"E você pode me chamar de brega, mas é um simples fato eu ainda te protejo..."
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Dizer aquelas palavras pela primeira vez foi algo estranho, mas eu precisava confessá-las em voz alta. Talvez ter ligado aquela hora para minha irmã e ter jogado a bomba de uma só vez não era a coisa mais racional do mundo, mas racionalidade era a última coisa que havia em mim naquele momento.
Afastei o celular do ouvido olhando para a tela tendo certeza de que a garota ainda estava do outro lado da linha, mas permanecia muda. Apertei a têmpora com força aguardando qualquer resposta que fosse. Dentro de meu peito o alívio e compreensão me dava uma ousadia que ainda estava experimentando, a certeza das coisas me dando confiança para conversar sobre aquele assunto.
Um suspiro do outro lado me fez ofegar, não havia percebido o quão superficial minha respiração estava.
– Mi cariño...– Soltei um choramingo aliviado ao ouvir o apelido carinhoso, sabia que teria seu apoio. - Você tem noção do que está falando?– Sorri débil.
– Sei muito bem do que estou falando. - Senti o coração acelerar. - Acha mesmo que ligaria a essa hora se não soubesse?
Olhei de relance para o relógio digital que me avisava da hora avançada. Escutei uns ruídos estranhos do outro lado, talvez o ranger da cama ao se levantar ou o interruptor para acender a luz.
– Como você está lidando com isso? – A frase me fez fechar os olhos.
– Nesse momento eu estou meio que desesperada. - Escutei um riso rouco muito parecido com o meu.
– Por quê? Não sabe se é correspondida? Tem medo da amizade de vocês mudar?
– Bom, a gente meio que já mudamos. - Fiquei ofegante ao lembrar, a pressão no peito reaparecendo.
– Como? – A pergunta curiosa me fez contorcer o rosto.
– A gente, bem... - Pausei. Como iria falar?
– Corazón?– Me repreendi por tentar enrolar minha irmã, ela estava realmente disposta a ouvir e a ajudar.
– A história é longa. - Tentei me livrar da explicação mais uma vez.
– Você já me acordou mesmo, tenho tempo até dar o horário de ir para a faculdade.
Havia uma grande diferença entre Claudia Maria e Angelique Boyer. Angelique era como uma irmã mais velha que sempre me fazia falar o que estava acontecendo e nossa amizade mesmo sendo cercada pela imprensa era rara, sólida e descontraída. Não havia julgamento entre a gente, nos ouvíamos porque não havia ninguém que nos ligasse, era apenas eu e Angel sem pressão.
Com Claudia a coisa era diferente. Eu sabia que sempre poderia contar com ela, sabia que poderia confiar cegamente, mas coisas tais como família, crescer juntas e não querer deixá-la preocupada me impedia de me abrir completamente, até que o ápice chegasse. Aquele momento era o ápice. Contei sobre meus sentimentos, pensamentos, sobre os dias em que havíamos nos beijado, sobre o telefonema de madrugada...
– Vocês são tão fofas juntas.– Sorri com a voz meiga do outro lado da linha.
Podia avistar o céu se tornando alaranjado através da janela coberta pela fina cortina.
– Eu sei - Balancei a cabeça me sentindo presunçosa. - Mas o que eu faço, Claudia? Não posso estar sentindo isso.
– Por que não? Pelo que percebi ela também sente o mesmo.– Balancei a cabeça em estado de negação.
– Não, ela pode só estar confusa. - Argumentei.
– Pare de ser pessimista! A mulher fez uma música pra você! – Sorri com sua impaciência.
– Você pode ter razão, mas não quero alimentar falsas esperanças. Ela é instável. - Cocei a cabeça arrumando mais desculpas.
– Que eu saiba nunca foi instável com você. Por que não diz a ela como se sente? Acho que não haverá surpresa nenhuma.
Mordi o lábio inferior me sentindo inquieta.
– Não posso.
– Por quê?– A pergunta esganiçada me fez fechar os olhos
– Porque... - Apertei os olhos com força antes de abri-los. - Tenho medo.
– De quê? – Incitou.
– De perder o que temos, de assustá-la. - Esfreguei o vinco entre os olhos tentando me explicar da melhor maneira possível.
