Fanfic: Até eu te encontrar | Tema: Romance, realidade, misticismo, bruxaria, wicca, amor, suspense, aventura
Flávia acordou eufórica na quinta-feira da Semana Santa. Ia viajar para ver seus tios e estava empolgada para voltar a Lavras; já fazia quase dois meses que não ia em casa. Lembrou dos amigos que deixara lá. Verdade que eram poucos, mas mesmo assim lhe faziam falta. Ficou pensando na fazenda, nos bons momentos que teve quando criança. De quando andava com seu pai pela plantação de café, aos cinco anos de idade, junto dele no cavalo, e depois, desta cena se repetindo sempre com seu tio, até completar dez anos e ganhar seu próprio cavalo, para ir atrás do tio nas vistorias semanais que ele fazia pela plantação. Flávia adorava o cheiro do café torrado ali mesmo, da terra molhada em dia de chuva, de ficar simplesmente na varanda grande que contornava a casa da fazenda, apenas sentada, olhando a paisagem de montanhas, pensando em nada.
Ela se levantou e se arrumou rapidamente. Tomou apenas um copo de suco; iria passar na padaria antes de pegar a estrada e comprar um pouco de pão de queijo para comer no caminho. Felipe a havia viciado no pão de queijo daquela padaria. Lembrou-se dele, de Gustavo, Lauren, todos que ficariam em Viçosa naquele feriado. Tinha vontade de ficar também, de participar do churrasco no sábado na República Máfia, de conhecer a esposa e a filha de Mauro, mas a vontade de ir para Lavras rever seus tios e sua fazenda era maior.
Apressadamente, Flávia desceu as escadas do prédio, segurando apenas uma pequena mala. Não precisava levar muita coisa, havia deixado algumas roupas em lavras. Só precisava se lembrar de trazer mais roupas de frio, sabia que o inverno em Viçosa era rigoroso, um pouco menos que o de Lavras, mas fazia muito frio lá e em breve a temperatura iria cair. De noite já conseguia sentir um leve friozinho.
Jogou a mala no banco de trás do carro e sentou na frente. Ligou o Palio e seguiu em direção à padaria. O dia estava amanhecendo. Queria pegar a estrada cedo, para chegar a Lavras antes do almoço. A passagem na padaria foi rápida, não havia muito movimento e ficou feliz por comprar os pães de queijo bem quentinhos, acabados de sair do forno. Essa era a recompensa por ter acordado cedo. Foi saboreando-os aos poucos, enquanto pegava o caminho em direção a Rio Pomba.
Apesar do feriado, a estrada não estava muito cheia, apenas no trecho da BR-040 e depois quando entrou em Barbacena. Dali até São João del-Rei, passando por Tiradentes, havia bastante movimento, devido ao fato de ser Semana Santa e essas cidades receberem muitos turistas nesta época do ano. Ela fez uma anotação mental de um dia voltar à pequena Tiradentes, nem que fosse por um fim de semana. Havia ido ali poucas vezes, embora ficasse perto de Lavras, mas adorava a cidadezinha, suas pousadas aconchegantes e sua bela igreja no alto. Quem sabe não conseguiria juntar seus amigos de Viçosa para ir lá algum fim de semana ou feriado? Poderia também convidar outros de Lavras.
Embora a estrada estivesse cheia e malconservada, chegou a Lavras na hora que havia planejado. Tinha falado com seus tios que chegaria apenas no final do dia para poder fazer uma surpresa a eles.
Flávia sentiu o coração bater mais rápido quando começou a entrar na cidade. As ruas conhecidas lhe traziam sempre boas lembranças. É claro, havia também algumas ruins, mas tentava deixá-las de lado. Gostava muito da cidade, de seu povo. Não planejara sair de lá para estudar, mas sabia que isso estava lhe fazendo bem. Seu objetivo era retornar para Lavras quando se formasse, para poder assumir com segurança a fazenda, embora já ajudasse seu tio a administrá-la. Era reconfortante saber que a fazenda, que um dia pertenceu a seu pai, estava em boas mãos enquanto estivesse fora. Seu tio era um homem bom, assim como sua tia, embora fosse um pouco mais fechada e ranzinza.
Passou em frente à loja de roupas que sua tia possuía na Rua Francisco Salles, mas não conseguiu ver se ela estava lá dentro. Provavelmente não, já devia estar em casa, supervisionando o que teria para o almoço. Flávia passou em frente ao Instituto Gammon, sua antiga escola, e se lembrou de Verônica. Ia ligar depois para a miga, combinar de fazer algo à noite. Quem sabe ir até o Miliorelli e comer o delicioso frango na chapa, coberto com queijo e bacon, e batata frita que ela tanto adorava.
