Fanfic: Até eu te encontrar | Tema: Romance, realidade, misticismo, bruxaria, wicca, amor, suspense, aventura
Flávia acordou ainda se sentindo um pouco cansada. Levantou e viu que passava do meio-dia. Havia dormido muito, mas, depois do que aconteceu, isso foi a melhor coisa que fez. Na cozinha, preparou um queijo quente, pois não havia se alimentado direito no dia anterior e estava com fome. Enquanto esperava o sanduíche ficar pronto, ligou para Sônia, que prometeu ir até sua casa assim que terminasse de almoçar.
Flávia pegou o queijo quente e foi para a sala. Sentou no sofá, sem ligar a TV. Comeu, ficou ali pensando em tudo o que estava acontecendo e depois foi para seu quarto. Resolveu desfazer a mala, para passar o tempo. A campainha tocou e Flávia foi atender. Era Sônia.
— Oi, Sônia. Estou desfazendo a mala, vem até aqui no meu quarto.
Sônia a seguiu e sentou na cama de Flávia, que terminou de guardar as últimas peças de roupa que estavam fora. Ela também sentou na cama, em frente a Sônia, que respirou fundo.
— Você já leu os livros que te emprestei?
Flávia franziu a testa. Não entendeu a pergunta, mas achou que Sônia poderia estar tentando começar a conversa com outro assunto.
— Terminei o terceiro já. Ainda falta o quarto, Taltos.
— O que você achou?
— Sônia, não entendo o que isso tem a ver. Quero falar da minha mãe, da conversa de ontem dos meus tios.
— Eu sei. Mas responda a minha pergunta antes.
— Eu gostei. Achei uma narrativa interessante, gostei da ideia central.
— Das bruxas?
— É, achei legal o modo como a Anne Rice expôs esse assunto. Porque se pensa em bruxa como alguém que só quer fazer o mal. Tudo bem que algumas das bruxas Mayfair eram más, mas a maioria não. Algumas eu achei interessantes. — Flávia olhou para Sônia. — Afinal de contas, o que isso tem a ver com a minha mãe? Eu não entendo a conexão entre essa família e a minha. — Flávia parou de falar e sentiu um frio percorrer sua espinha. Olhou assustada para Sônia. — Oh! Não vai me dizer que a família Callaghan é parecida com a Mayfair, amaldiçoada?
— Não, não. — Sônia achou graça do medo de Flávia. — Não é isso. Mas tem uma conexão, de certa forma, por isso lhe emprestei os livros, para você entender melhor o que vou lhe contar... Flávia, você já ouviu falar de Wicca?
— Wicca? Não... O que é isso?
— É uma religião. Você tem alguma religião?
— Não. Minha tia é católica, eu cresci indo às missas, mas nunca me identifiquei muito. Nunca tive muita paciência para missas, não consigo acreditar em santos. Acredito apenas que existe uma grande força que, digamos, rege nossas vidas. Pode-se dizer que eu acredito em Deus, apenas Nele.
— Interessante. — Sônia ficou alguns segundos quieta. — Na Wicca, nós acreditamos que existem duas divindades. A Deusa e o Deus. Mas reverenciamos principalmente a Deusa, a Mãe Natureza. Ela é a fonte de tudo. Nós não temos hierarquia ou dogmas, alguém a obedecer, digamos assim. Não temos mandamentos, apenas provemos o respeito e a diversidade. Temos como lei fazermos o que quisermos, desde que isso não prejudique ninguém.
Flávia ouvia com atenção, mas ainda estava confusa e perdida.
— Realmente não estou entendendo nada. O que minha família, minha mãe, as bruxas Mayfair e essa Wicca têm em comum?
— Wicca é o que se pode chamar de bruxaria. Mas não leve ao pé da letra.
Flávia ficou quieta, tentando assimilar o que Sônia falava.
— Você está me dizendo que você é uma bruxa?
— Basicamente sim.
Flávia olhou fixamente para a vizinha e começou a rir, descontrolada.
— Desculpa, mas eu realmente não acredito nisso.