– Dul, ela não vai fugir assim de você. – Era verdade, mas eu não queria acreditar naquelas palavras.
– Mas o que está acontecendo entre a gente pode deixar de existir. - Soltei a respiração tentando controlá-la.
– Isso seria muito ruim para você?
– Sim - Respondi de imediato.
– Por quê?
– Porque eu a amo. - Puxei o oxigênio com mais afinco determinada a dizer tudo o que estava na minha cabeça. - Eu amo aquela garota, Claudia. Eu faria tudo pra ela ficar bem, mesmo que isso significasse sumir da vida dela. Eu sei que ela nunca vai querer se afastar de mim, mas o fato de estar perto e não poder tocá-la... - Resfoleguei impossibilitada de continuar.
– Você não aguentaria?– Perguntou em um tom baixo.
– Não - Fui curta.
Alguns segundos se passaram enquanto permanecíamos em um silêncio confortável. Eu poderia visualizar os olhos escuros da morena estreitos tentando achar algo para dizer.
– Posso estar parecendo uma chata, mas ainda acho que deveriam conversar. Eu entendi o que você falou, mas ainda acho que deveria falar com a roqueirinha. – Sorri com o apelido antigo.
– Eu estou me sentindo tão egoísta. - Confessei em meio ao suspiro. - Isso é ruim?
– Acho que isso é bom. Você sempre foi a mais altruísta, nada mais justo querer um pouquinho para você.
– Mas é ela - Espalmei a mão livre na testa. - Não aguento mais isso. Vem pra cá?
– Não posso, estou em provas finais.
– Sábado tem show da Angelique - Anunciei propositalmente. - Vem? - Provoquei.
– Pare de me provocar, isso não se faz!– Escutei um muxoxo irritado.
– Okay. - Tentei conter a risada que queria dar. - O sol já está raiando. Vou ficar aguardando sua vinda pra cá assim que terminarem suas provas, combinado?
– Combinado.
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Me remexi um pouco mais me acomodando melhor no sofá e no colo que me abrigava. Minha cabeça estava deitada sobre as pernas de Anahi enquanto recebia carinho em meus cabelos, à nossa volta a correria para a gravação do vídeo clipe me irritava. Christian e Maitê estavam gravando uma das tomadas sozinhos sentados na beirada do palco, Anahi estava comportadamente sentada no sofá mais afastado comigo deitada em seu colo. Senti o corpo pequeno se debruçar sobre meus ombros.
– Me diz que podemos voltar a gravação sem nossas personagens brigarem? - A voz de piedade me fez sorrir.
– Não, não podemos e pare de reclamar do seu figurino.
– Impossível! Tenho que ficar segurando a barra desse vestido o tempo todo. Ainda não entendi o porque de não me deixarem colocar uma calça.
– Para nos privilegiar com suas belas pernas. - Gargalhei sentindo um beliscão na barriga.
Suspirei alisando o pano rosa que cobria as coxas perfeitas. Ucker se aproximou se sentando no chão de frente para nós, os olhos castanhos vagando pelo grande espaço.
– A próxima é nossa - Suspirou parecendo entediado. Franzi o cenho.
– Pensei ser o casal maravilha. - Apontei o polegar para Anahi debruçada em mim recebendo um muxoxo de volta.
– Eu também. - Ucker abriu os braços visivelmente irritado - Mas parece que eles irão dar mais trabalho e blá blá blá.. - Movimentou a mão no ouvido me fazendo rir, senti o calor do corpo de Anahi me deixar.
– O que foi? - Ergui a cabeça a olhando melhor.
– O Poncho está um nojo comigo ultimamente. - Desviou os olhos para Ucker - Está sabendo de alguma coisa?
– Como se ele conversasse comigo. - Soltou um riso debochado.
– DULCE E UCKERMANN.– O chamado do diretor nos fez gemer.
[...]
Me sentei delicadamente no sofá enquanto rodava a pequena colher de plástico no copo de suco. Beberiquei olhando a cena a ser gravada: Poncho e Anahi. Senti um corpo se largar ao meu lado, arqueei uma das sobrancelhas ao notar quem era. Os cabelos pretos emodulavam o rosto redondo e caía sobre os ombros, os olhos escuros fitavam o outro lado do espaço, a boca carnuda carregava um biquinho e a testa estava franzida.
