Fanfic: Cartas do Interregno | Tema: Hetalia, ONU, Yaoi, França, Inglaterra, Brasil, Alemanha, Japão, EUA, China
Madrugada chuvosa de Setembro.
Arthur,
Estive mexendo no quartinho, você sabe como fico quando reviro as coisas antigas. Quantas vezes só depois de soprar a poeira você percebeu que aquele livro que lhe viera à mão era a peça que faltava no quebra-cabeça? Já fiz muita coisa errada, sabe muito bem quantas vezes já lhe pedi ajuda em desalento, mon ami. Quantas vezes Arthur, fechando os olhos antes de dormir, o barulho da cidade não te deixou pegar no sono? Ou então, quando deitado em teu leito de olhos bem abertos, passou horas à racionalizar sobre tudo e o silêncio foi alto de mais, a saudade e a solidão não te deixaram adormecer em paz?
De nossos amigos e colegas você é o único que sabe deste zumbido que tenho no ouvido esquerdo. Maldita bomba que todos sabiam, se abaixaram e se protegem e eu lá, apreensivo com mil outras coisas, as crianças com fome que morriam sem escola, os jovens violentados buscando alicerce em suásticas e coturnos de bico de ferro, medo e violência, terror dos felizes e alívio dos desgraçados. Escuta aqui Arthur Kirkland, pois o senhor conhece muito bem estes tais jovens rudes, neonazistas, skinheads, hooligans e os hippies cantarolando no parque em que faziam piquenique 15 anos antes do museu sucumbir em chamas infernais “Tudo que precisamos é amor! Chega de bombas!”. Estes seres humanos de raiva choram, se danam na calada da noite, vertendo lágrimas amargas, pedindo para que passe a primeira mosca, o primeiro bandido, o primeiro tormento nominável que consigam agarrar, espancar, chutar, cuspir e jogar bosta. Arthur, me sinto completamente desperto, fumo um cigarro atrás do outro e escrevo aqui mesmo do quartinho do porão. “Governar homens é defendê-los da injustiça dos outros e obrigá-los a serem também justos.” sábias palavras do Sol que iluminou as almas francesas por 72 anos e até hoje faz brilhar com o que resplandece de seu legado, meu chegado Luis XIV. O que seres como eu e você fazemos se não cutucar os mortais para proteger o patrimônio que a nós nos importa? O desespero dos pintores ao sentir o aroma de minhas rosas iluminadas pelo primeiro raio de sol do equinócio de primavera, não abro mão disso, amado Arthur. Podem vir me atacar com paus e pedras, os paus enfio no cu, e as pedras colocarei no caminho dos que como Rodin, saberão como lhes dar o devido valor.
Agora, isso não é fofoca, não estou nada surpreso que Ludwig tenha agido daquele modo depois do brinde de Alfred. O próximo na linha de sucessão do trono britânico aparece em uma festa “fantasiado” de nazista e Kiku já se desculpou publicamente duas vezes por bandas pop “fantasiadas” de membros da SS. Estamos de olho nos fanáticos e nos agitadores. Como a Loba muito bem colocou, nem mesmo um político assumidamente fascista de hoje tem coragem de vestir esse uniforme, e os motivos deveriam ser muito óbvios. Então, como um príncipe o faz, sai impune e as fotos simplesmente desaparecem? Eduardo VIII saiu “à francesa” e sabemos muito bem que foi por amor ao nazismo. Eles vêm aí de novo Arthur, eles nunca foram embora em primeiro lugar, você sabe, todos os aliados sabem, todos os homens e mulheres de 20 de julho que viram Ludwig, Kiku, Feliciano Vargas e os condenados da Alemanha no banco dos réus sabiam que não havia acabado. Os punks sabim nos anos 70, você sabe, Yao sabe, Alfred e Ivan sabem, quem se posicionou pessoalmente contra isso pela primeira vez sabe. Não é à toa que a saga se chama “Axis Power” e foi exportada para o mundo todo.
