo, levantei do meu lugar à
janela, dei de ombros e disse em voz alta:
— Estou começando a aprender, Senhor. Meu sentimento da
coisa certa a fazer nada é comparado com o teu! Irei, uma vez que
o Senhor me diz que vá.
E, é claro, o sentimento de sua presença retornou. Que série
extraordinária de experiências estava tendo com a ida e a vinda de
sua glória! Ainda assim, sentia que estava somente principiando a
compreender o significado de tudo isso. Como poderia eu aprender
a permanecer em sua presença por um tempo sempre crescente?
Eu não tinha maneira de saber que nos próximos dois meses
encontraria uma série de experiências que me fariam dar um
passo mais nesse processo de aprendizagem.
Hesitei, em pé, na rua de paralelepípedos da casa de Karim. A
despeito de minha promessa em obedecer, sentia-me como uma
pomba solitária entre mil gaviões. Inspirando o ar profundamente
dirigi-me à casa de pedra, em meio a tantas iguais a ela. Fui ao
jardim, subi à varanda, sentindo os olhares dos aldeões sentados
ao redor em silêncio. Entrei na casa antiga com tetos gravados e
paredes de gesso brancas, onde Karim e eu tantas vezes tínhamos
rido e brincado juntos.
Agora não havia risos. Além da tristeza da família enlutada, a
frieza de uma dezena de olhares desafiadores dava-me arrepios.
Olhei para uma prima com quem eu tinha sido muito íntima.
Nossos olhos se encontraram por um instante; minha prima
rapidamente voltou a cabeça e começou a falar com uma vizinha.
Aprumando os ombros, entrei na sala de estar da casa de
Karim, sentei-me num dos grossos colchões de algodão que tinham
sido colocados no assoalho rodeados de almofadas para as pessoas
se reclinarem. Ajeitei o sari em torno de minhas pernas.
Subitamente as pessoas começaram a perceber quem eu era. A
conversa quieta que tinha enchido a sala, de repente parou. Até as
mulheres que contavam as contas do rosário, cada conta uma
oração a Alá, cessaram sua atividade e levantaram os olhos. A sala,
que estivera quente com o calor do início de verão, e por causa dos
muitos corpos juntos, quase que ombro a ombro, de repente
parecia gelada.
Eu não disse nada, não fiz nenhuma tentativa em ser social,
simplesmente abaixei os olhos e fiz minhas preces: "Senhor Jesus",
sussurrei em meu coração, "está comigo enquanto te represento a
este grupo de amigos e parentes queridos que estão tão tristes pela
morte de Karim."
Depois de uns quinze minutos o fluxo da conversa começou
de novo. Era hora de prestar homenagem à esposa de Karim. Com
a cabeça erguida, levantei-me do colchão e entrei na sala adjacente
onde jazia o corpo de Karim, num caixão alto, fundo e preparado
de acordo com a crença muçulmana de que o morto deve poder
sentar-se quando os anjos vierem questioná-lo antes de entrar no
céu. Dei os pêsames à esposa de Karim; olhei para a face tranqüila
do meu querido primo enrolado na mortalha nova e branca de
algodão e murmurei para mim mesma uma oração a Jesus pelo
espírito deste homem. Oh, como desejava ter tido a oportunidade
de conversar com ele antes de sua morte!
Um murmúrio baixo enchia a sala enquanto os membros da
família mais chegados oravam por Karim. As senhoras levantavam-se
havíamos brincado em criança, sentia no rosto o vento que soprava
da Índia, dobrando os topos das árvores. Parecia-me perceber nele
uma mensagem extraordinária! Meus ouvidos recusavam-se a
acreditar no que ouviam.
— O Senhor não pode estar-me realmente dizendo isso —
disse sorrindo. — Estou simplesmente escutando vozes! O Senhor
não quer que eu vá ao funeral de Karim. Não ficaria bem. Eu
acabaria ofendendo pessoas enlutadas.
Ainda no meio da objeção, reconheci uma vez mais que o
sentimento de sua presença começava a diminuir. Imediatamente,
com esse sinal, comecei a perguntar a mim mesma se o Senhor
realmente estava-me dizendo que fizesse essa coisa extraordinária,
ir direto ao rosto das hostilidades do boicote.
Finalmente, suspirando profundo, levantei do meu lugar à
janela, dei de ombros e disse em voz alta:
— Estou começando a aprender, Senhor. Meu sentimento da
coisa certa a fazer nada é comparado com o teu! Irei, uma vez que
o Senhor me diz que vá.
