DULCE
Estou funcionando com quatro horas de sono. Por favor, alguém me mate. O lado bom é que ninguém viu Christopher me deixar na porta do alojamento hoje cedo, então pelo menos minha honra ainda está intacta.
As aulas da manhã não acabam nunca. Tenho uma de teoria seguida de um seminário sobre história da música — e ambas exigem minha atenção, o que é difícil, quando mal consigo manter os olhos abertos. Já bebi três cafés, mas, em vez de me dar energia, a cafeína só está drenando os resquícios da que eu tinha.
Vou almoçar tarde, num dos refeitórios do campus, escolho uma mesa bem no fundo e fico enviando vibrações de ‘Me deixem em paz’, porque estou cansada demais para jogar conversa fora. A comida me acorda um pouco, e passo pelas portas de carvalho do edifício de filosofia com tempo sobrando para a aula seguinte.
Aproximo-me do auditório de ética e paro, num sobressalto. Ninguém menos que Justin está caminhando pelo corredor largo, as sobrancelhas escuras franzidas, enquanto digita no celular. Mesmo tendo tomado banho e trocado de roupa no
alojamento, me sinto uma completa idiota. Estou de calças de ginástica, um moletom verde e botas de borracha vermelhas. A previsão do tempo tinha dito que ia chover, o que não aconteceu, então agora me sinto ridícula por ter escolhido esse sapato.
Justin, por outro lado, é pura perfeição. A calça jeans escura abraça suas pernas compridas e musculosas, e o suéter preto se estica sobre os ombros largos de um jeito que me faz tremer nas bases.
Meu coração bate mais rápido à medida que me aproximo.
Estou tentando decidir se deveria dizer “oi” ou só cumprimentar com um aceno, mas ele resolve o dilema, falando primeiro.
“Oi.” Seus lábios se curvam num meio-sorriso. “Belas galochas.”
Suspiro. “Ia chover.”
“Não foi sarcasmo. Gosto de galochas. Me fazem lembrar de casa.” Ele percebe meu olhar interrogativo e explica depressa: “Sou de Seattle”.
“Ah. Foi de lá que você pediu transferência?”
“Foi. E, vai por mim, se não estiver chovendo em Seattle, é porque tem alguma coisa errada. Botas de chuva são um item de sobrevivência quando se vive em Seattle.” Ele enfia o smartphone no bolso, adotando um tom casual. “Então, o que aconteceu com você na quarta-feira?”
Franzo o cenho. “Como assim?”
“A festa. Procurei por você depois da sinuca, mas já tinha ido.”
Ai, meu Deus. Ele me procurou?
“É, saí cedo”, respondo, torcendo para parecer casual também. “Tinha aula às nove no dia seguinte.”
Justin deita a cabeça de lado. “Ouvi dizer que foi embora com Christopher Uckermann.”
Isso me pega desprevenida. Não achei que alguém nos tivesse visto saindo juntos, mas é claro que estava enganada. Aparentemente, os boatos circulam mais rápido que a velocidade da luz, na Briar.
“Ele me deu uma carona para casa”, respondo, dando de ombros.
“Ah. Não sabia que eram amigos.”
Abro um sorriso travesso. “Tem muita coisa ao meu respeito que você não sabe.”
Deus do céu. Estou flertando com ele.
Ele também sorri, e a covinha mais sensual que já vi aparece em seu queixo. “Acho que você tem razão.” Faz uma pausa significativa. “Talvez devêssemos mudar isso.”
Deus do céu. Ele está flertando de volta.
Por mais que odeie admitir, estou começando a achar que a teoria de Christopher de dar uma de difícil realmente faz sentido. Justin parece curiosamente fixado no fato de que saí da festa com Christopher.
“Então…” Seus olhos brilham, alegres. “O que você vai fazer depois da…”
“Saviny!”
Engulo um gemido exasperado diante da interrupção alegre de — quem mais? — Christopher. Ele caminha na nossa direção, e Justin fecha o rosto ligeiramente, mas logo em seguida sorri e cumprimenta o intruso indesejável com a cabeça.
Christopher está trazendo dois copos de isopor e passa um para mim com um sorriso no rosto. “Trouxe um café. Achei que estaria precisando.”
Não deixo de notar o olhar estranho que Justin lança em nossa direção, ou o brilho de desagrado em seus olhos, mas aceito o café com gratidão e abro a tampa, soprando o líquido quente, antes de dar um pequeno gole. “Salvou minha vida”, suspiro.
Christopher acena para Justin e o cumprimenta: “Kohl”.
Os dois trocam uma espécie de tapa viril, que não chega a ser um aperto de mãos, mas também não é bem um soco com os punhos.
“Uckermann”, devolve Justin. “Ouvi dizer que vocês destruíram o St. Anthony. Bela vitória.”
“Obrigado.” Christopher ri. “Ouvi dizer que vocês foram destruídos pelo Brown. Que merda.”
“Lá se vai nossa temporada perfeita, né?”, lamenta-se Justin.
Christopher dá de ombros. “Vocês vão se recuperar. Maxwell temum braço do outro mundo.”
“Nem me fale.”
Como considero que conversas sobre esportes estão no mesmo grau de chatice das de política e jardinagem, dou um passo em direção à porta. “Vou entrar. Obrigada pelo café, Christopher.”
Meus batimentos cardíacos continuam acelerando enquanto caminho pelo auditório. É engraçado, mas minha vida de repente parece estar se movendo na velocidade da luz. Antes da festa, o máximo de contato que tive com Justin foi um aceno a míseros três metros de distância — e isso em dois meses. Agora, em menos de uma semana, tivemos duas conversas, e, a menos que esteja imaginando coisas, ele estava prestes a me convidar para sair, antes de Christopher interromper.