Fanfic: Pecados e Desejos *AyA*Ponny* | Tema: Ponny, AyA

Eu tinha vontade de sacudi-la, mas perguntei friamente:

— Vai me emprestar o carro ou não?

— Escolha qualquer um. Pegue as chaves com Elisa. — e voltou a pentear o cabelo, com um sorriso de escárnio.

Antes de sair, fui ver Joaquim.

Ele dormia e conversei com a enfermeira daquele dia, uma negra alta e bonita de trinta e poucos anos, chamada de Solange. Segundo me explicou, ele dormiu o tempo todo.

Ao descer, encontrei Nate à minha espera.

Ele estava arrumado, com os cabelos bem penteados e úmidos, e me fitou de um modo tão desconfiado que senti uma onda de ternura me envolver.

Ele ainda era tão novinho para sofrer...

Olhou para minha simples roupa de jeans e camiseta e indagou logo:

— Nós vamos mesmo?

— Claro. Vamos falar com Elisa e pegar um dos carros.

Saímos com uma pick-up prateada e Nate ficou muito à vontade me ensinando o caminho até o centro de Florada.

Relaxamos, aproveitamos a bela paisagem que nos cercava, e me senti tão bem que nem acreditei que estava com algum problema de estafa.

Há muito tempo não me sentia tão em paz.

Era uma quinta-feira ensolarada e a cidade estava animada com turistas.

Estacionei o carro e nos metemos entre as pessoas que iam e vinham.

Meu sobrinho apontava as coisas, lojas, explicando o que eram, até chegarmos ao cinema.

Compramos dois sacos de pipoca e vimos um desenho engraçado em 3D sobre uma aventura espacial.

Fiquei surpresa ao ver Nate rindo, de olhos grudados na tela, mastigando a sua pipoca.

Em nada ele lembrava o menino agressivo do dia anterior.

Sabia que não seria fácil ajudar meu sobrinho enquanto ele sofresse pelo pai e o visse morrer aos poucos. Mas esperava ao menos ser sua amiga.

Não sabia quanto tempo ficaria ali, mas talvez pudesse ajudar Letícia a entender mais o filho, e se relacionar melhor com ele. Seria bom para ambos, quando Joaquim morresse.

Dentro do cinema escuro, pensei se não seria pretensão minha achar que poderia resolver parte dos problemas daquela família. Mal conseguia ajudar a mim mesma. Até uma estafa quase me derrubara...

De qualquer modo, me condoía por Nate. Ele era novo demais para ser tão sozinho, tão gordinho e carente.

Parecia se cuidar sozinho, como se ninguém se preocupasse com ele.

Saímos do cinema e o menino estava animado, parecendo outra pessoa, falando sem parar do filme.

Percebendo que ele não tinha amigos, e ninguém que o levasse para sair, me senti ainda mais arrasada.

— Vamos tomar um sorvete agora?

— É o que quer?

— Sim. A sorveteria é bem ali.

— Tudo bem. Vamos lá.

Tomei um sorvete de casquinha, mas ele se fartou com um sundae. Saímos de lá num silêncio amistoso.

Ao contrário do que minha irmã tinha afirmado, ficar com Nate não tinha sido nenhuma obrigação ou estorvo. Eu estava bem, como há muito tempo não me sentia.

Nunca tinha me imaginado como um tipo maternal, mas naquele momento pensei que seria bom ter um filho.

O carinho que estava sentindo por Nate era uma boa amostra do que sentiria ao ser mãe.

Passamos em frente a uma livraria e parei.

— Vamos entrar um pouco, Nate? Quero comprar um livro.

— Eu adoro gibi do Homem-Aranha... — disse como quem não quer nada.

Acabei sorrindo.

— Então escolha uns para você. Mas não se afaste muito, tudo bem?

— Tá. — ele foi rapidamente para a ala de gibis.

A livraria era enorme, com diversas divisões. Elegante, decorada com madeira envernizada e com luzes claras, era um convite à passeios pelas várias prateleiras de livros.

Alguns atendentes e clientes passavam por ali e folheavam páginas em silêncio.

Eu peguei um romance de Simone de Beauvoir, sem perder Nate de vista olhando gibis em outra seção.

Li o título "Os Mandarins" virando para conferir o resumo atrás. O livro parecia interessante e eu gostava da autora. Pensei em levá-lo. Escolheria mais alguns, para ler à noite.

Lancei novamente um olhar a Nate. Ele continuava folheando gibis, entretido.

Ia tornar a olhar para o livro em minhas mãos quando um movimento ali perto chamou a minha atenção.

Não soube por que fui atraída a fitar o homem de costas para mim, que lia um livro. Mas algo nele era incrivelmente familiar, e por um momento forcei a mente tentando relacioná-lo a alguém.

Subitamente meu coração acelerou e senti um frio na boca do estômago.

Olhei para ele com mais atenção.

Era alto, talvez quase um metro e noventa de altura. Apesar de esguio, visivelmente tratava-se de um homem musculoso. Seus cabelos eram curtos, densos e de um escuro brilhante.

A camisa cinza grafite marcava os ombros largos e as costas fortes. O jeans delineava uma bunda perfeita e pernas longas, musculosas.

"Não é ele...", disse a mim mesma.

Mas estava nervosa, imóvel, com o olhar fixo no homem.

O jeito dele parar e folhear o livro, com a cabeça levemente inclinada para o lado, era charmoso e másculo.

Algo inexplicável, além de seu belo físico, parecia diferenciá-lo dos demais.

Era ridículo imaginar que aquele homem tratava-se de Alfonso Herrera. Nunca o tinha visto antes.

Só por que parecia atraente como Letícia descrevera, não queria dizer que era ele.

Tive raiva de mim mesma por meu descontrole emocional. Cada vez me convencia mais de que estava enlouquecendo.

Antes que pudesse desviar o meu olhar, ele se moveu. Fechou o livro, mas não o recolocou na estante.

Virou-se lentamente, até ficar quase de frente para mim, olhando em volta devagar, como se sentisse que era tão intensamente observado.

Eu prendi a respiração.

Ele era magnífico.