E, é claro, o sentimento de sua presença retornou. Que série
extraordinária de experiências estava tendo com a ida e a vinda de
sua glória! Ainda assim, sentia que estava somente principiando a
compreender o significado de tudo isso. Como poderia eu aprender
a permanecer em sua presença por um tempo sempre crescente?
Eu não tinha maneira de saber que nos próximos dois meses
encontraria uma série de experiências que me fariam dar um
passo mais nesse processo de aprendizagem.
Hesitei, em pé, na rua de paralelepípedos da casa de Karim. A
despeito de minha promessa em obedecer, sentia-me como uma
pomba solitária entre mil gaviões. Inspirando o ar profundamente
dirigi-me à casa de pedra, em meio a tantas iguais a ela. Fui ao
jardim, subi à varanda, sentindo os olhares dos aldeões sentados
ao redor em silêncio. Entrei na casa antiga com tetos gravados e
paredes de gesso brancas, onde Karim e eu tantas vezes tínhamos
rido e brincado juntos.
Agora não havia risos. Além da tristeza da família enlutada, a
frieza de uma dezena de olhares desafiadores dava-me arrepios.
Olhei para uma prima com quem eu tinha sido muito íntima.
Nossos olhos se encontraram por um instante; minha prima
rapidamente voltou a cabeça e começou a falar com uma vizinha.
Aprumando os ombros, entrei na sala de estar da casa de
Karim, sentei-me num dos grossos colchões de algodão que tinham
sido colocados no assoalho rodeados de almofadas para as pessoas
se reclinarem. Ajeitei o sari em torno de minhas pernas.
Subitamente as pessoas começaram a perceber quem eu era. A
conversa quieta que tinha enchido a sala, de repente parou. Até as
mulheres que contavam as contas do rosário, cada conta uma
oração a Alá, cessaram sua atividade e levantaram os olhos. A sala,
que estivera quente com o calor do início de verão, e por causa dos
muitos corpos juntos, quase que ombro a ombro, de repente
parecia gelada.
Eu não disse nada, não fiz nenhuma tentativa em ser social,
simplesmente abaixei os olhos e fiz minhas preces: "Senhor Jesus",
sussurrei em meu coração, "está comigo enquanto te represento a
este grupo de amigos e parentes queridos que estão tão tristes pela
morte de Karim."
Depois de uns quinze minutos o fluxo da conversa começou
de novo. Era hora de prestar homenagem à esposa de Karim. Com
a cabeça erguida, levantei-me do colchão e entrei na sala adjacente
onde jazia o corpo de Karim, num caixão alto, fundo e preparado
de acordo com a crença muçulmana de que o morto deve poder
sentar-se quando os anjos vierem questioná-lo antes de entrar no
céu. Dei os pêsames à esposa de Karim; olhei para a face tranqüila
do meu querido primo enrolado na mortalha nova e branca de
algodão e murmurei para mim mesma uma oração a Jesus pelo
espírito deste homem. Oh, como desejava ter tido a oportunidade
de conversar com ele antes de sua morte!
Um murmúrio baixo enchia a sala enquanto os membros da
família mais chegados oravam por Karim. As senhoras levantavam-se
e liam versículos do Alcorão. Tudo era parte do ritmo de vida e
morte que eu conhecia tão bem. Eu estava voltando as costas a
tudo isso. Antes do pôr-do-sol de hoje, fariam uma procissão até o
cemitério e toda a família seguiria o esquife. Os carregadores
deporiam o caixão ao lado da sepultura e o sacerdote clamaria:
Deus é grandioso. Senhor, este é teu servo, filho de teu servo. Ele
testificou não existir outro Deus senão a ti, e que Maomé é teu servo
e teu mensageiro ...
Enquanto escutava o gemido suave na sala, via a mãe de
Karim ajoelhada junto ao esquife. Ela parecia tão perdida que de
repente senti um impulso avassalador de colocar-me a seu lado.
Teria eu coragem para isso? Não seria uma afronta? Devia eu
dizer-lhe algo a respeito de Jesus? Provavelmente não. A minha
presença de cristã traria Jesus para o lado dela de um modo
amoroso.
