Fanfic: Autodestruição - AyA | Tema: Ponny

 4 anos antes

Após um exaustivo trajeto de ônibus de Monterrey para a capital, os alunos do 1º ano do Elite Way pegavam suas malas no bagageiro e iam de encontro com suas famílias para contar tudo sobre a animada viagem escolar de início de ano letivo. O colégio organizava todos os anos com o propósito dos alunos se conhecerem e integrarem melhor. Haviam muitas risadas e abraços calorosos de pais que levavam seus filhos de treze anos de volta aos seus lares para aproveitar a última semana de recesso antes das aulas começarem.

Pouco a pouco, o saguão principal foi se esvaziando. O sol já havia se posto quando restavam apenas dois estudantes parados de pé naquele local. Eram os únicos em todo o colégio, além de um inspetor que ficava de vigia às noites.

A menina foi em direção a escada espiral ali presente e se sentou no terceiro degrau. Não iria voltar para seu quarto no internato, ainda tinha a esperança de que seus pais não houvessem esquecido da data de sua volta. Lhes ligou tantas vezes lembrando quando regressaria. Olhou para o garoto que estava a meia hora parado no mesmo local. Queria falar com ele, mas se sentia muito tímida. Nunca tivera contato com alguém de sua idade e não sabia como agir, portanto.

Estava com fome. Procurou em sua mochila algo que pudesse comer. Nada. De repente, sentiu seu estômago roncar de maneira alta. Olhou para o menino que estava em pé por perto para ver se ele tinha notado. Viu que ele a encarava, então ficou constrangida e abaixou a cabeça para esconder o pequeno rubor em sua face. Ouviu passos em seu sentido e levantou a cabeça para ver o que ele estava fazendo. O menino estava de frente para ela lhe estendendo uma barra de chocolate Hershey´s.  

- Vamos dividir. – Ela propôs enquanto pegava a embalagem, a abria e quebrava a barra ao meio.

Então, ele se sentou ao lado dela no degrau da escada e começaram a comer.

Comeram em absoluto silêncio. Algumas vezes, ela lhe lançou pequenos olhares furtivos quando achava que ele não estava olhando. Ele fazia o mesmo com ela.

- Qual é o seu nome? – Ele perguntou para quebrar o constrangedor silêncio que havia se instaurado naquele lugar.

- Anahí. E o seu?

- Alfonso, mas prefiro que me chamem de Poncho. – Batucava os dedos incessantemente, por conta da ansiedade. Nunca havia sequer falado com uma garota antes. - Seus pais também se esqueceram de você?

- Sim. – Ela disse e sua face murchou em tristeza. Ele percebeu e se sentiu mal por ela.

- Olha, sua situação não pode ser pior que a minha. Quero dizer, meus pais já esqueceram até do meu aniversário. – Ele tentou fazer ela se sentir melhor.

- Sério? Mas você não tem nenhum amigo que lembrou do seu aniversário?

- Não, não tenho amigos. – Ele balançava a cabeça em sinal de negativo. – Pode parecer muito surreal para você mas nunca fui a um colégio. Sempre estudei em casa com professores particulares. Então nunca saía e jamais conversei com outra criança.

- Eu te entendo. Aconteceu exatamente a mesma coisa comigo. – Ambos se olhavam incrédulos por conta da tamanha semelhança de suas vidas.

- Foi você também que teve de insistir muito para que seus pais lhe colocassem aqui? – Ela assentiu.

- Eles viviam dizendo que num colégio não teria a mesma educação que meus professores particulares podiam me dar. Que aqui estaria em contato com gente que não é do meu nível. – Ela rolou os olhos. – Que não teria meus empregados para atender os meus caprichos. Que seria quase impossível de ver meus pais se ficasse trancafiada durante toda a semana na escola. Eu já mal os vejo. – Um leve semblante de mágoa apareceu em seu rosto, que ela prontamente disfarçou. - Mas nada disso importa. Não quero mais ficar sozinha e isolada do mundo. Não sei fazer amizades, porém vou aprender. – Disse de maneira confiante, enquanto estufava o peito.

