Fanfic: casamento de conveniência | Tema: Rebelde
Capítulo 24
Miguel viu Mia mesclar-se à multidão e vagou por entre as estantes. Ouviu, distraído, ao poeta seguinte, que declamava entre os ruídos abstratos de selva, e torceu o nariz. Por Deus, odiava poesia. A explosão de emoções, desordenada e incontrolável, capaz de ser ouvida e partilhada por qualquer estranho... as comparações desnorteadas entre raiva e natureza, os clichês infinitos, as imagens confusas faziam um homem questionar a própria inteligência.
Não, ele preferia uma bela biografia ou um clássico como Hemingway. Ou a ópera, na qual as ferozes emoções estavam controladas.
Uma voz rouca e familiar ecoou no microfone.
Ele parou no escuro e viu Mia subir no pequeno palco. Ela brincou com os presentes, agradeceu-lhes por sua presença e apresentou seu novo poema.
“Um Lugar Escuro”, disse ela.
Miguel preparou-se para muito drama e começou a imaginar elogios. Afinal, não era culpa de Mia a sua antipatia por poesia. Estava decidido a não fazer piadas de algo tão importante para ela e até mesmo queria encorajá-la.
Escondido entre pele macia e tecido liso
Com as pernas reprimidas e dobradas sob mim
Espero pelo fim no começo
Espero pela luz clara e brilhante que me traga de volta
Ao mundo de cores luminosas e aromas perfumados que atacam minhas narinas
Ao mundo de línguas ácidas, saindo para destroçar sorrisos suaves
Eu escuto o ruído de gelo contra líquido cor de âmbar
O calor arde por dentro, lembrança de um suicídio do passado
Lembrete de um assassinato silencioso
Segundos, minutos, séculos
A repentina ciência torce meu ventre; estou em casa
Abro os olhos para a luz faiscante de uma porta a abrir
E me pergunto se vou lembrar
Mia dobrou o pedaço de papel e acenou para a plateia. O silêncio pairava sobre todos. Algumas pessoas escreviam loucamente em seus cadernos. Roberta vibrava. Mia riu, saiu do palco e começou a recolher copos vazios e bater papo à medida que a noite acabava.
Miguel ficou à parte, observando-a.
Um sentimento estranho borbulhava dentro dele. Já que nunca o experimentara antes, não sabia como chamá-lo. Havia pouco na vida que o comovia, e admitia que preferia assim.
Naquela noite, isso mudou.
Mia havia partilhado uma parte importante de si com uma sala cheia de estranhos. Com Roberta. E com ele. Aberta para críticas, vulnerável ao capricho dos outros, ela aceitava o que sentia e também o fez sentir. A coragem de Mia o deixou sem fôlego. E, por mais que a admirasse, a dúvida o dominou como um monstro saído de um pântano, e ele se perguntou se, além de todo o seu racionalismo, era apenas um covarde.
– E aí, o que achou?
Ele piscou para Roberta e tentou se concentrar.
– Ah, eu gostei. Nunca tinha ouvido uma obra dela antes.
Roberta sorria como uma mãe orgulhosa de miss.
– Eu sempre digo a ela pra publicar um livro, mas ela não parece se interessar. A verdadeira paixão de Mia é a loja.
– Ela não pode ser os dois? Poetisa e dona da loja?
Roberta riu.
– Claro. Você e eu faríamos isso sem pensar, porque não perdemos uma chance. Mas a Mia é diferente. Ela fica feliz em partilhar; não precisa da glória da literatura. Algumas revistas publicaram trabalhos dela, e ela aceita críticas de um grupo, mas é mais por eles do que por ela mesma. Esse é o novo defeito, Miguel. Sempre foi.
– O que quer dizer?
– Nós aceitamos o que nos dão. É parte dos nossos traumas de infância, eu acho.
Os dois voltaram-se para Mia, que acompanhava os presentes à porta com o bom humor de sempre.
– Mas Mia... – continuou a ruiva – Mia é exatamente o contrário. Não há nada que ela faça por alguém.
De repente, Roberta virou-se para ele. Seus olhos cor de mel brilhavam com uma ferocidade que Miguel lembrava da infância. A irmã enfiou o dedo no peito dele.
