Fanfics Brasil - VENTOS DE MUDANÇA - Parte I 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA)

Fanfic: 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA) | Tema: Cristianismo, Islamismo, Fé, Amor


Capítulo: VENTOS DE MUDANÇA - Parte I

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O processo de emancipação começou certo domingo algumas
semanas mais tarde, durante nossa reunião regular de oração.
Achei que tanto os Old como os Mitchell pareciam inusitadamente
sombrios nessa noite.
— O que há de errado? — perguntei ao entrarmos na sala de
visitas dos Old. Ken inclinou a cabeça para trás olhando para o
teto.
— Marie e eu vamos tirar férias de um ano — disse ele
abruptamente.
Minha primeira reação foi de pânico. Tive a impressão de
estar sendo abandonada. O que faria sem os Old?! É claro que
ainda havia os Mitchell, mas eu dependia do apoio de ambas as
famílias. Os Mitchell haviam-me levado ao primeiro contato com a
igreja; os Old tinham andado intimamente comigo. Seria isto
apenas o começo? Quanto tempo levaria para perder as duas
famílias?
Marie deve ter lido meu coração, pois, aproximando-se,
tomou-me a mão. Enquanto falava, lágrimas enchiam-lhe os olhos.
— Querida, você deve compreender que sempre será assim —
disse Marie. — Os que amamos sempre partirão. Só Jesus
permanece conosco para sempre.
Ken agora havia-se juntado à esposa ao meu lado.
— Há outra coisa, Bilquis —, disse Ken. — Você pode ter a
certeza de que o Senhor jamais nos tira de uma situação segura a
menos que tenha um propósito para isso. Assim, você pode
começar a regozijar-se neste instante, ainda que no meio da dor.
Os Old, os Mitchell e eu tínhamos somente mais algumas
semanas para passarmos juntos. A data da partida aproximava-se
trazendo consigo um horrível sentimento de destruição. Todos nós
tentávamos olhar com fé para o vácuo que criaria a partida de Ken
e Marie; mas tudo não passava de encenação.
Foi um dia triste quando os Mitchell, eu e outros de nosso
pequeno grupo de cristãos fomos à casa dos Old dizer-lhes adeus.
Fizemos o mais que podíamos para transformar este último
momento em celebração, mas nossos corações estavam pesados
demais. Tentávamos ver a ocasião como uma oportunidade não de
"deixá-los ir" mas de "enviá-los".
Foi uma tentativa corajosa. Mas em nossos corações, ao
vermos o carro dos Old carregado partir em direção à rodovia
Tronco Grande, parecia-nos a todos que a vida já não poderia ser
tão rica quanto antes.
Ao dirigir de volta à minha casa nesse dia tive uma sensação
estranha de estar agora por minha conta, sozinha numa
comunidade hostil. Que ridículo! Afinal de contas os Mitchell ainda
estavam em Wah!
O processo de emancipação tomou rumo novo e inesperado
certa manhã alguns meses depois de os Old terem partido, quando
o Dr. Danie Baksh me telefonou. Disse ele que o Dr. Stanley
Mooneyham e ele, representando um grupo chamado World Vision
(Visão Mundial), com sede no estado de Califórnia, nos Estados
Unidos, gostariam de visitar-me. Eu nunca havia ouvido falar
dessa organização, mas minhas portas estavam abertas a qualquer
pessoa; até àquelas que só tinham curiosidade em ver uma
muçulmana que se tornara cristã.
Ambos chegaram alguns dias mais tarde. Terminado o jantar,
o Dr. Mooneyham começou a falar e suas palavras deixaram claro
que ele não era nenhum curioso à procura de novidades. É claro
que tinha interesse em minha conversão, mas percebi que ele teria
tido o mesmo interesse se o convertido fosse o meu jardineiro.
Enquanto tomávamos chá ele tocou no assunto.
— A senhora viria a Cingapura, Madame Sheikh — perguntou
o Dr. Mooneyham — para testemunhar do Senhor?
— Cingapura?
— Billy Graham está programando uma grande conferência lá,
chamada Cristo Busca a Ásia, tendo em mira todos os cristãos
