Fanfic: My world was always you ( portinõn) finalizada | Tema: Rebelde
"Estou suportando. Só eu mesma nunca foi o bastante. Devo ser muito forte. Há um poder naquilo que você faz.. Te mostrarei como é, agora que estou do lado de fora.."
***************
Geralmente é normal as pessoas terem esse tipo de sonho, onde suas pernas se movem em uma velocidade absurda afim de alcançar algo almejado. Mas por mais que você corra, não consegue sair do lugar. Parece que existe algum tipo de magnetismo que te fixa no mesmo lugar ou te obriga à correr em uma lentidão agonizante. Então, a areia contra a sola de seus pés se torna mais fina e leve te sugando pouco à pouco. Você sente a cena mudar drasticamente se encontrando à beira de um precipício rochoso, onde sem motivo algum, você cai e acorda sentindo um solavanco na cama.
Sonhos.
Uns dizem ser medos, outros ansiedade, há até quem diga que seja falta de confiança em si próprio ou dinheiro vindo de algum lugar improvável. Até acredito nessas interpretações, quando isso acontece nos sonhos. Mas quando você percebe correr e não chegar à lugar algum na vida real, não há o que interpretar, apenas desistir e tentar um outro caminho.
Anahí parecia absorta brincando com as pontas de meus dedos entre as mãos. Os olhos azuis brilhando e um sorriso quase imperceptível no canto da boca. A galáxia gritava que não existia nenhuma outra coisa no mundo mais correta do que nós duas estarmos juntas. Era visível o ponto de pulso no pescoço de Anahí bombear sangue com força, a pele de seus braços sensíveis ao arrepio constante. Era notório o que a linguagem corporal dela causava em mim; meu peito acelerado, o processo respiratório dificultoso, as borboletas teimosas que não sumiam nunca da região da barriga..
Mas alguma coisa naquela galáxia gritante sussurrava algo errado e descabido que eu não conseguia compreender. Talvez fosse um buraco negro sinalizando que existiam outras galáxias.
O universo tem dessas coisas.
Um universo, algumas galáxias, vários planetas.
- Dulce? - A voz rouca me fez piscar e voltar o foco para os olhos a minha frente. - Está tudo bem?
A pergunta obtinha uma única resposta simples: Sim. Estava tudo teoricamente bem, mas aquele buraco negro ainda estava lá, em algum lugar. Sorri fraco em resposta no mesmo instante que um celular começou a tocar. Suspirei observando Anahí atender o telefonema e o sorriso largo surgir em seu rosto. As mãos pálidas abandonaram minha pele enquanto se sentava ereta no sofá. Palavras como "saudade", "ótimo" e "hoje" me fez olhar para a janela com o pensamento longínquo. Nossa paralisação do mundo havia acabado e ele estava em movimento novamente.
- Anie...
Meu chamado foi baixo enquanto saíamos do elevador em direção ao carro. Minhas pernas tremiam com a sensação das agulhadas frequentes nos nervos enquanto observava Anahí brincar descontraída com a chave na mão. As portas foram abertas e fechadas em sincronia quando já nos encontrávamos nos assentos dianteiros.
- Pode falar. - Anahí regulou o ar e se certificou dos pontos importantes antes de me olhar confusa diante ao meu silêncio. - O que foi?
Minhas mãos trataram de esfregar meu rosto com certa agonia antes dos dedos frios dela tocarem os meus. Olhei o pulso junto ao meu analisando a palavra cravada ali, o bombardeio de imagens surgindo na minha cabeça deixava o ar escasso e vi seus olhos brilhantes me olhando em confusão piorava ainda mais a situação.
- Dulce, o que está acontecendo?
- Isso mesmo. - Limpei a garganta me livrando das mãos que me levavam ao céu e depois ao inferno em uma velocidade absurda. - O que está acontecendo, Anie?
- Como assim o que está acontecendo?
As sobrancelhas perfeitas franzidas para mim deixaram meus pensamentos momentaneamente em branco. Os olhos azuis preocupados me fazia esquecer de qualquer outra coisa e a boca fechada em uma linha dura quase me fez ter vontade de morrer.
Eu já não lembrava mais o que estava me agoniando e a única coisa que eu queria fazer era voltar para aquele apartamento e esquecer de todo o resto. E então, mais uma enxurrada de pensamentos apareceu. Esse era o motivo da agonia; todo o resto.
