Fanfic: O Silêncio da Paixão *AyA*Ponny* | Tema: Ponny, AyA

Capítulo Treze

A temperatura baixara de repente e o ar da noite pesava úmido.

Pela janela da carruagem, o conde de Herrera contemplava a névoa cinzenta quase sem notá-la.

Ainda que tornasse lento o tráfego pelas ruas londrinas e a vida em geral desconfortável, o mau tempo estava de acordo com seu humor.

Oito dias já se haviam passado desde o baile em Wilborn Place.

Oito longos e exaustivos dias.

A Câmara dos Lordes estivera constantemente em sessão, o que em outras circunstâncias o teria agradado, uma vez que comparecer ao Parlamento era o principal motivo daquelas temporadas em Londres.

Só que a política e a legislatura já não lhe proporcionavam tanto prazer quanto antes.

A exemplo dos demais prazeres, esse também se desvanecera.

E Lady Anahí Portilla era a responsável.

Deus sabia o quanto se esforçara para esquecê-la, mas fora inútil.

Pensava nela o dia todo. Sonhava com ela ao dormir.

Aquilo já se tornava uma obsessão.

Não falava com ela havia mais de uma semana, ainda que a avistasse de longe às vezes.

Não lhe fora possível falar-lhe, mas não apenas devido aos trabalhos na Câmara. Os dias posteriores ao baile tinham sido um pesadelo.

A sociedade, um tanto restringida, fizera vista grossa ao espetáculo promovido por ele e Margate em Greenwich, mas a cena de Axel e Lady Camila no jardim do conde de Keller reavivara as brasas dos mexericos, que logo alcançavam proporções avassaladoras.

Para piorar, o conde de Keller ausentara-se da cidade por tempo indeterminado, abandonando-o com a tarefa de tentar aplacar os rumores venenosos.

Sua única aliada vinha sendo Lady Catherine, sempre impassível em meio aos urubus ao acompanhar a filha e a cunhada pela corte como se nada houvesse acontecido.

Ele mesmo vinha desempenhando seu papel com perfeição. Sob a vigilância arguta de toda a sociedade, mostrava-se polido, cavalheiresco e formal, amaldiçoando em silêncio as regras que assim o exigiam.

A carruagem finalmente parou e Herrera pegou o chapéu.

Seria bom passar algumas horas no White's, jogando e tentando animar Axel.

Depois, no baile de Lorde e Lady Denber, voltaria a ser o impecável conde de Herrera, mas agora queria algumas horas de relaxamento.

Saltando do veículo, perdeu alguns segundos ajeitando o chapéu e pegando os demais pertences.

O nevoeiro estava tão denso que a visibilidade era de poucos metros.

— Meu Senhor, espere um minuto! — pediu alguém. — Preciso falar-lhe! É muito urgente! Por favor, meu Senhor!

Herrera reconheceu a voz.

— Aproxime-se, então. — autorizou, contrariado.

Esperava nunca mais rever o capanga que Vincent contratara para segui-lo.

— Avisei-o de que não deveria me incomodar mais...

— Não o estou seguindo, eu juro! — o homem magro acercou-se. — Passei em sua casa, mas o Senhor já havia saído, por isso vim aqui, na esperança de encontrá-lo. Meu Senhor, é um problema muito urgente!

— Desembuche logo. — ordenou Herrera.

— É a irmã de Lorde Vincent, Lady Anahí. Ela foi sequestrada por um dos inimigos do meu patrão, agora há pouco...

Herrera agarrou o homem pelo colarinho e puxou-o para bem perto.

— Lady Anahí foi sequestrada?! Isso é verdade?!

O homem tremia de medo.

— Juro por Deus, meu Senhor! Procurei-o porque meu patrão está viajando, longe demais para ser avisado a tempo. Imploro que me ajude...

Herrera sacudiu-o.

— Como aconteceu?! Como ficou sabendo?!

— Depois que o Senhor me deu aquele soco, meu patrão ordenou-me que vigiasse a irmã dele, Lady Anahí. Ela, Lady Catherine e Lady Camila estavam a caminho da mansão de Lady Wyscott quando a carruagem foi abordada pelos homens de John Saxby, o maior inimigo de meu patrão. Lady Anahí foi colocada em outra carruagem e ninguém sabe onde ela está agora. Também não se sabe o paradeiro da carruagem em que ficaram Lady Catherine e Lady Camila.

