Fanfic: 𝔸𝕋ℝ𝔼𝕍𝕀-𝕄𝔼 a chamar-lhe Pai (CONCLUÍDA) | Tema: Cristianismo, Islamismo, Fé, Amor
Nur-jan enxugou os olhos. Contou-me que seu irmão, seu
próprio irmão, tinha ido à mesquita no dia anterior, e havia
escutado um grupo de homens dizendo que finalmente havia
chegado a hora de fazerem alguma coisa contra mim.
— Você tem alguma idéia do que eles planejavam?
— Não, Begum Sahib —, disse Nur-jan. — Mas estou com
medo. Não somente pela senhora mas também pelo menino.
— Uma criança de nove anos de idade? Eles não se
atreveriam ...
— Begum Sahib, esse já não é o país que foi cinco anos
atrás — disse Nur-jan seriamente, tão diferente de sua natureza
geralmente borbulhante. — Por favor, tenha cuidado.
E deveras, algumas semanas mais tarde algo aconteceu.
Tinha sido um dia tão lindo! O outono estava no ar. A monção
havia passado e o tempo era fresco e seco.
Nada tinha acontecido por vários dias e comecei a pensar que
afinal de contas estávamos vivendo numa idade moderna. Era
1971, não 1571. As guerras santas eram coisa do passado.
Subi ao quarto para meu período de oração.
Subitamente, sem saber por que, senti um impulso fortíssimo
de pegar Mamude e correr para fora de casa!
Que coisa tola! Mas o impulso era tão definido que corri pelo
corredor, acordei Mamude, e sem explicar nada empurrei a criança
ainda meio adormecida e protestando corredor abaixo. Ainda
sentindo-me ridícula, desci correndo as escadas, abri as portas e
corri para fora.
No instante em que cheguei ao terraço, senti o cheiro acre de
fumaça. Alguém devia estar queimando galhos de pinheiro.
Tínhamos uma regra que vinha de longa data de que ninguém
tinha permissão para queimar lixo em minha propriedade. Fui à
procura do jardineiro e ao rodear a casa estaquei horrorizada.
Empilhado contra a casa estava um monte de galhos secos de
pinheiro, em chamas. A labareda crepitante subia rapidamente
pelo lado do edifício.
Gritei. Os criados vieram correndo. Logo alguns corriam ao
riacho com baldes e traziam-nos cheios d`água. Outros
desenrolaram a mangueira do jardim e jogavam água nas chamas;
mas a pressão da água era pouca. Por uns instantes parecia que o
fogo ia pegar na madeira saliente sob o telhado, que começava a
soltar fumaça. Não havia jeito de jogar água àquela altura. A única
maneira pela qual podíamos evitar que a casa se queimasse era
apagar as próprias chamas.
Corremos contra o tempo. Os dez criados formaram uma
fileira até o riacho e começaram a passar baldes d`água de uma
pessoa para outra, entornando--o, às vezes, com a pressa.
Todo mundo trabalhou arduamente por meia hora.
Finalmente dominamos as chamas. Estávamos de pé, em círculo
ao redor do fogo, suados e tremendo. Alguns minutos mais e a
casa teria pegado fogo, sem possibilidade de salvamento.
Percebi os olhos de Nur-jan. Ela estremeceu de leve e
assentiu com a cabeça.
Eu sabia exatamente o que ela estava pensando. A ameaça
havia sido cumprida. Olhei para as traves de madeira com as
pontas negras de carvão, para as manchas de fuligem nas paredes
brancas da casa. Agradeci ao Senhor nada mais ter acontecido e
tremi ao pensar no que poderia ter acontecido se eu não tivesse
sido levada para fora em tempo.
Uma hora mais tarde, depois de a polícia ter vindo investigar,
tomar notas, interrogar a mim e aos criados, estava eu de novo
sentada em meu quarto. Apanhei a Bíblia para ver se o Senhor
tinha alguma coisa especial para dizer-me.
Um versículo parecia saltar da página.
"Apressa-te, refugia-te nela; pois nada posso fazer,
enquanto não tiveres chegado lá" (Gênesis 12:22).
