Fanfic: O Enigma do Medalhão *AyA*Ponny* | Tema: Ponny, AyA

Assumindo um tom mais sério, ele mudou de assunto:

— Terminei de ler o diário de Mia e... Confesso que estou com remorso. Olho à minha volta, vejo todas as coisas que sempre considerei importantes, e sinto-me envergonhado, arrependido. Eu devia ter dado mais valor às pessoas que me cercavam, principalmente no que diz respeito a Mia. Quando penso no quanto ela deve ter me odiado...

— Sim, Mia deve tê-lo odiado, às vezes. Eu mesma cheguei a odiar você depois de ler o diário. — admitiu Anahí. — Por outro lado, se eu achasse que você era um "caso perdido", jamais teria lhe mostrado o diário. Seria como jogar pérolas aos porcos.

Arriscando-se a levar mais uma bronca do pintor, ela virou o rosto para fitar Carlos. Sorrindo, argumentou:

— Sei que você pode ser generoso, quando quer. Lembro-me muito bem da noite em que aquela mulher interrompeu o nosso jantar. Você me prometeu que não a deixaria passar por dificuldades financeiras e...

— Srta. Anahí, por favor... — resmungou Falvo.

Ela ignorou o pintor e continuou falando:

— Também pude perceber o quanto você era generoso ao observar o seu relacionamento com Alfonso, e ver o modo como você se preocupa em dinamizar a economia da cidade que fundou. Não é só com o seu império particular que você se preocupa, Carlos, mas também com as pessoas que vivem na cidade.

— Se sou tão generoso quanto você diz, por que não me preocupei mais com Mia? Céus, quando penso no modo como a tratei... Eu nunca me dei conta do que estava fazendo com ela. Pensei que seguir uma disciplina rígida fosse o melhor jeito de educar uma criança. Meu pai era um homem severo, e no entanto eu me tornei um adulto equilibrado.

— Tem certeza, Carlos?

Ele sorriu, sem graça.

— Bem, pelo menos eu achava que era equilibrado. Agora, no entanto...

— Carlos, ouça com atenção. O maior erro que você poderia cometer agora seria sair dessa história toda sem ter aprendido nada. Você errou ao tratar Mia como tratou, ao dar prioridade a coisas que deveriam ter ocupado um segundo plano. Mas agora você está arrependido, e o melhor que tem a fazer daqui para a frente é viver segundo novos padrões de comportamento. O que passou, passou, portanto pare de se atormentar e tente ser feliz.

— Como poderei ser feliz, Anahí? Perdi todo mundo. Mia... Alfonso... Até você vai embora, amanhã.

A simples menção de sua partida e do nome de Alfonso, Anahí sentiu um aperto no coração.

Não via o amado há dois dias, desde que ele viera despedir-se.

Ao contrário de Carlos, Alfonso não ligara a mínima para as broncas do pintor, pusera-se ao lado de Anahí enquanto ela posava, sem se importar com o fato de estar "bloqueando a luz", sem se importar com quem pudesse ouvir o que tinha a dizer.

"— Eu te amo, Anahí Portilla. — ela havia declarado com a voz rouca de emoção e um brilho de angústia no olhar. — Eu gostaria de passar o resto da minha vida com você, repetindo todos os dias que te amo, mas sei que não é possível. Sabia que vir até aqui para me despedir seria doloroso, e no entanto eu tinha de vir, nem que fosse para vê-la pela última vez..."

Anahí balançou a cabeça e procurou afastar a lembrança que lhe partia a alma em mil pedaços.

— Sinto muito. — desculpou-se Carlos, enxugando com a ponta dos dedos a lágrima que escorreu pelo rosto de Anahí. — Você também vai perder alguém muito importante, não é mesmo?

— Sim, é verdade. Mas não se esqueça do que eu lhe disse, Carlos. Você ainda tem muitos anos de vida pela frente. A decisão é sua. Ou você passa o resto dos seus dias lamentando o passado ou utiliza tudo o que aprendeu para mudar o seu jeito de ser. — ela forçou um sorriso. — Acho que você vai escolher a segunda opção, certo? De algum modo, não consigo imaginá-lo como sendo o tipo de homem que perde tempo com lamentações.

— Obrigado. — murmurou Carlos — Por tudo.

— Não há o que agradecer. — respondeu Anahí, levantando-se da cadeira onde estava sentada há mais de três horas.