Assim, fui até a mãe de Karim e coloquei os braços ao seu
redor, dizendo-lhe em voz suave e acariciante o grande pesar que
eu sentia: "Karim e eu éramos tão íntimos. Que Deus a abençoe e a
conforte." A mãe de Karim voltou o rosto para mim. Seus olhos
negros e cheios de lágrimas agradeceram-me e eu sabia que Jesus
nesse mesmo instante confortava-lhe o coração cheio de dor.
Mas a mãe de Karim era a única pessoa na sala que parecia
aceitar o que eu estava fazendo. Ao deixá-la e voltar a unir-me aos
pranteadores, um primo — que também havia sido íntimo —
levantou-se ruidosamente e saiu da sala. Outro primo seguiu-o. E
depois mais outro.
Fiquei sentada lutando, de um lado, com as emoções de
minha própria dor por Karim e por sua família e de outro, com este
profundo embaraço. Meu coração batia descompassadamente. A
hostilidade estava-me atingindo. Tive de lutar a fim de ficar
sentada o tempo apropriado, dizer adeus e sair da sala. Ao sair
senti que todo mundo olhava fixamente para mim.
No carro, fiquei sentada por alguns instantes atrás do volante,
tentando controlar-me. Eu tinha obedecido mas o preço fora alto.
Certamente que eu teria preferido ficar em casa em vez de entrar
na boca desta ira declarada.
Estava enganada ao pensar que tinha de andar por esse vale
somente uma vez. Algumas semanas mais tarde, quando o calor do
verão começava a chegar a nosso distrito, outro primo faleceu. De
novo, fiquei sabendo de sua morte por meio de meus criados. De
novo, em obediência a Deus, encontrei-me entrando,
relutantemente, em uma sala cheia de pranteadores, na presença
enregelada da discórdia e do ódio. Por um ato de força de vontade
desviei a atenção de mim mesma, focalizando-a na pessoa
realmente destituída, a viúva de meu primo. Ela tinha um filho que
ia fazer cinco anos, a mesma idade de Mamude; parecia tão
perdida e sozinha ao lado do esquife que chorei por ela e por seu
marido.
Então justamente como tinha acontecido no funeral de Karim,
fui impulsionada para essa mulher em desespero. Ao aproximar-me,
nossos olhos se encontraram, percebi a hesitação passar-lhe
pelo rosto manchado de lágrimas. Então, com um ar de repentina
determinação, sabendo estar indo contra a vontade da família,
estendeu-me a mão. Ao segurar-lhe a mão idosa e que tremia nas
minhas, chorei em silêncio. Trocamos somente uma ou duas
palavras, mas meu coração orava com fervor para que o
Espírito Santo a tocasse em sua destituição e cumprisse sua
promessa, a esta querida muçulmana: "Bem-aventurados são os
que choram."
— Obrigada, Bilquis, obrigada —, disse a viúva num sussurro
ao soltar-me a mão. Abracei-a e saí da sala.
Houve uma estranha e rápida sucessão de mais dois funerais.
Isto era muito incomum até mesmo para uma família grande como
a nossa. E em cada caso foi-me dito, muito clara e distintamente
pelo Senhor, que eu saísse de minha casa segura e fosse ao lugar
onde precisavam de mim. Eu não devia falar muito. Devia deixar
que minha presença amorosa fosse sua única testemunha.
Nessa época o Senhor trabalhava comigo. Ele tinha tanto a
me ensinar e usava esses funerais como sala de aula.
Foi durante uma destas visitas a um funeral que descobri o
próximo grande segredo de permanecer em sua presença.
Num funeral muçulmano ninguém cozinha ou come até que o
corpo seja enterrado. Isto geralmente resulta em um dia de jejum e
na verdade, tal coisa não é sacrifício. Entretanto, naquele dia,
enquanto sentava isolada na sala apinhada de gente, descobri de
repente que desejava ter meu costumeiro chá da tarde. Era algo,
disse a mim mesma, que eu simplesmente não podia dispensar.
Finalmente, incapaz de controlar meu desejo, levantei-me e
murmurei uma desculpa qualquer. Eu tinha de lavar as mãos,
disse. Saí da casa e desci a rua até um pequeno café. Ali tomei o
meu precioso chá e voltei para junto dos pranteadores.
Imediatamente senti uma solidão estranha, como se um
amigo tivesse saído de junto de mim. É claro que eu sabia o que
era. A presença confortadora de seu Espírito havia-me deixado.
— Senhor —, disse para mim mesma — que fiz? E então eu
sabia. Tinha mentido enquanto dava a desculpa.
— Mas foi somente uma mentira inocente, Senhor — disse eu.
