Fanfic: My world was always you ( portinõn) finalizada | Tema: Rebelde
"Quando.. Quando eu estava no palco, estava pensando.. Eu sinto que o conheço, eu conheço seu coração e sei de tudo o que ele jamais faria para me machucar.."
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O sofá verde musgo já não me causava tanta antipatia como nas primeiras vezes. O barulho do relógio me fazia pensar que o tempo corria desenfreado, não me dando oportunidade para viver algo realmente significativo. Fechei os olhos com força balançando sutilmente a cabeça para afastar os devaneios que pareciam querer me engolir. Não pensar me fazia bem, não pensar deixava as coisas meio equilibradas.
- Você tem certeza de que não quer uma indicação? – A voz da Doutora Sullivan me puxou para fora de minha própria cabeça. – Eu tenho ótimos conhecidos na capítal que cuidariam das suas sessões tão bem quanto eu.
Batuquei os dedos no braço do estofado olhando a face conhecida da mulher. Eu estava de partida para minha vida rotineira, a medicação havia sido bem aceita pelo meu organismo e a terapeuta tinha feito sessões extras para garantir minha autonomia durante um mês, porém, o receio em me deixar sem assistência ainda era existente.
- Eu não me sentiria confortável. – Respondi calma ganhando um aceno compreensivo da doutora. – Eu acho que consigo não surtar dentro de um mês. - Ri sem humor ganhando um sorriso fraco da mulher que anotava algo no bloco de papel.
Eu não me sentiria confortável mesmo. O ponto de confiança que havia adquirido com a mulher era algo que eu julgava ser impossível de se repetir com um outro profissional da área.
- Tudo bem. – A terapeuta tirou os olhos do papel mirando em mim. – Dulce, é importante você saber que os remédios não te deixam imune a pequenas recaídas.
- Sim. Eu sei. – Aprumei o corpo sentindo serem os últimos tic-tac do relógio naquela sala.
- Seu progresso foi incrível. – Sorriu fraco demonstrando certo orgulho e senti minha face esquentar. – Você é incrivelmente madura para a sua idade, mas ainda precisa trabalhar em quem você é.
Concordei com a cabeça recordando das infinitas conversas sobre minha própria identidade. Para solucionar um problema exterior é necessário estar com o interior resolvido, dizia ela. Mas uma coisa que eu ainda não estava era resolvida internamente e era essa a nossa preocupação.
- Eu sei. – Suspirei tentando não demonstrar meu medo por viver. – Eu acho que poderei trabalhar melhor nessa questão dentro do meu habitat natural. – Cocei a nuca aguardando por uma concordância da mulher.
- Sem dúvidas. – Sorriu mais confiante se levantando com calma da cadeira. – Se concentre em você, Dulce. Se precisar parar, pare. Se não quiser fazer, não faça. Sinta o que quiser sentir. Se descubra. E por favor.. – Caminhou até meu lado quando o tempo já havia acabado. - Por favor, não retenha.
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Não retenha.
Era meu quinto dia na capital e ainda não havia contatado Anahí. Esse detalhe era a única coisa que me perturbava porque o acordo era resolvermos o que quer que fosse para resolver quando eu voltasse, mas meu medo por abandonar a concentração em mim e ceder à dependência dela era maior.
Bebi do suco doce amaldiçoando os remédios controlados que me impediam de beber algo com álcool. Não que eu precisasse, mas o cheiro dos drinks junto ao meu suco de laranja puro na mesa fazia minha língua implorar por uma gotícula de teor alcoólico.
- O que você tem? – A voz fina ao meu lado tirou minha atenção dos copos.
- Nada. – Ergui os ombros olhando estranhamente para a morena. – Por quê?
- Você está no mundo da lua. – Maite balançou seu copo no ar girando o gelo no liquido âmbar enquanto corria os olhos negros pelo restaurante movimentado.
Me remexi na cadeira me sentindo incomodada. As feições de Maite eram serenas, exalava calmaria. Já por outro lado, o vinco que se formava entre as sobrancelhas dela demonstrava bastante curiosidade e desconfiança. Não gostava disso, já que anos de convivência a morena me conhecia muito bem.
- Não estou. – Sorri fraco buscando meu copo na mesa. – Eu estou bem.
Bebi do suco tendo o olhar atento de Maite em meus movimentos.
