Fanfic: Mentira Perfeita- AyA | Tema: Ponny
O calor em meu rosto se intensificou. Mas que droga! Alguém devia dar uma olhada no ar-condicionado daquela sala.
— Porcaria — ele chiou baixinho.
— Quer que eu dê uma olhada? — me ouvi dizendo. — Sou programadora.
Ele virou a cabeça, um dos cantos da boca curvado para cima.
— Você faz programa, é?
Toda vez que alguém usava aquela piada comigo, eu sentia um desejo quase incontrolável de chutar alguma coisa.
— Chega pra lá. — Deixei a mochila no sofá de couro marrom e contornei a mesa. Ele não se levantou, o que me deixou ainda mais irritada.
Então eu vi as rodas pretas com o círculo cromado preso à cadeira.
Ele não se levantou porque não podia.
A surpresa me fez hesitar. Mãos grandes tocaram as rodas e as empurraram. A cadeira se afastou. Olhei para o rosto dele e encontrei seus olhos verdes ridiculamente claros reluzindo, me desafiando. Olhos profundos, de um verde cristalino, como as águas da praia de Maragogi, em Alagoas, aonde tia Marieta me levara para comemorar meus quinze anos.
E pareciam ainda mais pálidos em contraste com o cabelo preto e a barba de um dia que lhe recobria o maxilar e o pescoço. Descendo o olhar um pouco mais, notei alguns fios negros encaracolados escapando da gola em V da camiseta vermelha.
Uma fisgada no baixo-ventre me fez engolir um palavrão e me perguntar se eu estava com algum problema no estômago. Devia estar, porque ele se contorcia de um jeito muito esquisito agora.
O rapaz se afastou mais para me dar espaço. Não perdi tempo e parti para cima da máquina, me inclinando.
— Belo traseiro — pensei tê-lo ouvido murmurar.
— O quê? — Lancei a ele um olhar cortante.
— Belo chaveiro. — Indicou o pequeno Mario pendurado no meu bolso.
Eu sabia. Sabia que eu não ia gostar dele. No momento em que atravessei aquela porta e o vi, eu soube que era um idiota. Pessoas bonitas demais sempre são.
Estreitei os olhos.
— Você deve ser o Alfonso.
Uma de suas sobrancelhas se arqueou.
— E você deve ser amiga de alguém cujo nome eu devia lembrar, mas não lembro, então vamos fazer isso de novo. Eu sou o Alfonso, e você é...
— A programadora que acabou de colocar seu sistema operacional no ar.
Ele piscou e olhou para o monitor.
— Já? — Chegou mais perto para enxergar melhor. Suas sobrancelhas se arquearam de um jeito inacreditavelmente cômico e ofensivo.
— Só tinha desconectado da rede.
— Tudo certo, Anahi. — Dulce guardou os papéis no envelope. — Já assinei. Diz para a Maite que ainda vou demorar. Vou ficar por aqui até os computadores voltarem a funcionar.
— Ela... já resolveu o problema. — Alfonso clicava sem parar, testando se estava tudo ok.
Claro que estava. Eu era boa nisso.
Ele voltou a me examinar — minhas bochechas voltaram a esquentar —, e algo em seu rosto mudou. Não sei o quê. Nunca fui muito boa em ler as pessoas.
— Preciso ir. — Peguei a mochila no sofá e a joguei no ombro. — O táxi está me esperando.
— Diz pra Maite me ligar quando a reunião terminar. — Dulce me levou até a porta e a abriu.
Concordei com a cabeça. Lancei um último olhar a Alfonso, que ainda mantinha a atenção em mim.
Quente. Estava quente demais ali. Antes que eu entrasse em combustão, deixei a biblioteca, um pouco desorientada, fechando a porta. O painel de madeira não era grosso o bastante para abafar os sons que vinham lá de dentro.
— Você está bem, Alfonso? — ouvi Dulce perguntar.
— Claro. Por quê? — ele respondeu, com aquela voz de barítono.
— É a primeira vez que você cruza com uma garota linda e não pede o telefone dela.
— Ela não é tão linda assim...
Claro que eu não era. Mas existe uma grande diferença entre você estar ciente disso e outra pessoa dizer em voz alta. Senti muitas coisas ao mesmo tempo: vergonha, tristeza, indignação e uma raiva quase homicida. Quem ele pensava que era?
— E é porque ela não é tão linda assim que você não conseguiu tirar os olhos dela? — Dulce questionou.
Não sei o que ele respondeu, já que uma gritaria vinda da sala me fez pular e sair do caminho, ou eu seria engolida por uma onda de crianças.
Mas não fazia a menor diferença. Eu nunca mais o veria. Ele e sua opinião sobre mim podiam muito bem ir para o inferno.
Autor(a): daanitzm
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