Fanfics Brasil - Capítulo 11 Prometida - Uma longa jornada para casa (Levyrroni)

Fanfic: Prometida - Uma longa jornada para casa (Levyrroni) | Tema: Levyrroni [Adaptada]


Capítulo: Capítulo 11

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  • Eu sempre soube que Dulce guardava um segredo. Ela aparecera em nossa propriedade com um corte na cabeça e roupas que mais pareciam trapos que mal lhe cobriam o dorso e os quadris. Chegamos a pensar que tivesse sido assaltada. Ela negara, claro, mas nunca contou o que realmente havia acontecido. Não para mim, pelo menos. E eu não me importava. Ela fazia tão bem a Christopher — a mim! — que eu não precisava realmente saber como ou por que viera até nós. Ela simplesmente viera.


    No entanto, algum tempo depois do casamento deles, eu ouvira parte de uma conversa. Eu não estava espionando. Ia passar um recado a meu irmão e encontrei a porta entreaberta. A voz do casal me alcançou antes que eu pudesse bater e... bem... acabei ouvindo tudo. Dulce viajara no tempo; viera de outra era, mais moderna, por isso suas maneiras tão peculiares. Eu não compreendia como


    aquilo podia ser possível, mas estava claro que Dulce era diferente de todos nós.


    Saber que vinha de outro mundo explicava tudo, embora os mecanismos parecessem irreais para mim. E ela dissera algo mais. Garantira a Christopher, com uma certeza assombrosa, que William seria o homem da minha vida, confirmando a certeza que pulsava em meu peito.


    Por muitas vezes me peguei pensando em como seria esse lugar onde ela viveu. Mas nunca, nem uma única vez, me passou pela cabeça que eu teria a chance de conhecer aquele mundo pessoalmente.


    Depois de uma terrível discussão com Christopher na madrugada após o baile, na qual ele me recriminara por ter ido até o jardim com William e eu o acusara de arruinar minha vida indo atrás de mim, eu entrei em seu escritório para apanhar o livro que havia deixado ali mais cedo, na esperança de que o sr. Shakespeare pudesse ajudar a acalmar meus nervos.


    Então eu ouvi aquele zumbido vindo da gaveta da mesa de madeira maciça do meu irmão, e a curiosidade acabou me vencendo. O que encontrei ali foi uma máquina diminuta, ruidosa e fria que não se parecia com nada que eu já tivesse visto. Mas, ah, como era poderosa.


    E perigosa!


    Em uma explosão branca e fria, fui transportada para o mundo de onde minha querida irmã viera: o ano de 2011. É claro que, de início, eu não entendi o que estava acontecendo. Em um minuto eu estava no escritório do meu irmão, e no seguinte... também, só que não exatamente. Estava escuro, a única fonte de luz vinha do lado de fora, meio esbranquiçada, e mesmo assim consegui distinguir o cômodo. Era o escritório de Christopher, mas a cor das paredes não estava certa. Nem a mobília.


    — Christopher — chamei, mas minha voz mal passou de um zumbido. — Christopher! — falei mais alto.


    Deixei o objeto que encontrara na gaveta sobre uma mesa totalmente feita de vidro e me afastei alguns passos. Recuei até bater as pernas em um vaso grande. A planta ameaçou tombar. Eu a segurei pelas folhas, endireitando-a, e franzi a testa. Não era uma planta. Era feita de um material áspero, que lembrava tecido engomado. Soltei o que quer que aquilo fosse imediatamente.


    — Christopher!


    Corri para a porta e saí aos tropeços, o coração pulsando no mesmo ritmo dos meus passos.


    Trombei em alguma coisa. Um aparador que não deveria estar ali. Havia um pequeno quadro sobre ele. Mesmo com a parca luz, consegui divisar rostos tão reais, como se as pessoas tivessem encolhido e congelado dentro dele.


    Assustada, acabei por derrubá-lo no chão. Ouvi o barulho de vidro se partindo enquanto saía correndo, chamando por Christopher, por Dulce. Ao chegar no quarto deles, encontrei a porta trancada. Bati muitas vezes, até minha mão começar a doer.


    Mas ninguém respondeu e eu tinha a impressão de que nem responderia. Olhei para o corredor, mirando a porta do meu próprio quarto. A passos lentos e hesitantes, parei diante dele e forcei a tranca. A porta se abriu com um nhec agudo. Tudo que era meu havia sido substituído por uma mobília reta de aparência pouco confortável. Experimentei entrar, vendo nas paredes gravuras coloridas de coisas que eu não compreendia.