- Primeiro fator condenatório de que você não estar bem: – Pegou o copo de minha mão fazendo a Zoraida rir ao meu lado. – Você está bebendo suco. – Não consegui conter o sorriso e apoiei os cotovelos na mesa descansando o queixo em meus dedos entrelaçados. – Segundo fator: Você não prestou atenção em absolutamente nada do que eu falei aqui.
- Prestei sim. – Rebati calma.
- Prestou não. – Zoraida discordou gargalhando levemente passando uma mão pelos cabelos curtos. – Vamos lá, Dul. Onde está sua cabeça?
Bufei me voltando para a sobremesa em meu prato no intuito de ignorar as duas. Maite havia acabado de voltar de viagem e estava ansiosa para nos contar de suas aventuras. Por sorte ou destino, eu ainda me mantinha com a agenda livre e Zoraida estava de passagem pela cidade por causa de alguns trabalhos paralelos. Era minha primeira aparição em público desde minha volta do litoral e, por incrível que pareça, não havia encontrado nenhuma câmera direcionada para mim até aquele momento.
- É o Cristopher?
Zoraida ganhou meus olhos para os seus calmos com o comentário. Não, a minha última preocupação era Ucher, mas o nome do garoto me lembrou a ligação confusa e desesperada que havia recebido alguns dias atrás.
- Não. – Remexi no pudim com o talher reparando na minha pouca vontade em comê-lo.
- Ouvi dizer que ele não está muito bem. – Dessa vez foi Maite quem falou, ganhando assim os meus olhos. – Semana passada ele deu uma festa na casa dele e as coisas saíram um pouco do controle.
- Como assim saíram um pouco do controle? – Me recostei na cadeira intercalando o olhar entre as duas que se entreolharam rapidamente. – Dá pra falarem de uma vez?
- Não sei. – Maite gesticulou um pouco absorta. – Eu não estava aqui. Só fiquei sabendo que no final deu até policia.
- Hn. – Olhei para Zoraida que tinha a culpa estampada no rosto bonito. – Fala.
- O que te leva a crer que eu sei de algo? – Riu sem humor bebericando do copo em sua mão.
Arqueei uma sobrancelha ainda aguardando pela resposta de Zoraida que suspirou antes de colocar o objeto de vidro sobre o tampo de madeira.
- Okay. – Zoraida apoiou os braços na mesa se inclinando um pouco para frente diminuindo o tom de voz. – Alfonso me falou que Ucher foi parar no hospital no dia da festa. A Belinda que disse pra ele. Ela e o Cris encontraram o Ucher desmaiado depois que a policia foi embora.
- Desmaiado? – Pisquei voltando a focalizar em minha amiga. – Mas o que aconteceu?
- Aparentemente... – Zoraida olhou para os lados antes de se inclinar um pouco mais sobre a mesa e diminuir ainda mais o tom de voz. – Aparentemente foi overdose.
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O ronco suave do motor cessou, mas permaneci com as mãos firmes no volante e os olhos fixos no portão de ferro. Me sentia calma, mas ao mesmo tempo ansiosa. Meu coração batia devagar, mas ao mesmo tempo forte. Estava preocupada e não sossegaria até ver com meus próprios olhos que tudo estava bem, por isso deixei que Zoraida me convencesse de ir até lá. Baixei o vidro do carro para que a câmera de segurança me reconhecesse e logo o chiado do porteiro eletrônico surgiu.
- Menina Dulce! – A voz doce de Alexandra me saudou alegre. – Um segundo que já irei abrir o portão.
- Obrigada, Alexandra.
Minha voz saiu fraca e senti minha garganta seca. Girei a chave de volta na ignição quando o portão começou a se abrir e guiei o carro até a porta de madeira da casa grande. Tirei o óculos escuro sem me importar de pegar a bolsa no banco do carona e sai do carro sendo recepcionada pela governanta da casa.
- Quanto tempo que não aparece por aqui. Eu já estava ficando preocupada.
Sorri fraco para a mulher dando a ela um abraço simples no portal de entrada. Beatrice era uma governanta antiga naquela família. Sua pele clara mostrava manchinhas escuras como sinais de sua idade um pouco avançada, os olhos verdes eram sempre brilhosos e o sorriso constantemente caloroso. Não tinha uma única pessoa que não gostasse de sua aura materna e eu agradecia por ela ainda estar ali.
- É eu sei. Ele está em casa?