— Entendo. Para alguém de fora, que nunca ouviu falar, é estranho mesmo.
— Mas você é uma bruxa que faz feitiços, poções? Tem poderes? — Flávia tentava controlar o riso, mas não conseguia. — Desculpa, mas isso tudo é um pouco estranho.
— Não é bem assim. Eu não tenho o poder de sumir, me transformar ou transformar os outros ou coisas, isso não existe. Apenas tenho meus pressentimentos do futuro, mas isso se pode chamar de poder mediúnico. Poçôes? Não faço poções do mal, para enfeitiçar pessoas. Eu faço rituais, para celebrar os sabbaths, uma espécie de celebração dos estágios cíclicos da natureza, que são as estações do ano. Os sabbaths compõem a Roda do Ano.
— Espera um minuto. Não estou entendendo nada. Rituais? Como assim?
— Rituais de agradecimento, nada mais que isto. Não rituais nos quais eu mato uma galinha, ou bebo sangue de criança para adorar o diabo. São rituais de celebração pelo que conseguimos e pelo que iremos conseguir. Pela estação do ano que começa e pela que termina. — Sônia olhou para Flávia. — Eu sei que é difícil entender. A bruxaria, ou antiga religião, foi muito deturpada pela Igreja Católica durante a Inquisição. Fomos mostrados como pessoas do mal, nossos rituais foram distorcidos. Mas não é bem assim.
Sônia parou de falar e olhou para Flávia, que tentava entender o que ela estava contando.
— Ok. Eu acho que consigo tentar assimilar algumas coisas, embora tudo seja muito surreal para mim... Mas onde a minha mãe se encaixa nisso?
— Sua mãe fazia parte da Wicca também.
— Você está dizendo que a minha mãe era uma bruxa? — Flávia estava espantada demais. Nunca havia lhe passado pela cabeça, nunca ninguém havia lhe falado algo do tipo.
— Foi assim que eu conheci sua mãe. Sua avó, Emily, e Elizabeth faziam parte desta religião, eu e minha mãe também.
Flávia ficou olhando para Sônia, balançando a cabeça.
— Isso tudo é fantasioso demais.
— Eu sei que parece assim para você. É porque não conheceu sua família materna, não sabe sua história. Seus bisavós vieram da Irlanda para o Brasil muitos anos atrás, sua avó era criança ainda. Sua bisavó já era uma bruxa poderosa na Irlanda, mas sofria muito preconceito do povo de lá. Ela não quis criar sua avó sob os olhares maldosos das pessoas, que sempre as apontavam na rua. Então seu avô deicidiu vir para o Brasil e se instalou aqui, na Zona da Mata de Minas Gerais, mais precisamente em Rio Casca. Sua avó casou-se com seu avô e eles foram morar em Ponte Nova.
Sônia segurou as mãos de Flávia. Elas estavam geladas.
— Eu e Lizzy fomos amigas desde o primeiro instante em que nos vimos. Sempre pensamos de modo parecido, tivemos os mesmos interesses. Carmem e Laura eram minhas amigas. Eu as trouxe para Wicca. Nós quatro formávamos o nosso grupo, sempre estávamos juntas. Às vezes, Lizzy ficava dias hospedada na minha casa, às vezes, nós íamos para Ponte Nova, as três, para encontrá-la, ou às vezes, só uma ou duas. Sempre fizemos rituais, os sabbaths, juntas. Nós falámos que éramos um coven, mas sem alguém como a Alta Sacerdotisa.
— O que é coven? — Flávia ainda se mostrava confusa, mas já estava começando a entender o que Sônia falava.
— Coven é um grupo de bruxas. A Alta Sacerdotisa podemos chamar de líder do coven.
Flávia balançou a cabeça, concordando.
