“Dulce… oi.” Devon fica visivelmente desconfortável quando nossos olhares se cruzam.
Levo um segundo para perceber que não está sozinho. Tem uma ruiva alta ao seu lado… de mãos dadas.
Meu pulso acelera, porque não vejo Devon desde que nos separamos, no inverno passado. Ele estuda ciência política, e não temos nenhuma matéria em comum. Nossos círculos sociais também não costumam se cruzar. Provavelmente nem teríamos nos conhecido se Allie não tivesse me arrastado para aquele show em Boston, no ano passado. Era um lugar pequeno, só com bandas locais, e Devon era o baterista de uma delas. Passamos a noite inteira conversando, descobrimos que nós dois estudávamos na Briar, e ele acabou nos levando de volta ao campus naquela noite.
Depois disso, nos tornamos inseparáveis. Ficamos juntos por oito meses, e eu era perdida e inequivocamente apaixonada por ele.
Devon também disse que me amava, mas, depois que me deixou, uma parte de mim ficou se perguntando se talvez só estivesse comigo por pena.
Não pense assim.
A voz severa em minha cabeça pertence a Carol, e, de repente, sinto falta de ouvi-la pessoalmente. Nossas sessões de terapia terminaram quando entrei na faculdade, e, embora tenhamos nos falado por telefone uma ou outra vez, não é a mesma coisa que estar sentada na poltrona de couro acolhedora da sala dela, respirando seu perfume relaxante de lavanda e ouvindo aquela voz quente e tranquilizadora. Já não preciso de Carol do jeito que costumava precisar, mas agora, diante de Devon e sua linda namorada nova, todas as antigas inseguranças vêm correndo de volta.
“Como você tá?”, pergunta ele.
“Bem. Ótima”, me corrijo depressa. “E você?”
“Não posso reclamar.” O sorriso que me lança parece forçado.
“Ahn… a banda se separou.”
“Ah, merda. Que pena. O que aconteceu?”
Ele esfrega distraído a argola de prata em sua sobrancelha esquerda, e me lembro de todas as vezes em que beijei aquele piercing enquanto estávamos na cama.
“Brad deu certo”, admite Devon. “Você lembra como sempre ameaçou seguir carreira solo? Pois é, finalmente decidiu que não precisava de nós. Conseguiu um contrato de gravação com um novo selo indie famosinho, e quando eles disseram que queriam entrar com a banda deles, Brad não lutou por nós.”
Não fico surpresa em ouvir isso. Sempre achei que Brad fosse o imbecil mais convencido do planeta. Na verdade, provavelmente se daria muito bem com Cass.
“Sei que é uma merda, mas acho que vocês estão melhores sem ele”, digo a Devon. “Brad ia acabar passando a perna um dia. Pelo menos aconteceu agora, antes que vocês assinassem qualquer coisa, sabe?”
“É isso que vivo dizendo a ele”, intercede a ruiva, em seguida se volta para Devon. “Tá vendo, alguém concorda comigo.”
Alguém. É isso que sou? Não a ex-namorada de Devon, não sua amiga, nem mesmo uma conhecida. Sou simplesmente… alguém.
A forma como ela diminui meu papel na vida de Devon faz meu coração se apertar de um jeito dolorido.
“Aliás, meu nome é Emily”, se apresenta.
“Prazer”, respondo, sem jeito.
Devon parece tão desconfortável quanto eu. “Então, hmm, o festival de inverno tá chegando, né?”
“Sim. Vou fazer um dueto com Cass Donovan.” Suspiro. “O que tá começando a parecer um grande erro.”
Devon assente. “Bom, você sempre funcionou melhor sozinha.”
Meu estômago fica rígido. Por alguma razão, parece que Devon está lançando uma indireta. Como se estivesse insinuando alguma coisa. Como se, na realidade, o que estivesse dizendo fosse você nunca teve problema em se dar prazer sozinha, né, Dulce? Mas na hora de fazer isso com um namorado não consegue.
Sei que é só minha insegurança falando. Devon não é cruel assim. E ele tentou. Tentou de verdade.
Mas, com ou sem insinuação, a dor é a mesma.