Flávia fez a volta para entrar na Firmino Sales e estacionou em frente à sua casa. Sentiu uma vibração estranha, uma angústia dentro do peito. Estranhou a sensação, pensou que ficaria feliz ao chegar em casa, mas sua reação foi outra. Talvez tenha sido pelo fato de ter ficado muito tempo longe. Balançou a cabeça, afastando qualquer pensamento ruim, e desceu do carro. Não tinha com o que se preocupar, seria um fim de semana tranquilo, no qual mataria a saudade de tudo e de todos.
Com a mala na mão esquerda, abriu o pequeno portão de ferro que havia na entrada da sua casa. Subiu os três degraus e foi até a porta. Respirou fundo e, antes de entrar, ouviu sua tia conversando na sala com seu tio. Espiou pela janela, sem que eles a vissem. Só assim conseguiu se dar conta da saudade que sentia deles. Não queria mais esperar para entrar, mas ouviu sua tia falar seu nome e em seguida de sua mãe. Automaticamente, Flávia congelou ali, atrás da janela. Sentia-se mal por estar naquela situação, não gostava de ficar ouvindo conversas por trás da porta, mas também não conseguia sair do lugar. Era como se algo forte estivesse prendendo seus pés ao chão.
— Eu ainda não concordo com isso, Heitor. Ela não podia ter ido para tão perto de Ponte Nova. — Sua tia falava bem alto.
— Para com isso, Tereza. Não aguento mais você falando desse assunto. É isso todo dia agora, sempre antes do almoço, quando chego da fazenda, essa mesma discussão que não leva a lugar nenhum.
— Não é uma discussão, é o meu ponto de vista, minha opinião.
— A Flávia é maior de idade, pode ir morar onde quiser. E ela vai chegar hoje de noite, então para de falar disso.
— Você não consegue enxergar a real gravidade do assunto, é disso que venho falando esse tempo todo. Deixa de ser cabeça dura e para um pouco para pensar. Ela está muito perto da verdade.
— Que verdade, mulher? Você fica criando estas besteiras na cabeça e passa a achar que tudo é realidade.
— Não é besteira e você sabe disso. Você sabe muito bem o poder que Elizabeth tinha.
— A Elizabeth está morta, deixe-a em paz. E deixa a Flávia em paz. Você sabe que ela é uma boa menina.
— Vocês todos estão brincando com fogo, depois não diga que eu não avisei. — Tereza levantou e se aproximou do marido. — Aproveita que ela vem para cá este fim de semana e tente convencê-la a transferir a matrícula para cá. É a melhor coisa a se fazer. Daqui a pouco, o semestre acaba e ela volta para cá, antes que vá a Ponte Negra, antes que conheça a verdadeira história de sua mãe. Isso se já não tiver ido, já não estiver sabendo de tudo.
— Você é neurótica demais. Eu não vou convencê-la de nada, a Flávia estuda onde quiser. — Heitor foi para dentro da casa, provavelmente para seu quarto. Tereza ficou na sala, sentada no sofá, olhando para o nada. Flávia ainda estava parada do lado de fora, tentando absorver a conversa que ouvira.
Instintivamente, correu para o carro, entrou e virou a chave na ignição. Sua respiração estava ofegante e sua cabeça tinha vários pensamentos e dúvidas. Afinal, sobre o que eles falavam, qual era a verdade sobre sua mãe? Por que não podia estudar em Viçosa e pensar em um dia visitar Ponte Nova? Agora fazia sentido o motivo de sua tia ser totalmente contra quando Flávia havia passado para Viçosa. Pensou que sua tia estava triste porque ela não fez vestibular para Lavras, que a tristeza era pela sua mudança, ficar longe da família, e não porque estava indo para Ponte Nova, para perto das origens de sua mãe. Afinal de contas, qual era o grande segredo que sua tia parecia saber sobre sua mãe? E que poder era aquele que ela mencionara?
Sem se dar conta e pensar, Flávia saiu dirigindo, pegando o caminho de volta para Viçosa. Não sabia o que fazer, só sabia que não podia nem queria ficar ali, não naquele fim de semana, depois de tudo que ouviu. Precisava pensar, organizar suas ideias e sabia o que tinha de fazer naquele momento. Precisava procurar Sônia. A antiga amiga de sua mãe tinha algumas respostas a lhe dar e ela iria procurar por isso.
Flávia fez o trajeto de volta automaticamente. Chegou a Viçosa no final do dia, seguindo direto para casa. Estacionou em frente ao seu prédio, desligou o carro e ficou alguns instantes ali dentro parada, quando começou a sentir um grande cansaço. Não havia pensado nisso até aquele momento. Foi um dia exaustivo, mas não havia sentido cansaço nenhum durante a viagem de volta e não queria sentir agora.
Precisava falar com Sônia. Balançou a cabeça, pegou a mala e entrou no prédio, subindo o lance de escadas para chegar ao primeiro andar. Respirou fundo e tocou a campainha. Logo em seguida, Sônia abriu a porta.