— Deus do céu... — murmurou Herrera.

— Todas estão desaparecidas, mas é por Lady Anahí que temo, meu Senhor. Sendo irmã de meu patrão, ela corre grande perigo nas mãos de Saxby. Creio que ele não teria a menor dó dela.

— Viu para que lado fugiram com Lady Anahí?

— Vi, meu Senhor. Eu os segui enquanto foi possível, até perdê-los, a caminho das docas.

— E Lady Catherine e a filha? Para que lado foram levadas?

— Para o norte, meu Senhor. Quanto a elas, é tudo o que sei.

— Sabe para onde Lorde Vincent viajou?

— Sim, e já despachei um mensageiro para avisá-lo. Todos os homens disponíveis estão à procura das damas.

— Ótimo. — Herrera interrompeu-o. — Entre em minha carruagem e me aguarde. Infelizmente, vou precisar de você para resolver esse problema.

A porta do White's, pediu um favor ao porteiro.

Dois minutos depois, Lorde Axel aparecia, com a barba por fazer e sem sua capa.

— Alfonso, o que está havendo?

Herrera pegou o amigo pelo braço.

— Vamos para a minha carruagem. Você logo vai saber.

— Tem certeza de que foi aqui que os perdeu, Porter?

— Absoluta, meu Senhor.

De pé junto à carruagem, Herrera olhava desconfiado em meio à cerração.

Estavam próximos às docas. Ouvia as águas do rio batendo no molhe e sentia um cheiro forte de peixe e óleo.

Um sino soava a distância e luzes brilhavam fracamente ao longo da via fluvial, providências quase vãs no sentido de orientar os navios naquela invisibilidade.

— Temos de ir a pé. — opinou Porter, checando a pistola que sacara de debaixo de sua capa. — O barulho da carruagem chamaria a atenção. Os demais homens de Lorde Vincent estão a nossa espera nas proximidades. Talvez já tenham descoberto onde Saxby prendeu Lady Anahí.

Herrera escondeu melhor sua própria arma dentro da capa.

— Acha que esse Saxby vai pedir resgate? Não quero que Lady Anahí corra o menor risco.

— Não sei se ele vai aceitar algo menos do que deseja de Lorde Vincent. Mas uma coisa é certa, se houvéssemos avisado a polícia, conforme sugeriu, Lady Anahí estaria morta antes que conseguisse gritar por socorro. Nossa única chance é perguntar a Saxby o que ele quer em troca da vida dela.

Herrera ordenou aos lacaios que aguardassem ali e seguiu Porter nevoeiro adentro.

Guiados pelas luzes embaçadas que iluminavam os poucos prédios ocupados, seguiram para a taverna de onde, segundo Porter, Saxby comandava suas operações.

A entrada do estabelecimento, toparam com dois bêbados que saíam cambaleantes, cantando daquele jeito horrível característico.

— Céus... — desolou-se Herrera.

Se Anahí estivesse ali, mantida cativa por capangas, faria com que John Saxby fosse enforcado na muralha mais alta de Newgate.

— Vou entrar primeiro e ver se Saxby ou algum de seus homens está aí — sussurrou Porter. —, bem-vestido assim o Senhor só chamará a atenção. Fique aqui de olho. Não se afaste, pois eu jamais o encontraria nesse nevoeiro. Volto assim que descobrir algo.

Herrera o deteve.

— Onde estão os outros homens de Vincent?

Porter esquivou-se.

— Estão por toda parte, meu Senhor, escondidos e à espera. Não percebeu as trocas de sinais ao passarmos? Acho que não está acostumado a esse tipo de coisa.

— Não, não estou. — sem alternativa, Herrera liberou o homem. — Vá, então.

Sozinho na penumbra, Herrera apurou os ouvidos, mas não detectou nenhum dos sinais que os homens de Vincent estariam trocando entre si. Continuava ouvindo apenas as águas do rio contra os barcos e atracadouros e o sino dobrando em seu ritmo monótono.

Era péssimo ter de confiar num tipo suspeito como Porter.