Abaixei o livro e olhando para cima disse:
— Tudo o que o Senhor precisa fazer agora é mostrar-me a
maneira pela qual o Senhor deseja que eu parta. Será fácil ou será
difícil? E acima de tudo, Senhor, — disse eu, desta vez as lágrimas
enchiam-me os olhos, — e o menino? Ele pode vir também? O
Senhor tem-me tirado tudo. Isso também inclui a criança?
Certo dia, seis meses mais tarde, em março de 1972, o
Senhor falou comigo de novo mediante outro sonho. Raisham veio
a mim com os olhos transbordando preocupação.
— Begum Sahib —, disse Raisham — o cofre de dinheiro é
seguro?
Ela se referia ao cofre portátil em que guardava o dinheiro de
casa.
— É claro que é seguro — respondi. — Por quê?
— Bem, — Raisham explicou — obviamente tentando
controlar a voz, — tive um sonho na noite passada no qual a
senhora ia de carro em uma viagem longa. Levava o cofre.
— Sim? — disse eu. Isso não era coisa incomum, pois muitas
vezes levava o cofre comigo nas viagens.
— Mas o sonho era tão real — insistiu Raisham. — E a parte
triste é que enquanto a senhora viajava, algumas pessoas
tentaram roubar o cofre.
Ela tremia e, uma vez mais, tive de confortá-la assegurando-lhe
que a perda do dinheiro levar-me-ia para uma dependência
ainda mais íntima de Deus. Depois de ela ter voltado ao trabalho
fiquei pensando no sonho. Seria ele profético? Estaria ele dizendo-me
que minhas finanças seriam tiradas? Estaria eu em breve
completamente às minhas custas, correndo para o desconhecido
sem apoio financeiro?
Esses foram dias espantosos.
Dois meses mais tarde, num
dia quente de julho de 1972, um criado veio anunciar a chegada de
meu filho Khalid.
— Khalid? — meu filho ainda morava em Lahore. Por que
fazer uma viagem especial, particularmente nesse calor intenso? O
que era tão importante que não podia ser tratado pelo telefone?
Khalid esperava-me na sala de visitas.
— Filho! — exclamei ao entrar. — É tão bom vê-lo de novo!
Mas por que não me telefonou?
Khalid veio até a mim e beijou-me. Fechou a porta da sala, e,
sem preâmbulos, lançou-se ao propósito de sua visita.
— Mamãe, ouvi um rumor horrível. — Parou. Tentei sorrir.
Khalid abaixou o tom de voz e continuou:
— Mamãe, o governo vai desapropriar muita propriedade
privada.
Minha mente voltou-se à visita do meu amigo que trabalhava
para o governo e que havia dito a mesma coisa, cerca de um ano
atrás, em março de 1971. Será que sua visita profética estava
agora cumprindo-se? Khalid contou-me que Bhutto estava
começando suas reformas agrárias e que era muito provável que
minhas propriedades estivessem entre as primeiras a ser
nacionalizadas.
— O que você acha que devo fazer? — perguntei. — Será que
tomarão tudo ou somente uma parte?
Khalid levantou-se e foi até a janela do jardim, em
pensamentos profundos. Voltando-se para mim, disse:
— Bem, mamãe, ninguém sabe. Talvez fosse melhor vender
um pouco de suas propriedades em porções pequenas. Dessa forma
o novo proprietário estaria protegido contra a apropriação do
governo.
Quanto mais pensava a esse respeito, mais sentia que a
sugestão de Khalid fazia sentido. Fomos discutir a questão com
Tooni, e todos nós concordamos ser esta a maneira correta de se
proceder.
Autor(a): grandeshistorias
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Ficou então decidido. Khalid voltaria a Lahore. Iríamosencontrar com ele lá a fim de dar andamento aos papéis.Foi assim que numa manhã quente de julho de 1972, Tooni,Mamude e eu estávamos quase prontos para a viagem a Lahore afim de ver corretores para tratar da venda de minhas propriedades.Ao sair da casa, a beleza do jardim atingiu ...
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