Fanfics Brasil - 8 - Minha vida parece ter virado um pesadelo Remanescentes - A Fazenda Amaldiçoada (Livro 1)

Fanfic: Remanescentes - A Fazenda Amaldiçoada (Livro 1) | Tema: Fantasia


Capítulo: 8 - Minha vida parece ter virado um pesadelo

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Sabe quando dizem que depois de comer as coisas ficam melhores? É verdade. O bom humor estava ao nosso lado, até Ferdinand estava mais sorridente e alegre, e eu pensando que só havia uma expressão no rosto dele: zangado. Candence cantarolava uma música que nunca tinha ouvido na minha vida e rodopiava nos postes de luz. Sue, que vinha atrás de mim, parecia mais feliz, mas acho que ainda mascarava o que estava sentindo de verdade. Quando nos conhecemos hoje cedo, no ônibus, ela havia dado a entender que o relacionamento com seu pai não era tão bom assim, mas ver o jeito como ele a tratava, chamando por apelidos carinhosos, parecia que não era um dos piores pais do mundo. Mas mesmo assim, preferi não falar sobre o assunto ou, falar sobre o fato dela ter me stalkeado.


Os dez minutos haviam se passado e estávamos já perto de casa, só faltava dobrar mais uma esquina e estaríamos de frente a ela. Mas, mesmo dali senti uma sensação estranha, como se houvesse alguém nos observando de longe. Tentei disfarçar, enquanto olhava para todos os lados. Nada. Era possível que fosse apenas minha imaginação absorvendo a paranoia do Ferdinand de ficar olhando para todos os lados, esperando um ataque.


Quanto mais perto chegávamos de casa, uma coisa martelava na minha cabeça, talvez fosse minha intuição de que tinha alguém nos seguindo, de fato. O grandão Ferdinand parece ter sentido a mesma coisa, pois ele também vasculhava cada canto com seus olhos e tinha voltado com a antiga expressão: zangado, cara fechada e olhos atentos a tudo.


Sue e Candence não pareciam ter notado.


Quando chegamos, de fato, na calçada de casa notei que a porta da frente estava aberta. Talvez fosse a Marie que tivesse esquecido a porta aberta. Mas, não. A fechadura parecia ter sido forçada ao ponto de quebrar. Tinha um montinho de areia avermelhada em cima do tapete de entrada. Marie nunca deixaria areia no tapete, pensei.


— Tampinha – disse Ferdinand, me dando mais um novo apelido (Ebaa!) -, mora mais alguém com vocês?


— Sim. A Marie. Ela é nossa empregada, A.K.A. Mãezona. – expliquei. – Mas ela nunca deixaria a porta aberta assim, ainda mais cheia de areia.


— E se houver um ladrão que arrombou sua casa e ainda estiver lá dentro? Posso ligar para a polícia – sugeriu Sue.


— Que mané polícia o quê. – disse Candence num tom agressivo. – Estão vendo esta areia vermelha? Só pode significar uma coisa...


— Zumbis de Areia. – completou Ferdinand. – Mas como que eles chegaram aqui?


— Eu não sei, Fer. Talvez tenham sentido o cheiro do Adrian até aqui. Ou decidiram por separar e conquistar.


— É claro que existem Zumbis de Areia. - resmunguei em meio a um sussurro.


Ambos se armaram – Ferdinad com sua espada, e Candence com seu arco dourado. Ferdinand ostentava uma espada que devia ter no máximo noventa centímetros, a lâmina de aço com ornamentos em dourado. Decidi segui-los e apertei o botão esquerdo do meu relógio, segundos após surgiu uma espada de lâmina negra, com runas roxas brilhando num tom intenso. (Só fiz isso uma vez, nem sabia manejá-la bem o bastante para ser um adversário digno, mas eu faria de tudo para proteger a Marie). Com Anoitecer em mãos, me direcionei até a porta da frente da casa. Ferdinand vinha logo atrás de mim, seguido por Sue e Candence na retaguarda, nos protegendo caso houvesse um ataque pelas nossas costas.