Eu sabia que ao sair por aquelas portas e voltar para minha vida o peso que eu levava no dia a dia retornaria. Sabia que os surtos esporádicos de Anahí continuariam acontecendo. Sabia que nossa rotina seria tão cheia que o máximo de contato que poderíamos ter era uma mensagem de texto antes de dormir, ou talvez nem isso.
Minha boca se abriu para falar alguma coisa, mas minha cabeça não conseguia formular uma frase coerente. Os pensamentos bagunçados faziam a agonia ainda maior e na mesma velocidade que eles surgiram na minha cabeça, eles desapareceram outra vez.
- Nós. - Consegui suspirar. - Estamos no mesmo lugar.
Minha sentença suavizou a expressão de Anahí que me puxou para um abraço apertado. Fechei os olhos sentindo o cheiro único que emanava dela. Ele é meu preferido até hoje.
- Nós não estamos.
- Não minta. - Retruquei ainda no abraço.
Anahí suspirou levando uma das mãos ao meu cabelo iniciando um cafuné lento. O silencio permaneceu por alguns segundos antes da garota plantar um beijo na lateral de minha testa e se afastar um pouco me olhando nos olhos.
- A gente vai arrumar um jeito nisso tudo. - Anahí soprou e eu quase ri, mas estava tão entorpecida que a deixei falar. - Nós duas precisamos ver isso direito e decidir como vamos tentar levar as coisas. Minha divulgação está uma loucura e aposto que as gravações para seu próximo filme começam logo. - Concordei com a cabeça quando pausou. - Nós não estamos no mesmo lugar, Dul.
Eu queria debater aquilo. Queria perguntar como iríamos dar esse tal jeito. Queria falar que sempre haveria divulgações, gravações e turnês. Eu sinceramente queria dizer que sim, estávamos paralisadas no mesmo lugar e que eu não conseguia enxergar uma maneira de nós duas sairmos dessa situação. Mas algo me impediu. Os olhos azulados parecendo sinceros sugou toda a negatividade que pairava na minha mente. A agonia evaporou e a paz retornou ao meu peito com a esperança de que ficaríamos bem, ficaríamos okay.
- Me desculpe por isso. - Pedi calmamente deixando um sorriso brincar em meus lábios. - Eu honestamente não sei porque pensei nisso.
- Não precisa se desculpar, meu amor. - O sorriso divertido de Anahí fez o meu próprio se estender e eu nem estava pensando no adjetivo que fez meu coração inflar. - Todos nós temos o direito de surtar às vezes.
- Só.. - Iniciei o pensamento, mas me calei no mesmo instante. O que atiçou a curiosidade da outra mulher.
- Só o quê? - Os olhos me fitaram curiosos e eu mastiguei o lábio inferior criando coragem para expulsar o pensamento pela boca.
- Só não aguento mais mentiras. - Tentei explicar. - Esconder isso. - Gesticulei entre o espaço entre nós duas. - Está me matando.
A atenção de Anahí vacilou e os olhos, antes em mim, miraram para além do parabrisa. A testa franzida sinalizava pensamentos.
- Isso é complicado no momento. - Sua voz soou distante. - Na verdade isso é bastante complicado no momento.
O loop infinito de instabilidade do meu humor já estava me causando dor de cabeça. Lá estavam as linhas duras no rosto de Anahí e mais uma vez a agonia dentro de mim. Fechei os olhos com força inspirando profundamente antes de ignorar toda a parte sombria que me assolava e puxar delicadamente o rosto de Anahí em minha direção outra vez.
- Está tudo bem. - Encenei com um sorriso que jurava ser convincente. - Eu sei que não podemos revolver tudo agora. Eu só sinto sua falta. - Encolhi os ombros sendo sincera.
Anahí piscou fazendo os olhos azuis se esconderem por trás das pálpebras por alguns segundos antes de me fitar novamente em meio à um suspiro. Uma de suas mãos encontrou a minha que repousava no rosto de porcelana e os lábios plantaram um beijo suave em minha palma.
- Nós podemos fugir de vez em quando. - A voz rouca sugeriu calma. - Podemos sair também. Não há nada de mau nisso.