    Andei pela casa toda, e gostaria de ter encontrado uma vela para poder entender melhor aqueles objetos esquisitos sobre a mobília, nas paredes, mas não parecia haver uma em lugar algum, nem qualquer sinal da minha família.


    Acabei ficando na sala, encolhida em um canto, encarando a porta. Não sabia o que tinha acontecido, não sabia se alguém apareceria, não sabia o que pensar.


    Tudo o que eu sabia era que tinha brigado com meu irmão, sido dura com ele quando tudo o que fez foi tentar me proteger do erro que eu havia cometido.


    Eu só sabia que, pela primeira vez na vida, eu tinha feito o que queria, e por consequência acabei noiva de um homem que parecia nunca ter tido a intenção de me propor casamento.


    Meu coração estava aos pedaços.


    Levou muito tempo até que alguma coisa acontecesse, além dos ruídos estranhos que eu ouvia do lado de fora.


    — Oh, graças a Deus — exclamei, me levantando de um pulo, quando um rapaz que eu nunca vira antes abriu a porta. Meus cabelos soltos me caíram no rosto.


    — Jesus Cristo! É a menina de O chamado! Vade retro, Satanás! — Fez o sinal da cruz.


    Eu não tinha tempo para entender o que ele dizia. Afastei os cabelos do rosto e dei um passo. Ele se afastou outra vez.


    — Meu senhor, eu preciso de sua ajuda. Toda a minha família desapareceu.


    Já procurei pela casa toda, mas todos sumiram depois que eu vi a luz. A mobília também. Não compreendo o que está acontecendo!


    Uma mulher de cabelos vermelhos como as pétalas de uma rosa passou pelo batente. Teve uma reação um pouco diferente da do rapaz.


    — Quem diabos é você? — ela exigiu, em tom pouco amistoso.


    — Sou Maite William, esta casa é minha e eu...


    — O cacete que é sua! Como foi que você entrou aqui? Ah, pelo amor de Deus. Se você quebrou uma das janelas...


    — Senhora! — eu a interrompi. — Estou lhe dizendo que minha família desapareceu! Tudo na casa sumiu! A minha família, a mobília, as velas! Não restou nada além deste esqueleto de tijolos depois que eu vi aquela luz. Acho que a luz os levou embora!


    Ou... levou a mim, compreendi, já que o rapaz usava roupas muito diferentes das que eu conhecia e a mulher tinha um traje azul que mal lhe chegava aos joelhos. Eu vira apenas uma vez na vida alguém usando roupas que deixavam as pernas de fora.


    Foi aí que eu entendi. Minha família não tinha desaparecido. Eu tinha.


    O homem levou a mão ao bolso da calça preta e de lá tirou algo muito semelhante ao que eu encontrara no escritório de Christopher pouco antes. Recuei, assustada.


    — Fica calma — falou o rapaz. — Nada de mal vai te acontecer. É só ficar calma. De boa. Nada vai acontecer.


    Algo duro me acertou a cabeça. Uma vassoura!


    — Safada! — gritou a mulher de cabelos carmim. — Achou que ia conseguir uma grana roubando a casa e acabou ficando presa, né? Pois agora você vai aprender a não invadir a casa onde eu trabalho!


    — Alô, eu preciso da polícia aqui. A casa foi invadida — ouvi o rapaz dizer.


    — Eu não invadi! Eu moro aqui! Como poderia roubar alguma coisa? Mas eu me perdi da minha família depois que vi aquela luz!


    — A luz! O pó devia ser do bom, né, querida? — Ela me atacou de novo.


    Estendi o braço, peguei a primeira coisa que encontrei e atirei. Eu não esperava ferir ninguém, só queria que aquela mulher parasse de me bater.


    Infelizmente, o pequeno quadro que arremessei acertou a cabeça do rapaz.


    — Ai! Andem logo! Ela está nos atacando.


    — Eu não estou! — Não sei com quem ele falava, mas não havia tempo para descobrir com aquela mulher fora de si me dando vassouradas. — Me perdoe, senhor! Não queria machucá-lo, apenas... Pare com isso, minha senhora! — gritei quando a mulher me acertou no traseiro.