- Sim. Quer que o avise que está aqui?
- Não, não. – Neguei rapidamente. – Quero fazer uma surpresa. Onde ele está?
- Está no quarto, senhorita. Qualquer coisa é só me chamar. Ou a senhora.
Acenei com a cabeça observando a mulher se direcionar de volta ao corredor que dava acesso para a cozinha. Olhei a escada à minha frente passando as mãos pelos cabelos sentindo certo descontentamento com a familiaridade da situação. Corri os degraus da escada até o topo entrando na primeira porta do corredor.
O quarto estava escuro, mas o filete de luz que entrava pela janela dava para localizar bem os objetos. Dois violões estavam jogados pelo chão junto às folhas soltas, o amontoado de roupa me impedia de ver onde estava de fato o assoalho e as garrafas de vodka se distribuíam pelo aposento. Suspirei mais pesado coçando a testa, aquilo não podia estar acontecendo de novo. Levei minha atenção para a cama encontrando o garoto deitado entre as cobertas. Me aproximei devagar sentando na beirada da cama sentindo meus olhos arderem com as lágrimas que nem me avisaram nada antes de cair. Que tipo de piada cósmica era a minha vida para os fatos se repetirem tão semelhantemente daquela forma?
Limpei o rosto com raiva fungando baixo. Ucher parecia tranqüilo em seu sono, os cabelos cacheados extremamente bagunçados sobre a testa e os lábios finos entreabertos na passagem da respiração. Sorri fraco correndo o indicador pelo nariz pequeno subindo para os cabelos macios, o resmungo do garoto me fez rir.
- Acorda, preguiçoso. – Sussurrei passando a mão pelo ombro despido. – Vamos lá. - O chacoalhei de leve sorrindo mais largo quando os olhos caramelos se abriram para mim. – Oi..
Ucher piscou parecendo confuso em me encontrar ali. Os olhos pequenos correram pelo aposento bagunçado antes de se espreguiçar devagar.
- Oi. – Se sentou contra a cabeceira da cama coçando os olhos. – Faz quanto tempo que está aqui?
- Eu cheguei agora. – Brinquei com uma dobra no lençol que cobria o colchão.
O silêncio constrangedor invadiu o ambiente e eu não sabia mais o que estava fazendo ali. Parecia natural ir até lá e iniciar um contato direto com uma das pessoas mais importantes para mim, o que eu não contava era me sentir uma completa estranha diante dos olhos dourados.
Olhei para Ucher que mantinha o rosto sério, o que fez meu estômago afundar em receio, mas logo um sorriso sapeca surgiu nos lábios finos e os olhos pequenos brilharam em meio à escuridão. Sorri aliviada com o passaporte que me foi dado e levantei devagar da cama.
- Vá se vestir. – Ordenei indo de encontro à porta. – Estou te esperando na cozinha para comermos alguma coisa.
Não demorou muito para o Cristopher descer. Eu já havia ajudado Beatrice a fazer um café reforçado para o garoto e descoberto que ele não pisava naquela cozinha fazia tempo.
Quando decidi conversar com Ucher imaginei que seria um clima pesado, mas a risada do garoto naquele momento dissipou qualquer clima estranho. As piadas bobas que fazia e o ar leve a sua volta me fez relaxar aos poucos.
Ucher caminhava ao meu lado com as mãos nos bolsos da bermuda enquanto buscávamos assuntos para nos atualizar. Ele parecia bem, mas também parecia extremamente exausto. A pele estava ainda mais alva e bolsas escuras se localizavam abaixo dos olhos.
- Eu queria me desculpar pela maneira rude que tenho tratado você ultimamente. - Olhei a rua que se estendia à nossa frente levando minhas mãos para os bolsos traseiro da minha calça jeans. – As coisas meio que saíram do controle e eu acabei descontando tudo em você.
- Você não precisa se desculpar, Dul. – Sorriu ajeitando o boné na cabeça. – Você estava certa. Eu não deveria ter ido até o hospital naquele dia, muito menos ter te ligado.
Encolhi os ombros checando os dois seguranças que seguiam nossos passos a uma distância segura.
- Mesmo assim. – Reforcei. – Eu não deveria ter feito aquilo. – Suspirei observando um carro dobrar a esquina. – Eu fiquei sabendo sobre a sua festa na semana passada..
