Fanfic: Eu te conserto | Tema: Delinquentes
O carro avançava pelas estradas rurais de Minas Gerais. O verão estava começando e as férias também. Como uma adolescente recém-formada no ensino médio era de se esperar que eu estivesse indo para férias paradisíacas em Paraty ou em Porto de Galinhas, relaxar depois de tantos meses de tensão pré-vestibular. Mas eu sempre fui uma garota simplória. Por isso meus pais não ficaram nem um pouco surpresos quando lhes disse que queria ir para um acampamento de música naquelas férias.
Mamãe dirigia, tamborilando os dedos no volante ao som da música que tocava no rádio: Em paz, de Maria Gadu.
- Tem certeza de que não esqueceu nada? – Perguntou pela décima terceira vez. Sim, eu estava contando.
- Tenho, mãe.
- Celular?
- Trouxe.
- Carregador?
- Está aqui.
- Absorventes?
- Mãe!
Eu amava minha mãe, mas as vezes ela perdia a noção do ridículo.
- Me desculpe se sou uma mãe preocupada! – Ela disse fingindo uma falsa mágoa.
- Está desculpada.
Meu nome é Rebeca Marques, tenho 17 anos e simplesmente amo música. Faço aula de canto desde os seis anos e, modéstia à parte, sou muito boa no que faço. Todos juravam que eu iria prestar vestibular para música, mas quebrei as expectativas de todos – inclusive da minha instrutora – quando avisei que iria prestar vestibular para Arquitetura.
Agora, depois de meses de cursinho e simulados, decidi relaxar e esperar o resultado do Enem fazendo algo que gosto.
Mamãe parou o carro em um estacionamento de ônibus. Pelo que o panfleto dizia cada ônibus levaria a um acampamento diferente, que iam desde esportes radicais até jogos de tabuleiro. Mas falando sério, quem abriria um acampamento dedicado a jogos de tabuleiro?
- Tchau, Rebeca! Vou sentir muito a sua falta. Todos nós vamos. – Ela disse me abraçando.
- Prometo ligar todos os dias e mandar notícias para o pessoal lá de casa – prometi.
Peguei minha mochila e minha mala, desci do carro e fui caminhando na direção dos ônibus. Pelo que a minha ficha de inscrição dizia o meu era o número duzentos e vinte e...
De repente meu corpo esbarrou com alguém e as nossas coisas caíram no chão. Me ajoelhei rapidamente, com o rosto corado de vergonha.
- Foi mal! Eu realmente não estava olhando para onde andava... – Tentei sorrir para tornar as coisas menos estranhas.
- Então deveria começar a olhar.
A sujeita na minha frente deveria ter a mesma idade que eu senão mais velha. Havia tingido seus cabelos de vermelho vivo, feito tatuagens que estavam em praticamente cada canto visível de seu corpo, e colocado piercings enfeitando o rosto.
Quando dizem que tem gosto para tudo não estão brincando.
Dei um sorriso amarelo, me desculpei mais uma vez e voltei ao meu caminho. Depois daquele pequeno incômodo voltei a analisar minha ficha. O meu ônibus era o 229.
Em frente ao transporte em questão havia um homem escrevendo algo em uma prancheta. Me aproximei e me apresentei:
- Olá, meu nome é...
- Não precisa me dizer seu nome a menos que queira me levar para um jantar. – Disse em um tom rabugento e pegando a ficha de inscrição da minha mão. – Você é se inscreveu para este acampamento?
Seu tom era pura desconfiança. Ele estava duvidando dos meus talentos musicais?
- Desculpe, senhor, mas eu treinei muito para estar aqui! – Falei determinada.
Ele apenas levantou a sobrancelha e escreveu algo na prancheta.
- Okay, né? Não é da minha conta o que vocês jovens decidem fazer. Pode subir.
Passei por ele de queixo erguido. Que ousadia! O cara nem me conhecia e vinha duvidar de mim?
Estava tão indignada que quase não notei as figuras dentro daquele ônibus. Todos os campistas pareciam mais detentos do que jovens artistas. Alguns tinham penteados que, de acordo com a minha mãe, eram estilo de maloqueiro. Piercings e alargadores eram coisas que estavam na moda por ali. Alguns usavam roupas largas, outros, roupas muito justas, e ainda outros utilizavam peças rasgadas. Todos possuíam o mesmo olhar: Não se meta comigo que eu não me meto com você, colega.
De início achei estranho, mas conheço diversos artistas que seriam considerados delinquentes caso não fossem famosos. Então, ignorando completamente os meus instintos, caminhei pelo corredor do ônibus e fui procurar um assento.
Depois de guardar minhas coisas e já estar devidamente acomodada, resolvi rever algumas letras de músicas que estava trabalhando nos últimos tempos. O ônibus saiu do estacionamento e pude ver minha mãe acenando para mim fora do carro. Acenei de volta, animada, pois estava com o pressentimento de que aquelas seriam as melhores férias da minha vida.
Em parte, eu estava certa. Aquele seria o melhor e pior verão de toda a minha volta.
Autor(a): justagirl
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