— Nunca tivemos problemas entre nós, até Laura começar a namorar Armando, que estudava na UFV. Ele era da turma dois anos à frente da de Henrique, seu pai. Quando Carmem o conheceu, enlouqueceu, por assim dizer. Ela se apaixonou por ele, mas não falou nada para nós, muito menos para Laura. Não aceitava que ele preferisse Laura a ela. Ainda mais porque Laura não estava tão empolgada com o namoro quanto ele. Então Carmem decidiu se afastar da gente. Não entendemos nada e demorou até que descobrissemos tudo. Eu e Lizzy, pois Laura nunca soube o que de fato aconteceu. Ela acha que Carmem se afastou porque cansou da Wicca e depois porque casou, teve Carla e, por fim, perdeu o marido.
— Que história! — sussurrou Flávia.
— Você ainda não ouviu nada. — Sônia recuperou o fôlego e continuou. — Carmem fez várias simpatias para atrair a alma gêmea de Laura; acho que isso acabou "trazendo" Phill aqui mais cedo do que deveria. Mas isso não foi ruim. O pior foi quando ela começou a fazer feitiços contra nós. Elizabeth ficou doente uma época e nenhum médico conseguia descobrir o que era. Laura começou a sofrer com um ciúme doentio de Armando, o que antes não existia, sem contar o modo rude com que ele começou a tratá-la. Ela tentava terminar, mas ele se dizia arrependido e ela dava mais uma chance. Foi estranho, porque ela sempre estava decidida a terminar, não aguentava mais ele, mas quando se encontravam, mudava completamente.
— Vocês não desconfiavam que houvesse algo errado? — Flávia quis saber.
— Não. Érammos muito novas, não tínhamos malícia e também não podíamos imaginar que nossa amiga estava fazendo aquilo conosco. Na época, minha mãe era dona da MinaZen, mas eu já ajudava na loja, que sempre teve um bom lucro. Mas, de uma hora para outra, a vizinhança começou a reclamar da loja, queriam nos despejar, já não tínhamos mais lucro. Minha mãe comentou que estava tudo dando errado para todas nós e que parecia até feitiço de alguém. Eu comecei a ficar desconfiada e fui investigar. Descobri que Carmem estava tendo um caso com Armando, mesmo ele ainda estando com Laura. Por sorte, Phil apareceu aqui alguns dias depois. Laura nunca soube deste caso, só sua mãe. Eu contei para Lizzy e decidimos não contar nada para ela, ainda mais porque logo depois que sua mãe soube, Phill chegou e Laura já não queria mais saber de Armando.
— Nossa, que história! Parece novela, filme...
— É, mas isso infelizmente acontece na vida real também. — Sônia parou um pouco de contar, para ter certeza de que Flávia estava acompanhando e entendendo tudo. — Armando não aceitava que Laura o tivesse largado, ainda mais por Phill, que era mais velho. Ele tinha trinta e três anos e Laura, vinte. Armando começou a culpar Carmem e os dois viviam brigando. Ele se formou logo depois e foi embora, deixando Carmem grávida. Nunca mais soubemos dele. A sorte dela foi onofre, que sempre havia sido apaixonado por ela, ter aceitado se casar e criar Carla como se fosse dele. Laura também não sabe disso, pensa que Carla é realmente filha de Onofre. Bom, depois disso tudo, e da morte de Onofre, Carmem nunca mais foi a mesma. Ela já não estava muito bem antes.
— O que aconteceu com Carmem?
— Não sei ao certo, porque nos afastamos. Mas acho que ela não soube lidar com nada do que aconteceu desde que Laura começou a namorar Armando. Parece ter ido enlouquecendo aos poucos, por assim dizer. Não que seja louca, mas não é cem por cento normal. Acho que nunca foi. Não é à toa que Carla também seja um pouco estranha. Carmem a criou com a obsessão de que ela precisa ter o homem que ama a qualquer custo.
— Mas isso ela tem — disse Flávia, lembrando de Luigi. — Não?
— Sim, não há dúvidas que ela ame o namorado, mas a que preço foi isso?
— O que você quer dizer?
Sônia balançou a cabeça e respirou fundo.