Em seguida, aproximando-se do pintor, argumentou:

— Sei que você vai ralhar comigo, Falvo, mas não aguento mais ficar imóvel e... Oh! — exclamou ela, quando o seu olhar pousou sobre o retrato.

— "Oh"? Depois de todo o trabalho que tive, isso é tudo o que a senhorita tem a dizer?

— É... É incrível! Ficou igualzinho ao outro!

Anahí estendeu a mão para tocar o retrato. O pintor deu-lhe um tapinha no braço, protestando:

— Não toque nele! Quer borrar a tinta?

Ela recolheu a mão, mas não porque Falvo lhe dera uma bronca. O zumbido...

Acabara de ouvi-lo de novo ao aproximar os dedos da tela!

Isso significava que a mágica funcionaria outra vez!

— O que foi, Anahí?! — indagou Carlos, preocupado. — Você empalideceu... Está se sentindo mal?

— Não, eu estou bem. — mentiu ela antes de sair da sala de pintura do estúdio dos artistas.

Será que teria forças para seguir o mesmo conselho que dera a Carlos?

Teria forças para não ficar lamentando o passado e tentar ser feliz novamente?

— O retrato está pronto, então? — perguntou Carlos, olhando a tela pela milésima vez.

— Sim. — respondeu o pintor.

— É impressionante... Ficou idêntico ao primeiro! Meus parabéns, Falvo! Você é um gênio!

— Obrigado, Sr. Tremayne. A propósito, eu ainda não lhe agradeci por ter me pedido para pintar este retrato pela segunda vez, a fim de substituir o que foi danificado. É uma honra saber que o meu trabalho é considerado em tão alta estima. Ao mesmo tempo, suponho que tenha sido a memória da sua adorável esposa que motivou o pedido, também.

— É verdade. — concordou Carlos.

O retrato serviria para a viagem de retorno de Anahí, mas serviria também como uma homenagem póstuma a Mia.

De repente, Carlos reparou em algo que não havia notado antes.

— Falvo... Essa sombra... — murmurou ele, apontando para a tênue mancha cinza perto do ombro da mulher retratada.

— Sim?

— Oh, não importa. Creio que havia uma sombra igual no outro retrato.

— É claro que havia!

— Está bem. E, mais uma vez, obrigado. Você fez um excelente trabalho!

Falvo esperou que Carlos saísse da sala para começar a limpar os seus pincéis, lembrando-se das exigências do magnata há três dias.

"O retrato precisa ser idêntico, Falvo! As mesmas cores, a mesma luz, a mesma composição!"

Ele cumprira as ordens, claro, mas na medida do possível... Afinal, não era uma máquina, era um artista.

Jamais poderia ter deixado de incluir no retrato, por exemplo, a sombra da tristeza do Sr. Herrera quando ele viera se despedir da srta. Anahí.

Anahí percorreu a mansão de ponta a ponta pela última vez, numa espécie de despedida, deixando por último o salão de festas.

Sabia que poderia voltar a visitar a luxuosa residência no futuro, se quisesse, mas preferia guardar na lembrança os detalhes da aparência do lugar como ele era agora, nos anos 20.

As salas, os quartos e banheiros, a cozinha...

Até mesmo o Packard, na garagem, merecera uma última visita.

— Jeans, camisa e tênis... Vejo que já está vestida para viajar.

O olhar de Anahí dirigiu-se para Carlos, que estava parado à porta do salão de festas.

— Sim, já estou pronta para partir. — disse.

— Alfonso também vai embora hoje.

— Você conversou com ele, Carlos? — indagou, sentindo-se estranhamente calma, não tinha mais lágrimas para chorar.

— Conversei. Alfonso ainda não sabe para onde vai. Acho que ele irá andar meio sem rumo por aí, mas acabará voltando para cá um dia. O que não falta em Oklahoma são fazendas e, imagine só, Alfonso comentou que gostaria de ser fazendeiro.

— Isso não seria tão ruim, seria? — perguntou Anahí, enquanto o magnata se aproximava dela. — Lembre-se do que aprendeu, Carlos. Os seus negócios são tão importantes quanto os seus relacionamentos pessoais. Antes de mais nada Alfonso é seu amigo, e que diferença faz se ele vai deixar de ser seu sócio? Se ele se tornar fazendeiro, pelo menos você o terá sempre por perto.

— Tem razão. Ah, irei sentir muitas saudades suas, Anahí... Mas você disse que vamos nos reencontrar no futuro, não disse?