São tantas lembranças aqui em baixo, dá até esperança de um dia conseguir ser tudo aquilo que a gente queria lá atrás. Éramos dois vagabundos afrontosos e cheios de sonhos, indignos de nossa opulência vendo passar toda aquela beleza, tentando abarcar o mundo em nossas botijas. O mundo é muito maior do que queríamos acreditar que fosse, e aqueles homens e mulheres estrondosos já sonhavam, já brigavam, nunca pararam. Qualquer canto aqui de baixo é tão maior que a vida de qualquer pessoa, acabo de ouvir isso de um disco brasileiro que toca na vitrola, ironicamente ela fala que quer contar sobre coisas que não aprendeu nos discos. Himaruya é tão imbecil que nunca conseguiu retratar o Brasil com dignidade. Também não se ateve a discutir as implicações do fascismo e dos holocaustos ao longo da história, aí também seria demais pra um quadrinho pastelão. Não se preocupe caro Himaruya, disso me ocupo eu e Arthur, Alfred e os Aliados, a ONUSP e o Fandom que vai além de seus afazeres cordiais de autor oficial. Acredito, como Jostein Gaarder, que alguns assuntos deveriam interessar à todos os seres humanos, mas naturalmente, está além de minha alçada de personagem ficcional disseminar o interesse por direitos humanos e filosofia. Será mesmo Arthur? Tivemos todos esses anos para acumular nossos tesouros, organizar ao norte, centro, sul, os reinos, aos povos, mas e quem ainda nem teve tempo de se perguntar por que se vive? “Quem, de três milênios, não é capaz de se dar conta, vive na ignorância, na sombra, à mercê dos dias, do tempo.” Goethe disse isso tantas primaveras atrás, mon ami. E hoje mesmo me atiraram pedras quando disse na embaixada Alemã no Brasil que o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães não era comunista mas sim de extrema direita. “O Fanatismo enfraquece o sentimento moral.” disse Monnier, francesa que ficou presa por 25 anos sem ver a luz do sol. Não temos tempo a perder, a razão atrofiada sede rápidamente à novos deuses barulhentos balbuciando bobagens em bando.
Contra a censura e pela cultura, qual cultura prevalecerá? Com o que eles vem alimentando nosso povo? Por que sabemos como partes infelizes da história ascendem bruscas como labaredas e subtraem, por vezes 100 anos ou mais de vidas dos inocentes penitentes, que tinham direito à alegria, sem bombas, sem tiros, sem fogueiras, sem que se suprimam cabeças e opiniões. Mas quem sou eu para dizer que não se deve suprimir algumas cabeças quando se cava fundo demais teu próprio buraco? A escalada para fora foi longa e a luta perdura até hoje, eu contra eu mesmo. Muitas vezes tenho de atracar-me contra meus próprios demônios, teria como usá-los a nosso favor? Toco música aqui em baixo pois faz tanto silêncio que não consigo ignorar o zumbido no meu ouvido esquerdo, me deixa angustiado. Não vá dizer que não sabia, que não teve tempo para pensar, o senhor teve desde 1707, tempo bem vivido, não é possível que nunca te ocorreu o perigo eminente. Você se lembra dos “Weltanschauung” nazistas? A aversão que tinham pelos judeus, gays, pretos, ciganos, deficientes, lésbicas, índios, pobres e eslavos? Da teoria de que os alemães deviam procriar com ou sem casamento? Ludwig não é gagá, ele guarda cartas de Barmann no porão. Numa delas, ele escreve “Os eslavos nasceram para trabalhar para nós. Quando não precisarmos mais deles, podem morrer. Portanto a vacinação obrigatória e os postos médicos Alemães são supérfluos. A fertilidade dos eslavos é indesejável, podem usar preventivos e praticavam abortos tanto quanto quiserem. Sua educação é perigosa. Basta que saibam contar até cem. Uma educação no entanto que nos forneça servos admissíveis. Toda pessoa educada é um inimigo.”
