Fanfics Brasil - AVISOS DE TEMPESTADE - Parte I 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA)

Fanfic: 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA) | Tema: Cristianismo, Islamismo, Fé, Amor


Capítulo: AVISOS DE TEMPESTADE - Parte I

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Passaram-se dois meses desde o relato de ameaças contra
mim. A coisa mais ameaçadora que me aconteceu foram os olhares
hostis de alguns jovens; comecei a cogitar se os alarmes não eram
infundados.
Era Natal novamente, alguns anos depois de eu ter
encontrado o bebê de Belém. Embora alguns membros da família
tivessem vindo visitar-me, o telefonema de advertência do meu tio
lembrava-me que o relacionamento da família ainda era forçado e
senti ser uma boa idéia dar uma ceia para meus parentes e amigos
a fim de ver se podíamos fazer algo para pôr fim à separação.
De modo que gastei bastante tempo fazendo a lista de
convidados. Certa noite, antes de ir para a cama, coloquei a lista
dentro de Bíblia com a intenção de mandar os convites na manhã
seguinte.
Isso jamais seria realizado.
Ao abrir a Bíblia na manhã seguinte a fim de tirar a lista
meus olhos caíram numa passagem que dizia:
Quando deres um jantar ou uma ceia, não
convides os teus amigos, nem teus irmãos, nem
teus parentes, nem vizinhos ricos; para não
suceder que eles, por sua vez, te convidem e sejas
recompensado. Antes, ao dares um banquete,
convida os pobres, os aleijados, os coxos e os
cegos; e serás bem-aventurado, pelo fato de não
terem eles com que recompensar-te; a tua
recompensa, porém, tu a receberás na ressurreição
dos justos. Lucas 14:12-14
— Senhor, é esta tua mensagem para mim? — Indaguei,
segurando a Bíblia em uma mão e a lista de convidados na outra.
Era certo que a maioria de meus parentes, vizinhos e amigos eram
gente rica. Tinha dito a mim mesma que esta era uma
oportunidade de fazer com que muçulmanos e cristãos se unissem,
mas na realidade percebi que o orgulho se tinha intrometido. Eu
queria mostrar à minha família que ainda tinha amigos na classe
rica.
Amarrotei a lista.
Fiz exatamente o que a Bíblia mandava. Preparei uma lista de
viúvas, órfãos, pessoas desempregadas e pobres da aldeia e
convidei-os a todos inclusive os mendigos para a ceia de Natal.
Alguns convites eu mesma entreguei, outros dei para meus criados
entregarem. Notícia como esta viaja rápido. Logo meus criados
vieram dizer que a vila inteira planejava comparecer à festa. Por
um momento fiquei preocupada. Toda aquela gente. Pensei nos
tapetes persas fabricados a mão que havia encomendado recentemente
para a sala de estar. Ora, pensei, eu poderia erguer as
coisas boas nesse dia.
E assim começamos as preparações. O entusiasmo de
Mamude que agora tinha oito anos de idade, era contagioso.
Ajudava-me ele a escolher presentes para as pessoas que viriam.
Para os meninos escolhemos camisas de lã; para as meninas,
vestidos de cores brilhantes; peças de pano vermelho, rosa e
púrpura para as mulheres; pantalonas quentes para os homens;
panos de embrulhar e sapatos para as crianças. Meus criados e eu
gastamos horas embrulhando os presentes e amarrando-os com
fitas prateadas.
Certo dia bateram à porta. Lá fora estava um grupo de
mulheres de Wah. Queriam ajudar.
— Não é para ganhar dinheiro, Begum — disse a
representante do grupo. — Simplesmente queremos ajudá-la a
preparar o jantar.
Subitamente a celebração havia-se tornado um programa da
comunidade. Para a decoração, pedi a uma família de oleiros que
fizesse lâmpadas — pequenas lâmpadas de barro ainda muito
usadas naquela parte do Paquistão. Encomendei 500. Mandei as
mulheres entrar e levei-as à sala onde estávamos fazendo pavios
de chumaços de algodão. Enquanto trabalhávamos surgiu
oportunidade de falar de Cristo. Ao colocarmos as lâmpadas nos
lugares, por exemplo, contei-lhes a história das virgens loucas e
das virgens sábias.
O alimento foi outro projeto excitante. De novo as aldeãs
ajudaram-me a preparar doces tipicamente paquistanenses,
amêndoas partidas e as deliciosas castanhas do Paquistão. Elas
transformavam o papel prateado em tiras tão finas que podíamos
decorar com ele vários tipos de doces.
Os aldeões começaram a chegar a casa no dia 24 de
dezembro e continuaram vindo para o que se transformou num
festival de uma semana. Que lindas eram as lâmpadas em cada
canto da casa e ao longo dos guarda-mãos, balaustradas e soleiras
das janelas! Mamude divertiu-se muito brincando com as crianças
da vila. Nunca tinha visto os olhos dessas crianças brilharem tanto,
nem os de Mamude. Risos e gritinhos enchiam a casa. De vez em
quando Mamude vinha pedir alguma coisa.
— Mamãe — dizia ele, — há mais cinco meninos lá fora; será
que eles podem entrar?
— É claro — ria eu, acariciando-lhe a cabeça, certa de haver