“De qualquer forma, foi bom ver você, mas tô com uns amigos, então…”
Aceno na direção da mesa em que Tucker, Simms e Logan estão escondidos, o que provoca uma ruga de incompreensão na testa de Devon. “Desde quando você sai com a turma do hóquei?”
“Tô dando aula para um dos jogadores e… é, a gente sai às vezes.”
“Ah. Legal. Bom… vejo você por aí.”
“Prazer em te conhecer!”, acrescenta Emily.
Minha garganta se fecha à medida que eles se afastam de mãos dadas. Engulo em seco e viro na direção oposta. Entro no corredor que leva ao banheiro, piscando para afastar as lágrimas quentes que inundam meus olhos.
Meu Deus, por que estou chorando?
Repasso depressa as razões por que não deveria estar chorando.
Devon e eu terminamos.
Não o quero mais.
Passei os últimos meses fantasiando sobre uma pessoa.
Vou ter um encontro com Justin Kohl no fim de semana.
Mas a lista não melhora nada, e meus olhos ardem ainda mais. Quem estou tentando enganar? Que chance eu tenho com Justin? Mesmo que a gente saia uma vez, mesmo que fiquemos próximos o suficiente para termos algo íntimo, o que vai acontecer quando fizermos sexo? E se todos os problemas que tive com Devon brotarem de novo, como um resfriado irritante do qual não consigo me livrar?
E se tiver mesmo algo de errado comigo, e eu nunca, nunca conseguir ter uma vida sexual normal como uma mulher normal, cacete?
Pisco depressa, tentando interromper o fluxo de lágrimas. Me recuso a chorar em público. Me recuso.
“Saviny?”
Christopher volta do banheiro masculino e franze a testa logo que me vê. “Ei!”, pergunta com urgência, erguendo meu queixo com a mão. “Aconteceu alguma coisa?”
“Não”, murmuro.
“Mentira.” Ele mantém a mão firme no meu queixo enquanto corre os polegares sob meus olhos. “Por que tá chorando?”
“Não estou chorando.”
“Estou enxugando suas lágrimas neste segundo, Saviny. O que significa que está chorando. Agora me diga o que houve de errado.”
Seu rosto de repente empalidece. “Ai, merda, alguém chegou em você ou algo assim? Demorei só uns minutos. Desculpa…”
“Não, não é isso”, interrompo. “Juro.”
O rosto de Christopher relaxa. Mas só um pouco. “Então por que você tá chateada?”
Engulo o nó na garganta. “Esbarrei com meu ex aí fora.”
“Ah.” Ele parece assustado. “O cara que você namorou no ano passado?”
Faço que sim de leve com a cabeça. “Tava com a namorada nova.”
“Merda. Deve ter sido estranho.”
“Mais ou menos.” A hostilidade vai crescendo dentro de mim feito um exército de formiguinhas. “Ela é linda, por sinal. Tipo, linda mesmo.” O rancor se intensifica, embrulhando minhasentranhas e enrijecendo meu queixo. “Aposto que tem orgasmos que duram horas e, no auge, grita ‘vou gozar’!”
A preocupação lampeja nos olhos de Christopher. “Hmm. É. Tudo bem. Não entendi nada do que você falou agora, mas tudo bem.”
Só que não está nada bem. Não está.
Por que achei que poderia ser uma universitária normal? Não sou normal. Estou quebrada. Continuo dizendo que o estupro não me destruiu, mas destruiu sim. Aquele filho da puta não roubou só a minha virgindade, mas também a minha capacidade de transar e sentir prazer como uma mulher saudável com sangue nas veias.
Então como vou ter um relacionamento de verdade? Com Devon, com Justin, com qualquer um, quando não posso…
Com um movimento dos ombros, afasto abruptamente as mãos de Christopher do meu rosto. “Esqueça. Estou sendo idiota.” Erguendo o queixo, dou um passo de volta para o bar. “Vamos, quero outra bebida.”
“Dulce.”
“Quero outra bebida”, rebato, então o atropelo e sigo até o bar.
Oi amores,desculpe postar essa hora acabou a luz no meu bairro e demorou um tempão para voltar!!
Respondendo os comentários do Facebook:
Ana Keity: Não se preocupe linda,não vai demorar!! Bjos.
Alicia Mariana: Continuando,bjos.
Beijos ♡♡