“Aliás, quero uma stripper de presente de aniversário”, anuncia GQ. “Acabei de decidir. Se vira.”
“Vou ligar para umas pessoas”, promete Christopher, mas, no segundo em que o amigo se afasta, revela: “Que stripper que nada. Fizemos uma vaquinha para comprar um iPod novo. Ele deixou o velho cair no laguinho atrás da Hartford House.”
Solto uma risada contida, e Christopher pula feito um lince.
“Nossa! Isso foi uma risada? Não achei que você fosse capaz de se divertir. Faz de novo para eu filmar?”
“Rio o tempo todo.” Faço uma pausa. “Mas, em geral, é de você.”
Ele leva as mãos ao peito num gesto de dor, como se tivesse levado um tiro. “Você é capaz de acabar com o ego de um cara, sabia?”
Reviro os olhos e fecho a porta atrás de mim.
“Vamos para o meu quarto”, diz ele.
Merda. Ele quer estudar no quarto? Sei que esse é o sonho de
qualquer menina da faculdade, mas a possibilidade de ficar a sós com Christopher me deixa apreensiva.
“C., essa é a sua professora particular?”, grita uma voz masculina ao passarmos pelo que concluo ser a sala de estar. “Ei, professora, dá um pulo aqui! Preciso ter uma palavrinha com você.”
Lanço um olhar alarmado na direção de Christopher, mas ele apenas sorri e me leva até o corredor. A sala é típica de uma casa de jovens solteiros: dois sofás de couro arrumados em L, um home theater muito complexo e uma mesinha de centro cheia de garrafas de cerveja. Um sujeito de cabelos escuros e olhos azuis intensos levanta do sofá. É tão bonito quanto Christopher e GQ, e, pela forma como seu corpo esguio caminha na minha direção, sei que é inteiramente consciente de sua aparência.
“O negócio é o seguinte”, olhos azuis anuncia numa voz muito séria. “O menino aqui precisa gabaritar essa prova. É melhor que ele consiga.”
Meus lábios se contraem. “Senão…?”
“Senão vou ficar muito, muito chateado.” Seu olhar
provocante percorre meu corpo lenta e deliberadamente, demorando-se no decote antes de voltar para o meu rosto. “Você não quer me deixar chateado, né, gata?”
Christopher solta um suspiro cansado. “Não perca seu tempo, cara. Ela é imune a xavecos. Vai por mim, já tentei.” Então se vira para mim. “Esse é Logan. Logan, Saviny.”
“Dulce”, corrijo.
Logan pensa por um segundo e balança a cabeça. “Hmm…Prefiro Saviny.”
“Você conheceu Dean lá na entrada, e aquele ali é Tucker”, acrescenta Christopher, apontado para o rapaz de cabelos castanhos no sofá, que — adivinha? — é tão bonito quanto os outros.
Fico imaginando se ser gostoso é pré-requisito para morar nesta casa.
Não que um dia vá perguntar isso a Christopher. Seu ego já é grande o suficiente.
“E aí, Saviny?”, cumprimenta Tucker.
Deixo escapar um suspiro. Ótimo. Acho que daqui para a frente serei Saviny.
“Saviny é a estrela da apresentação de Natal”, Christopher explica aos amigos.
“Festival de inverno”, murmuro.
“E o que foi que eu disse?”, devolve ele, com um aceno displicente da mão. “Certo, vamos acabar logo com essa merda. Até mais, pessoal.”
Sigo Christopher pela escada estreita até o segundo andar. Seu quarto fica no final do corredor e, pelo tamanho do cômodo e do banheiro particular, deve ser o quarto principal da casa.
“Se importa se eu me trocar?”, pergunto, desconfortável. “Trouxe minhas roupas normais na bolsa.”
Ele senta na beira da cama e joga o corpo para trás, apoiando-se nos cotovelos. “Vá em frente. Vou sentar aqui e aproveitar o show.”
Ranjo os dentes. “Quis dizer no banheiro.”
“Não tem a menor graça.”
“Nada disso tem a menor graça”, resmungo.
O banheiro é muito mais limpo do que eu esperava, e um leve aroma almiscarado de loção pós-barba permeia o ambiente.
Coloco depressa uma calça de ginástica e um suéter preto, prendo o cabelo num rabo de cavalo e enfio o uniforme na bolsa.
Christopher ainda está na cama quando volto. Está entretido com o celular e nem ergue os olhos quando despejo uma pilha de livros na cama.
“E aí? Pronto para encarar essa merda, como você mesmo falou?”, pergunto, sarcástica.
Ele responde, distraído: “Pronto. Um segundo”. Seus dedos digitam uma mensagem, e ele joga o telefone no colchão. “Foi mal. Estou prestando atenção agora.”
Minhas opções de assento são limitadas. Tem uma escrivaninha junto da janela, mas com uma cadeira só, que está coberta por uma montanha de roupas. O mesmo vale para a poltrona no canto do quarto. O piso de madeira parece desconfortável.
Só me resta a cama.
Sento, relutante, de pernas cruzadas no colchão. “Certo, acho que a gente devia repassar todas as teorias antes. Ter certeza de que você sabe os postos-chave de cada uma, e então começar a aplicá-las à lista de conflitos de dilemas morais.”
“Parece bom.”
“Vamos começar com Kant. A ética dele é bem simples.”
Abro o fichário de leituras que Tolbert entregou no começo do ano e passo as páginas até encontrar o material sobre Immanuel Kant. Christopher escorrega o corpo grandalhão até o alto da cama e se recosta na cabeceira de madeira. Jogo o material em seu colo, e ele solta um suspiro profundo.
“Leia”, ordeno.
“Em voz alta?”
“É. Depois que terminar, quero que faça um resumo do que acabou de ler. Acha que dá conta disso?”
Ele fica em silêncio por um segundo, então seu lábio inferior treme. “Talvez não seja a melhor hora de dizer isso, mas… não sei ler.”