Respirei fundo tentando não mostrar o calafrio que percorreu meu corpo. Algo naquilo me aterrorizava. Por mais que a mídia ainda pensasse que eu e Ucher estávamos juntos, não estava preparada para enfrentar os rumores sobre eu e Anahí ou o famoso trauma Portinõn tão cedo. O que entrava em contradição com o fato de eu ter reclamado com a mulher sobre nosso relacionamento sigiloso.
A passagem de ano foi de longe a mais complicada. Os acontecimentos próximos das datas comemorativas deixaram o tempo ainda mais curto e corrido. Em um momento estava no interior para as reuniões em família de fim de ano, no outro já estava viajando pelo mundo, atolada de entrevistas e apresentações. O que era apenas a ponta do iceberg, porque as filmagens para meu próximo trabalho estavam mais perto de se iniciar a cada segundo que se passava.
Meu ciclo social se resumia apenas nos produtores e artistas que me acompanhavam por toda parte, e na mesma proporção que isso me livrava de problemas, me trazia ainda mais.
**********
Eu havia escapado do trabalho quando meus pés tocaram no solo na cidade do México. Enviei uma mensagem rápida para Anahí e dirigi até o apartamento já familiar. Era assim sempre que podíamos; nós duas acabávamos no apartamento solitário enroladas nos cobertores em dias frios, ou uma na outra nos quente.
Girei a chave na porta entrando no aposento sem muita paciência. Por mais que nossos encontros ali fossem para matar a saudade, naquele dia existia exceção. Eu não tinha tempo e precisava falar com Anahí pessoalmente. Meus dentes doíam por causa da força que eu trancava o maxilar. Cortei a sala à passos largos avistando a mulher deitada no sofá. Joguei a revista com força na mesa de centro e o som rude ganhou os olhos da mulher para a capa.
- Merda! - Anahí se sentou no estofado ainda encarando a foto estampada. - Dulce, isso não é o que você está pensando.
- Claro. - Ri debochada. - É montagem? - Cruzei os braços.
A mulher esfregou a testa apoiando os cotovelos nos joelhos. Os olhos fixos na capa da revista famosa.
- Não. Não é. - Respondeu em voz baixa e eu não contive a respiração forte. - Mas não é isso. - Gesticulou. - Eu não estava esperando, e ele sabia que tinha paparazzi.
- Você passou a noite na casa dele, Anahí!
- Passei, mas não aconteceu nada! Ele é meu amigo, pelo amor de Deus!
- Então você quer que eu acredite que você passou a noite na casa de um amigo e no dia seguinte resolveram fazer uma caminhada despretensiosa, e que ele resolveu te dar um beijo porque tinha paparazzi? Nada demais, certo?
- Você precisa acreditar em mim, okay? - Os olhos de Anahí se conectaram nos meus e eu me vi muda. - Eu e o Velasco não temos absolutamente nada além de uma amizade. Nós já tivemos um passado sim, mas foi passado. E você sabe que ele é amigo da família.
- Você não pode me julgar por não acreditar nisso, Anahí. Você não pode me julgar mesmo.
- Não posso, mas ele sabe da gente, Dulce. - A declaração fez minha irritação se transformar em algo maior: choque. - Eu perdi muitas pessoas depois da reabilitação, e ele é um dos poucos verdadeiros que ficou do meu lado e eu confio nele! Ele me conhece, sabe o que estou passando. Não existe nada além disso. - A cada palavra que saia da boca de Anahí, era uma batida mais lenta que meu coração realizava. - Ele achou uma boa ideia para a imagem de nós dois se me beijasse, e eu tive uma briga horrível com ele por causa disso depois. Me desculpe se eu não te falei antes, eu deveria ter te contado.
- Deveria. - Suspirei pesadamente me rendendo para a poltrona atrás de mim. - Deveria mesmo.
- Você precisa confiar em mim. - Fechei os olhos com força ouvindo a voz da garota mais perto. - Você mais do que ninguém sabe o que é viver dentro de rumores.
- Você está apontando algo? - Estreitei os olhos para Anahí que já se encontrava agachada em minha frente.
- Não. Eu não estou. - Respondeu calma segurando minhas mãos entre as dela. - Mas você precisa confiar em mim, assim como eu estou me esforçando para confiar em você.