Não percebi nenhum conforto do Espírito. Só silêncio.
— Mas, Senhor —, continuei — não tenho de seguir mais
essas práticas do luto muçulmano. Além disso, simplesmente não
posso passar sem meu chá. O Senhor sabe disso.
Nenhum sentimento de seu Espírito.
— Mas, Pai —, continuei — não podia dizer-lhes que ia sair a
fim de procurar chá e bolos. Isso os teria magoado.
Nenhum Espírito.
— Está bem, Pai —, disse eu. — Compreendo. Errei em
mentir. Percebo que procurava a aprovação dos homens e que devo
viver somente para a tua aprovação. Sinto muito, de verdade,
Senhor. Magoei-te. Com tua ajuda não mais farei isso.
E com essas palavras sua presença confortadora inundou-me
de novo, como a chuva que cai num leito de rio ressecado.
Descontraí-me. Sabia que ele estava comigo.
E foi assim que aprendi a voltar para sua presença
rapidamente. Sempre que não sentia sua proximidade, sabia que o
havia entristecido. Voltava ao passado, até o momento em que
tinha sentido sua presença pela última vez. Então fazia uma revisão
de cada ato, cada palavra ou pensamento até descobrir onde me
havia desviado. Então confessava meu pecado e pedia seu perdão.
Aprendi a fazer isso com audácia crescente. Mediante esses
exercícios na obediência aprendi o segredo maravilhoso do
arrependimento. Arrependimento, descobri eu, não era remorso
lacrimoso mas sim admitir onde eu havia errado e fazer um voto
que com a ajuda dele nunca mais cometeria tal erro. Ao perceber
minha própria fraqueza, pude invocar sua força.
Foi durante essa época que descobri não haver mentira
inocente. Uma mentira é uma mentira e sempre procede de
Satanás, o pai das mentiras. Ele usa mentiras "inofensivas" e
inocentes a fim de iniciar-nos nesse hábito traiçoeiro. As mentiras
preparam o caminho para as futuras e maiores tentações. Satanás
murmura que uma mentira inocente pode ser "consideração" por
outras pessoas. Dobramo-nos ao mundo em vez de dobrarmo-nos
a Jesus, a Verdade.
Embora tenha aprendido essa lição num funeral de um
parente, foi o princípio de um novo tipo de vida para mim, no qual
tentei desarraigar toda a mentira. Desse dia em diante tentaria
policiar-me toda vez que estivesse prestes a dizer uma mentira
inocente. Certa vez uma missionária amiga convidou-me a uma
reunião à qual não queria assistir. Tinha decidido dar a desculpa
de ter outro compromisso. Um sinal de advertência soou dentro de
mim e estaquei justamente em tempo. Em vez disso, descobri que
podia dizer a verdade e ao mesmo tempo não magoar o sentimento
de ninguém, simplesmente dizendo: "Sinto muito, mas não poderei
estar lá."
Certo dia sentei-me para escrever uma carta a um amigo em
Londres e automaticamente comecei a escrever que estivera fora da
cidade por algum tempo e por isso não tinha podido responder à
sua última carta. Parei, com a caneta no ar.
Fora da cidade? Eu estivera aqui o tempo todo. Amarrotei o
papel, joguei-o na cesta de lixo e comecei de novo: "Querido amigo:
Por favor, perdoe-me o não ter respondido à sua maravilhosa carta
antes..."
Coisinhas, é verdade. Mas eu estava aprendendo que ter
cuidado com as pequenas coisas tornava muito mais fácil lidar
com as tentações maiores à medida que chegavam. Além disso, a
vida ficava muito mais fácil por não ter de passar muito tempo
tentando encontrar uma desculpa.
morte que eu conhecia tão bem. Eu estava voltando as costas a
tudo isso. Antes do pôr-do-sol de hoje, fariam uma procissão até o
cemitério e toda a família seguiria o esquife. Os carregadores
deporiam o caixão ao lado da sepultura e o sacerdote clamaria:
Deus é grandioso. Senhor, este é teu servo, filho de teu servo. Ele
testificou não existir outro Deus senão a ti, e que Maomé é teu servo
e teu mensageiro ...
Enquanto escutava o gemido suave na sala, via a mãe de
Karim ajoelhada junto ao esquife. Ela parecia tão perdida que de
repente senti um impulso avassalador de colocar-me a seu lado.
