Fanfics Brasil - Capítulo 23 Prometida - Uma longa jornada para casa (Levyrroni)

Fanfic: Prometida - Uma longa jornada para casa (Levyrroni) | Tema: Levyrroni [Adaptada]


Capítulo: Capítulo 23

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A luz incidiu bruscamente sobre minhas pálpebras.


— Bom dia, senhora. Dormiu bem? — perguntou Berta, continuando a abrir as cortinas.


Eu teria adorado ficar mais um pouco na cama, mas a mulher estava decidida a me tirar de lá.


— Dormi bem, obrigada. — Era uma completa mentira. Eu não conseguira fechar os olhos, em parte porque meus pensamentos não tinham me dado trégua, em parte porque estava nua naquela cama, e isso era estranho.


— Aposto que dormiu. — Ela deixou escapar uma risadinha ao pegar a camisa de William, enroscada na penteadeira.


Oh. Ela estava pensando que William e eu...


Puxei o lençol até a altura do pescoço, observando Berta zanzar pelo quarto para preparar minha toalete.


— A água está quente. Venha, vou lhe ajudar a se lavar. Seu marido já se levantou e espera na sala, querida.


— Obrigada, sra. Veiga, mas não é necessário. Sou capaz de cuidar de minha toalete sozinha.


Ela se deteve, os olhos esbugalhados.


— Eu lhe desagrado, senhora?


— Ah, não! Apenas gosto de fazer minha toalete sozinha. A senhora é ótima, sra. Veiga. Honestamente.


Ela olhou para baixo, as mãos unidas na altura da cintura, em um gesto muito parecido com o que Madalena fazia quando ficava chateada.


— Oh, está bem! — Passei o lençol ao redor do corpo e me levantei.


Berta observou a cama agora vazia, e seus olhos reluziram. Olhei por sobre o ombro para entender o que tanto lhe agradara e avistei sobre o colchão o lenço sujo de sangue — aquele que William usara para cuidar do corte em sua mão na noite anterior.


— Sempre soube que o que diziam era calúnia. — Ela me sorriu largamente.


A princípio, não compreendi o que ela quis dizer, mas então uma conversa que tive com Dulce me veio à mente. Mulheres tendiam a sangrar na primeira vez que faziam amor.


Aquele lenço maculado de vermelho parecia ser a única coisa que eu via em todo o quarto.


Berta agora pensava que William e eu tínhamos...


Oh, tudo ficava cada vez pior! Minha vida se tornara uma sucessão de mentiras.


Enquanto eu me banhava, via através das frestas do biombo Veiga trabalhar furiosamente, esvaziando meu baú e acomodando seu conteúdo dentro da cômoda e do guarda-roupa. Ela se interrompeu quando terminei, para me ajudar com o espartilho e prender meus cabelos. Como estavam muito longos, ela conseguiu torcê-los no alto, deixando as mechas me caírem sobre os ombros.


Contemplei, com os olhos esbugalhados, meu novo guarda-roupa.


Vermelhos, azuis profundos, verdes intensos, estampados.


— São belíssimos, senhora. — Berta pegou um dos vestidos, acomodando-o no cabide. — Qual gostaria de usar hoje?


— Acho que este aqui. — Apanhei um que ainda estava sobre a cama: branco com bolinhas azul-marinho e um largo cinto de cetim vermelho.


Era lindíssimo, mas o decote, percebi assim que estava dentro dele, permitia entrever o início da junção entre meus seios. Os outros seguiam o mesmo estilo.


Coloquei um xale de renda branca sobre os ombros.


— Não! — Joguei o xale sobre a poltrona e aprumei a coluna.


As mudanças em minha vida haviam acontecido. Vestir-me da maneira que estava acostumada apenas me faria lembrar de uma vida que jamais voltaria a ter. Irônico que eu tivesse ansiado por aquela mudança. No que dizia respeito aos vestidos, quero dizer.


Como eu conhecia a casa, não foi necessário que Berta me acompanhasse, embora ela tivesse insistido um pouco. Eu estava receosa, não sabia como seria recebida por William, mas logo minha família e a dele viriam para o almoço, respeitando a tradição, então ao menos naquele dia eu não teria com que me preocupar.


Ao chegar à sala, foi com alívio que vi que a família dele já tinha chegado.