Eu sentia o buraco negro maior, e o sussurro já estava se transformando em voz ativa. Deixei Anahí me acalmar naquela tarde, não que fosse uma opção, mas sim necessidade. Já fazia parte de mim, deletar todo estresse quando Anahi estava ao meu lado e era tão fácil acreditar naqueles olhos azuis, que eu não lutava para o contrário.
O problema é que o buraco negro começava a gritar quando estávamos longe uma da outra.
**********
Não demorou muito para Ucher dar o ar de sua graça novamente. E por mais descabível que isso soasse na minha cabeça, além da pressão que se fazia com os nossos nomes rodando o mundo ainda como um casal, ele fez com que eu me sentisse bem na ausência de Anahí. O que me fez mais uma vez voltar para a sinuca entre Anahí e Ucher.
Mas nós três estávamos focados demais para resolvermos algo, ou talvez, apenas eu resolver.
Ucher mantinha uma rotina impossível de turnês infinitas, enquanto Anahí voltava aos poucos para a música e com o uma nova novela.
Cláudia me imprensava na parede sempre que possível, mas minha resposta de que estava tudo sob controle era tão verídica na minha cabeça, que minha irmã passou a acreditar, ou pelo menos fingir acreditar. Angélique por outro lado soltava uma indireta ou outra, mas nunca ia fundo no problema. Os olhos azuis bem marcados intercalavam entre preocupados e astutos, o sorriso no canto da boca me dizia que estaria me apoiando quer que fosse minhas condições. E entre essas duas mulheres, havia Maitê.
Trabalhar com Pablo e Shirley era uma tarefa um tanto quanto divertida. Nossas semelhanças e diferenças fez com que nos identificasse de imediato. O jeito espevitado da Shirley provocava sorrisos cúmplices entre eu e Fuzz, já a loira tentava aproveitar todos os momentos que lhe era oferecido da forma mais intensa possível, o que ganhou grande admiração de minha parte.
Fuzz, Zoraida e Shirley eram três amigas profissionais que eu carreguei por um bom tempo comigo. Principalmente a Fuzz.
Eu me lembro de ter recusado a proposta de Ucher em viajar com ele naquela semana. Os rumores sobre Anahí namorar o governador estava crescendo a cada dia, mas a garota me afirmava que os dois eram apenas amigos, mesmo não negando nada diante das câmeras.
Minha cabeça latejava em um ponto particular da nuca e minhas vistas queimavam enquanto eu tentava ler pela milésima vez o roteiro que me foi designado. Eu me sentia perdida. Sem propósito de vida.
Já era noite quando o quarto que eu dividia com as meninas foi invadido pelas duas que me carregaram para o lado de fora mesmo em meio aos meus protestos. O hotel que nos foi cedido para o trabalho de filmagem era simples de aparência exótica e o clima quente da região deixava a noite deliciosa.
Não demorou muito para eu me encontrar na área da piscina com alguns membros da equipe que também se instalava ali, mas eu não podia ver Pablo ou os próprios diretores. Zoraida já estava nitidamente embriagada, ou não, julgando pelo fato da garota ser inconsequente mesmo sóbria. Então minha fiel companheira mais uma vez havia sido Fuzz.
Entre uma garrafa de cerveja e outra, eu já me encontrava rindo de qualquer coisa. Shirley já havia saído do estado alegre e ido para o triste sentada na espreguiçadeira à minha frente quando decidimos ir dormir.
Meu choque não foi lá grande coisa quando Fuzz selou os lábios nos da Zoraida em um beijo de boa noite antes de se jogar na própria cama. Mas a partir do momento que ela retirou um cigarro suspeito da mochila, minha sobriedade bateu de volta com força.
- Você se importa? - A voz suave rompeu o silêncio e observei a loira cruzar o quarto se sentando contra a parede. - Eu só preciso de um.
Retirei os sapatos sentindo o assoalho frio contra meus pés, ouvi o som do isqueiro e o aroma adocicado preencheu o cômodo escuro. Aquele cheiro parecia como uma maquina do tempo que me levou à dois lugares; O primeiro e mais recente foi quando visitei Anahí pela última vez antes dela entrar em reabilitação. O segundo..
''- Deixa de ser enjoada, Savinõn. - A voz debochada de Alfonso ressoava no quarto fechado. - Juro que você não vai se arrepender.
Me levantei da cadeira ouvindo a risada débil de Alfonso mais uma vez. A cena em minha cabeça era patética. Ucher já havia saído dali fazia tempo, e a única coisa que me arrependia era de não ter ido junto com ele quando tive a oportunidade.