Parei poucos centímetros à porta. Virei o rosto pra eles e contei até dez. Empurrei a porta com sutileza, para não chamar atenção, caso houvesse alguém... algo lá dentro. Quando coloquei o rosto para ver o que tinha lá dentro, quase caí pra trás. Um grito ficou engasgado na minha garganta. Ferdinand, que vinha logo atrás de mim, deu uma olhada pela porta. Abaixou a espada, a tensão esvaiu, relaxou os ombros. Candence e Sue se aproximaram também da porta e viram aquela cena: dois corpos cobertos da mesma areia vermelha que havia no tapete jaziam no chão da sala, esta que por sinal estava toda destruída.


Entramos dentro de casa, a tensão voltou. Ferdinand, agora na dianteira, liderou-nos até os corpos. Ele os examinou. Eu não prestei atenção no que ele disse, estava focado no que a nossa sala de estar havia se tornado. Os sofás estavam completamente destruídos, as poltronas viradas e rasgadas, as almofadas haviam virado farrapos, os quadros estavam no chão, quebrados. O me deixou encucado foi que, a única coisa que não tinha sido arrasada eram as plantas que tinha em um dos cantos da sala. Talvez os zumbis de areia fossem a favor da jardinagem. Tendo visto aquele cenário de destruição, tive um impulso de gritar, a procura da Marie:


— MAAAARIE?


— Você quer nos matar, Tampinha? – Ferdinand me repreendeu. – Quer que os outros saibam que estamos aqui?


— D-desculpe... – falei. – Estou preocupado com a Marie.


— Se eu fosse você não ficaria tão preocupado assim. – disse Candence. – Está sentindo esse cheiro de queimado?


Ela virou o corpo do zumbi de areia e havia uma marca esférica chamuscada em seu tronco.


— Isto não é fogo comum. – continuou. – Não acho que sua empregada/mãezona seja apenas uma empregada.


— Mas como que ela faria isso? – perguntou Sue.


— Eu não sei... Mas tem que haver uma resposta. Sempre tem.


— Temos que acha-la. – sugeri. – Marie não deve estar longe. Tenho a sensação de que ela ainda está aqui.


— Espere! – Ferdinand colocou a mão no meu peito, me impedindo de avançar pela casa. – Pode haver mais deles por aqui. Tive uma sensação estranha de que alguém estava nos vigiando.


Ele virou-se para Candence.


— Candy, fique com eles enquanto vou vasculhar a área. Espero que eu esteja errado, e com sorte não tenha mais nenhum desses por aqui.


Candence sorriu em deboche.


— Desde quando tivemos sorte, Fer?


— Fique de olho neles, docinho. – Disse Ferdinand, só então foi para o lado de fora da casa, com a espada em mãos, pronto para atacar qualquer coisa que o ameaçasse.


— Docinho? – perguntei.


Candence estava enrubescendo.


— Esquece isso, garoto. – disse ela, por fim. – Temos que procurar essa tal de Marie, não acha?


— Sim, claro. Ela pode estar ferida...


— Sangue. – falou Sue. – Vejam! Ali perto da cozinha. Sangue.


— Isto é um mau sinal. – respondi. Meu coração bateu mais forte, o ar gélido passou pela minha nuca. Só podia ser da Marie. – Marie deve estar ferida, temos que acha-la o mais rápido possível. Vocês, fiquem com a parte de baixo da casa, que eu vou lá em cima procura-la. Ah, quase ia esquecendo. Candence, o carro está na garagem. Assim que acabarmos aqui vamos direto para o Q.G. que vocês tanto falam.


— Mas... – Sue protestou. – Por que eu tenho que ir com ela?


— Acho que é para não stalkear ele, queridinha. – disse Candence, sarcástica.


Susan parecia explodir de raiva. Ela olhava pra mim com aqueles olhos vermelhos, igual hoje mais cedo, em frente ao colégio, quando ela conversava com seu pai. Por mais que ela desse medo, era bom ver que seu rosto não tinha tanta tristeza como antes. Não sei se foi a melhor decisão, mas, torço para que tenha sido. Desde o momento em que elas se viram não se deram bem. Candence a todo instante implicava com a Susan, mesmo eu pedindo que ela parasse. Não que a Susan precisasse de alguém para defendê-la. Ela era forte e corajosa o bastante para não se intimidar com Galiofeu. Mas, estava um tanto fragilizada com o que aconteceu durante o telefonema de seu pai.


