Fanfic: Através das barreiras do tempo | Tema: amizade, ternura,
— Não vou buscar — alegou ela.
Mas mãe é mãe. Esposa é esposa.
As mulheres desta época se sentem submissa ao esposo e acabam fazendo coisas as quais deixam os safados se julgando como reis diante de um trono de mentiras.
Consertando o papai.
Assim que meu pai saiu de seu banho, fui preparar o meu. Puxei do fundo do poço um balde de água natural, despejei-o em outro balde e o levei para o chuveiro improvisado, despejei a água sobre o balde do chuveiro, busquei no fogão da cozinha uma chaleira de água fervente que já preparara com antecedência, porém, meus bracinhos frágeis não conseguiam força suficiente para levantar tal balde.
Voltei à cozinha onde meu pai já estava preparando seu prato de jantar no fogão:
— O senhor pode levantar o chuveiro para mim, por favor?
— Não é o machinho que está falando? — ironizou ele.
— É ele mesmo! Mas a força desse machinho tem só nove anos de idade.
— Então o machinho é totalmente dependente?
— Sou! E essa dependência é responsabilidade de duas pessoas. Meus dois pais! Como minha mãe é mulher, ou seja, um pouco mais frágil, preferi pedir ajuda ao homem da casa.
— Eu vou jantar agora — alegou ele irônico.
— Tudo bem! Eu espero!
Meu irmão Leonardo se aproximou, puxando-me pelo braço, dizendo:
— Eu ajudo você!
Acompanhei-o, que com certa dificuldade conseguiu levantar o chuveiro que era então puxado por uma corda através de uma polia presa ao teto.
— Por que encheu tanto o chuveiro de água? Vai dar banho na família inteira?
— Gosto de bastante banho — balancei os ombros — Obrigado pela ajuda. Você é legal.
— Todos os dias sou eu quem subo o chuveiro pra você! Por que hoje pediu ao pai? Só porque brigou com ele?
— Eu não briguei com ele! — comecei a me despir. —Só conversamos!
— O que deu em você? É sempre o menininho mais tímido de casa!
— Vou te contar um segredo — já entrava sob a água do chuveiro. — Cuidado com as pessoas calmas.
— O quê!? — não entendeu ele.
— Cão que late não morde.
— Se tá biruta! — franziu o nariz, ele.
— A pessoa quando é muito nervosa, assim como papai… grita, xinga, esperneia… mas não passa disso. As pessoas que são sonsa assim como este sonsinho aqui, quando o sangue ferver nas veias saia de perto.
Ele saiu do banheiro sem entender muito o que eu queria expressar e eu continuei meu banho, que durou até toda a água descer de tal bico de regador.
O problema foi que… meu plano em preparar minha família para me adotar em seu meio, tivera que ser adiado até… talvez a manhã seguinte.
Pouco depois das nove horas da noite, meu pai fora se deitar e o bule continuava jogado no fundo do quintal.
As onze horas da noite, levantei-me para esvaziar a bexiga, de um menino que se esquece de ir no banheiro na hora certa e me deparei com o bule limpo em cima do fogão.
Quem o colocara ali?
Não era difícil saber!
Se ele ainda estivesse sujo com manchas do antigo café, teria dúvidas, mas… limpinho e ariado? Meu pai nunca lavou uma caneca!
Apanhei-o com cuidado e o levei para dormir no mesmo lugar em que ele estava às nove horas da noite.
De propósito fui o primeiro a me levantar as seis horas da manhã, me deparando com o probrezinho dormindo gelado no mesmo lugar.
Fui ao banheiro para as necessidades de todos os dias, inclusive escovar os dentes com a escova de meu outro eu, a qual eu descobrira na noite anterior por sorteio (na verdade nem tanto. Teria esperado todos os irmãos escovar os dentes primeiro e depois fiz uso daquela que ainda estava seca).
Ao sair do banheiro encontrei mamãe que ameaçava ir até o fundo do quintal se mostrar submissa ao homem de sua vida. Fiz apenas um gesto de reprovação e ela mudou seu rumo para o monte de lenhas de pés de café seco, apanhando alguns e levando para preparar o fogo.
Enquanto isso eu desci o balde até o fundo do poço e girando o sarilho com certa dificuldade pelo peso e pela altura, trouxe à tona tal balde cheio daquela pureza sagrada de temperatura morna. Enchi a chaleira, levando-a para mamãe.