- Deixe ela, Cris. - Anahí levantou do chão indo pegar a bolsa jogada na cama. - Ela já disse que não quer.
Maite no quarto olhou para Anahí com os olhos estreitos. O cigarro indo de encontro aos lábios finos mais uma vez.
- Tá bom. Eu a deixo em paz. - Alfonso concordou entregando o baseado para Maite que se mantinha deitada sob os travesseiros. - Mas vai ficar me devendo essa.
Anahí revirou os olhos me puxando pela mão para que saíssemos do quarto abafado. A mão pálida soltou a minha no instante que nossos pés pisaram no corredor do hotel. Estávamos todos hospedados no mesmo local em um festival, era nosso primeiro encontro como RBD, mas fiquei internamente satisfeita por Anahí não ter aceitado a oferta de Alfonso do meio quando lhe foi proposta.
- Obrigada. - Resmunguei irônica. - Isso meio que pareceu um pesadelo.
A risada rouca de Anahí me fez rir.
- Por nada. - Anahí fez uma reverência exagerada enquanto caminhávamos para nossos quartos. - Eles são uns idiotas. Ignora.
- Pois eu ignoro. - Abri os braços como se fosse óbvia. - Queria saber o porque de você não ignorar.
Observei Anahí morder o lábio inferior segurando o sorriso ao parar na porta de meu quarto.
- Eu não sei. É complicado. - Deu de ombros antes de depositar um beijo em meu rosto. - Boa noite, Candy.
- Boa, Anie. - Ri antes de desaparecer pela porta.''
- Você está bem? - A voz da loira sentada debaixo da janela chamou minha atenção. - Eu que fumo e você que viaja?
A pergunta da garota foi acompanhada por uma risada gostosa. O sorriso fácil e os olhos claros brilhantes me fez rir.
- Idiota. - A xinguei deixando as pulseiras, antes nos meus pulsos, na escrivaninha. - Você não deveria estar fumando isso. - Comentei retirando o par de brincos.
- Você quem não deveria.. - Pausou parecendo pensar e gesticulou no ar cada palavra à seguir. - Não. Estar. Fumando. Isso.
Esfreguei o rosto tentando não sorrir para a mulher levemente descabelada. O álcool ainda estava presente no meu metabolismo e isso me deixava fácil, propensa ao acerto. Caminhei até a garota me sentando ao seu lado no chão. Não precisou de perguntas ou respostas. O cigarro fino foi estendido para mim em um convite mudo e eu o peguei sem pensar entre os dedos.
O meu erro foi pensar que tragar a erva dos sonhos fosse a mesma coisa que tragar a nicotina do cigarro comum. A queimação na garganta foi imediata e meus olhos lacrimejaram tão rapidamente que eu não sabia o que controlar primeiro. A sessão de tosses a seguir pareceu divertir Fuzz que esfregava minhas costas com cuidado.
- Meu Deus, Dulce. - A garota tentava falar entre risadas. - Eu não sabia que essa era sua primeira vez.
Minha risada se misturou com a tosse, o que piorou a situação em meus olhos. Limpei a garganta quando consegui amenizá-la.
- Bom. Agora você já sabe. - Declarei ainda sentindo a mão quente em minhas costas.
- Okay. - Os olhos brilhantes me analisavam fascinados. - Tente outra vez. Só que mais devagar. Só a reação é diferente do cigarro comum, o processo é o mesmo.
E eu o fiz. Logo Fuzz acendeu outro que fez questão que dividíssemos. Em determinado momento eu já não conseguia discernir o real do imaginário. O mundo parecia maior, as paredes pareciam inchadas e mais altas. Os dedos de meus pés pareciam minúsculos em relação à minhas pernas temporariamente moles. O nivelamento da sensação havia chego ao topo e descia gradativamente.
- Eu já havia treinado com as meninas Beijar Zoraida não foi nada. - A Loira explicou com a cabeça apoiada na parede.
- Atualmente, eu não sei se faria um papel assim. - Comentei ainda sentindo a cabeça leve. - Futuramente quem sabe. Nem homens eu beijei decentemente nos meus papeis.
A loira riu o que me fez rir.
- Mas você já ficou com mulheres, certo? Angel, Anie..?
Rosnei.