– Eles não são pateticamente perfeitos?
Me controlei para não cuspir o líquido que havia acabado de por na boca, engoli com dificuldade antes de me render ao riso. O jeito como havia falado era mesclado a nojo e irritação.
– Se você diz. - Dei de ombros tentando não me meter no assunto.
– Qual é, Saviñon. Vai me dizer que gosta daquele casal ali. - Apontou descaradamente para os dois.
– Prefiro não comentar. - Abaixei os olhos procurando o que fazer no celular repousado em minhas pernas.
– Caramba, vocês nunca se entregam. Isso me frustra sabia? - Complementou me fazendo sorrir ainda mais.
Passamos um tempo observando a filmagem até que escutei a reclamação sobre o casal mais uma vez. Eu não gostava do casal, na verdade não gostava da Anahi com mais ninguém além de mim, mas estava me intrigando o fato de Maitê ter aversão ao Poncho.
– Me diz o porque de você não gostar de "Ponny" - A olhei esperando pela resposta.
– É só olhar - Apontou mais uma vez. - É enjoativo.
Balancei a cabeça em negativo tentando parar de rir do comentário da garota. Uma coisa eu sempre confessei, Maitê poderia ser tudo, menos chata. Os comentários que ela fazia ao meu lado me fizeram sorrir e certas vezes até gargalhar.
– Okay, mas você pode me falar se ela está realmente solteira ou se ainda está interessada no meu irmão?
Torci a boca enquanto respirava fundo. A lembrança do garoto não me fazia nada bem, bebi um pouco no líquido em meu copo antes de responder.
– Eu não sei.
– Como assim não sabe, Dulce? Vocês são melhores amigas ou o quê? - Rolei os olhos me escondendo no copo mais uma vez.
– Ela não cita mais seu irmão - Fui clara.
– Ela está chateada com ele. Meu irmão é um idiota. - Bufou. - Mas gosta dela.
– Gosta? - Forcei um riso debochado.
– Sim. Bem que você podia dar uma ajudinha pra variar. - Sugeriu.
– Não me envolvo nesses assuntos. Se ela quiser eles ficarão bem, não me peça para ajudar nisso.
– Hum.. - Ponderou olhando para a cena novamente. - Acha que está rolando algo com o Poncho?
– Não! - Minha negação urgente a fez me olhar novamente. - Ele mal olha pra cara dela.
– Ele é outro idiota. Quer saber, os homens são uns idiotas.
– Hey, que mal eu fiz à vocês? - A voz de Ucker nos arrancou risadas.
– Você não é homem Ucker - Maitê retrucou deixando o garoto boaquiaberto, me escondi no copo novamente.
– Olha, dê graças a Deus que a Dulce está aqui, caso contrário você receberia uma resposta muito mal criada.
– Não seja por isso. - Ameacei a levantar mas as mãos da Perroni se fecharam em meu braço me fazendo permanecer sentada.
– Nada disso. Não me deixe sozinha com ele - Olhei para Ucker que estreitava os olhos em direção a garota ao meu lado.
– Covarde - Sibilou me fazendo sorrir.
*********
– Amanhã tenho uma entrevista na rádio às sete da manhã. Se não fosse isso eu juro que ficaria.
Escutei a resposta a minha pergunta enquanto brincava com as unhas negras que antes arranhavam meu antebraço. Anahi havia me levado para casa ao final das gravações e nos acomodamos no sofá da sala mesmo, havia se passado quase uma hora de conversa jogada fora. Estava deitada em seu peito escutando o palpitar suave do coração, a mão livre da Portilla vagava por meu cabelo em uma caricia sutil.
– Vai ficar lá em casa no sábado? - Torci a boca para a pergunta que me foi feita.
– Não. - Respondi fazendo com que o movimento em meu cabelo parasse.
– Por quê? - Senti a cabeça se mexer para me olhar mas não ergui a minha.
– Domingo tenho um compromisso. - Dei de ombros.
– Com o quê? Não soube de nada pela sua agenda.
– É pessoal. Minha mãe marcou um café da manhã. - Expliquei.
– Ela vai? - Perguntou desconfiada.
– Vai me levar - Me limitei a responder.
– Dá pra falar o que é exatamente? - Me puxou para cima para que nos encarássemos.