— Por favor... tentem não se matar, está bem? – sorri e fui em direção a escada.


Olhei para trás e percebi que elas estavam se estranhando, Susan estava com a cara fechada, enquanto Candence balançava a cabeça em desaprovação. Mas, por fim, devem ter entrado num consenso e foram até a cozinha procurar algum vestígio da Marie.


Segui caminho pela escada, ainda estava com Anoitecer em mãos, mas não parecia que iria usá-la. Mesmo assim, era bom ter uma garantia de que pudesse me defender (ou atacar) caso não fosse a Marie que estivesse lá em cima. Ah, a Marie. Hoje foi o dia das bizarrices e revelações mais nada a ver da minha vida. Primeiro, tenho aquele sonho maluco, depois mensagens de sangue feitas na minha janela e no espelho do banheiro. Pode piorar mais? Pode, sim. Fui atacado por um Chacáh, embora eu não saiba o que porquê, ganhei asas, fiz alguns amigos (que pra mim, foi a coisa mais estranha do dia) e, agora, Marie enfrentando zumbis de areia, mostrando não ser apenas uma doce senhora que cuidou de mim por toda uma vida. Será que ela os via como monstros ou como bandidos que tentaram invadir a casa?


Em alguns degraus da escada havia gotículas de sangue. Bom, agora, quase que certeza era da Marie. Os zumbis estavam mortos lá na sala e não pareciam sangrar. (ME DIGAAA, VOCÊ SANGRA? VAI SANGRAR! Desculpe, não resisti). Os pensamentos corriam de um lado para o outro na minha cabeça. Por que eles atacariam a Marie? Será que tinha sido apenas um aviso? Se sim, eles fariam de novo, só que com um novo alvo. Meu pai! É claro. Droga! Às vezes, não queria ter um pensamento tão lógico. Queria ser apenas um, sei lá, um cabeça de vento, não sabendo as respostas antecipadamente.


Já no topo da escada, havia uma grande concentração de sangue. O ferimento deve ter piorado e com isso Marie estava fraca, ao menos era o que parecia. O ar ficou pesado. O clima ficou tenso, como aconteceu antes. Eu estava perto de descobrir alguma coisa, e estou torcendo para ser Marie. Depois de tantos anos, eu cuidaria dela. Ela, certamente, faria com que eles partissem sem mim. Fui até meu quarto, procurei no banheiro, mas ela não estava lá. Segui até o quarto do meu pai, ela também não estava lá.


— Aonde você está, Marie? – murmurrei para mim mesmo.


A única porta que sobrava lá em cima era do escritório, um lugar quase que restrito da casa. Mas, se Marie estivesse lá, não importava, eu iria mesmo assim. Além disso, já estive lá pela manhã, antes de ir para o colégio. Estendi de frente à porta, havia uma marca de mão ensanguentada na maçaneta e na porta. Ela estava ali! Sem nem pensar duas vezes, abri a porta e me deparei com uma cena que fez meu coração murchar: Marie estava deitada no sofá, com a mão tampando, possivelmente o ferimento que sofrera na luta contra os zumbis de areia. Ela estava mais branca que o de costume. Estava pálida, seus lábios estavam rachados. Seus olhos mal se mantinham abertos. Não aguentei vê-la naquela situação e fui correndo ficar ao lado dela, chorando.


Marie colocou sua mão esquerda sob minha cabeça, mexeu nos meus cabelos como sempre fazia. Com um sorriso no rosto ela disse, com sua voz já enfraquecida:


— M-Meu menino... chegou a hora de saber a verdade sobre você.


***


Marie vestia a mesma roupa de hoje cedo, só que agora tingida com sangue. Seu sangue. Mesmo ferida ela mantinha o mesmo rosto sereno e acolhedor que sempre teve. Sua mão direita estava empapada de sangue por pressionar o ferimento.


— M-Marie... temos que dar um jeito neste seu ferimento. – disse eu, com urgência. – Você consegue levantar? Posso ajuda-la. Fiz uns amigos hoje, Marie, eles têm um bolo, ou algo do tipo que ajuda a curar tudo. Elas vão deixar você melhor. Eu prometo!


