Fanfic: Adeus, Pimpão | Tema: angst, suicidio, abuso sexual
Sou o que se pode chamar de Morte, acompanho a vida de todos os seres vivos, desde o seu nascimento até o momento em que os acolho em um abraço e os levo comigo.
Houve muitas vezes em que eu soube que para alguns a morte cairia bem, assim como era injusta para outros, mas sabe, ocorreu uma que me marcou, que eu fiquei feliz em poder acolher, para que assim, aquela pobre alma tivesse alguma paz.
Seu nome era Camila uma criança adorável não era do tipo irritante, ela era bastante gentil e criativa, tinha um amor incondicional por sua avó, fazia de tudo pelo sorriso do irmão e sempre tentava agradar sua mãe. Levava uma vida normal, ia à escola, assistia desenhos, fazia os deveres, realmente uma criança adorável com as suas marcantes bochechas redondas e rosadas e sempre sorria até que seus olhos ficassem bem pequenos deixando-a cada vez mais estonteante.
Quando Camila completou 7 anos teve uma festa de aniversário, tudo muito simples, já que a família não podia arcar com algo grande, mas o que não diminuiu em nada a sua felicidade. Seus amigos estavam ali ganhou presentes e ainda comeu bolo com recheio de chocolate. Camila pensou no momento em que soprou as velas "esse é o dia mais legal que já tive", e eu sorri ao vê-la tão alegre, veja bem não sou alguém ruim, somente acompanho a vida das almas humanas para saber qual melhor julgamento darei a elas no final, faz parte de todo o meu processo, até mesmo me apego a algumas delas...
Depois da festa a aniversariante estava cansada sua mãe mandou que ela tomasse banho e fosse dormir, prontamente obedeceu à parte do banho, mas antes de ir dormir deitou no sofá para mostrar todos os seus presentes a seu melhor amigo, sim, Camila tinha um fiel companheiro que lhe acompanhava desde seu nascimento, Pimpão, um urso de pelúcia, a menina detalhou com riqueza cada um dos presentes, explicou quem lhe deu e até mesmo onde iria guardar alguns deles, e com toda a honestidade de uma criança de 7 sete anos disse "Pimpão eles vão ser meus amigos, mas você ainda é o melhor".
Com toda a sua inocência infantil ela adormeceu no sofá, sua mãe vendo a cena pediu que seu marido a levasse para cama, ele prontamente seguiu as orientações pegando a menina no colo e a levando para o quarto colocou-a na cama e sentou-se ao seu lado. O homem acariciou o rosto da menina, seu cabelo, toda a extensão do seu pijama desceu as mãos para barriga e eu o vi engolir a seco e naquele momento eu me odiei. Eu sabia o que ele faria, e eu não poderia impedir, não posso interferir nos eventos do ciclo da vida de um ser vivo, mas eu sabia que aquilo que se seguiria iria mudar tudo.
Ele a tocou, e tocou em partes que não deveria, ela acordou e se assustou, e ele pediu para que ela fizesse silêncio, ela estava sem entender o que ocorria, mas sentia que não era bom, seu coração palpitava e sua mente a dizia para chamar sua mãe. A pobre garota ficou sem reação, seus olhos assustados olhavam para o homem ao seu lado, ele a encarou, se levantou a ajeitou e sussurrou "não conte nada a ninguém", ela balançou a cabeça e permaneceu calada. E aquela foi à primeira de muitas vezes que vi Camila chorar e abraçar Pimpão até que o sono a levasse.
No dia seguinte ela agiu normalmente, ou pelo menos tentou, foi para a escola e fez seus deveres, sua professora estranhou seu comportamento, mas imaginou que fosse algo de momento, em casa sua mãe lhe perguntou se estava tudo bem e a menina não a olhou nos olhos quando respondeu "tá sim mãe". Ela não quis brincar com seu irmão naquela tarde, Camila se sentia estranha, não sabia definir ou sequer entendia o que havia em seu coração, mas torcia para nunca mais passar por aquilo de novo.
É triste dizer que aquele episódio se repetiu inúmeras vezes, Camila ficava cada vez mais triste seu comportamento mudava e as pessoas ao seu redor tentavam entender, alguns até diziam "é só uma fase", mas ninguém sabia de fato o que ocorria claro, você pode pensar "por que ela não disse nada? Poderia ter conversado com um adulto", mas ela tinha apenas 7 anos quando ocorreu a primeira vez e aquilo se repetiu dia após dia, ela era uma criança que nem mesmo entendia o que realmente estava passando com ela.
Camila tinha medo, temia pelo aconteceria se dissesse algo, ela apenas se calou. Os anos foram passando consequentemente a dor foi aumentando, quem deveria lhe proteger era quem lhe afligia, quem deveria estar ali para lhe amparar foi quem lhe tirou à inocência, em seu coração a escuridão se fez presente, lhe rondava, as vozes sempre lhe diziam "você pode acabar com tudo isso", e ela chorava e se fechava para o mundo.