Saulo foi o primeiro a registrar minha entrada, ficando de pé, mas não fez o cumprimento educado que era esperado. Em vez disso, ele ficou me olhando, de boca aberta, como se tivesse visto uma aparição. Isso atraiu a atenção dos demais, que se viraram para mim. Os olhos da sra. Levy cintilaram, o pai de William sorriu, Tereza se levantou também para cutucar as costelas do marido e


William... bem... ele engasgou.


— Minha querida Maite — o sr. Alfredo Levy veio me cumprimentar, beijando minha mão com galantaria. — Está mais encantadora do que nunca esta manhã.


— De fato — concordou sua esposa. — Parece uma rainha!


— A senhora é muito gentil — murmurei. Estava tendo problemas para controlar os tremores, já que William se ergueu lentamente, o olhar intenso e íntimo demais me avaliando por inteira. Por um instante, eu me esqueci de que não estávamos sozinhos naquela sala.


O sr. Baltazar apareceu para anunciar que o café seria servido. Alguém falou mais alguma coisa. Depois houve uma movimentação, mas não consegui acompanhar nem me mover porque William ainda me encarava. Aquele arrepio subindo pela minha nuca parecia que ia durar a vida inteira. Mantendo o olhar atrelado ao meu, ele chegou mais perto e me ofereceu o braço.


Quando aceitei que ele me conduzisse e os demais seguiram na frente,


William diminuiu o passo.


— Do que se trata tudo isso? — ele sussurrou entredentes.


— Não sei a que você se refere.


— Por que está vestida assim, como uma... uma... mulher?


Deixei escapar uma risada pouco encantadora.


— Sei que é chocante, doutor. Estive guardando esse segredo durante todo esse tempo, mas não aguento mais esconder. Perdoe-me, mas a verdade é que eu sou uma mulher.


A julgar por sua expressão — furiosa e um tanto confusa —, ele não achou meu comentário tão espirituoso assim.


— O que aconteceu com seus vestidos recatados? — ele quis saber.


— Madame Georgette me contou que essa é a última moda em Paris. Como esteve na Europa recentemente, imagino que já saiba disso.


— Não estamos em Paris — contestou, impaciente. — Você não devia dar ouvidos a ela. Nem permitir que ela costure esses vestidos infernais que a fazem parecer uma... uma...


— Mulher? — ajudei.


Ele praguejou e começou a andar mais rápido. Quando entramos na sala de jantar, de paredes estampadas por um bonito papel com ramos azul-claros que deixavam o marinho das cortinas ainda mais intenso, todos já haviam se acomodado.


William me levou até a cadeira ao lado direito da cabeceira. Assim que me sentei, o olhar de toda a família recaiu sobre mim.


— O que gosta de comer pela manhã? — Rosália Levy quis saber enquanto William se acomodava na ponta da mesa. — Eu aconselharia os ovos mexidos. Eu mesma preparei. É minha especialidade. — Ela piscou para mim.


Não pude esconder a surpresa.


— A senhora não devia ter se dado o trabalho.


— Foi o que me disse a cozinheira. Mas o que posso fazer? Gosto de cozinhar de vez em quando, para horror dos empregados. Posso lhe servir um pouco?


Antes que eu respondesse, Rosália começou a empilhar comida em um prato, alheia ao olhar escandalizado do jovem empregado que se mantinha perto da porta.


— Você precisa recuperar as energias. — Ela colocou a porcelana diante de mim.


Observei o que ela me servira. Eu levaria um dia inteiro para comer aquilo tudo. Talvez dois dias. Sobretudo porque, com tanta tensão entre mim e William, meu estômago estava meio revirado.


— Conheci suas sobrinhas ontem no casamento, Maite. — Tereza adicionou um pouco de açúcar ao seu chá. — Parecem ser ótimas meninas.


— Quando não estão atirando pedras em ninguém, elas são — murmurou William, se servindo de um pouco dos ovos mexidos.


Estreitei os olhos para ele.


— Nina ainda não entende as regras sociais. — Dobrei o guardanapo no colo. — Ela não fez por mal. Estava apenas tentando me proteger. — Voltei a atenção para Tereza. — Elas são as crianças mais doces deste mundo... mas gostam de se meter em confusão de vez em quando.


— Isso é sinal de saúde — Saulo comentou, entre garfadas.


— É verdade. — Tereza bebericou seu chá. — Vivo dizendo para o Saulo que quando nossos meninos estão quietos demais é porque estão doentes ou aprontando alguma coisa. Estou com tanta saudade deles! Mas papai foi para o campo caçar. Os dois quase me deixaram louca para que eu permitisse que eles fossem com o avô.


— Espero conhecê-los em breve — falei. — O dr. Levy me contou que são meninos bastante ativos.