    Mas ela não parou. E, quando percebi, havia mais pessoas na sala. A guarda local. Tentei explicar a eles o que estava acontecendo, mas ninguém pareceu entender. Fui colocada em uma espécie de carruagem sem cavalos que fazia muito barulho e se movia muito rápido. Depois disso, tudo fica meio borrado.


    Lembro de uma sala escura e fétida, com papéis se empilhando em um canto. A seguir, de um lugar branco com um cheiro estranho que fazia meu nariz arder.


    Vez ou outra, alguém furava meu braço. Eu mal conseguia implorar para que parassem, pois era dominada por uma sensação esquisita, uma letargia confusa, como se eu me desprendesse de meu corpo e flutuasse. Quando aquela sensação ia embora, eu me sentia como se minha cabeça tivesse sido pisoteada por uma manada de elefantes.


    Foi em um desses raros momentos de lucidez que conheci Alexander. Ele entrou sorrindo no quarto ao qual eu fora confinada, aparentando amabilidade e gentileza. Era muito bonito, e a cicatriz na lateral da testa criava um ar de mistério ao seu redor.


    — Maite Uckermann! — disse, fechando a porta. — Finalmente nos conhecemos.


    Eu me sentei, alerta, naquela cama estreita com grades. Ninguém naquele lugar me chamava pelo nome. Era só “a garota que viu a luz” isso e “a garota que viu a luz” aquilo.


    — Você sabe quem eu sou? — perguntei.


    — Ué, e como não saberia? O Christopher fala de você o tempo todo. Só elogios, claro. Tá pra nascer um irmão mais orgulhoso ou protetor que ele. Ele sempre foi assim, né? Desde antes dos pais de vocês morrerem.


    — Sim. — Oh, graças a Deus! Alguém que não era maluco naquele lugar, afinal.—


    Cara, imagino quanto ele deve estar preocupado agora, com você assim, tão longe de casa. É por isso que eu vim aqui me apresentar. Fiquei preocupado que você não encontrasse outros conhecidos.


    — Perdoe-me, senhor...


    — Alexander. — Ele parou ao lado da cama. — Só Alexander.


    — Sr. Alexander — repeti. — Eu realmente não conheço ninguém aqui. E não sei como fazer para voltar para casa. Nem sei como...


    — Ah, não. Não precisa fazer essa carinha, linda. — Ele deu dois tapinhas em minha mão. — Já saquei tudo. Você tá pensando que tá sozinha.


    — Completamente!


    — Mas você tá errada, Maite. Eu tô aqui. Vou te ajudar a encontrar seu irmão. Ou esperar ele vir te buscar. — Enfiou as mãos nos bolsos, erguendo os ombros. — O que acontecer primeiro.


    — Acha que Christopher virá? — perguntei, a esperança espiralando por todo o meu corpo.


    — Eu não tenho dúvidas. — Seu tom de voz mudou, tornando-se um tanto sombrio. Então ele piscou, voltando ao humor de antes. — Tenho certeza de que ele deve ter falado de mim pra você. Ou talvez a Dulce.


    — Bem... Não me recordo. Minha cabeça está esquisita. Este lugar me deixa confusa.


    — Deixa a todos nós, linda.


    Alexander me contou, então, de sua “amizade” com meu irmão, e eu não vi motivos para não acreditar nele. Ele dissera coisas que apenas alguém realmente próximo de Christopher saberia. Por isso eu permiti que ele me tirasse do que, descobri depois, era um hospital e me apresentasse seu mundo. E tudo ali era diferente: as roupas, as construções, os cheiros, os sons, a maneira de falar. De todas as diferenças que encontrei entre aquele mundo e o meu, a que mais me maravilhou foi o destino das mulheres. Elas não eram mais parte da mobília da casa. Agora desempenhavam papéis importantes na sociedade — conduzindo veículos imensos, exercendo a medicina, lidando com bandidos, vivendo. Eu não escolheria aquele lugar para chamar de meu, mas confesso que testemunhar essa mudança me causou alívio.


    No começo, fiquei um pouco apreensiva em me hospedar no apartamento de Alexander, um rapaz solteiro, sem família ou empregados. Minha reputação não sobreviveria se alguém soubesse disso. Mas eu não estava em condições de me importar com minha honra naquele momento, então aceitei sua ajuda e descobri que ele era um rapaz muito gentil e divertido.