asiáticos: indonésios, japoneses, indianos, coreanos, chineses,
paquistanenses. Seu testemunho seria uma inspiração para todos
nós.
Não parecia direito. Eu tinha o suficiente a fazer em Wah sem
ter de viajar a outras partes do mundo.
— Bem —, disse eu — orarei a esse respeito.
— Por favor, faça-o! — disse o Dr. Mooneyham e logo
despediu-se.
Muito tempo depois de o Dr. Mooneyham ter saído, fiquei
sentada na varanda pensando e orando, como havia prometido, a
respeito do convite. Uma parte de mim dizia que eu devia
aproveitar a oportunidade; outra parte dizia que eu não devia nem
pensar nisso.
Então ocorreu-me uma idéia.
Meu passaporte. É claro. Estava quase vencido. Para ir a
Cingapura teria de renová-lo. Nessa época no Paquistão o processo
burocrático para a renovação de passaportes era muito complicado.
A situação era impossível. Algumas pessoas mandavam os
passaportes para renovação e nunca mais os recebiam de volta.
Por que não deixar que esta situação falasse pelo Senhor? Se
ele desejasse minha ida, tomaria conta do passaporte.
Nessa mesma tarde preenchi os formulários necessários e
mandei o passaporte aos oficiais competentes. Ao colocá-lo na
caixa do correio tinha pouca dúvida de que isto seria o "não" à
minha viagem a Cingapura.
Uma semana mais tarde um envelope com aparência oficial
chegou pelo correio.
— Humm — sorri — é o primeiro passo para conseguir minha
renovação; alguns formulários para serem preenchidos. E assim
continuará por meses.
Abri o envelope.
Lá, renovado e oficialmente selado, estava meu passaporte.
E assim foi. Alguns meses mais tarde disse adeus a Mamude,
agora com seis anos de idade e fui de carro até Lahore. Lá, antes
de partir para Karachi onde tomaria o avião a jato para Cingapura,
fiz uma curta visita ao meu filho Khalid. Embora estivéssemos em
1968 e um ano e meio houvesse passado desde que o Senhor se
encontrara comigo, Khalid agia como o restante de minha família;
mostrava pouco interesse em minha descoberta. Suspeitei que ele
achava ser estranho que eu, aos 48, fizesse uma viagem dessas.
Mas, como mãe, eu devia ser respeitada e assim tivemos uma
conversa agradável.
Mais tarde, depois de embarcar no jato em Karachi e
examinar a situação objetivamente, tive a impressão de que Khalid
estivera certo. O que estava eu fazendo num avião a caminho de
Cingapura? Havia muitos cristãos a bordo e eu não tinha certeza
de estar gostando do que via. Afastei-me da exuberância deles.
Cantavam hinos, gritavam uns para os outros através do corredor,
e às vezes erguendo as mãos, exclamavam: "Louvado seja o
Senhor!" Fiquei embaraçada. Havia uma qualidade artificial nessa
alegria, não muito diferente da alegria forçada que ocasionalmente
tinha visto entre os convencionais nas ruas de Londres. Murmurei
para mim mesma que se era isto que significava viajar em círculos
cristãos, eu não estava interessada.
O que piorava a situação era que, por motivos que não podia
definir, sentia ter esta viagem um significado pessoal que ia além
de meu safári a Cingapura. Era como se fosse uma viagem
profética, prenúncio do tipo de vida a que seria chamada para viver.
— Oh, não, Senhor — disse a mim mesma. — O Senhor deve
estar brincando comigo! — Profética em que sentido? Que terei de
passar muito tempo em meio a extrovertidos, viajando de jatos?
Em Wah eu acabava de me acostumar um pouco com o meu papel
de cristã, mas Wah era uma vila provinciana. Lá pelo menos, eu
estava no controle da situação. Cristianismo para mim era uma
alegria privada, a ser partilhada de acordo com minhas regras.
Definitivamente não gostava da idéia de desfilar perante centenas,
talvez milhares de pessoas estranhas.



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Autor(a): grandeshistorias

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