Eu não sabia como ainda conseguia falar (e muito, por sinal), estava chorando à beça. Ver Marie naquele estado era de partir o coração, ela era uma mãe pra mim, se houvesse algo que pudesse fazer, eu faria!


— Adrian... – fez uma pausa, e teve uma crise de tosse o que fez piorar seu estado, o ferimento começou a jorrar mais sangue pela sua mão. – Já não tem mais salvação para mim, meu menino. A morte me espera, criança.


— Ora, não diga isso! – vociferei. – Meus... amigos, eles podem cuidar de você.


Corri até a porta e gritei:


— Susan! Candence! Ela está aqui no escritório! Venham rápido, ela não tem muito tempo!


Voltei a ficar do lado dela, segurando sua mão. Mesmo ferida, sua mão ainda era quente e reconfortante.


— Vou ficar com você até o fim, Marie. Não importa o que aconteça.


Ela deu um breve sorriso fraco, mas ainda transmitia a mesma energia de sempre. Porém, foi interrompida pela dor.


— Não depende de você se vou morrer ou não, Adrian. Minha hora chegou. Na verdade, até passou da hora. – fez outra pausa mais longa. – Fico feliz que tenha feito amigos, meu menino. – ela parou de falar, subitamente. Ficou olhando para a parede, como se fosse a coisa mais bonita que ela já tinha visto. Até que se deu conta de que eu estava ali e não no colégio – Adrian... o que você está fazendo em casa? Está matando aula? Seu pai não vai gostar de saber disso.


Não pude deixar de não sorrir. Mesmo nas últimas, Marie ainda conseguia se manter alegre. O que fez mais ainda meu coração apertar. Ela é uma pessoa boa, não merece morrer assim.


— Você não viu o noticiário? – perguntei delicadamente. – Hã... a escola foi destruída, Marie.


Ela olhou pra mim com uma careta.


— Ei, antes que coloque a culpa em mim, sabia que não foi de propósito.


Contei-a sobre o sequestro feito pelo professor de história, o Sr. Finchyn, que depois se revelou ser um Chacáh, Galiofeu, que matou o verdadeiro Arthur Finchyn. E que fui forçado a lutar contra ele, pois ia ferir a Susan e não podia deixar que fizesse isso. Falei também sobre o desabamento do colégio e que antes de matar Galiofeu, ele fora atingido por flechas douradas disparadas pelos meus outros novos amigos.


— Eu sabia. – Marie tinha dificuldades para falar, agora. – Por treze anos eu sabia que aconteceria cedo ou tarde. Por mais que... – outra crise de tosse. – Onde que eu estava? Ah, sim, por mais que tivesse a mínima esperança de que não ocorresse, eu estava pronta para contar-lhe tudo.


— Contar o quê, Marie? Você não está em condições de fazer muito esforço tanto quanto de falar. Apenas descanse. Elas já estão vindo... assim espero.


— Adrian... você não vê? Já estou morrendo. Não há nada que você possa fazer por mim, além de escutar com atenção o que eu digo.


Puxei a mesinha que ficava no centro do escritório para perto do sofá. Nem me importava se fosse quebrar com meu peso (o que não aconteceu). Ainda segurava a mão da Marie.


— Adrian... o que sabe sobre sua mãe?


— Hã? O que isso tem a ver? – fui pego de surpresa. Marie, mais do que ninguém, recusava-se a falar sobre minha mãe, e agora ela manda essa. – Quase nada. Ela era uma mulher importante em seja lá o que for que ela trabalha e abandonou meu pai e eu.


— De modo grosseiro, está certo. Mas há coisas que você não sabe.


— Marie, você nunca falou sobre minha mãe. Por que falar disso agora?


— Porque é algo crucial para o que está por vir. Adrian...


Marie foi interrompida por Sue e Candence que adentraram no escritório no maior alvoroço. Elas pareciam bem, só por um pequeno detalhe que me chamou atenção: ambas tinham o que parecia ser farinha nos cabelos.


— Esta deve ser a Marie. – disse Candence.


— Quem mais seria, espertinha? – rebateu Sue, no mesmo tom sarcástico que Candence havia usado contra ela. – Ela não parece nada bem.