— Eu não estou aqui para falar da Carla, mas sim de sua mãe. — Ela olhou para Flávia. — O que sua tia quis falar é isso. Sua tia sabia o que sua mãe era. Mas ela não entendia, nunca entendeu. As pessoas distorcem o que somos, acham que fazemos o mal, que queremos prejudicar os outros para nos darmos bem, mas isso não é verdade. As pessoas que praticam Wicca não fazem mal, porque nosso lema diz justamente o contrário e acreditamos na lei tríplice, de que tudo que se faz vem para você em triplo. Ou seja, se você faz o mal, receberá o mal três vezes maior do que fez. Ninguém quer isso para si próprio.
Flávia ouviu o que Sônia falou e começou a fazer sentindo agora. A conversa de seus tios sobre sua ida para Viçosa, sobre o passado de sua mãe e o poder dela.
— O poder. Minha tia falou do poder da minha mãe. Que poder era esse?
— Sua mãe tinha o poder de conseguir o que desejava. Ela tinha um pensamento muito forte. Se pensava em algo, imaginava a cena dela conseguindo aquela coisa, isso acabava acontecendo. Também tinha uma grande intuição sobre as pessoas, para saber se uma pessoa é boa ou não, se ela seria sua amiga, esse tipo de coisa.
— Isso acontece comigo, às vezes.
— Eu sei disso. — Sônia sorriu. — Desde que te conheci, senti uma força muito grande vindo de você. Quando soube que era filha da Elizabeth, entendi perfeitamente que força era essa. A sua força, Flávia, é bem maior que a da sua mãe. Você só precisa exercitá-la.
— Não sei se quero exercitá-la. — Flávia fez uma careta.
— Eu entendo, isso tudo é muito recente para você. Mas acho que seria bom aperfeiçoar essa força que tem.
— Eu não sou uma bruxa.
— É sim. — Sônia sorriu de maneira amigável. — Você pode não querer exercitar a bruxaria, seguia a Wicca. Mas é uma bruxa, isso não tem como negar. Sua família vem de uma linhagem forte de bruxas, está no seu sangue, basta olhar para você. Não leu o terceiro livro? Quando falava de Mona?
Sônia balançou a cabeça, sem entender o que Sônia queria dizer.
— As bruxas de cabelo vermelho são as mais fortes. E você é forte, muito. Mais que sua mãe.
— Eu achei que isto era uma invenção do livro.
— Não; na verdade, não. Não sei se Anne sabia quando escreveu, mas é uma verdade. As bruxas ruivas, de cabelos vermelhos, são as mais fortes. Você é uma bruxa, uma bruxa forte.
— Eu não sei se quero seguir este caminho...
— Como falei, isto tudo é muito recente para você. Não precisa seguir esse caminho, celebrar os sabbaths. Mas seria bom pelo menos você desenvolver sua força, nem que seja para se proteger.
— Me proteger? — Flávia se assustou. — De quê? De quem?
— Não digo de alguém em especial. Mas uma força protetora sempre é bem-vinda, não acha?
Flávia deu de ombros. Não sabia mais o que pensar.
— Vamos fazer o seguinte: eu trago alguns livros sobre Wicca aqui para você ler. Aí você decide se quer saber mais ou não. Qualquer coisa, também estou à sua disposição. E vou te ensinar alguns exercícios para desenvolver sua força. Não custa nada, só um pouco do seu tempo.
Flávia concordou mecanicamente com a cabeça. Pensou em várias coisas ao mesmo tempo, em toda a história que Sônia contou, em como sua vida foi dirigida até ali, até aquele ponto, para conhecer Sônia, Laura, saber a história de sua mãe.
— O que você falou aquele dia, sobre coincidência não existir...
— Sim, não acredito nisso. Como te falei, certas pessoas são colocadas em nossa vida, nosso caminho, por algum motivo especial. Talvez eu tenha sido colocada em seu caminho para você saber a verdade sobre sua mãe. Talvez porque era para nós nos conhecermos já, caso não tivesse tido o acidente com seus pais. De uma forma ou de outra, era para eu entrar na sua vida em algum momento, e o seu caminho te trouxe aqui para Viçosa, para perto da sua história, desconhecida por você até poucos minutos atrás.
A campainha tocou, interrompenso a conversa das duas. Sônia olhou para Flávia, que só estão percebeu que estava escuro lá fora.