Teria eu coragem para isso? Não seria uma afronta? Devia eu
dizer-lhe algo a respeito de Jesus? Provavelmente não. A minha
presença de cristã traria Jesus para o lado dela de um modo
amoroso.
Assim, fui até a mãe de Karim e coloquei os braços ao seu
redor, dizendo-lhe em voz suave e acariciante o grande pesar que
eu sentia: "Karim e eu éramos tão íntimos. Que Deus a abençoe e a
conforte." A mãe de Karim voltou o rosto para mim. Seus olhos
negros e cheios de lágrimas agradeceram-me e eu sabia que Jesus
nesse mesmo instante confortava-lhe o coração cheio de dor.
Mas a mãe de Karim era a única pessoa na sala que parecia
aceitar o que eu estava fazendo. Ao deixá-la e voltar a unir-me aos
pranteadores, um primo — que também havia sido íntimo —
levantou-se ruidosamente e saiu da sala. Outro primo seguiu-o. E
depois mais outro.
Fiquei sentada lutando, de um lado, com as emoções de
minha própria dor por Karim e por sua família e de outro, com este
profundo embaraço. Meu coração batia descompassadamente. A
hostilidade estava-me atingindo. Tive de lutar a fim de ficar
sentada o tempo apropriado, dizer adeus e sair da sala. Ao sair
senti que todo mundo olhava fixamente para mim.
No carro, fiquei sentada por alguns instantes atrás do volante,
tentando controlar-me. Eu tinha obedecido mas o preço fora alto.
Certamente que eu teria preferido ficar em casa em vez de entrar
na boca desta ira declarada.
Estava enganada ao pensar que tinha de andar por esse vale
somente uma vez. Algumas semanas mais tarde, quando o calor do
verão começava a chegar a nosso distrito, outro primo faleceu. De
novo, fiquei sabendo de sua morte por meio de meus criados. De
novo, em obediência a Deus, encontrei-me entrando,
relutantemente, em uma sala cheia de pranteadores, na presença
enregelada da discórdia e do ódio. Por um ato de força de vontade
desviei a atenção de mim mesma, focalizando-a na pessoa
realmente destituída, a viúva de meu primo. Ela tinha um filho que
ia fazer cinco anos, a mesma idade de Mamude; parecia tão
perdida e sozinha ao lado do esquife que chorei por ela e por seu
marido.
Então justamente como tinha acontecido no funeral de Karim,
fui impulsionada para essa mulher em desespero. Ao aproximar-me,
nossos olhos se encontraram, percebi a hesitação passar-lhe
pelo rosto manchado de lágrimas. Então, com um ar de repentina
determinação, sabendo estar indo contra a vontade da família,
estendeu-me a mão. Ao segurar-lhe a mão idosa e que tremia nas
minhas, chorei em silêncio. Trocamos somente uma ou duas
palavras, mas meu coração orava com fervor para que o
Espírito Santo a tocasse em sua destituição e cumprisse sua
promessa, a esta querida muçulmana: "Bem-aventurados são os
que choram."
— Obrigada, Bilquis, obrigada —, disse a viúva num sussurro
ao soltar-me a mão. Abracei-a e saí da sala.
Houve uma estranha e rápida sucessão de mais dois funerais.
Isto era muito incomum até mesmo para uma família grande como
a nossa. E em cada caso foi-me dito, muito clara e distintamente
pelo Senhor, que eu saísse de minha casa segura e fosse ao lugar
onde precisavam de mim. Eu não devia falar muito. Devia deixar
que minha presença amorosa fosse sua única testemunha.
Nessa época o Senhor trabalhava comigo. Ele tinha tanto a
me ensinar e usava esses funerais como sala de aula.
Foi durante uma destas visitas a um funeral que descobri o
próximo grande segredo de permanecer em sua presença.
Num funeral muçulmano ninguém cozinha ou come até que o
corpo seja enterrado. Isto geralmente resulta em um dia de jejum e
na verdade, tal coisa não é sacrifício. Entretanto, naquele dia,
enquanto sentava isolada na sala apinhada de gente, descobri de
repente que desejava ter meu costumeiro chá da tarde. Era algo,
disse a mim mesma, que eu simplesmente não podia dispensar.
Finalmente, incapaz de controlar meu desejo, levantei-me e
murmurei uma desculpa qualquer. Eu tinha de lavar as mãos,
disse. Saí da casa e desci a rua até um pequeno café. Ali tomei o
meu precioso chá e voltei para junto dos pranteadores.