— São suas amigas, Adrian? – Marie disse numa forma retórica. – É bom conhecer vocês, garotas, mas preciso ter uma conversa séria com ele. – deu uma piscadinha. Sério, Marie é incrível. Mesmo em momentos como esses ela ainda consegue manter o bom humor. – Podem esperar lá fora?


— Marie, ela pode ajudar você a ficar melhor, assim como fez comigo. – implorei. – Só deixe ela ajudar você!


Ela nada disse. Porém, soltou-se da minha mão e num gesto circular com a sua, fez Susan e Candence desaparecer do escritório e a porta fechar com certa violência.


— O que... – eu fiquei estupefato com aquilo. – Elas estão bem? Você fez isso com aqueles zumbis de areia lá fora também?


— Adrian – sua voz enfraquecida ficou mais áspera. – Sim, elas estão bem. Só estão do outro lado da porta, apenas isso. Os zumbis de areia... não. Aquilo foi necessário outra coisa. Mas não estou aqui para falar de mim. E, sim, sobre seu passado.


— Sobre minha mãe?


Ela assentiu.


— Eu conheci sua mãe, Adrian. – revelou. – Ela... me pediu para que eu viesse cuidar de você e de seu pai, também.


— Como assim, Marie? Não pode estar falando sério. Você a conhecia? Por que nunca disse nada? – minha mente foi rapidamente inundada com dezenas de perguntas que era impossível falar todas.


— Adrian, sua mãe e eu temos uma relação de amizade, hã, digamos que beeem longa. A verdade é que ela não pode sair de onde está. Ela foi proibida de pisar na Terra de novo.


— Como assim na Terra? Ela é de outro planeta por acaso? Nada disso faz sentido, Marie.


Eu queria ficar com raiva. De verdade. Mas, a verdade é que eu não pude. Ela sempre esteve quando precisei de ajuda. A raiva que crescia no meu peito não era pela Marie, e, sim, pela minha mãe. Durante anos eu imaginava ela vindo até mim, ficando com meu pai de novo. Sermos uma família como eu sempre quis, mas, pelo visto, não era possível que fosse acontecer.


— Adrian, você precisa entender que há forças maiores que tudo.


Alheio a conversa com a Marie, ouvi batidas na porta, Sue gritando para abri-la. Mas, ao que parecia, a porta estava trancada, selada por alguma coisa.


Marie teve outra crise de tosse, só que esta havia sido pior; ela regurgitava bolotas de sangue aos montantes. Demorou alguns minutos para que cessasse. Minha preocupação estava em níveis extremos. Ela estava morrendo na minha frente e eu não podia fazer nada. Ela não desejava ser salva. Por quê?


— Marie... – tentei mais uma vez. – Deixe-se ser ajudada pela Candence. Você vai ficar melhor, eu prometo. Não quero que você morra.


— Mesmo se eu deixasse, Adrian – seus olhos estavam vermelhos e lacrimejavam. –, não funcionaria comigo. Não sou essencialmente mortal.


— O quê? Isto é a perda de sangue, Marie. Você não está raciocinando direito.


Marie fechou os olhos. Entrei em desespero. A porta se escancarou e à frente dela estava Sue e Candence com expressões semelhantes. Ambas pareciam assustadas, mas, acho que aliviadas, também, por finalmente ter conseguido arrombar a porta.


— Marie? – sacudi-a repetidamente tentando fazer ela acordar. – Você não pode morrer agora! MARIE!


— Por... por que você está gritando? – disse ela, com a voz fraca, quase falhando. – Não vou morrer antes de falar-lhe tudo que você precisa saber.


— Senhora...- falou Candence. – Posso dar um pedaço do bolo cura todo. Vai se sentir nova em instantes.


— Poupe seus suprimentos, menina. Não funcionará comigo. – fitou Candence com seus olhos vermelhos, envoltos às lágrimas.


— Adrian. – voltou-se a mim. – Há muito tempo venho tomando conta de você sem contar quem verdadeiramente eu sou. Agora, nesta hora fatídica, revelo-lhe que sou eu. Eu sou uma das cinco Dêidas. Enviada por sua mãe, com objetivo de proteger você e seu pai.


Aquele nome não me era familiar. Podia ser mais uma das coisas sem sentido que ela estava falando, sabe, por causa da perda de sangue.