Quando chegou à adolescência e teve sua primeira menarca começou a entender o que lhe acontecia, o homem com quem vivia tirou dela o que deveria ser sua escolha, fazer ou não. E ela enfim entendeu e se sentiu suja, sentiu que seu corpo nunca fora seu, sentia os dedos dele lhe tocando mesmo quando estaca sozinha em seu quarto, quando fechava os olhos podia até mesmo ouvir sua voz dizendo aquelas coisas, de como ela era uma boa menina, "seja a garotinha que o papai ama" e ela se odiou.
Pimpão, seu urso de pelúcia surrado e antigo era quem lhe trazia algum conforto quando a tortura da noite acabava, ela o abraçava, chorava e orava, mas nenhum Deus jamais a respondeu, mas eu sempre ouvi todas as suas preces. Com o tempo Camila passou a colocar a dor para fora de outras formas às vezes eram nos pulsos outras nos tornozelos ou também nas coxas, com os olhos, agora, vazios ela via um pouco da dor sair juntamente com o líquido rubro com cheiro de ferrugem.
Era sempre da mesma forma, ela deitava e alguns minutos depois ele entrava em seu quarto, ela fechava os olhos e pedia a Deus, qualquer Deus, que pudesse ouvi-la naquele momento, que acabasse por fim com seu sofrimento, o ritual se iniciava, ele se despia deitava-se sobre ela e segurava seu rosto para que o olhasse, mas o que mais lhe assustava era o prazer que podia ver estampado nos olhos daquele monstro e no fim ele ia embora e falava sempre a mesma coisa "Já sabe que não deve dizer a ninguém ou eu acabo com todo mundo", e novamente ela chorava abraçando-se na vã tentativa de juntar seus pedaços novamente.
Você deve perguntar como ninguém notou? Como não perceberam a mudança na sua autoestima? No comportamento ou nas atitudes daquela menina, e eu lhe digo, alguns até perceberam e questionaram, mas Camila sempre assegurou que estava tudo bem, outros só atribuíram tudo a pirraça ou alguma fase da adolescência. As pessoas, no mundo de hoje, só se preocupam com elas mesmas, vivem com a falsa ideia de que os indivíduos ao seu redor estão bem e então elas não precisam ter todo o cuidado em realmente checar como estão as coisas realmente, elas gostam de viver na ilusão.
Em um domingo à tarde, durante um almoço de família, Camila finalmente teve um dia tranquilo, quem lhe machucava não estaria ali naquela noite e ela sentia seu coração mais leve. Até mesmo se arrumou para o churrasco que aconteceria na casa de sua avó, estava radiante como a muito não se via, Camila possuía um sorriso deslumbrante e ela sabia disso, as bochechas rosadas tinham leves covinhas e tudo contribuía para lhe dar um aspecto belo. E naquele almoço ela havia se decidido. Passou tanto tempo naquela situação que havia se esquecido como era se sentir livre, ela estava determinada, após o almoço no dia seguinte iria procurar às autoridades e contar tudo o que já lhe ocorreu, iria finalmente dar um fim ao mal que lhe assolava desde a infância.
É revoltante dizer que não foi assim que sucederam os fatos, o homem voltou à noite dizendo que faria uma surpresa, Camila saía do banho quando se deparou com ele na sala seu coração quis sair pela boca, sentiu-se tonta e quase caiu, ele prontamente a amparou questionando se estava tudo bem, mas ela estava sentindo-se tão fraca que não conseguiu responder a essa pergunta. Ele, aproveitando-se do momento, a levou até o quarto e mesmo jurando a si mesmo e a Pimpão que aquilo não iria ocorrer ela não conseguiu impedi-lo, e novamente perdeu a esperança em si mesma e na justiça Divina, já estava ficando sem forças e ele, naquela noite, levou todo o resto de vida que ainda possuía dentro de si, ele se aproveitou do jovem corpo a sua frente e quando a penetrou a perfurou bem no fundo de sua alma, a chicoteou quando pediu para que olhasse dentro dos seus olhos enquanto a torturava e a humilhava e ela se perdeu dentro de sua própria dor.
Quando tudo acabou Camila não possuía lágrimas, seu interior se tornou oco e ela que durante a tarde se preparava para sair de tudo aquilo, se rendeu pela ultima vez, passou a noite em claro olhando pela janela e por fim decidiu escrever uma carta, nela pedia desculpas a seu irmão por não poder ir a seu jogo no fim de semana seguinte, pediu perdão a sua avó, pois não tinha mais forças para seguir em frente, escreveu à sua mãe e contou tudo o que lhe ocorrera, ela sabia que deveria ter dito aquilo antes, mas agora nada mais importava, não faria diferença á essa altura.
Ela desistiu, disse sim para mim e adeus para a vida que deixava, eu senti certa alegria em saber que ela finalmente estaria livre, estaria em paz. Sentou ao lado da cama e segurou Pimpão no colo acariciou os pelos gastos pelo tempo, os cortes foram certeiros, ela se esvaziava em rubro com cheiro a ferrugem enquanto a mente flutuava e seu corpo se tornava pesado, me aproximei e lhe estendi a mão dizendo "Vamos?" Ela me olhou com olhos marejados e respondeu "Finalmente" e com um suspiro ela sorriu uma última vez e com um olhar carregado de sentimentos ela se despediu do seu amado ursinho.
"Adeus, Pimpão."
Autor(a): machadorisos
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