- Ah não. – O garoto abaixou a cabeça para os próprios pés sorrindo envergonhado. – Então foi por isso que veio.
- Sim. O que foi que aconteceu?
Ucher levou os olhos para o céu momentaneamente antes de suspirar.
- Não foi nada. Eu só perdi a noção das coisas e acabei me descontrolando demais. – Gesticulou como se realmente não fosse nada. – Eu precisava parar de pensar por alguns momentos e meio que deu certo.
- Isso nunca meio que dá certo. – Evitei os olhos do garoto quando percebi já termos dado a volta na quadra. – Overdose, Cristopher? Sério mesmo que vai se deixar acabar assim?
- Não chegou a ser isso. Foi isso o que falaram para você?
- Não importa o que me falaram, mas eu te conheço. – Cruzei os braços me mantendo firme enquanto uma tempestade conhecida se iniciava dentro de meu peito: Impotência. – Te conheço bem demais para saber que se você estragar esse teu momento, nunca mais irá se perdoar.
- Eu sei. – Suspirou parando de frente para mim, os olhos agitados olhavam para além de mim. – Eu vou tentar melhorar por você.
- Não. Você tem que melhorar por você. – Toquei o indicador em seu peito com calma tirando aquela responsabilidade dos meus ombros. – Você batalhou tanto por isso, Cristopher. Eu não posso acreditar que desistiria fácil assim.
- Se eu tentar melhorar por mim.. – Deixou a frase flutuando no ar e abaixou a cabeça rindo sem humor. – Como anda Anahí?
Pausei quando os olhos de Ucher me encararam. Como andava Anahi? Não andava, como sempre. E ele pareceu ler minha mente.
- Você sabe que isso nunca vai dar em algo concreto. Não sabe? – Eu não sabia, mas pensava muito a respeito. – Eu tento pensar.. – Os olhos de Cristopher miraram as nuvens. – Como você espera que isso dê certo, porque.. A probabilidade de dar em nada..
- Chega. – Fechei os olhos com força expulsando aquelas palavras negativas de minha mente. – Se não vai ajudar, por favor, também não atrapalhe.
- Desculpa. – Me fitou confuso. – Eu só não entendo.
- Você não tem que entender nada. – Corri as mãos pelos cabelos soltando o ar lentamente. – Quem está vivendo e quem tem que solucionar alguma coisa é apenas Anahí e eu.
- Tudo bem. – Tirou o boné bagunçando os fios castanhos de maneira nervosa. – Eu só quero.. Eu só quero que você saiba que eu ainda te amo, Dulce. E que pode contar comigo para o que for.
Naquele momento eu consegui entender meus sentimentos por Ucher. Era um carinho forte, um cuidado e admiração que fazia eu me sentir normal. Eu conseguiria viver ao lado dele. Conseguiria ter uma vida mais ou menos, com um amor mais ou menos que me proporcionaria uma tal felicidade comum, porém, não o êxtase.
Puxei o garoto para um abraço forte que me foi retribuído no mesmo instante e me xinguei mentalmente por não poder retribuir os sentimentos dele na mesma proporção.
*********
Três, dois, um..
O toque do meu celular soou outra vez enquanto vibrava sobre o tampo de vidro da mesa. Bati a caneta na folha fixa na prancheta enquanto corria os olhos pelas letras pretas.
Silêncio.
Três, dois, um..
O celular voltou a tremer e o visor a piscar com a foto antiga.
- Se você não vai atender, desligue essa porcaria. – A Voz de minha mãe acompanhou o toque telefônico, mas não tirei os olhos do roteiro em minhas mãos. – Dulce!
- O que foi? – Perguntei calma lendo a próxima linha.
Silêncio.
Três, dois, um e comecei a sorrir involuntariamente com o toque reiniciado.
Minha visão periférica acompanhou o movimento brusco de minha mãe ao colocar um livro na prateleira da estante e andar a passos pesados em direção a mesa para pegar o aparelho escandaloso, mas em um movimento rápido o peguei primeiro. A mulher buscou fôlego para falar algo, mas o chamado de Carmen soando pela casa a desconcentrou.
- Salva pelo gongo. – Apontou para mim antes de sumir pelo corredor.
Olhei para o celular em minhas mãos que notificava as inúmeras ligações perdidas. Eu poderia desligar o aparelho ou até mesmo colocá-lo no silencioso, mas a música tema do contato e a foto que me aparecia no visor durante a ligação, me davam uma nostalgia deliciosa ao ponto de eu me sentir de volta ao passado quando fechava os olhos.