Assim que ela conseguiu ascender o fogo, adicionou açúcar na água e seguiu para o banheiro e eu, percebendo que papai se levantava, voltei para a cama no intuito de… dar uma chance a ele.
É claro que ele, para se mostrar o rei do lar, não se submeteria às ordens de um filho tão pequeno. Mas, se ninguém tivesse vendo…
Ao ouvir mamãe saindo do banheiro, tornei a me levantar, encontrando o bule em cima do fogão. Meu pai estava na sala calçando seu sapatão, se preparando para o trabalho diário.
— Bom dia, papai! — cumprimentei-o educadamente.
— Bom dia, machinho — respondeu ele com sorriso irônico.
— Não vai ficar me chamando assim sempre, vai?
— Não! — riu ele de leve. — Só hoje.
Pensou um pouco e concluiu:
— Mas é machinho mesmo!
— Não sou! Sou só uma criança! Me fiz de macho porque eu te amo, papai.
Corri a abraça-lo.
Ele não esperava aquilo. Não era habituado.
Em minha verdadeira infância não me lembro de um dia ter sido abraçado por ele, ou por mamãe.
Porém, aceitou aquele abraço como o maior prêmio de sua vida e com certeza já teria perdoado minha intromissão da tarde anterior.
— Me diz uma coisa — insistiu ele. — No sítio eu lhe dei um tapa na cara mesmo?
— Sim! Eu tinha seis anos!
— Não foi na bunda? Quem sabe nas costas!
— Não! — neguei convicto. — Foi na cara mesmo.
— Não concordo. Não se bate na cara de um filho, ou de quem quer que seja. Quando Deus fez o filho, ele fez a bunda macia pra quando precisar ser corrigido, uma chinelada nela não machucará e corrigirá melhor.
— Pois eu acho que o senhor errou minha bunda, ou ainda não sabia que ela era macia.
— Me perdoe. Não gosto de bater em crianças! Mesmo que seja machinho.
— Tudo bem, papai. Apesar de ter doído até hoje, aquele tapa eu quase nem senti, garanto que depois dessa conversa já parou de doer.
É®Ê
Ao meio dia já estava na casa de meus avós, onde encontrei meu outro eu acabando de se aprontar para seu normal dia de aulas.
Quer dizer, não tinha muito o que aprontar. Não tinha outra roupa para vestir a não ser a que ele já estava usando.
— Você usa esta mesma roupa para dormir, ficar em casa e ir na escola? — perguntei-lhe em tom sarcástico.
— Na minha casa eu tenho roupas! Se me deixassem ir pra casa!
— Hoje você irá! — pensei um pouco. — Nós iremos!
— Disse alguma coisa para meus pais?
— Não consegui! — balancei os ombros. — Faremos isso juntos à tarde.
— Minha mãe vai nos bater!
— Bater! Por quê?
— Sei lá! Ela vai ter um troço!
— Hoje você só vai aparecer lá depois das seis horas da tarde. Ou seja, depois que papai chegar do trabalho.
— Eu não! Por que eu e não você, que é o dono da confusão?
— Tem que ser assim! Não me apareça lá antes de papai!
— Papai! Por que você chama ele de papai?
— Por que você não chama eles de papai, mamãe, vovó?
— Sei lá! — deu de ombros. — Coisa de gay!
— Coisa de família que se ama.
— Que se ama! — tornou a balançar os ombros. — Outra coisa de gay!
— Amar seus próprios pais é ser gay, moleque? Nem beijar seu próprio irmão é!
Taquei-lhe um beijo na bochecha que ele ficou até vermelho de vergonha.
— O loco, meu! — protestou limpando a face. — Sou muito homem!
— Eu também! Quer um beijo na boca?
— Sai fora, meu!
Vovó, só riu.
Ele foi para sua escola e eu, como não tinha nada para fazer, pelo menos agora tinha um lugar para ficar: a casa de minha avó. E é por isso que eu precisava esclarecer minha visita a meus pais. Para não precisar mais ficar escondido, fingindo ir na escola.
Autor(a): celso_innocente
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
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Ele foi para sua escola e eu, como não tinha nada para fazer, pelo menos agora tinha um lugar para ficar: a casa de minha avó. E é por isso que eu precisava esclarecer minha visita a meus pais. Para não precisar mais ficar escondido, fingindo ir na escola. Muito prazer: Regis sou eu. Cinco horas da tarde já estava em minha ...
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