    Foi graças à ajuda de Alexander que consegui me manter em segurança, pois minha memória começou a falhar cada vez com mais frequência.


    Nos momentos de clareza, eu sofria. Não sabia se um dia voltaria a ver minha família, e, conforme os dias iam passando e nada acontecia, minha esperança minguava. Dulce levara meses para conseguir retornar. E o que mais me partia o coração em pedaços era saber que na última vez em que estive com meu irmão nós havíamos discutido. Pensar que nunca mais o veria me doía na alma. Que eu nunca teria a chance de lhe pedir desculpas, de abraçá-lo, de abraçar Dulce ou ver Marina crescer.


    E eu também sofria por William. Muito! O que ele estaria pensando sobre meu desaparecimento?


    Para tentar manter a sanidade, eu escrevia para ele, contando tudo o que via, o medo que sentia, meus sentimentos por ele, coisas que eu descobrira e que pensava que ele ficaria feliz em saber, por exemplo, que o tifo tinha cura, segundo me dissera Alexander. Naquelas cartas tive com William a conversa que nunca chegara a acontecer, por culpa daquela viagem insana.


    — Você devia guardar estas cartas, linda — Alexander aconselhou, logo depois de preparar o almoço em sua casa pouco espaçosa, mas muito agradável.


    — Talvez o William gostasse de ler um dia.


    — É provável que ele pense que eu perdi o juízo. — Amassei o papel, mas o segurei de encontro ao coração.


    — Você é quem sabe. — Pressionou os lábios, como se me reprovasse. — Essa camiseta ficou legal em você.


    Olhei para o que ele chamava de camiseta. Uma espécie de chemise curta e com mangas que era usada como roupa. As vestes do tempo de Dulce eram... bem... diferentes. Muitas delas eram menores que minhas roupas de baixo.


    Alexander me dera uma calça e algumas chemises que, ele me garantiu, eram para ser usadas como roupas. As lingeries, coisinhas minúsculas que eu mal conseguia discernir o que era o quê, eu usara apenas nas ocasiões em que meu culote estava secando. Era um pouco complicado me vestir sem ter ajuda, e, quando terminava de me aprontar, cada curva do meu corpo estava exposta. No entanto, daquela chemise preta eu havia gostado.


    — Obrigada, Alexander. Eu gostei muito desta peça. É bastante emblemática. Me traz paz usá-la porque, neste momento, eu preciso de toda a ajuda que puder conseguir. Uma chemise... humm... camiseta com um motivo religioso me faz sentir melhor.


    — Camiseta religiosa? — Ele arqueou uma sobrancelha, fazendo sua cicatriz sorrir.—Estou supondo que este A.C. e D.C. desenhados nela estão relacionados


    ao nosso Salvador, não? Ele gargalhou tão alto que as janelas do pequeno apartamento sacudiram.


    — Do que está rindo? — Minhas bochechas ficaram quentes.


    — Do Salvador. Vou te contar uma coisa. Também acho que os caras do AC/DC deviam ser elevados à categoria de Salvador, porque a música de hoje em dia, em alguns casos, é sofrível.


    — Eu... não entendo — murmurei, confusa.


    Ele apertou a boca até se tornar uma fina linha esbranquiçada.


    — Desculpa, Maite. Eu tentei fazer uma brincadeira. Mas, já que você tocou no assunto, gostaria de ir a um show mais tarde? Tenho certeza que você vai adorar! Música da melhor qualidade! Quem sabe não damos sorte e encontramos o seu irmão?


    — Obrigada, sr. Alexander. Eu gostaria muito.


    Não tivemos sorte, embora depois eu tivesse ficado sabendo que meu irmão também estivera naquele espetáculo. Dois dias depois, porém, graças aos céus — e a Alexander, eu desconfiava —, consegui reencontrar minha família. Como Alexander garantira, Christopher e Dulce foram ao meu socorro. Eles estavam procurando por mim fazia dias, mas tiveram um pouco mais de dificuldade com as buscas depois que encontraram um parente de Dulce e ele caiu doente. Então, depois de longos, estranhos e desorientadores cinco dias, finalmente voltamos para casa. Alexander se ferira para nos ajudar, no entanto. Levou um tiro no ombro, e meu coração se apertava por não ter notícias dele. Por não saber se sobreviveu ou não. Christopher me garantira que ele ficaria bem.