Todos os olhos se voltaram para mim. Quase todos. O sr. Levy continuou comendo.


Uma mão grande e quente, envolta em uma atadura, cobriu a minha.


— Creio que pode me chamar pelo nome na presença da minha família. — William me encarou. Seu tom era algo entre um apelo e um alerta.


Claro. As aparências.


Com a desculpa de pegar o talher, me livrei de seu toque.


— É claro, William.


— Ora, deixem a menina em paz — ajudou o sr. Levy, sem deter as garfadas. — Ela acaba de se casar. É preciso se habituar a chamar o marido de maneira tão informal na frente dos outros. A mãe de vocês levou mais de um ano.


— Tereza não teve problemas com isso. — Saulo se serviu de um pedaço de torta de maçã.


— Tereza o chamava pelo nome muito antes de se casarem — insistiu o sr. Levy.


— E como poderia ser de outra forma, meu sogro? Nós nos conhecíamos desde a infância! — a nora se defendeu.


— Não foi uma crítica, minha querida. Apenas queria lembrar que William esteve viajando por três anos e que é natural que Maite ainda tenha dificuldade em demonstrar intimidade diante de outras pessoas. Tenho certeza de que dentro de uma semana isso não irá mais acontecer. — Deu uma garfada em seus ovos mexidos e mastigou um pouco antes de fazer uma careta. — Alguém poderia me passar o sal?


Um gemido coletivo ressoou pela sala. Entendi o porquê ao ver os olhos de Rosália se arregalarem, em completo horror.


— Como disse? — exigiu saber. — Você está sugerindo que meus ovos mexidos precisam de mais sal, Alfredo?


— Apenas um pouquinho de nada, querida — ele se apressou.


Ela levou a mão ao peito, arfando.


— Não dê atenção a ele, mãe. — William tentou ajudar. — Os ovos estão ótimos.


— Estão deliciosos — Tereza concordou depressa.


— Muito saborosos! — Saulo garantiu.


O olhar da mulher se voltou para mim, esperando. Peguei um pouco de comida e levei à boca. Sim, faltava sal. Muito.


— Estão maravilhosos, sra. Levy.


— Estão mesmo, minha querida?


— Sim. Os melhores que eu já provei. — Graças aos céus Madalena nunca saberia que eu tinha dito isso, ou cairia desmaiada diante de tamanha injúria.


Esticando o corpo sobre a mesa, a sra. Levy pegou o prato do marido.


— Rosália, eu ainda não terminei!


— E nem vai terminar. Meus ovos não são bons o bastante para você. Arranje algo com sal na medida certa para lhe encher a pança.


— Querida, eu só acho que poderia estar um pouquinho mais salgado...


Foi nesse ponto que Baltazar os interrompeu e anunciou que minha família tinha acabado de chegar.


Eu me levantei de imediato.


— Com licença. — Eu estava correndo antes que me desse conta.


Meus olhos marejaram quando avistei meu irmão, de pé, perto da entrada, analisando a sala. Dulce estava distraída com o quadro de Veneza. Marina e Laura estavam sentadas no sofá, parecendo muito inocentes e comportadas.


Eu queria correr para eles, enfiar o rosto entre as mãos e chorar. Queria contar que estava assustada. Que a noite passada havia sido um pesadelo e que eu sentia falta de casa. Em vez disso, coloquei um sorriso no rosto.


— Tia Mai! — Analu gritou, saltando sobre os próprios pés, correndo para me abraçar. Nina veio logo atrás.


— Bom dia, meus amores. — Eu me abaixei para abraçá-las.


— A gente viemos conhecer a sua casa nova — Nina explicou, afastando um cacho do rosto com impaciência. — Você disse que a gente podia.


— “Nós viemos”, Nina. E, sim, eu disse. Vocês são muito bem-vindas.


— Tava com saudade, tia Lisa. — Analu tocou meu rosto com sua mão macia.


— Eu também estava, Analu. — Beijei sua palma. Depois a bochecha de Marina.


Meu irmão chegou mais perto e me avaliou por um longo momento, franzindo a testa para o vestido novo.


— Você parece adulta.


— Talvez porque eu seja uma há algum tempo? — brinquei, me endireitando com sua ajuda.


Ele fez uma careta.


— Sim, mas antes não parecia.


— Você está fabulosa, Maite. De arrasar o quarteirão! — Dulce interferiu, me abraçando apertado.


— Você está bem? — Christopher me perguntou, muito sério.