Imediatamente senti uma solidão estranha, como se um
amigo tivesse saído de junto de mim. É claro que eu sabia o que
era. A presença confortadora de seu Espírito havia-me deixado.
— Senhor —, disse para mim mesma — que fiz? E então eu
sabia. Tinha mentido enquanto dava a desculpa.
— Mas foi somente uma mentira inocente, Senhor — disse eu.
Não percebi nenhum conforto do Espírito. Só silêncio.
— Mas, Senhor —, continuei — não tenho de seguir mais
essas práticas do luto muçulmano. Além disso, simplesmente não
posso passar sem meu chá. O Senhor sabe disso.
Nenhum sentimento de seu Espírito.
— Mas, Pai —, continuei — não podia dizer-lhes que ia sair a
fim de procurar chá e bolos. Isso os teria magoado.
Nenhum Espírito.
— Está bem, Pai —, disse eu. — Compreendo. Errei em
mentir. Percebo que procurava a aprovação dos homens e que devo
viver somente para a tua aprovação. Sinto muito, de verdade,
Senhor. Magoei-te. Com tua ajuda não mais farei isso.
E com essas palavras sua presença confortadora inundou-me
de novo, como a chuva que cai num leito de rio ressecado.
Descontraí-me. Sabia que ele estava comigo.
E foi assim que aprendi a voltar para sua presença
rapidamente. Sempre que não sentia sua proximidade, sabia que o
havia entristecido. Voltava ao passado, até o momento em que
tinha sentido sua presença pela última vez. Então fazia uma revisão
de cada ato, cada palavra ou pensamento até descobrir onde me
havia desviado. Então confessava meu pecado e pedia seu perdão.
Aprendi a fazer isso com audácia crescente. Mediante esses
exercícios na obediência aprendi o segredo maravilhoso do
arrependimento. Arrependimento, descobri eu, não era remorso
lacrimoso mas sim admitir onde eu havia errado e fazer um voto
que com a ajuda dele nunca mais cometeria tal erro. Ao perceber
minha própria fraqueza, pude invocar sua força.
Foi durante essa época que descobri não haver mentira
inocente. Uma mentira é uma mentira e sempre procede de
Satanás, o pai das mentiras. Ele usa mentiras "inofensivas" e
inocentes a fim de iniciar-nos nesse hábito traiçoeiro. As mentiras
preparam o caminho para as futuras e maiores tentações. Satanás
murmura que uma mentira inocente pode ser "consideração" por
outras pessoas. Dobramo-nos ao mundo em vez de dobrarmo-nos
a Jesus, a Verdade.
Embora tenha aprendido essa lição num funeral de um
parente, foi o princípio de um novo tipo de vida para mim, no qual
tentei desarraigar toda a mentira. Desse dia em diante tentaria
policiar-me toda vez que estivesse prestes a dizer uma mentira
inocente. Certa vez uma missionária amiga convidou-me a uma
reunião à qual não queria assistir. Tinha decidido dar a desculpa
de ter outro compromisso. Um sinal de advertência soou dentro de
mim e estaquei justamente em tempo. Em vez disso, descobri que
podia dizer a verdade e ao mesmo tempo não magoar o sentimento
de ninguém, simplesmente dizendo: "Sinto muito, mas não poderei
estar lá."
Certo dia sentei-me para escrever uma carta a um amigo em
Londres e automaticamente comecei a escrever que estivera fora da
cidade por algum tempo e por isso não tinha podido responder à
sua última carta. Parei, com a caneta no ar.
Fora da cidade? Eu estivera aqui o tempo todo. Amarrotei o
papel, joguei-o na cesta de lixo e comecei de novo: "Querido amigo:
Por favor, perdoe-me o não ter respondido à sua maravilhosa carta
antes..."
Coisinhas, é verdade. Mas eu estava aprendendo que ter
cuidado com as pequenas coisas tornava muito mais fácil lidar
com as tentações maiores à medida que chegavam. Além disso, a
vida ficava muito mais fácil por não ter de passar muito tempo
tentando encontrar uma desculpa.
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Autor(a): grandeshistorias
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Lenta e seguramente comecei a compreender que estavatentando viver tendo Cristo como meu companheiro constante! Éclaro, simplesmente não era possível fazer isto. Tantas vezes davaconta de mim mesma voltando a meus antigos hábitos! Mas continuavatentando.E no processo, descobri o lado prático da promessa: "Buscai,pois, em primeiro lugar, o s ...
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