    E foi por meio de meu irmão que descobri que Alexander não era exatamente quem dissera ser. Ele mentira para mim. Nem Christopher nem Dulce o conheciam. Ele apenas me usara para chegar até meu irmão. Fui enganada por ele e me sentia humilhada por minha estupidez. Eu me deixara cegar por suas gentilezas, pensando nele como um amigo querido, quando não passei de uma ferramenta para que ele pudesse atingir seu propósito. Jamais poderia perdoá-lo por isso.


    Ao voltar para casa, para o meu tempo, tive uma conversa franca com Christopher e nós nos entendemos. Ele me surpreendeu ao me dar a escolha de cancelar o compromisso com William, dizendo que apoiaria qualquer decisão que eu tomasse.


    E minha decisão foi manter o noivado.


    Se William não o rompesse, claro.


    Minha família e eu havíamos perambulado pelas ruas da vila na manhã seguinte ao nosso regresso, explicando que tudo não passara de um malentendido e que minha ausência se dera porque um parente de Dulce caíra doente. E era verdade, só não toda ela. Percebi que tanto Christopher quanto Dulce eram muito cuidadosos no que diziam, sem jamais deixar escapar o nome de um objeto do tempo dela ou se alongar muito quando questionavam por que era tão complicado voltar de lá. Era assim que protegiam a origem de minha irmã.


    Com William, no entanto, foi mais complicado.


    Eu o reencontrei na casa do primo Alfonso. Anahí passara mal aos seis meses de gravidez, e o dr. Almeida tinha sido chamado. No entanto, não foi o médico que apareceu.


    Bem... foi um médico. Só não era o médico que eu esperava ver.


    Assim que entrou na sala, os olhos de William pousaram em mim como se tivessem sido atraídos. Ele se deteve, e seu olhar percorreu meu corpo discretamente, como que para se certificar de que eu estava bem, antes de retornar ao meu rosto. Meus batimentos cardíacos perderam o compasso, para em seguida desandar a voar. Seu semblante parecia coberto por uma cortina espessa de tristeza, mágoa, decepção e dúvidas. Se a causa era o meu desaparecimento ou o compromisso que ele se vira obrigado a assumir, eu não sabia. Talvez fosse um pouco dos dois.


    Depois que atendeu Anahí, e me garantiu que minha amiga passava bem, William quis falar comigo. Endireitando os ombros, eu o segui até o jardim, e me sentei no banco de madeira.


    Ele, porém, preferiu ficar de pé, mudo feito as bromélias atrás de si.


    — Como... tem passado, doutor? — arrisquei. Já não suportava mais o silêncio.


    — Um tanto atarefado desde que Almeida decidiu viajar.


    — Fico contente em saber que o senhor conseguiu vencer a resistência da...


    — Onde esteve? — ele atalhou, bruscamente.


    — Eu... estive na cidade de Dulce. — Como, em nome de Deus, eu poderia explicar algo mais? Ele nunca acreditaria em mim. Eu mesma tinha dificuldade de acreditar, mesmo tendo visto aquele mundo moderno com meus próprios olhos. De toda forma, achava difícil que William acreditasse em mim. Eu estava convencida de que ele pensaria que eu inventara tudo, uma desculpa descabida e impossível. E como culpá-lo? Quem acreditaria que era possível viajar no tempo?


    Mas o principal motivo que me fizera manter a boca fechada era Dulce. Se eu revelasse onde estivera, teria de explicar tudo, desde o começo. Eu não sabia quais complicações isso teria, mas sabia que teria. Caso contrário, por que ela e Christopher haviam se esforçado tanto para encontrar as palavras para todas aquelas pessoas da vila? Por que ela teria escondido de mim? Se eu não tivesse ouvido sua conversa com Christopher, jamais teria sabido. Se ela decidira manter sua origem em segredo — até de mim —, como eu poderia traí-la?


    Eu não podia. E não ia.


    — E por quê? — William exigiu, estreitando os olhos.


    — Não posso explicar. Tudo o que posso dizer é que nada do que ouviu é verdade. Não dei um mau passo. Preciso que acredite em mim.


    — Não pode ou não quer explicar? — Ele chegou mais perto. — Foi uma fuga movida pela rebeldia? Ou pelo coração?


    Olhei para ele, magoada.


    — Pensei que me conhecesse melhor.