— Poxa, Christopher! — Dulce gemeu, me soltando e olhando-o de cara amarrada.


— Você prometeu que não ia fazer isso.


— Eu só quero me certificar de que ela esteja bem instalada.


— Eu prometi — disse William, ao passar pela porta, fazendo com que nos virássemos — que não tiraria sua irmã de casa se não fosse oferecer a ela o mesmo conforto que tinha antes.


Ele prometera?


— Melhor assim — rebateu Christopher. — Prometi a Dulce que não iria matá-lo antes que completassem um mês de casados. — Seu olhar foi atraído para o curativo na mão de William. — O que aconteceu?


— Um copo quebrado. Eu estava distraído. — William parou ao lado do meu irmão e fez um gesto com a cabeça. — O que achou da casa?


Enquanto os dois conversavam, Dulce me puxou para o lado, ficando de costas para eles, e enfiou a mão no bolso do vestido.


— Isto chegou pela manhã. — Colocou um envelope em minha mão. — Não tem remetente nem destinatário, mas o mensageiro garantiu que era para você.


Desdobrei a carta e li. Era do sr. Matias.


Cara senhora, poderá encontrar aquele que procura na rua...


— Samuel — murmurei. — Oh, Dulce, obrigada por ter me trazido o bilhete.


— Alguma novidade sobre o garoto?


— Talvez!


— Por que não nos acompanham? — a voz de William nos alcançou, e nós duas nos viramos. Seu olhar recaiu para o que eu tinha nas mãos. — O café da manhã acaba de ser servido.


— Tem bolo? — Analu quis saber, inclinando a cabeça bem para trás para olhar no rosto dele.


O sorriso que William abriu para ela provocou uma ligeira pirueta em meu estômago.


— E torta de maçã também!


— Oba! — gritou Marina, empurrando Laura para a sala de jantar.


William se aproximou e me ofereceu o braço. Um pouco sem graça, acabei aceitando, mas me virei para meu irmão.


— Ah, quase me esqueço. Por favor, façam o que fizerem, não peçam sal.


William deixou escapar uma gargalhada, enquanto meu irmão me olhava confuso e Dulce perguntava:


— E por quê?


— É uma grande ofensa para a sra. Levy.


— Maite! E você só me diz isso agora? — ralhou Dulce, saindo atrás de minhas sobrinhas. — Ninaaaa! Espera!


— Dulce, tenha um pouco de fé na menina... — Ian foi atrás de minha irmã.


William e eu começamos a andar, seguindo-os.


— Algo importante? — Ele indicou o papel.


— Não. — Dobrei o bilhete e o guardei no bolso do vestido. Não havia razão para lhe dizer qualquer coisa, já que ele não dividia os seus problemas comigo.


Nem qualquer outra coisa. — É só um bilhete de uma amiga, me congratulando pelo casamento.


Eu tinha de pensar em uma desculpa para ir até a vila naquele dia. Depois que minha família fosse embora, eu daria um jeito de ir até lá falar com o garoto. Com um pouco de sorte, ele não fugiria desta vez.


 


 


                                                       * * *


 


 


O almoço transcorreu sem incidentes. Depois que a sobremesa foi servida, as meninas adoraram explorar a casa e William se provou um bom guia. A única parte aonde não as levou foi ao seu laboratório. Minha família partiu quase no fim da tarde, mas os Levy ficaram e me fizeram sentar com eles na sala e contar mais sobre minha vida. William tentou se esquivar. Havia algo que ele precisava fazer em seu laboratório que não podia esperar.


— Tentando fugir da esposa no primeiro dia de casado, William? — provocou Saulo.


Infelizmente, era isso mesmo. Talvez por esse motivo — para manter as aparências —, ele decidiu ficar um pouco mais. Não participou da conversa, e eu sentia que sua hostilidade para comigo crescia a cada segundo.


— Estão pensando em viajar? — Tereza quis saber.


Ah, sim. William está. Ele não contou? Vai viver na Europa e me deixar aqui.


— Não discutimos esse assunto ainda — William resmungou. — Talvez em algumas semanas. Agora não é um bom momento.


— Por que não? — seu pai exigiu saber.


— Eu preciso tomar algumas providências, pai. Preciso fazer uma experiência.


Saulo deu risada.


— Ora, William. Acho que eu e você precisamos ter uma longa conversa se você acha mais interessante mergulhar em um laboratório do que apreciar uma bela viagem de lua de mel.