- Anahí - Respondi certeira. - Aquela idiota. - A gargalhada da loira se espalhou pelo quarto mais uma vez. - Shiiiu.. Cala a boca. Vai acordar Zoraida. - Sussurrei.
- Aquela ali não acorda nem tão cedo, Dulce.
Compartilhamos mais uma rodada de risada divertida antes da mão quente da garota repousar na minha coxa. O toque simples e macio mandou uma corrente elétrica para toda parte de meu corpo. E mesmo todos os sinais vermelhos piscando diante de meus olhos, eu não podia negar que me sentia atraída pela loira. Atração inconsciente que o álcool transformou em mais que consciente. E quando isso se junta com carência, as coisas podem dar muito errado. Ou muito certo. Depende do ponto de vista.
- Acho melhor a gente ir dormir também, ou o Pedro vai matar a gente amanhã. - Sugeri para a loira que me olhava atenta agora. Os olhos claros fixos nos meus pareciam ler minha alma.
- Eu queria poder beijar você antes de dormir. O que acha?
Lá estava a loira investindo em mim novamente. Minha respiração sumiu no mesmo instante que as palavras de Fuzz saíram de sua boca. Boca essa que eu encarava sem parar. Os lábios entreabertos pareciam convidativos.
- Não seja estúpida. Você tem namorado. - Joguei minha única desculpa realmente válida para não avançar na boca rosada.
- Não é nada demais. Só um beijo entre amigas. - Deu de ombros. - Não é uma traição.
- Não? - Engoli em seco a sentindo se aproximar.
- Não. Relaxa.
E eu relaxei. Meus lábios se chocaram com os de Fuzz que prontamente me invadiu a boca com a língua quente. O beijo era sensual, ousado. A mão delicada veio de encontro a minha nuca aprofundando mais e exigindo um contato maior com minha língua.
***********
- Vamos tentar outra vez, Dulce.
A voz calma do diretor soou pelo megafone e eu suspirei passando as mãos pelos cabelos na tentativa de acalmar o nervosismo. A gravação da cena era tão simples que já estava me irritando por não conseguir. Massageei a têmpora esperando que o comando das câmeras fosse dado. Minha cabeça parecia que iria explodir a qualquer momento, a garganta seca suplicava por água e meus olhos pareciam pesar uma tonelada.
- Eu preciso de um tempo. - Gritei do cenário montado ganhando um aceno positivo de Pedro que analisava algumas folhas com o assistente.
Meus dedos tremiam ao tentar buscar o copo descartável. Tentei abrir a garrafa d'água, mas logo mãos quentes substituíram as minhas.
- O que você tem? - Pisquei forte para a voz de Fuzz. - E não adianta falar que não é nada porque eu nunca vi você errar tanto quanto hoje.
Observei a garota encher meu copo com o liquido transparente e os olhos verdes mares pareciam preocupados com minha mão trêmula que levava o recipiente até minha boca. O gelado refrescou minha língua e cabeça fazendo com que a respiração voltasse a entrar nos pulmões frágeis.
- Acho que é só a ressaca. - Tentei.
- Não. Eu já te vi de ressaca. - A loira negou e eu sabia que ela estava certa. - Você precisa ir ver um médico.
- Você está louca? Se encontrarem aquela coisa que você me fez usar ontem?
O riso curto da garota foi debochado e irônico.
- Você não reclamou na hora. - Apontou ganhando um grunido meu.
Olhei para além da loira encontrando o namorado da mesma conversando com um dos atores do filme. Meu nível de desconforto aumentou e algo na minha cabeça se contraiu.
- Como você pode ficar tão confortável com o ele depois de ontem? - Perguntei realmente confusa.
Fuzz olhou para trás rapidamente e observei a troca de olhar e sorriso dos dois antes da loira voltar a atenção para mim. As mãos quentes repousaram uma em cada lado do meu rosto em um carinho inocente.
- Nós somos amigas, Dul. Já te expliquei isso. - Ela disse e quando eu tentei falar um "mas", fui cortada. - Foi só um momento entre amigas. E está tudo bem.
Minhas vistas queimaram e minha cabeça pareceu girar 360 graus. A forma de pensamento da garota era tão absurda para mim que eu preferi desistir.
- Não me leve à mal. - Comecei enchendo meu copo outra vez. - Mas isso não vai acontecer de novo.