    — Eu também. — Seu rosto era uma máscara obscura. — Por que fugiu de mim?


    — Eu não fugi!


    — Você não queria aceitar meu pedido. — Ele nem ao menos tentou ocultar a mágoa em seu tom. Ou a raiva.


    — E você não queria fazê-lo!


    — Não — foi sua reposta.


    — Por que está fazendo isso? — Afundei o rosto entre as mãos. — Por que me tortura desta maneira? Se não pode acreditar em mim, então diga o que tem a dizer de uma vez por todas para que possamos tentar sair desta situação com alguma dignidade.


    — Alguma dignidade?! — gritou, me fazendo olhar para ele. — E por acaso me restou alguma? Minha noiva desaparece na manhã seguinte ao anúncio do nosso noivado. Retorna cinco dias depois e não me diz palavra sobre seu sumiço!


    Como posso manter alguma dignidade?


    Eu me levantei, ficando cara a cara com ele. Tive de inclinar a cabeça, já que ele era mais alto alguns bons centímetros.


    — Pois faça logo o que deve ser feito para restaurá-la. Punir-me desta maneira é cruel, e eu sei que não é assim. Coloque um ponto-final em nosso compromisso para que nós dois possamos seguir com nossa vida!


    — É isso o que quer? Foi por isso que fugiu?


    Doeu demais ver a desconfiança em seu olhar, ouvi-la distorcer sua voz.


    — Eu não fugi!


    — Você não pode explicar por que fugiu do seu noivo após ele lhe pedir a mão. — Ele riu com amargura. — Sabe como isso soa? Sabe o que se passa em minha cabeça agora? Você não quer se casar comigo. Deixou isso muito claro na noite em que eu pedi sua mão. E, no dia seguinte, você desaparece. Nem mesmo seu irmão conhecia seu paradeiro. — Sua voz subiu algumas oitavas. — Não venha me dizer que não fugiu! Foi exatamente o que você fez!


    — Não! Eu fui forçada a me ausentar!


    — Forçada por quem? — Seu peito subia e descia rápido demais.


    Mordi o lábio para que o segredo de Dulce ficasse a salvo.


    William notou que eu não lhe diria nada, a julgar pela sombra escura que embotou seu olhar.


    — Compreendo.


    Então era assim que tudo terminava. Pude ouvir meu coração se estilhaçar, lançando cacos em todas as direções, até que tudo que senti foi agonia. Eu devia me preocupar com o que me aconteceria depois que todos soubessem que o noivado estava desfeito. Mas não pude. Tudo o que eu conseguia pensar era que eu tinha perdido, de maneira irrevogável, o homem que amava.


    Obriguei as lágrimas a retrocederem, pois a última coisa que eu queria era que ele me visse chorar. Minha voz, no entanto, estava embargada quando falei, mantendo os olhos no chão:


    — Devo entrar agora. Minha família teve muito trabalho para tentar restaurar minha reputação esta manhã. Não vou dar motivos para que boatos infundados continuem. Mas não se preocupe com Christopher. Ele já esperava que o senhor retirasse o pedido.


    Comecei a voltar para casa. Obstinado, William me segurou pelo braço, me detendo.


    — Eu não me lembro de ter retirado o pedido.


    Pisquei, confusa como nunca.


    — Mas eu pensei que...


    — Sei o que você pensou — cortou, zangado. — E não nego que isso me passou pela cabeça mais de uma vez durante a sua ausência. Ou mesmo agora. Você não me diz o que a levou a se afastar tão abruptamente, então só posso fazer conjecturas. E nenhuma delas lhe é muito favorável.


    — Por que não pode confiar em mim? — gemi, desamparada.


    Aquelas íris que eu amava tanto foram enevoadas pela mágoa.


    — Você me pede para confiar em você, mas não confia em mim o bastante para me contar o que houve. Não está sendo justa, Maite.


    Aquela era a primeira vez que ele me chamava apenas pelo meu nome.


    Não pareceu se dar conta, mas eu sim.


    — Ainda assim — continuou em voz baixa —, vou manter minha palavra.


    — E por quê? — Diga que se preocupa comigo. Diga que acredita em mim.


    Diga que me ama!


    — Porque, se eu romper o noivado agora, serei o único responsável pela sua ruína. — Abriu um sorriso triste. — Irônico, não?


    — Não cabe a você me salvar! — Empinei o queixo.