Era irônico o fato de que algum dia eu já havia sido menor que Anahí, e era irônico também eu ter pedido para minha mãe me arrumar uma fantasia de princesa naquele dia, e logo após, Anahí aparecer em seus trajes de Príncipe. Minha mãe achou uma graça e Marichelo, por mais que resmungasse que a filha deveria usar um vestido bonito, se divertiu bastante com a animação da filha. A fantasia de Anahí lhe caiu como uma luva, tanto no corpo infantil, como em suas atitudes. Anahí havia ficado tão compenetrada no personagem que se tornou meu príncipe naquele dia, sendo uma completa cavalheira sem poupar reverências em minha direção.
Sorri divertida com a lembrança olhando para o roteiro sem ler uma palavra sequer. A porta se fechou em um baque mudo no mesmo instante em que notei que o aparelho celular em minhas mãos havia ficado calado. Desloquei minha atenção para a entrada sentindo o salto duplo do meu coração dentro do peito. A morena girou a chave nos trancando dentro do escritório antes de se virar para mim.
Engoli em seco com a visão de Anahí em minha frente. Os cabelos castanhos estavam bagunçados e os olhos sem maquiagem se mostravam vermelhos juntamente com o nariz. A calça jeans e regata branca pareciam ter sido uma das primeiras peças que a mulher havia encontrado dentro do armário.
- Por que não me atende?
A voz dela saiu baixa, rouca, fazendo o arrepio subir por minha espinha em meio ao nervoso. Anahí passou as mãos pelos cabelos dando alguns passos até chegar ao outro lado da mesa que eu ocupava. Os olhos azuis eram agitados, temerosos, a agonia da mulher estava transbordando para fora dela.
- Por que não me atende, Dulce?
Podia sentir que estava controlando a voz, a suavizando da melhor maneira possível para não perder o controle. Desconectei nossos olhos pousando a prancheta e o celular sobre a mesa tentando encontrar uma resposta que não gerasse desentendimento.
- Eu ia atender. – Falei baixo ainda procurando resposta mais exata.
- Ano que vem? – Me atrevi olhá-la e seus olhos estavam estreitos. – Quando iria me falar que estava de volta?
- Anie.. – Desviei dos olhos intensos me sentindo mal.
- Eu só quero que me responda duas coisas. – Dois de seus dedos flutuaram na minha frente chamando minha atenção. – Você voltou com ele? Cansou de mim?
Fechei os olhos com força tentando assimilar as duas perguntas e a olhei novamente. Medo. Eu enxergava o medo dentro dos olhos turbulentos.
- Não e não. – Me levantei da cadeira indo para o seu lado da mesa. – De onde você tirou uma coisa dessas?
Parei rente ao corpo de Anahí que estava tensa. Podia ver as veias saltadas do pescoço e a respiração dificultosa que tentava manter. Os lábios carnudos estavam crispados com força e os olhos vermelhos não desviavam dos meus.
- Por que não me avisou que estava de volta?
A pulsação na minha nuca foi forte e notei ali o quanto estava sendo injusta com ela. Eu deveria ter sido honesta, eu deveria ser honesta.
- Estava com medo. – Sussurrei tão baixo que estava me preparando para repetir a sentença quando Anahí indagou novamente.
- De quê? De mim? – Os olhos se desconectaram dos meus e pude ver as íris tremelicarem.
- Não, não. – Segurei o rosto bonito entre as mãos a fazendo focar de volta em mim. – Calma. Está tudo bem.
- Por que você foi até a casa dele?
Eu não precisava perguntar à quem Anahí se referia, muito menos ela precisava vocalizar o nome de Ucher.
- Eu acho melhor te fazer um chá antes de..
- Não. – Anahí cortou com a voz mais segura. – Eu quero saber o porquê de você ter ido até lá.
Engoli em seco perdida nos olhos sérios da garota. Tomei uma quantidade de ar razoável para acalmar o rebuliço dentro do peito porque meu coração parecia disputar uma maratona com meu cérebro. Senti meus joelhos fraquejarem e minha visão escurecer parcialmente; pressão. Eu me sentia pressionada e estava tão farta daquela sensação. Era aquela pressão que fazia tudo se confundir, tudo se complicar.