Quando fui fumar um cigarro, ele, aquele cara ruivo que Yao e Ivan também elogiaram os olhos azuis antes do jantar, me pediu um isqueiro e conversando, ele me contou um pouco de sua vida. Ex punk, agora no M16, não chorava a tanto tempo, mas quando soube que o rapaz tinha pendurado na parede B.O.s por agressão, uma extensa coleção de pornográfia infantil e videos de morte ao vivo, só 17 anos, Arthur. Não era uma gangue, era só um garoto muito doente, de uma família quebrada, sem pai, sem mãe, sem amor, sem escola, sem estado, eram pistas falsas, ele era um skinhead, já tinha se matado, no apartamento do irmão, que viveu e morreu fazendo a mesma coisa, agredindo homossexuais e negros na internet nas ruas de Berlin, se endividando, enchendo a vida de morte e anestesiando a vida até o fim. Ele estava abatido Arthur, um homem que já esteve na guerra, ele chorou me contando isso, ele achou aterrorizante, ele que estava com a cabeça tão longe dizia “Que posso eu fazer? Eu só lamento.” e ofereci mais um cigarro, ele fumou quieto. Imagina eu, Francis, sem ter o que dizer, Arthur, eu também lamentava, mas só conseguia pensar que lá do outro lado, esses eram os que estavam oprimindo os meus Punks, as minhas rosas, os meus defensores da Liberté, Egalité e Fraternité, mas a violência não vai nos levar a nada, ele não queria ter de matar aqueles meninos, nem eu. Você quer ter de matar alguém novamente? Entenda, desde julho, nunca houve realmente uma noite bem dormida, nem mesmo ao seu lado, mon ami. Foste Agag, os hebreus em Canaã, sempre com sangue e carniça, Vercingetórix foi passada pela espada, que posso eu fazer senão lamentar? Não chega nunca o juízo final, nem quero ter olhos pra ver quando chegar, Deus me livre. Às vezes parece que ouço os querubins das pinturas sussurrar pra mim “O sol há de brilhar mais uma vez!” aí, saio de Versailles e não ouço mais nada por dias. Vitor Hugo dizia “Só vivem os que Lutam.” é pra isso que somos aliados, para sobreviver, para lutar lado a lado pelo que acreditamos como as Nações Unidas que somos.
Isto é uma convocação. Precisamos nos posicionar mais uma vez, pessoalmente perante essa situação. Punir criminosos de guerra é sempre temporário, sempre há guerra mais longa, mais cruenta, mais hedionda ainda por vir. Quando no clima mais humano do século IXX eu soluçava de quatro sobre o morticínio desencadeado, sua mão tantos anos mais desdenhosa e nova me levou por meus cabelos tantos anos mais vistosos e louros para Ilha de Santa Helena onde na lembrança me fartava de suas peles e pelos, fora dos domínios da virulência amarga da dor, nunca mais nos atrevemos a falar um com o outro da maneira como falamos naquele dia. “Alfred é precioso e precisamos protegê-lo.” nunca me esqueço, seus lábios se molhavam com o sangue que escorria por minha orelha pronunciando o nome de nosso amado filho, nossa missão, nosso propósito. Em Santa Helena eu sentia que iria morrer, suava frio e as feridas ardiam todas, pela primeira vez eu sentia alguma coisa em anos. Suei tanto que estava febril, a ponto de me sentir completamente desperto, como com uma pele nova, não sabia mais se estava sozinho ou se você ainda estava pela praia. Sua Saliva ferrosa pouco depois, a água batendo nas pedras e os pássaros que até hoje são iguais por lá pareciam agonizar como nós, tudo parecia ferido e ferbil e faminto. Hoje em dia essa lembrança é um recanto de paz. Nunca terei te beijado o suficiente na minha vida, nunca terei ouvido, entendido, conhecido o suficiente você, mon ami, mas me deleito recordando o tempo que já passamos nos amando.