— Eu já estava de saída mesmo, pode deixar que vejo quem é.
Flávia suspirou e agradeceu com o olhar. Não queria sair da cama. Aquela conversa toda mexera muito com ela. Ficou observando Sônia ir até a porta do quarto e estranhou quando parou e ficou alguns segundos quieta, de costas para ela. Sônia se virou fixamente para Flávia. Era o mesmo olhar que tinha no dia em que o Gustavo havia ido visitá-la.
— Aproveite o momento, mas não se envolva. Ainda não é a hora nem a pessoa — disse Sônia em um tom de voz calmo, mas decidido. Depois virou e foi andando para atender a porta. Flávia apenas ficou parada, tentando entender o que ela falou.
Sônia chegou até a porta e a abriu. Viu Felipe parado. Ele sorria, mas, ao vê-la, o sorriso sumiu do seu rosto. Olhou em volta, para checar que estava no lugar certo.
— Er... A Flávia tá aí?
— Está sim, lá no quarto.
— Ela está bem? — Ele tinha um tom de preocupação real. Sônia ficou feliz em saber que Flávia estaria em boa companhia depois que ela saísse dali.
— Está um pouco cansada. Entre. — Ela abriu espaço para Felipe, mas ele estava hesitante.
— Eu posso voltar depois.
— Não, pode entrar. Ela precisa de companhia mesmo, precisa dos amigos no momento.
— O que aconteceu?
— Nada de grave. — Sônia mentiu. — Mas acredito que, se ela quiser, vai falar. Só não a pressione, mas não se preocupe porque ela está bem.
Felipe ficou parado em dúvida. Seu olhar alternou entre Sônia e o corredor do apartamento de Flávia, que levava até seu quarto.
— Eu vou lá falar com ela.
— Faça isso. Fala companhia para ela.
Antes de Felipe sair, Sônia pegou sua mão. Os dois sentiram um forte arrepio pelo corpo e um frio percorreu a espinha de Sônia. Ela olhou fixamente para ele.
— Não se martirize, você não teve culpa do acidente. Não fique pensando mais nisso. Seu amigo está bem onde estiver, e ele não quer que você sofra mais por isso. Se você sofre, ele sofre também.
Sônia soltou a mão de Felipe e saiu do apartamento. Ele ficou parado, olhando para a porta, com os olhos arregalados e a boca aberta, sem entender como sabia daquilo. Felipe sentiu um grande nó na sua garganta e tentou, em vão, segurar as lágrimas que inundaram seus olhos, escorrendo pelo rosto.
— Felipe? — disse Flávia, saindo do seu quarto. Ele não se moveu. Ela se aproximou cuidadosamente, chamando0o outra vez, sem uma reação dele. Flávia colocou a mão no ombro do amigo. — Felipe, você está bem?
— Não... — Felipe virou para Flávia e a abraçou, chorando compulsivamente.
— Meu Deus, o que aconteceu?
— Eu... Ela... O Ricardo... O acidente...
Felipe não falava nada claro e Flávia ficou preocupada com o amigo. Ela o levou até o sofá, obrigando-o a sentar. Foi até a cozinha e pegou um copo de água com açúcar. Quando voltou para a sala, Felipe estava parado na mesma posição em que ela o deixou. Estava sentado, com os braços caídos ao longo do corpo, olhando fixo para a frente, enquanto as lágrimas caíam pelo seu rosto.
— Felipe, me diz o que aconteceu, estou começando a ficar preocupada.
— A sua amiga estava aqui...
— A Sônia? O que tem ela? O que ela te fez?
— Ela disse... Disse que eu não tive culpa no acidente. Que o Ricardo quer me ver feliz. Isso não tem lógica. — Felipe finalmente olhou para Flávia, que deu um longo suspiro.
— Felipe, calma... Como eu vou te explicar isso? — Flávia ficou alguns segundos pensativa. — A Sônia é, digamos, um pouco sensitiva. Ela fala algumas coisas sobre a gente, parece que ela adivinha o que vai acontecer, o que estamos pensando.