– Só um aviso, meu chapa. Eu te amo muito, mas, se magoá-la, vou matá-lo pessoalmente. Entendeu?
Em vez de aceitar a provocação, Miguel surpreendeu-se com a própria risada. Então, beijou-a rapidamente na testa.
– Você é uma boa amiga, Roberta Alexandra. Eu não seria tão rápido em considerá-la alguém que só aceita o que lhe dão. Só espero que o cara certo veja isso um dia.
Roberta recuou, boquiaberta.
– Está bêbado? Drogado? Onde está o meu irmão?
– Não me pressione. – Miguel parou e olhou para a livraria. – E quanto à expansão da livraria? – Miguel viu o espanto nos olhos da irmã e sufocou uma risada. – Não se preocupe. Isso não é mais segredo. Mia admitiu que quer o dinheiro para construir uma lanchonete. Dei o cheque a ela, mas achei que ela ia me pedir o projeto.
Roberta piscou e continuou calada. Miguel estranhou.
– O gato comeu a sua língua, Roberta?
– Ai, merda – resmungou a irmã.
Ele ergueu a sobrancelha.
– O que houve?
De repente, Roberta ocupou-se com os copos vazios de café e a limpeza das mesas.
– Nada. Ah, eu acho que ela está sem graça porque contratou outra pessoa para fazer o projeto. Ela não queria te incomodar.
Miguel sufocou uma onda de raiva.
– Tenho tempo para ajudá-la.
Roberta riu, mas foi um riso estranho, desesperado.
– Deixe isso pra lá, Miguel. Preciso ir. Até depois. – Ela se retirou às pressas.
Miguel sacudiu a cabeça. Talvez Mia não quisesse envolvê-lo em seu projeto. Afinal, ela dissera várias vezes que seu relacionamento era um acordo de negócios.
Era isso que ele queria.
Decidiu tocar no assunto depois. Ajudou Mia a trancar a loja e acompanhou a esposa até o carro.
– Você jantou? – Perguntou.
A loira sacudiu a cabeça.
– Não tive tempo. Quer pegar uma pizza no caminho?
– Prefiro cozinhar pra gente em casa. – Miguel engasgou-se com a última palavra. Que estranho... começava a ver seu santuário como também sendo dela. – Não vai demorar.
– Tá. Até em casa – Mia virou-se, depois voltou e o encarou. – Miguel, não esquece...
– A salada. Eu sei.
Mia arregalou os olhos. Parecia não ter o que falar, mas recompôs-se com uma velocidade que ele admirou. Ela nem mesmo questionou como ele sabia.
– Isso mesmo, a salada – confirmou ela. Depois disso, ela se virou e entrou no carro. Miguel assobiou ao dirigir-se ao próprio carro. Estava mesmo aprendendo. Gostava de surpreendê-la. Finalmente tinha a vantagem.
Foi para casa ainda assobiando.
Autor(a): juliethewriter
Este autor(a) escreve mais 2 Fanfics, você gostaria de conhecê-las?
+ Fanfics do autor(a)Prévia do próximo capítulo
Capítulo 25 Miguel fechou a porta ao entrar e acomodou-se na cadeira de couro. Olhou para a prancheta e cerrou as mãos em punhos fechados para conter a vontade que sentiu. Visualizou materiais como mármore e tijolos, imagens fluidas de vidro e curvas sutis. À noite, seus sonhos eram cheios de ideias, mas, agora, como dono da companhia, passava o ...
Capítulo Anterior | Próximo Capítulo
Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 4
Para comentar, você deve estar logado no site.
-
sunshineaya Postado em 01/11/2019 - 19:45:03
Eu tô rindo demais da Marina hahaha o Miguel falou para ela nao falar para ninguém que ela tomou sorvete que ele deu a ela e a primeiro coisa que ela diz para a Mia é que tomou soverte kkkkkk Continua
-
dayse108 Postado em 04/07/2018 - 14:08:04
Continua
-
amandaponny3 Postado em 27/09/2017 - 19:37:29
Adorei! Continua pfvr
-
Anahi Postado em 25/09/2017 - 20:33:11
Oi posta mais