— Não é possível... – falou Candence, surpresa. Prontamente ela se ajoelhou em forma de reverenciar a Marie. Quando ouviu a palavra "Dêida", Candence parecia espantada, como se fosse pega desprevenida para aquela situação incomum – O que você está esperando, sua garota tola? Ajoelhe-se também.


Mesmo contrariada, Susan se ajoelhou em forma de respeito.


— Tudo bem. Mas o que é uma Dêida? – perguntou.


É, talvez não fosse delírios pela perda de sangue.


— Dêida – começou Marie, num tom como se fosse uma professora explicando as coisas para os alunos. – São as manifestações da natureza – terra, ar, fogo e água. E a junção deles: Plasma. Existem cinco, ou melhor, quatro Dêidas. Somos tão antigas quanto os deuses, porém, menores em comparação ao poder. Eu era a líder delas, o quinto elemento. A manipuladora do plasma, e foi assim que acertei os zumbis de areia. Mas não fui rápida o bastante para não ser atingida por uma de suas espadas. Pode-se dizer que é a idade. – ela deu um breve sorriso.


— Deuses, Marie? – não pude evitar de soltar uma risada sarcástica. – Não existe deuses. Desculpa, mas não é cabível uma coisa dessas.


— Hã, Adrian, é verdade. – Candence se intrometeu. – Tudo aquilo que falei lá naquela lanchonete é real. Nós somos o legado do deuses. Eu, por exemplo sou filha de Xaylã, deusa das estradas. Deusa mensageira. Ferdinand é filho de Borthus, deus da guerrilha. Temos um termo específico para gente como nós: Remanescentes.


— E-eu também sou uma dessas aí? É... Remanescente? – perguntou Susan.


— Eu preferia que não. Mas, sim, você parece ser uma de nós. Iupiii! – disse Candence, com um falso entusiasmo.


— Eu ainda não entendo. – disse, confuso. – Como isso pode ser real? – me voltei a Marie. – Quem é minha mãe, então? Diga!


— Não posso contar, meu menino. Isto é algo que você terá que descobrir sozinho.


Marie parou de falar, subitamente. Uma áurea multicolorida (igual a roupa da Candence) surgiu em torno dela. Sua pele pálida começou a brilhar.


— Meu menino, meu tempo está acabando. Quero que você saiba que eu faria tudo de novo para proteger você. Adrian, você será o responsável por trazer a paz para todos os mundos. Ou destrui-los – Sim, ela acabou de dizer mundos, no plural. Imagine o quão espantado e confuso eu estou. – Eu passei por milhares anos, sentada naquela gruta absorvendo o conhecimento mundano, mas nunca realmente vivi, até renegar meu passado como Dêida e vir morar com vocês.


— Não, Marie... – a vontade de chorar foi mais forte do que eu, e a dor de perdê-la tomou conta do meu corpo. E parece que não fui o único. Mesmo não a conhecendo tão bem, Candence e Sue se solidarizaram e deram por chorar também.


Ela começou a brilhar mais intensamente. Marie soltou-se da minha mão, e flutuou até quase tocar no teto. Antes de desaparecer por completo, ela conseguiu dizer suas últimas palavras:


— Seu pai está em perigo, Adrian. – disse ela, em tom profético. – E você, minha criança – apontou para Susan. –, seu futuro será decidido por uma escolha agridoce que irá tomar. Seja forte e siga seu coração.


E então, desapareceu. O quarto, antes iluminado por sua áurea cinza, se tornara um lugar escuro. Sem vida.


Por um breve momento o mundo pareceu ficar mais gélido.


A luz se extinguira por poucos segundos.


Marie, a Dêida. Marie, a mãezona para todas as horas. Havia morrido em frente a mim, e com ela, uma parte boa minha e mundo tinha morrido junto a ela.



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Você deve estar se perguntando como eu fiquei ao ver Marie morrer diante de mim. Bom, me senti arrasado. Impotente. Fraco. Frágil. E todas outras palavras que possam definir como estou me sentindo agora. Ela esteve presente na minha vida desde... bom, desde sempre! E está claro que não sabia tudo sobre ela, mas não importa. Se ela assim o fe ...


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