Me sinto velho, porém completamente desperto, preciso dos americanos, de seus melhores investigadores e sonhadores. Arthur, sigo de perto seus mais avançados centros de pesquisa e temo, por infiltração fascista em seus pólos mais avançados de tecnologia. Por que ainda se vive? Já fomos à Lua, já escavamos Pompeia, já matamos Sócrates, Jesus Cristo, John Lennon, o que ainda há para se fazer? Não sei, mas estou com saudades de rir ao teu lado pelos vinhedos vestindo roupas de plebeus do século passado na calada da noite, de peruca e tudo mais. Serenatas de amor afinada ao tom dos embriagados com o vinho sagrado dos padres, beijando, rindo eventualmente até chorando, mas não a noite toda. Uma vez o sol brilhando, seguiremos para Barcelona, encontraremos com Antônio para então el trio de ouro com beijo na boca, calor, comida, riso, recordações e é claro mais bebedeira, cantoria em todas as línguas seguir sapateando abraçados até Portugal. Tem tantos mistérios no mar e nos teus olhos verdes e no passado e nas tuas sobrancelhas desgrenhadas e no futuro e no presente que sempre que se sente já se tornou passado. Aqui em baixo vejo como os acontecimentos as vezes me fogem à memória, se não fossem estas pinturas que me cercam agora, esses meus velhos diários, esses discos e pergaminhos, talvez não tivesse salivando por Armagnac, a água da vida que cessa lágrimas, que encoraja os tímidos, que bense e ilumina a vida dos vivos e cá estamos, ainda vivos, algo temos que desatinar a fazer mais uma vez. Já fiz muita coisa errada, mas terei tempo ainda para redimir? Acho que não. Não com violência, mas talvez pela palavra, se sobrar alguma, pelo amor, se algum amante ainda sentir saudade, pela arte, se não explodirem tudo, e pelas rosas, acho que as rosas são permanentes nesse mundo, não, nada é assim tão permanente, talvez as pirâmides do Egito, não tenho certeza, nada é assim tão eterno mas as rosas, eu, Francis Bonnefoy quero as rosas florescendo. Já passei por altos e baixos mas se tem uma cadeira que me orgulho é a que tenho ao teu lado na ONU. Essa aliança talvez seja a menos mesquinha que já coloquei no dedo e certamente a que mais me dá dor de cabeça, sim, mais do que você, amado. Pelas alianças das Nações Unidas, fornecer ajuda humanitária, proteger e promover os direitos humanos pelo mundo, combater as mudanças climáticas, lutar contra a pobreza e trabalhar pelo desenvolvimento, pela paz, enfrentando os desafios globais, é o que temos de honrar nesse casamento que já dura 70 anos, com altos e baixos é claro, mas estamos na ONU por escolha nossa, se lembra?
Escuta bem Arthur, eles estão sabotando os meios de recrutamento da ONU, os sites, as sedes, os rádios e os vídeos. Censurando e mudando as línguas para que as pessoas não consigam entender o que a ONU faz hoje em dia. Geram interferências, trocam palavras nas telas, pequeno desvio no caminho, mas que a nós causa grande tumulto. No Brasil o site sofre severas interferências, as páginas de recrutamento precisam lutar para se manter no ar. Isso não é coincidência, eles querem nos sabotar, nos derrubar, pelo mundo todo, querem fazer de nossa aliança de amor, esperança e paz uma grande chacota, não podemos permitir isso. Aquilo no jantar foi um desacato, Arthur, eu não vou abaixar a cabeça, me calar para insultos fascistas em minha própria casa. Queria que tivesse alguém me dizendo que estou ficando paranóico, mas não tem. Acredito que estão com tanto medo da próxima grande guerra quanto eu, estão exaustos e feridos pelos conflitos locais, de problemas globais estamos cheios. Diga-me meu amigo, vale a pena lutar pelos direitos humanos? Se ainda vale, grite em voz alta, grite na tua língua mãe e em todas as que aprendeu a falar nestes anos todos, grite que sim, grite que luta, grite pois onde ainda há lágrimas há vida, e eu quero viver, ainda somos aqueles jovens indignos, mas hoje com alianças formadas, com cicatrizes que nos lembram de nossas histórias, tão clara em cada marca, mas é preciso olhar, é preciso expor, é preciso lutar para viver, mon ami.
De seu eterno amante,
Francis
Bibliografia
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-37845522
https://pt.wikipedia.org/wiki/Lu%C3%ADs_XIV_de_Fran%C3%A7a
https://nacoesunidas.org/onu-no-brasil/
https://nacoesunidas.org/vagas/trabalho/
https://careers.un.org/lbw/home.aspx?viewtype=SC
“A Alemanha no banco dos Réus” Eugene Davison
“O Mundo de Sofia” Jostein Gaarder
"Eloy" Carlos Droget
Palavras chave:
Totalitarismo, Organização das Nações Unidas, Censura, Repressão, Violência, Nazismo, Punk, Hetalia
Autor(a): abigailbedilia
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