Pisquei forte e logo senti os braços firmes envolta de minha cintura me dando permissão para apoiar minhas mãos em seus ombros.
- Dulce? – A voz de Anahí soava preocupada ao longe. – Dul, está tudo bem?
Respirei fundo me concentrando em voltar ao normal. Encarei de volta os pequenos olhos azuis de Anahí que haviam se modificado, de agressivos para passivos, de indagadores para preocupados. Me afastei o suficiente nos guiando para o sofá branco encostado na parede e agradeci quando meus sentidos pareceram ter voltado ao normal.
- Está tudo bem. – Encolhi as pernas para cima do estofado sentando de maneira indiana.
- Tem certeza? – Anahí me olhou desconfiada amarrando os cabelos em um coque frouxo. – Você está pálida.
- Absoluta. – Esfreguei as mãos no rosto tentando afastar minha expressão provavelmente fantasmagórica.
- Okay. – Lá estavam os olhos temerosos outra vez, fugindo dos meus.
O silêncio se instalou no escritório deixando o oxigênio denso. Eu sabia o que ela queria saber e eu sabia o que dizer, mas parecia que qualquer palavra que eu falasse seria interpretada de uma maneira errada.
Não retenha.
A lembrança do aviso veio como um estalo em minha cabeça. Não havia maneiras corretas em minha mente para que eu começasse a me explicar, mas eu sabia que deveria iniciar de alguma forma. Qualquer forma.
- Eu estou em tratamento, Anie – Sussurrei para a garota que fitava o carpete bege do aposento. – Eu estou em uma fase de autoconhecimento.
- Eu entendo isso. – Comentou em um tom baixo me dando margem para continuar.
- Eu preciso focar um pouco em mim, por isso estava com medo de te encontrar. – Disse mais firme. – Toda vez que estamos juntas eu esqueço do resto do mundo, esqueço dos meus problemas, esqueço de mim. E isso faz com que eu sinta medo em relação ao meu autoconhecimento.
- Então você também acha que pode ter confundido o sentimento de..
- Não! – Minha voz saiu alta e forte ao me lembrar da época em que Anahí havia pedido espaço para tentar entender sobre nossa relação quando ainda estava na reabilitação. – Não tem nada haver com isso. É completamente o oposto. – Ri da grande ironia. – Anahí, se você soubesse a bagunça que está minha cabeça ultimamente.
- Eu consigo ter certa noção. – Anahí respondeu séria ainda encarando o carpete. – Ainda estou tentando entender sobre o fato de você querer vê-lo ao invés de ver a mim.
Dor. Ali estava outro sentimento no qual eu conseguia compreender. Ucher me causava agonia, impotência. Anahí me causava tudo.
Levei minha mão até o queixo bem desenhado fazendo o rosto bonito me encarar. As sardas contornando o nariz e parte da face sem maquiagem me trazia paz, os olhos ausentes de delineador eram infinitamente mais claros fazendo meu coração pulsar forte contra minha pele. Passei o polegar em seu queixo em uma caricia calma.
- Ucher teve uns problemas e eu queria conversar sobre isso com ele. – Fui sincera tentando encontrar as palavras mais brandas. – Ele é meu amigo. Nosso amigo. Apenas isso. – Me certifiquei em dizer já ciente da perturbação de Anahí.
- Não gosto dele perto de você. – Os azuis eram fixos em meu braço evitando meu olhar.
- Você costumava gostar dele. – Comentei observando os olhos dela vagarem ainda incomodados. - Eu deveria ter te contado isso antes..
O silêncio se instalou entre nós duas mais uma vez e senti Anahí enrijecer o corpo. Seus olhos se conectaram com os meus como se pudessem ler a minha mente.
- O quê?
- Ucher sabe sobre a gente. – Anahí fechou os olhos e inalou com força. – Ele descobriu faz algum tempo, desde a época da banda, então não há necessidade de você ficar assim. Ele sabe que estou com você.
- Isso é perigoso. – Anahí se afastou de meu domínio esfregando o próprio rosto.
- Por quê? – Franzi o cenho a olhando.
- Ele pode usar isso, Dulce.
- Não. – Neguei rapidamente tentando compreender a reação.
- Pode te chantagear. – Retrucou.
- Não! – Cortei indignada com a suposição. – Estamos falando do Ucher, ele é nosso amigo, é meu amigo, ele não vai fazer nada disso!