    Seu olhar passeou por meu rosto. Uma faísca chispou em seus olhos.


    Soltando meu braço, ele acariciou minha bochecha com o nó dos dedos. O toque suave reverberou por todo o meu corpo.


    — Não cabe a mim destruí-la, Maite — sussurrou.


    Minha respiração perdeu o compasso logo que seu olhar se fixou em minha boca. No entanto, ele se afastou inesperadamente, levando as mãos à cabeça.


    Então andou de um lado para o outro, murmurando alguma coisa que não fui capaz de ouvir.


    Parou diante de mim.


    — Por favor, seja franca comigo. Você deseja desfazer o noivado? — perguntou.


    Atordoada, neguei com a cabeça.


    — Pois bem. — Inspirou fundo. — Serei seu por honra. Preciso apenas de um tempo para conseguir me estabelecer e então marcaremos a data.


    Com uma mesura curta, ele girou sobre os calcanhares e atravessou o jardim em direção a casa. Eu fiquei para trás, as mãos pressionadas no centro do peito para tentar deter a dor que me atravessava.


    “Serei seu por honra”, dissera ele.


    Não por amor.






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Autor(a): Fer Linhares

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 32



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  • poly_ Postado em 13/09/2019 - 14:11:41

    Desculpa a demora pra comentar, tô com muitos trabalhos, mas finalmente consegui vir aqui. E Simmm, posta a continuação, vou adorar. Bjuss!!!

  • poly_ Postado em 05/09/2019 - 12:28:41

    Menina quem imaginaria que era o Matias? Fiquei pasma. Nem acredito que tá acabando, vou sentir muita falta. Depois desse vc podia fazer uma adaptação Levyrroni do livro A Lady de Lyon, tô louquinha pra ler esse livro, dizem que é muito bom. Bjuss!!!

    • Fer Linhares Postado em 07/09/2019 - 19:22:35

      Vou ler esse livro, assim que eu terminar eu posto, bjss ;)

  • tehhlevyrroni Postado em 02/09/2019 - 11:58:23

    continua amo esse livro e vou amar mais ainda adaptado para Levyrroni

    • Fer Linhares Postado em 03/09/2019 - 20:09:23

      Continuando linda, bjss ;)

  • poly_ Postado em 31/08/2019 - 00:27:37

    Certeza q é o Duarte q fez isso, esse nojento. Mas tenho fé que o Will vai salva-la, tomara que ele consiga e ninguém fique ferido. Q momento fofo deles dois, amei. Continuaaa

    • Fer Linhares Postado em 31/08/2019 - 11:40:07

      Eles precisavam de um tempo só pra eles bjss ;)

  • poly_ Postado em 30/08/2019 - 13:02:45

    Aí mds, posso bater no William? Kkkkkk Continuaaaa

    • Fer Linhares Postado em 30/08/2019 - 17:02:44

      Pode kkk , me chama pra ajudar tbm kkk bjs ;)

  • poly_ Postado em 27/08/2019 - 23:50:45

    Tomara que eles sentem e se resolvam, e q Maite fale logo a verdade. Continuaaa

    • Fer Linhares Postado em 30/08/2019 - 11:17:06

      Do jeito que eles são, duvido que eles se resolvam calmamente kkk bjs ;)

  • poly_ Postado em 27/08/2019 - 15:26:50

    Aí q ódio de td mundo, da Maite por ser inocente ao ponto de ir atrás do homem, do William por ser um teimoso e principalmente desse Alex. Continuaaa

  • poly_ Postado em 26/08/2019 - 22:19:08

    Não vejo a hora de saber o que vai acontecer, parou na melhor parte. Continuaaaa

    • Fer Linhares Postado em 26/08/2019 - 23:53:59

      Do próximo capítulo em diante as coisas vão começar a esquentar, amanhã eu volto a postar, bjsss ;)

  • poly_ Postado em 26/08/2019 - 01:05:46

    Tô amando mulher, continuaaa (OBS: Ri demais com a briga do William com o irmão KKKKKKKKK)

  • poly_ Postado em 24/08/2019 - 13:34:10

    Ahh não acredito que Berta interrompeu esse momento. Pelo menos já estamos tendo um sinal de redenção né. Continuaa

    • Fer Linhares Postado em 25/08/2019 - 01:13:21

      Berta não e o problema agr kk, tem coisa ainda pra acontecer bjs ;)


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