- Mas por quê? - A voz manhosa me provocou um sorriso verdadeiro.
- Porque por mais que você não ligue, eu me importo e não me sinto bem em olhar para a cara dele.
- Ele não se importa.
- Fu.. - A repreendi com um olhar de soslaio. - E além do mais tem Anahí.. Ai minha cabeça. - Choraminguei ganhando a mão da garota em meu ombro como apoio.
- Tudo bem. Eu desisto. - O suspiro da garota foi audível. - Mas é uma pena. Você realmente beija muito bem. - Soltou me fazendo gargalhar. - Agora sério. Você deveria pedir um médico.
- Eu estou okay. - Menti no instante em que a pausa permitida havia terminado.
Ao longo da semana minha cabeça parecia em ponto de ebulição. Os pensamentos repetitivos e acumulativos surgiam sempre que minha atenção fugia de algo concreto. Quando repousava sobre os travesseiros era pior, a sensação de erro e impotência parecia me asfixiar e o fato de eu estar sozinha aumentava a agonia em três vezes a mais na escala.
Era uma tarde chuvosa quando eu resolvi ligar para Anahí. Já havia dias que não conversávamos descentemente e a garota parecia apenas responder as minhas mensagens e ligações, nunca tomando uma atitude de contato, o que me afetava em um nível ainda maior.
Eu me sentia sobrecarregada e precisava da companhia de Anahí. Necessitava ter algum ponto de fuga do mundo que me rodeava. Mas a ligação foi para a caixa postal imediatamente e o aperto no meu peito aumentou.
Sai da sala de alimentação movimentada discando o número novamente. Me apoiei na mureta da varanda esperando a ligação completar, mas mais uma vez caiu na caixa postal.
Apertei o celular com força descontando ali o espasmo pelo corpo. Eu já não me sentia em mim. Os pensamentos voltaram com mais força e eu me permiti analisá-los. Estava tudo errado. Tudo.
Meu comportamento era algo que eu já não reconhecia. Eu havia me afastado da minha família, havia me afastado de mim mesma. A pontada na nuca havia sido forte e se espalhado para as têmporas. Estava sem foco. Eu havia me perdido em algum lugar do caminho e não entendia o porquê.
Eu queria que o mundo desaparecesse, queria que os problemas sumissem, queria poder não lidar com nada. Eu queria voltar para uma época onde a pressão não fazia parte de mim. Eu queria voltar para a época em que eu tinha certeza das coisas que eu pensava, que eu fazia. Havia perdido a noção do certo e do errado. Havia perdido o meu próprio conceito.
Eu precisava parar aqueles pensamentos idiotas. Eu precisava de um cigarro ou uma dose de álcool. Minhas pálpebras pesaram com as contradições entre ceder e não ceder. Eu não precisava daquilo, precisava? Eu não queria precisar.
- Dulce?
Eu ouvi o chamado ao longe, parecia a voz de Zoraida. Tentei mover meus pés, mas não consegui. E então eu percebi a pressão forte na cabeça e meu corpo curvado por causa da dor insuportável no estômago. Eu não conseguia respirar. A ânsia de vômito era a reação do enjôo e minha cabeça rodava fazendo minha visão ser apenas um borrão.
O grito pelo meu nome ficou mais perto e eu já não podia discernir se ainda era Zoraida ou o buraco negro que estava me engolindo quando eu apaguei.
Autor(a): portisavirroni
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 5
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fernandaayd Postado em 06/03/2018 - 14:30:21
Já acabou?? Que pena, pois essa foi uma das melhores histórias que já li. E de alguma forma me ajudou muito. Obrigada pela dedicação e vc escreveu tudo com o coração, pq dar pra sentir isso em casa capítulo. Parabéns por tudo★
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fernandaayd Postado em 28/02/2018 - 17:41:23
Será que a Dul, vai falar para Anie sobre a depressão? ?
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candy1896 Postado em 25/02/2018 - 20:44:37
Continuaa, que não aconteça nada de ruim com Dul.
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fernandaayd Postado em 09/02/2018 - 14:16:33
Estou acompanhando e você escreve muito bem, parabéns! E que bom que você sempre posta.
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Lorahliz Postado em 31/01/2018 - 21:07:49
To acompanhando sua fic e to amando!!! Posta mais...o cap 7 tá dando erro!!