— Sim, iremos nos ver de novo.

Ela ouviu um zumbido alto e virou-se para olhar o retrato pendurado na parede às suas costas.

— Está escutando, Carlos?

— Escutando o quê?

— Um zumbido... Foi esse mesmo barulho que ouvi antes de viajar no tempo pela primeira vez.

— Não, não estou escutando nada.

— Bem... Acho que chegou a hora da minha viagem. — fitando Carlos, Anahí acariciou-lhe de leve a pequena cicatriz em forma e "C" e comentou: — Quando cheguei aqui, reconheci você por causa da cicatriz.

— Foi Mia que me "deu" essa cicatriz de "presente". Ela jogou um prato em mim quando cancelei pela terceira vez os seus planos de ir conhecer a Europa.

Anahí sorriu, depois ficou séria.

— Adeus, Carlos Procure ser feliz, e diga a Alfonso que...

— Anahí!

Ela interrompeu a frase no meio e arregalou os olhos, atônita.

Alfonso acabara de entrar no salão, usando a mesma roupa que usara no dia em que haviam trocado o primeiro beijo, perto do riacho.

O coração de Anahí começou a bater mais forte, ao mesmo tempo em que o zumbido em seus ouvidos ficou mais forte.

— Vou deixá-la agora, Anahí. — disse Carlos, sua voz quase inaudível por causa da intensidade do zumbido. — Adeus, minha querida, e obrigado por tudo.

Assim que Carlos se afastou Alfonso aproximou-se de Anahí, com um brilho de desespero nos olhos verdes.

— Não vá ainda, Anahí... Por favor, fique mais um pouco! — ele implorou.

"Oh, Deus, dê-me forças para abandonar esse homem que eu amo tanto!", pensou ela, sabendo que a separação era inevitável.

Em voz alta, porém, limitou-se a declarar:

— Eu preciso ir, Alfonso. Você sabe disso.

— Sim, eu sei... Mas eu tinha de vê-la uma última vez, pelo menos. Fui cavalgar agora de manhã, tentando descobrir um jeito de podermos continuar juntos. Pensei em levá-la para longe daqui, mas...

— Mas eu não posso ficar, Alfonso. Adeus. E lembre-se, eu te amo. Sempre vou te amar.

— O quê?! Não ouvi o que você disse, Anahí! Fale mais alto!

Ela estremeceu de espanto, uma semente de esperança brotando de seu coração.

— Alfonso, por acaso você está escutando um zumbido forte?! Carlos não ouviu o zumbido, mas você está ouvindo!

— É claro que estou! Parece até que tem um trem vindo na nossa direção!

Anahí o abraçou e beijou, sentindo-se a ponto de explodir de felicidade.

— Acho que isso significa que você pode ir comigo para o futuro, Alfonso! Lembra-se da história que lhe contei?! Depois que Mia foi assassinada, você nunca mais foi visto de novo! Talvez seja possível! Eu não posso ficar, mas talvez você possa...

Alfonso ficou boquiaberto e olhou primeiro para Anahí, depois para o retrato.

— A menos que... Alfonso, é isso o que você quer? Abandonar a sua época, os seus amigos e tudo o que possui? Se você não quiser...

— É claro que eu quero, meu amor! Afinal, só poderei ser feliz ao seu lado, seja lá onde for!

Excitada, Anahí segurou a mão dele. Juntos, aproximaram-se ainda mais do retrato.

— Toque no meu medalhão e no retrato ao mesmo tempo. — ela explicou. — E se por acaso não der certo... Se você ficar para trás... Saiba que eu te...

Alfonso a calou com um beijo apaixonado e depois murmurou:

— Vai dar certo, tenho certeza.

Anahí dirigiu um último olhar ao salão de festas e recordou-se do dia em que chegara aos anos 20.

Tornou a ouvir o conjunto de Jazz e a ver as pessoas rindo e dançando, como se estivesse assistindo a um filme antigo.

Tivera a extraordinária chance de conhecer um mundo diferente do seu, um mundo saído dos livros de história, mas agora era hora de voltar para casa.

Ela olhou para Alfonso e sorriu.

Juntos, seguraram o medalhão de ouro e, ao mesmo tempo, tocaram o medalhão pintado no retrato.

Antes de ser envolvida pela escuridão, Anahí teve a impressão de ouvir ao longe a voz de Carlos lhe dizendo adeus.