- E como você pode ter tanta certeza?
- Tendo! Eu confio muito mais nele do que naquele babaca do Velasco! – Soltei o que já estava engasgado na minha garganta.
A atenção de Anahí se voltou para mim perplexa. Me levantei do sofá sentindo a cabeça ferver. Eu precisava me afastar dela, estava tudo se desestabilizando outra vez e aquilo não era bom.
- Dulce...
- Melhor você ir embora. – Cortei indo destrancar a porta, mas mãos quentes me viraram para o corpo da mulher. – Me solta.
- Não. – Me prendeu mais quando tentei me desvencilhar. – A gente precisa falar sobre isso. Estamos em um circulo infinito!
Sim, estávamos. Mas aquilo não fazia uma semana ou um mês. Aquele circulo vicioso se estendia por anos e tudo o que eu queria era uma rachadura para onde nós duas pudéssemos fugir. Engoli em seco olhando os olhos serenos e preocupados a minha frente.
"Não é ela a dependente da relação, Dulce."
Pisquei duro tentando afastar as palavras da terapeuta e trazer a tona o fiapo de sanidade que os remédios tentavam estabilizar.
- Sobre o que você quer falar? – Tentei me desvencilhar outra vez e caminhei de volta ao sofá quando consegui.
Anahí passou as mãos pelos cabelos desfazendo o coque indo se sentar ao meu lado. A face antes pálida agora trazia manchas rosadas, os orbes azuis tremelicavam pelo aposento vazio.
- Dulce, eu.. – Pausou puxando o ar e o soltando pesadamente. – Eu não estou sabendo lidar muito bem com essa nossa situação.
Minha atenção caiu para o chão e meu coração se espremeu entre as costelas no exato momento que suas palavras penetraram meus ouvidos. Tentei puxar a respiração, mas parecia que o ambiente estava escasso de oxigênio. Meus tímpanos zuniam e a sensação de estar tudo escurecendo a minha volta de novo me deixou em pânico. Fechei os olhos com força antes de sentir o par de mãos quentes segurando o meu rosto.
- Não. – Anahí sussurrou. – Olha para mim. Não é nada disso.
- O quê? – Perguntei no mesmo tom me concentrando no ar filtrando vagarosamente para meus pulmões.
- Dulce, eu quero ficar com você. Só com você. – A voz parecia tão perto e tão longe ao mesmo tempo. – E quero que você fique só comigo. Quero acabar com essas pedras que atrapalham nosso caminho. Quero parar de esconder o que temos, quero que haja uma definição entre nós.
- Anie, eu..
- Sh... – Um polegar pousou em meus lábios me fazendo abrir os olhos. – Você disse que quando voltasse, iríamos resolver isso caso não estivesse resolvido. E Dulce.. – Sorriu torto levando o polegar até a maçã de meu rosto. – As coisas parecem estar virando uma bola de neve.
Sim. Uma bola de neve pronta para passar por cima de mim me esmagando até que não sobrasse mais nada. Respirei fundo tentando esquecer os pensamentos negativos e parar de tremer diante as vontades, até então confusas, que Anahí havia expressado com tanta garra segundos atrás, mas a próxima fala dela me tirou o chão outra vez fazendo com que toda a estabilidade que tanto buscava se dissipasse como fumaça no ar.
- Dulce, você quer namorar comigo?
Autor(a): portisavirroni
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 5
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fernandaayd Postado em 06/03/2018 - 14:30:21
Já acabou?? Que pena, pois essa foi uma das melhores histórias que já li. E de alguma forma me ajudou muito. Obrigada pela dedicação e vc escreveu tudo com o coração, pq dar pra sentir isso em casa capítulo. Parabéns por tudo★
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fernandaayd Postado em 28/02/2018 - 17:41:23
Será que a Dul, vai falar para Anie sobre a depressão? ?
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candy1896 Postado em 25/02/2018 - 20:44:37
Continuaa, que não aconteça nada de ruim com Dul.
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fernandaayd Postado em 09/02/2018 - 14:16:33
Estou acompanhando e você escreve muito bem, parabéns! E que bom que você sempre posta.
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Lorahliz Postado em 31/01/2018 - 21:07:49
To acompanhando sua fic e to amando!!! Posta mais...o cap 7 tá dando erro!!