— Não implique com seu irmão. — Rosália lançou um olhar mortífero a seu primogênito. — Ele se sacrifica assim por causa da nossa querida Beca. Tenha mais respeito, Saulo!


O silêncio recaiu sobre aquela família, e um sentimento nostálgico se abateu sobre todos. Até eu me senti afetada, e nem mesmo conheci Rebeca.


— Como ela era? — perguntei a Rosália.


— Muito parecida com o meu William. Só que magrinha feito um graveto. E era tão alegre que era impossível ficar triste perto dela.


— Ela inventava as melhores histórias — ajudou Tereza, olhando para o marido. — Lembra quando ela tentou capturar aquele porco, Saulo?


— Como eu poderia esquecer? Nunca ri tanto em toda a minha vida. A cara do William quando o porco o atropelou... — Começou a gargalhar. — Meu Deus!


— Devia ter um pouco de compaixão. — William riu também, abrindo o jornal que alguém deixara sobre a mesa de centro. — Minhas costas ainda doem.


— Ela foi uma menina maravilhosa — contou o sr. Levy. — Era muito levada, isso tenho de admitir. Mas eu não a trocaria por cem meninas bem-comportadas.


Sorri um pouco sem graça, abaixando os olhos. Eu tinha sido uma menina bem-comportada a vida toda. Ainda era.


— Não acredito que seja uma comparação justa. — A voz de William, calma e baixa, me chegou aos ouvidos. — As pessoas são diferentes. Ser levada ou mais prudente não torna uma melhor que a outra. Acho que Rebeca era especial por si mesma, não por suas travessuras. Assim como uma menina bem-comportadanão é especial por sua obediência, mas por sua essência. Mesmo que algo mais borbulhe sob a superfície.


Levantei a cabeça de imediato e olhei para ele, que mantinha a atenção no jornal.


Rosália tocou meu braço.


— E você e seu irmão? Devem ter muitas histórias também. Ele a criou, querida?


— De certa forma. Eu tinha nove anos quando ficamos órfãos.


Olhei pela janela. Lá fora, naquele exato momento, havia um garotinho tão jovem quanto eu tinha sido. Sem pai e sem mãe, eu desconfiava, e sem um Christopher para olhar por ele. Eu tinha de fazer alguma coisa.


O som de uma rápida cavalgada atraiu a atenção de todos. William foi até a janela.


— Doutor! — gritou o rapaz, acenando freneticamente com o chapéu.


Parecia um empregado dos Romanov.


— É melhor eu ir buscar minha maleta — ele murmurou, se afastando.


A intuição de William estava certa. Dimitri fora baleado. Em questão de cinco minutos, William estava pronto. Subiu em seu cavalo e partiu com o rapaz.


— Ah, minha querida, lamento muito. — Rosália deu palmadinhas em minha mão. — Mas não fique chateada. Tenho certeza de que ele teria ficado se isso não fosse pesar na sua consciência mais tarde.


Mas Rosália estava enganada. A saída de William não podia ter acontecido em momento mais oportuno.


Inventando uma pequena indisposição, fui para o quarto. Peguei um par de luvas e uma bolsinha. Conferi se havia algumas moedas. Achei melhor pegar mais algumas na bolsa reserva que eu levara escondida no enxoval. A conversa com Valentina, tantos anos antes, a respeito de conviver com um marido sovina ainda me atormentava. Eu não fazia ideia se William seria mesquinho ou não. Ele mudara tanto nos últimos tempos que tudo me parecia possível.


Aguardei por quase meia hora, zanzando pelo aposento com o bilhete na mão, decorando o endereço. Guardei o papel dentro da caixinha de prata que pertencera a vovó e saí na pontinha dos pés. Parei na cozinha apenas para fazer uma trouxa, enchendo-a de pães, biscoitos, queijos e algumas linguiças antes de ir até a estrebaria.


— A senhora pretende cavalgar agora? — Quinzinho me perguntou, horrorizado, depois que expliquei que precisava de um cavalo.


— Não é tão tarde. E estarei de volta antes que o dr. Levy volte.


Prometo.


— Mas o patrão me arrancará as orelhas se souber que eu selei um cavalo para a senhora sair sozinha a esta hora.


— Ele não vai saber. Por favor, Quinzinho. É importante. Já me demorei demais.


Ele soltou uma pesada expiração, coçou a cabeça, murmurou algumas coisas ininteligíveis. Mas acabou preparando um belo baio para mim.