- Sabe, Anny... Posso te chamar assim? – Ela fez que sim com a cabeça. – Você já tem um amigo bem aqui. – Ela o olhou com surpresa e ele sorriu, sendo seguido por ela.

De repente ela se levantou e com uma expressão enigmática lhe estendeu a mão. Ele não entendeu o que ela estava fazendo, mas a segurou e se ergueu também.

- Aonde você quer me levar?

- Vamos assaltar a geladeira da cozinha. Ainda estou morrendo de fome. – Ela falou com uma cara sapeca.

- Mas e se o inspetor nos vir? Não quero ser expulso antes do primeiro dia de aula. – Ele olhava para todos os lados, com medo de ser pego no flagra enquanto ela o puxava pela mão.

- Não vai nos acontecer nada, Poncho. Relaxe. – Disse de modo confiante.

Chegaram à cozinha. Ela estava realmente com fome. Devorou rapidamente três sanduíches de mortadela e queijo que preparou. Estava toda suja de maionese entorno da boca. Ele riu do modo como ela ficava quando estava esfomeada, pegou um guardanapo e limpou seu rosto. Ela ficou sem graça diante sua falta de modos e corou.

- Acho que pelo bem da humanidade, devo a partir de agora sempre te manter alimentada. Vai saber do que você é capaz quando está com o estômago vazio. – Ele gargalhou e ela lhe lançou um olhar fulminante. Então, um segundo depois, sua expressão mudou. Tinha um sorriso na face quando pegou um ovo que estava em cima do balcão sem que ele visse.

Tacou em sua cabeça e ele não pode acreditar. Fechou os olhos enquanto a gema e clara escorriam lentamente por sua testa. Agora era ela quem gargalhava.

- Tá rindo né? Você vai ver só. – Segurou seu braço e pegou um chantilly que estava por perto. Apertou e jorrou todo o conteúdo no rosto e corpo dela, que inutilmente tentava escapar.

Quando enfim conseguiu se soltar, correu até um dos armários que ali tinham e agarrou a primeira coisa que viu. Um saco de farinha. Era perfeito. O abriu e foi na direção dele, que tentava fugir dela.

- Anny, não faz isso. – Pedia com olhos suplicantes.

Ela o encurralou em um canto e lhe deu um sorrisinho de lado antes de despejar todo o conteúdo do saco nele. Estava completamente sujo de branco. Ela saiu correndo e ele foi atrás, ambos rindo. Cada um se posicionou de um lado do balcão que ficava no centro da cozinha. Utilizavam-o como se fosse uma espécie de muro que separava os exércitos inimigos em uma guerra. Se escondiam agachados detrás do balcão e esperavam o momento oportuno para que pudessem atirar a comida.

Quando decidiram dar por encerrada a guerra de comida e levantaram bandeira de paz, ambos estavam sujos dos pés a cabeça. Estavam sentados no chão, encostados na parede. Riam levemente ao olhar o estado da cozinha antes limpa.

- Como vamos fazer para limpar isso tudo? – Ele perguntou.

- Eu não sei. Nunca limpei nada em minha vida.

- Nem eu.

- Bem, temos que tentar, não? Não pode ser tão difícil. Onde será que estão os produtos de limpeza? – Eles se levantaram e começaram a procurar.

Nesse momento, escutaram passos e uma maçaneta girando. Somente deu tempo para ambos trocarem um olhar cúmplice de pânico. A porta se abriu e o inspetor Estevão entrou. Deu uma boa olhada em todo o cómodo antes de parar sua visão nos dois jovens que estavam a sua frente. Podia vê-los tremendo.

- O QUE SIGNIFICA ISSO??? – Gritou enfurecido.

- N-nós só estávamos... – Ele foi interrompido enquanto tentava se explicar.

- Não quero saber. Amanhã bem cedo quero os dois na sala do diretor Pascoal. Vão se explicar para ele. – Disse e em seguida saiu.

Os dois se olharam e ela disse:

- Começamos bem.