mais crianças em nossa casa neste instante do que existiam em
toda a vila de Wah. Quando disse aos aldeões que Jesus nos havia
instruído a tratar uns aos outros desta maneira, sua reação foi:
— Ele realmente andou com gente como nós?
— Sim — disse eu, — e hoje o que fazemos para ele fazemos
pelos outros.
Finalmente, quando as festividades se acabaram e pude
deixar-me cair numa cadeira sem a preocupação de estar sentando
numa criança adormecida, suspirei de contentamento, elevando o
pensamento a Deus. "É isto o que o Senhor queria que eu fizesse?"
E pareceu-me ouvir a resposta suave: "Sim." Então percebi: tinha
esquecido de suspender os novos tapetes persas. Entretanto nem
pareciam ter sido usados.
Muitos dos pobres jamais se esqueceram daquela festa. Cerca
de um mês mais tarde uma criada contou-me de um funeral em
Wah. A esposa do mulá local reclamava em voz alta que eu tinha
errado em perder a fé. Alguém, entretanto, respondeu: "A senhora
viu Begum Sahib ultimamente? A senhora fez algumas das coisas
que ela tem feito desde que se tornou cristã? Se deseja aprender
alguma coisa a respeito de Deus, por que não vai visitá-la?"
Mas havia outro lado para a experiência também. Descobri
que existiam forças em Wah que não viam a festa com bons olhos.
— Begum Sahib —, um velho empregado que trabalhava no
jardim parou-me certo dia. Levando a mão à testa disse: — Tem
um minuto, por favor?
— É claro.
— Begum Sahib Gi —, andam dizendo coisas na vila e acho
que a senhora deve tomar conhecimento delas. Falam que a
senhora se tornou um problema. E há os que dizem que devem
fazer algo a seu respeito.
— A meu respeito? — disse eu. — Não compreendo.
— Nem eu, Begum Sahib. Mas achei que devia informá-la...
Comecei a receber advertências como esta, ora quase
seguidas, ora com intervalo de meses, mas com regularidade
crescente no ano seguinte. Era como se a Pai estivesse tentando
preparar-me para uma época de dificuldade vindoura.
Certo dia, por exemplo, três meninos da vila vieram a nossa
casa. Mais tarde indagava-me a mim mesma se não eram
mensageiros de Deus, disfarçados de crianças. Mamude veio
procurar-me para dar--me notícias dos meninos. Ele tremia e seus
olhos estavam cheios de medo.
— Mamãe, a senhora sabe o que os meus amigos disseram?
Disseram que na vila as pessoas estão planejando matá-la.
Tencionam fazer isso depois das orações de sexta-feira. — Ele
começou a soluçar. — Se a senhora morrer eu também morrerei!
Que devia fazer? Peguei Mamude nos braços, acariciei-lhe o
cabelo negro e despenteado, tentando confortá-lo.
— Minha querida criança —, disse eu — vou contar-lhe uma
história. — E contei-lhe de novo a história do primeiro sermão de
Jesus em Nazaré, onde a multidão ficou tão furiosa que decidiu
matá-lo a pedradas. — Mamude — disse eu —, Jesus passou por
meio deles. Não havia nada que alguém pudesse fazer para ferir a
Jesus a menos que o Pai o permitisse. A mesma coisa é verdade a
respeito de você e de mim. Temos a perfeita proteção de Deus.
Você acredita nisto?
— A senhora quer dizer que nunca seremos feridos nem
magoados?
— Não, não é isso que quero dizer. Jesus foi ferido. Mas
somente quando o tempo de seu sofrimento havia chegado. Não
precisamos levar uma vida de constante temor de que algo terrível
está para acontecer a nós. Nada poderá acontecer até que chegue
nossa hora. E talvez essa hora nunca venha. Simplesmente
teremos de esperar para ver. Mas, nesse ínterim podemos viver
confiadamente. Você compreende? — Mamude olhou para mim;
seus olhos castanhos escuros suavizaram-se. Subitamente sorriu,
deu meia volta e saiu correndo para fora, gritando alegremente.
Era a melhor resposta à minha pergunta que ele poderia ter dado.
Gostaria de poder dizer que eu própria sentia essa confiança.
Não que eu não cresse no que tinha dito a Mamude, mas minha fé
ainda não era como a das crianças. Levantei-me e levei a Bíblia
para o jardim. Meu coração não estava exatamente leve. Que ousadia
a deles tentar expulsar-me de minha terra!
O clima outonal era seco e revigorante e, andando lentamente
ao longo do caminho encascalhado, podia ouvir ruídos de peixes
pulando no pequeno riacho e chamados de pássaros ao longe.
Crisântemos e outras flores, resquícios do verão, reanimavam o
caminho. Sorvi o ar agradável e leve. Essa era minha terra, meu
povo, meu país. Minha família o havia servido bem por setecentos
anos. Este era meu lar, e eu não podia deixá-lo, e não o deixaria!
Entretanto, acontecimentos, totalmente fora de meu controle,
estavam sendo preparados, acontecimentos que não prometiam
bons resultados à minha determinação teimosa de permanecer em
meu lar.



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Autor(a): grandeshistorias

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