— Flávia? Você não tinha ido para Lavras? — Sônia estranhou e abriu caminho para que Flávia entrasse. Ela colocou sua mala em um canto da sala e se abaixou para falar rapidamente com Rabisco, que chegou pulando em suas pernas.
— Eu fui. Mas voltei. — Flávia sentou no sofá. — Sônia, pega um copo de água para mim.
— Sim, claro. — Sônia franziu a testa e foi até a cozinha. — O que aconteceu? Eu estou preocupada.
— Preciso falar com você sobre a minha mãe.
Sônia congelou. Entregou o copo para Flávia e ficou parada ao seu lado. Flávia sentiu sua hesitação e esperou que ela falasse algo, mas Sônia permanecia muda. Bebeu a água e olhou para sua vizinha.
— Eu fui até Lavras e quando cheguei lá ouvi uma conversa estranha entre meus tios. Minha tia falava da minha mãe e da minha vinda para cá.
Sônia prestava atenção a tudo, e Flávia percebeu o quanto estava rígida. Ela sentou em uma das poltronas em frente a Flávia.
— E? — perguntou Sônia.
— Bom, ela disse que eu não devia ter vindo para cá, que não podia ir até Ponte Nova, que não podia descobrir sobre minha mãe. — Flávia cerrou os olhos. — O que isto significa? Você deve saber alguma coisa, você era amiga dela.
— Flávia, eu... Eu não sei o que falar.
— Que mistério é esse? O que aconteceu com minha mãe? O que ela fez?
— Não aconteceu nada, ela não fez nada de mais.
— Eu sempre achei minha tia um pouco estranha no que se referia à minha mãe, mas pensei que poderia ser implicância de cunhada, inveja ou ciúme porque minha mãe me teve e minha tia nunca pôde ter filhos, mas o que ela falou foi bem estranho.
— Sua mãe era uma pessoa boa, você tem de acreditar e entender isso.
— Eu acredito, mas é que... É estranho o que ela falou e só você pode me ajudar, porque, pelo que vi, você conhecia minha mãe muito bem.
— Sim. Nós éramos muito unidas.
— E você não vai me contar por que minha tia tem tanto medo que eu viva aqui e descubra algo sobre o passado da minha mãe?
Sônia olhou para Flávia, que mostrava aflição e ansiedade. Seus olhos eram de súplica e percebeu que Sônia se sentiu um pouco mal por aquilo.
— Eu não sei se você está pronta para saber.
— Mas o que há de tão horrível assim que você sabe?
— Não é nada horrível.
— Então por que você não me conta?
Sônia ficou muda. Flávia levantou e se aproximou dela, se abaixando à sua frente, de modo que seus olhos ficassem na mesma altura.
— Por favor. Minha tia falou em algo como uma força que minha mãe tinha. O que é isto tudo, afinal?
— Eu te conto, mas amanhã. Amanhã te conto toda a história da sua mãe, da sua avó, da sua família. Acho que você não está em condições de assimilar nada hoje.
— Eu preciso saber.
— Amanhã. O que você precisa agora é descansar. Passou o dia todo na estrada, dirigindo, com certeza está cansada.
Flávia não podia negar isso. O que mais queria naquele momento era tomar um banho quente e deitar, para descansar seu corpo. Sentia todos os seus músculos rígidos e doloridos.
— Não sei se aguento esperar até amanhã.
— Aguenta sim. Quando você deitar, vai apagar.
Flávia ficou hesitante por alguns segundos, mas percebeu que não conseguiria arrancar nada de Sônia naquele momento.
— Vamos fazer o seguinte: você toma um banho, deita e, se não conseguir dormir, a gente conversa.
— Ok — concordou Flávia, sem muito ânimo. Ficou em pé, sem saber o que fazer.
— Você pode ficar aqui, se preferir.
— Não, vou para o meu apartamento. Preciso ligar para os meus tios e dar uma desculpa. Eles devem estar me esperando lá.
Flávia pegou sua mala e foi para casa. Ainda não estava convencida de que deveria esperar pelo dia seguinte, mas o cansaço estava chegando forte e não tinha condições de pensar em nada naquele momento. Ligou para seus tios e inventou que estava com febre, por isso não havia ido para Lavras. Prometeu ir lá algum outro dia, mas não tinha certeza se iria antes das férias de julho. Foi para o banheiro, tomou um banho bem quente e depois deitou. Não demorou muito para que estivesse dormindo, dominada pelo cansaço.
Autor(a): biiviegas
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Flávia acordou ainda se sentindo um pouco cansada. Levantou e viu que passava do meio-dia. Havia dormido muito, mas, depois do que aconteceu, isso foi a melhor coisa que fez. Na cozinha, preparou um queijo quente, pois não havia se alimentado direito no dia anterior e estava com fome. Enquanto esperava o sanduíche ficar pronto, ligou pa ...
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