– O empresário do Jose Enrique ligou pra ela já faz um tempinho querendo marcar um encontro. - Desviei rapidamente dos olhos azuis antes de voltar a encará-la.
– O garoto do Usher? - Acenei com a cabeça. - Hum...
– O quê? - Sorri com a expressão perdida da Portilla.
– E por que querem esse encontro? - Estreitou os olhos firmando os braços envolta de minha cintura.
– Vou saber no domingo. - Fui sincera.
– Hum.. Cuidado com esse garoto.
– Giovanna! Está com ciúmes? - Sorri da careta que a outra expressou.
– Quem gostaria de estar nessa situação? - Resmungou.
– Pare de bobeira. - Empurrei seu ombro ainda sorrindo.
Os braços me puxaram ainda mais para seu corpo fazendo nossos rostos se aproximarem, o nariz perfeito roçando no meu. Fechei os olhos sentindo o calor que irradiava dela, o aroma que emanava de seu corpo perfeito, o toque macio dos lábios imóveis sobre os meus.
– O que você está fazendo? - Perguntei débil ao notar que ela apenas permanecia extremamente próxima.
– Sentindo sua respiração. - Sussurrou puxando uma respiração profunda. - Ela é deliciosa. - Sorri de lado sentindo o rosto esquentar violentamente.
– Você tem que parar com isso. - Franzi o cenho encostando nossas testas. Abri os olhos encontrando os azuis sedentos.
– Parar com o quê? - Umedeceu os lábios.
– De fazer com que eu me apaixone por você. - Mordi o lábio inferior com o coração aos pulos.
– Está funcionando? - Senti a respiração ofegante e doce da outra bater em meu rosto.
– Mais do que deveria. - Confessei recebendo um meio sorriso da outra antes dos lábios se movimentarem sobre os meus.
A boca quente invadindo a minha com devoção me fez estremecer, a temperatura entre nós ficando cada vez mais elevada. Uma das mãos macias foi imediatamente para meu rosto fazendo um carinho delicado enquanto a língua atrevida deslisava por entre meus lábios abrindo passagem. Puxei o ar pelo nariz evitando em perder a profundidade mas o som de passos e a voz vinda do corredor me fez cessar o beijo e esconder o rosto nas mãos enquanto me enterrava no ombro de Anahi.
– Vocês escolhem meninas: Pizza ou Burger King? Estou sem a minima paciência para cozinhar. - Minha mãe se apoiou no portal com os braços cruzados.
Não dava para ver a expressão de Anahi, metade do meu rosto estava escondido nas mãos deixando visível apenas os olhos no intuito de ocultar a vermelhidão que ele provavelmente era.
– Não vou ficar, tia Blanca. Amanhã tenho uma entrevista cedo. - A voz de Anahi saiu calma e agradeci mentalmente por aquilo.
– Tudo bem então. Vou falar com o Fernando e decidimos, tudo bem filha?
– Sem problemas, como qualquer coisa que decidirem. - Minha voz saiu abafada pelas mãos que ainda cobriam meu rosto.
Observei minha mãe nos dar as costas e o corpo que me abrigava começar a chacoalhar em meio ao riso mudo. Olhei para Anahi que estava com os olhos lacrimejantes.
– Não tem graça. - Resmunguei.
– Eu estou rindo de nervoso. - Explicou soltando por fim uma gargalhada.
Me afastei da garota tentando ajudá-la a se recompor.
– Melhor? - Perguntei risonha após alguns segundos.
– Sim, temos que ser mais cuidadosas. - Limpou com o indicador uma lágrima fujona da lateral de um dos olhos.
– Irei trabalhar nisso, mas você tem que cooperar. Fica fazendo essas coisas aqui na minha sala, é difícil pra eu pensar em sigilo.
– Tudo bem. É melhor eu ir. - Se levantou me aguardando para que a acompanhasse até a porta. - Sábado?
– Sábado. - Acenei abrindo a porta. - Tchau e se cuida. - Apliquei-lhe o beijo costumeiro na testa.
– Tchau. - Se inclinou dando um beijo demorado no canto de meus lábios. - Para todos os efeitos foi no rosto.
Sorriu travessa antes de piscar um dos olhos e correr em direção ao carro.