O sol estava desaparecendo na linha do horizonte quando entrei na vila e tomei a direção da periferia. Eu estivera ali apenas uma vez, na ocasião em que William perseguira Bartolomeu. Pouco havia mudado nesses três anos. A sujeira ainda se acumulava nas calçadas. O mau cheiro me fez cobrir o nariz com um lenço enquanto procurava a casa 7. E, no fim das contas, não era exatamente uma casa, mas um amontoado de tábuas desalinhado; faltava um pedaço da porta e o telhado parecia que ia ceder a qualquer instante. Abandonada, eu teria pensando se não fosse pelo tremular reluzente de uma vela que cintilava nos vidros encardidos da janela.


Ajeitei as saias ao parar diante das poucas ripas que um dia certamente formaram um portão e acomodei melhor a trouxa de alimentos na dobra do cotovelo.


Um lamento de alguém em agonia veio de lá de dentro. O choro de uma criança.


Eu estava subindo os degraus antes que me desse conta.




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Autor(a): Fer Linhares

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— Está certo do que está fazendo, doutor? William julgou que era melhor ignorar a pergunta ofensiva de lady Romanov e manteve os olhos na ferida no ombro de Dimitri. A bala atravessara a carne e saíra pelo outro lado, deixando uma fenda com o diâmetro de uma azeitona. Por sorte, não atingira os ossos; facilitaria seu trabalho. Isso ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 32



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  • poly_ Postado em 13/09/2019 - 14:11:41

    Desculpa a demora pra comentar, tô com muitos trabalhos, mas finalmente consegui vir aqui. E Simmm, posta a continuação, vou adorar. Bjuss!!!

  • poly_ Postado em 05/09/2019 - 12:28:41

    Menina quem imaginaria que era o Matias? Fiquei pasma. Nem acredito que tá acabando, vou sentir muita falta. Depois desse vc podia fazer uma adaptação Levyrroni do livro A Lady de Lyon, tô louquinha pra ler esse livro, dizem que é muito bom. Bjuss!!!

    • Fer Linhares Postado em 07/09/2019 - 19:22:35

      Vou ler esse livro, assim que eu terminar eu posto, bjss ;)

  • tehhlevyrroni Postado em 02/09/2019 - 11:58:23

    continua amo esse livro e vou amar mais ainda adaptado para Levyrroni

    • Fer Linhares Postado em 03/09/2019 - 20:09:23

      Continuando linda, bjss ;)

  • poly_ Postado em 31/08/2019 - 00:27:37

    Certeza q é o Duarte q fez isso, esse nojento. Mas tenho fé que o Will vai salva-la, tomara que ele consiga e ninguém fique ferido. Q momento fofo deles dois, amei. Continuaaa

    • Fer Linhares Postado em 31/08/2019 - 11:40:07

      Eles precisavam de um tempo só pra eles bjss ;)

  • poly_ Postado em 30/08/2019 - 13:02:45

    Aí mds, posso bater no William? Kkkkkk Continuaaaa

    • Fer Linhares Postado em 30/08/2019 - 17:02:44

      Pode kkk , me chama pra ajudar tbm kkk bjs ;)

  • poly_ Postado em 27/08/2019 - 23:50:45

    Tomara que eles sentem e se resolvam, e q Maite fale logo a verdade. Continuaaa

    • Fer Linhares Postado em 30/08/2019 - 11:17:06

      Do jeito que eles são, duvido que eles se resolvam calmamente kkk bjs ;)

  • poly_ Postado em 27/08/2019 - 15:26:50

    Aí q ódio de td mundo, da Maite por ser inocente ao ponto de ir atrás do homem, do William por ser um teimoso e principalmente desse Alex. Continuaaa

  • poly_ Postado em 26/08/2019 - 22:19:08

    Não vejo a hora de saber o que vai acontecer, parou na melhor parte. Continuaaaa

    • Fer Linhares Postado em 26/08/2019 - 23:53:59

      Do próximo capítulo em diante as coisas vão começar a esquentar, amanhã eu volto a postar, bjsss ;)

  • poly_ Postado em 26/08/2019 - 01:05:46

    Tô amando mulher, continuaaa (OBS: Ri demais com a briga do William com o irmão KKKKKKKKK)

  • poly_ Postado em 24/08/2019 - 13:34:10

    Ahh não acredito que Berta interrompeu esse momento. Pelo menos já estamos tendo um sinal de redenção né. Continuaa

    • Fer Linhares Postado em 25/08/2019 - 01:13:21

      Berta não e o problema agr kk, tem coisa ainda pra acontecer bjs ;)


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