— Ela é médium?
— Acho que esse termo serve para ela, pode ser uma forma de explicar.
— Então ela conversa com o Ricardo? — Felipe se assustou.
— Não, não acho que ela chegue a conversar com espíritos. Acho que apenas sente o que a gente sente, sente as coisas ao nosso redor. Não sei explicar. — Flávia pediu desculpas com os olhos.
Felipe ficou quieto, e ela percebeu o quanto ele estava mexido com aquilo tudo. Ele se encostou no sofá e continuou olhando para a frente. Flávia ficou ao seu lado, esperando que ele falasse algo. Também tinha vários pensamentos na cabeça e precisava organizar tudo que Sônia havia lhe contado. Depois de um longo tempo, Felipe começou a falar, sem olhar para ela.
— Eu fui almoçar no Lenha e o George comentou que você estava aqui. Estranhei, achei que você ia para Lavras. ia vir logo depois que saí de lá, mas precisei ver algumas coisas na rua, por isso cheguei só agora de noite.
— É, eu fui... Mas acabei voltando.
— O que aconteceu? — Felipe olhou para ela. Fávia notou os olhos inchados. — Se eu puder saber, se você quiser falar.
— É complicado... — Flávia suspirou e desviou o olhar. — Eu cheguei lá e ouvi uma conversa dos meus tios, falando de mim, da minha mãe. Não tive mais condições de ficar lá e voltei para cá; precisava conversar com a Sônia, ela foi amiga da minha mãe durante muitos anos. — Flávia falava tudo direto, sem pausa. Felipe apenas a olhava, balançando a cabeça, às vezes.
— E a conversa foi boa?
— Foi... estranha. Mas acho que se pode dizer que foi boa.
— Você não está com cara de quem teve uma conversa boa. — Felipe esboçou um sorriso e Flávia o acompanhou.
— Talvez eu ainda não tenha entendido o que a conversa significa. Sei lá. — Ela balançou a cabeça, como se tentasse espantar os pensamentos. Os dois ficaram quietos por um longo tempo, se olhando.
— Vem cá. — Ele a puxou para perto e a abraçou. Flávia se sentiu bem naquele abraço. Era reconfortante demais e era o que ela precisava naquele momento. Não sabia o que mais a deixava calma no abraço, se era o fato de Felipe ser tão grande que praticamente a envolvia ou se era a forte amizade que existia entre eles. Sentiu seus olhos marejarem, mas não queria chorar, só que isto era inevitável, naquele instante. — Parece que estamos bem hoje, né?
— Você quer me fazer chorar mais? — disse ela rindo nervosamente, se afastando e limpando as lágrimas.
— Ô, Caloura, não quero te deixar pior. Quero te deixar melhor.
Felipe abriu o lindo e largo sorriso de que Flávia tanto gostava e ficou encarando-a. Aquilo era aconchegante demais. Ela olhou para ele e retribuiu o sorriso, embora soubesse que jamais sorriria daquele jeito, que seu sorriso jamais teria o mesmo efeito. Ficaram um tempo se encarando, e Flávia começou a se sentir desconfortável com o olhar dele.
— Vem cá. — Ele a puxou novamente e Flávia percebeu o que estava prestes a acontecer. Antes que pudesse se afastar, Felipe a abraçou forte e deu um beijo no pescoço dela. Flávia sentiu um arrepio pelo corpo. Ficou parada com os braços para baixo, sem reação, sentindo seu coração acelerar. Fechou os olhos. Felipe foi subindo para seu rosto, sem deixar de beijá-la, até chegar próximo à sua boca. Flávia prendeu a respiração. Ele a enxarou e ela abriu lentamente os olhos. Ele sorriu com o canto da boca e foi se aproximando devagar. Flávia podia sentir a respiração dele bem próxima.
— Felipe...
Antes que ela pudesse falar qualquer coisa, Felipe a beijou. Primeiro um beijo lento, calmo. Depois o beijo se tornou mais intenso, e Flávia não conseguiu resistir. Ela o abraçou e se deixou levar pelo momento.
Autor(a): biiviegas
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