Fanfic: Antoni e Bartolomeu #ConcursoObrasOriginais | Tema: drama, tragédia, #ConcursoObrasOriginais
Antoni pegou seu ursinho de cor azul-bebê e o segurou em frente ao rosto por alguns segundos, logo o soltando. Ele ergueu as mãos para cima, assim podendo abrir a caixa de papelão por completo, deixando toda a luz da noite entrar. Aquela luz devia vir de algum poste, ou quem sabe, da lua mesmo.
Olhando agora para o céu, Antoni ficava encantando com a quantidade de estrelas espalhadas que haviam ali, bem onde diziam ser infinito, mas, Antoni sabia que não era — houvera uma noite em que ele tocara no céu e, tinha textura de Marshmallow.
Uma estrela cadente passou e os olhos do garoto brilharam; aquela era uma noite espetacular, o que deixava Antoni muito feliz e aliviado. Haviam noites que eram escuras, as nuvens cobriam os céus e ruídos apareciam por todos os lados, inclusive sussurros ao pé de seu ouvido. O pior era que, quando ele virava a cabeça, ninguém estava ali, sendo assim, os sussurros vinham de ninguém. Antoni quebrava a cabeça ao tentar entender o que acontecia ao seu redor, pois ele sabia que mais ninguém via as coisas que ele via. As pessoas mais velhas, adultos inteligentes e maduros, diziam que Antoni sofria de alguma doença muito ruim que atingia sua mente. O garoto não podia entender que doença o faria tão feliz, pois, ele era especial; somente ele conseguia enxergar seu melhor amigo Bartolomeu. Também, só ele conseguia tocar no céu, observar nuvens coloridas e, só ele podia andar sobre um arco-íris. Mas também, como dizem, tudo bom tem seu lado ruim, e a parte ruim era que haviam noites obscuras. Estas, felizmente, vinham com menos frequência do que as noites mais belas, porém, bastava um pequeno acontecimento das noites obscuras para fazer com que Antoni não dormisse a semana inteira. Também, nessas noites mais desafortunadas, Bartolomeu ( melhor amigo de Antoni) incorporava uma personalidade e estilo um tanto diferentes do habitual, uma vez que suas roupas ficavam todas de cor preto e branca, ao invés de coloridas. Sem contar que ele ficava muito mais violento, falava palavras feias e também incomodava Antoni de diversas formas; inclusive o assustando praticamente o dia inteiro. Era um tormento, porém, passava.
***
— Antoni, tente prestar atenção em mim, tudo bem?
— Tudo bem — respondeu se virando de frente para a mulher de cabelos curtos e óculos de armação vermelha. Aquela era Emily, a pessoa que sempre fazia diversas perguntas e também afirmações sobre Antoni, ela tentava compreender o que ele sentia e pensava, era uma psiquiatra, como chamavam.
— Por que você não conseguiu dormir dessa vez?
Antoni estralou os dedos, como tinha costume de fazer.
— Porque Bartolomeu não deixou.
Ela arregalou os olhos, ele nunca havia falado sobre tal pessoa. Respirou fundo antes de fazer a próxima pergunta; não queria que o garoto logo fugisse do assunto.
— Quem é Bartolomeu?
— Meu melhor amigo. Na verdade, meu melhor amigo só que só às vezes.
— Como é esse seu meu melhor amigo?
Ela anotava algumas coisas em seu caderninho. Antoni observou que ela escrevia com a mão direita, e achou engraçado, porque ele escrevia com a mão esquerda.
— Ele é muito legal e engraçado. Ele gosta de se divertir comigo, mas, algumas noites, ele não é assim.
— Não é assim? Me dê detalhes. — Ela empurrou os óculos com o dedo para cima do nariz, e ficou encarando Antoni com uma expressão atenta, então ele teve de desviar os olhos porque era um pouco tímido.
— Quando as noites são escuras e frias, ele aparece de forma diferente. Ele usa roupas feias e age de forma cínica. Ele gosta de sorrisos sarcásticos e gosta de me machucar, por isso, nessas noites, eu sempre me escondo ou, sempre fujo dele. Mas eu o perdoo, porque nos dias bons, ele é muito mas, muito legal — disse a última parte sorrindo.
Emily fez que entendeu, e perguntou:
— Antoni, você sabe o que significa a palavra “cínico”?
— Sei. Mas não sei explicar… só sei que o Bartolomeu é.
Antoni era um rapaz baixinho, então, quando sentava naquele sofá de couro marrom, seus pés ficavam balançando no ar. Ele estava ali há um bom tempo batendo papo com Emily, o que já estava o deixando com sono; era chato responder tantas e tantas perguntas que, no fundo, pareciam as mesmas. Contudo, ele ficava alegre em saber que havia alguém tão interessado em sua vida pessoal.
— Voltando a falar sobre seu amigo, como que ele te machuca?
— Ham… é que ele tenta cortar o meu braço, nessas horas, meu coração bate muito forte. Eu tenho muito medo de quando ele faz isso, mas, na maioria das vezes ele nem consegue… porque eu corro e me escondo — disse de forma simplista, o que assustava Emily de certa forma, não era nada comum e, tão pouco saudável para uma criança passar por tais coisas.
— Descreva seu amigo, como ele é? Branco, negro, loiro…?
— Você não vai acreditar, ele é exatamente igual eu. Mas, eu sei que não tenho irmãos gêmeos, então sei que ele não é meu irmão. Mas, ele é exatamente igual eu.
Ela fez que entendeu novamente, anotou algo a mais em seu caderno e, olhou para o garoto com um sorriso gentil nos lábios finos.
— Antoni, acho que acabamos por aqui. Você está com fome?
— Estou.
Emily ergueu seu corpo da poltrona preta que estava sentada, Antoni admirou o fato de seu vestido ser muito comprido.
— Estou com fome, muita fome. Faz tempo que não como. — Apesar de tudo, Antoni era um garoto muito falador. Emily olhou para ele, e fez uma última pergunta:
— Antoni, você tem medo de alguma coisa? Como… um medo muito grande, que faz seu coração acelerar muito?
— Bartolomeu. Mas só às vezes.
— Uhum, mas, existe outro medo?
O rapazinho parou para pensar, até colocou o dedo no queixo para dizer que estava pensando.
— De ser estuprado. Algo assim.
Emily arregalou os olhos e, sua respiração pesou. Apesar de lidar com tantos pacientes e, com tantos problemas, Antoni era realmente alguém diferente; tudo que ele falava era imprevisível e, muito sério. Ela tinha medo do que poderia ter acontecido a ele antes de ir àquele orfanato.
— Você sabe o que é ser estuprado? E por que tem medo disso?
Antoni fez uma expressão triste.
— É porque Bartolomeu já foi.
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