Fanfics Brasil - Aba, o que? Abaruna

Fanfic:  Abaruna | Tema: Original


Capítulo: Aba, o que?

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Alvorada de uma sexta-feira qualquer. O sol mal despertava direito enquanto pescadores e comerciantes de Rio Adentro trilhavam metade do caminho aberto no meio da floresta para o rio onde canoas e barcos aguardavam por mais um dia de trabalho. Horas depois, trilhava o mesmo caminho um rapaz moreno e franzino com seus vinte anos enquanto conduzia um teimoso jumentinho para o igarapé mais próximo; de cabelos e olhos escuros era Pedro de Souza Antunes, o melhor filho que dona Rosaura poderia ter.


-Pobrezinho, se acostumou a levar pancada dos outros pra avançar! Ah, bem que eu podia te comprar daquele senhor e te dar uma vida melhor que essa sua de cargueiro!Mas veja, o igarapé fica bem ali! Vamos?


Desde que assumira a função de cuidar dos animais pertencentes aos viajantes da hospedaria, Pedro passou a dialogar com eles e animais e torcer para que estes não fossem maltratados com chicotadas, galopes acelerados de seus donos e o peso das bagagens; logo ele usufruía das águas correntes do igarapé ainda intocado pela poluição, depois retornaria para tomar seu café da manhã e a vida seguiria seu curso se não fosse surpreendido com um forte ruído, semelhante a um trovão. Toda a natureza silenciou ante a graciosa figura que surgia aos poucos enquanto Pedro se ajoelhou, tirou o chapéu, respirou fundo e esperou.


-Bom dia meu filho, que bom lhe ver aqui! Está um dia lindo, não está?


-Pois... Pois não mocinha, de onde vens?


-Aproxima-te sem medo, só quero teu bem! - Formosa e gentil,a donzela celestial que aparentava ter uns doze, treze anos vestia roupas luminosas e sentava-se sobre uma nuvem azul. Asas brilhantes mantinham-se encharcadas de orvalho da manhã e verdes carrapichos a lhe servir de enfeite. - Eu sou Estefânia, vossa fada madrinha desde o princípio. Não me conheceste pela visão, mas sempre estive contigo pois as fadas sempre se destinam as suas crianças quando elas nascem.


-Porque agora, depois de grande eu posso lhe ver?


-Antes de você nascer, seu pai foi o primeiro que vi naquela casinha onde sua família vivia antes da hospedaria. Mais do que nunca ele esperou tanto por ti e teve medo de te perder...


-Meu pai! - Com o passar dos anos, pai se resumia às lembranças saudosas da mãe e o retrato quase desbotado na parede do quarto. Depois de ver o filho ir e voltar da estrada, dona Rosaura teve de contar a verdade mas ele não cansou de esperar...


-Não tiveste a graça de conhecê-lo, mas sempre tiveste o carinho de teu pai. Lembra que você nasceu doentinho e ele prometeu deixar de ser pescador para se tornar cavaleiro e dar uma vida melhor à sua família...


-... E justo quando partiu, deu de cara com uma tempestade e um bicho que revirava as embarcações, aí ele desapareceu. Dele só restou a barca, sabe?


Em Rio Adentro muitos conheciam a história triste da barca batizada assim por ter retornado devagarzinho à praia, murmurando. Uns julgaram-na amaldiçoada e tentaram destruí-la, mas dona Rosaura não permitira; era a mais importante lembrança da promessa interrompida. Quantas vezes ela não levou Pedro para brincar ali perto ou recordar as histórias de Manuel Pedro Antunes. Enquanto Pedro contava estas coisas, Estefânia revelava o porquê de estar ali.


-Hoje estou aqui, pois a promessa de teu pai continua viva no teu coração e espera ser cumprida por ti! Tentei convencê-la a esquecer e te deixar em paz, mas não tive como. Por isso deves decidir se a continua ou não, de onde tudo terminou!


-Mas como se a promessa era de meu pai?! E eu nunca pensei em ser cavaleiro!


- Nunca pensaste? Olhe lá... Decida com clareza e liberdade, seja livre! - E com isso, Estefânia beijou-o na testa e um novo clarão se fez em toda parte.


Enxugando os olhos, Pedro se viu sozinho às margens do igarapé. Tudo continuou do exato ponto onde fora pausado, inclusive a teimosia no velho jumentinho; menos a promessa que agora se manifestava nele de tal forma com toda a angústia para se realizar e ser incorporada ao seu coração. Assim que chegou à hospedaria, Pedro contou tudo para a mãe que jamais desprezava seus sonhos e angústias, mas esta era uma angústia tão profunda e desafiadora que habitava nele que dona Rosaura pediu um tempo para pensar no assunto.


-Há quanto tempo não se falava dessa promessa... E agora? Que digo à ele?


- Que aflige teu coração dona Rosaura?


-Ô frei Salvador, sua bênção! - Respondia a boa senhora que em seguida oferecia-lhe o café. - É meu filho que me chegou com uma história que eu nem lembrava mais! Nem sei o que dizer...


-A senhora não sabe ou teme dizer, por saber a verdade?


-O senhor é fogo, viu? Mas por favor, me ajude a ajudar! - E dona Rosaura contou mais detalhes sobre a promessa até então esquecida. - Nem o pobrezinho sabe se vai ou não, mas quer decidir sozinho... Uma hora ele deve partir, mas já me contentei em perder marido e filho, se eu perdê-lo também?


-Minha senhora, ainda pensas que Abaruna é sonho de criança ou não guardaste as coisas que te ensinei?


No auge do amor, dona Rosaura corou. De menina-moça à senhora - mãe de Pedro, ouvira o nome de Abaruna poucas vezes nas vozes e rostos de andarilhos sem rumo e desapegados de tudo. O que dizer das histórias contadas por frei Salvador entre uma catequese e outra e o brilho incomum nos olhos do filho ainda criança enquanto o acalentava para dormir? Abaruna, outra vez aquele nome desconhecido que lhe remetia a um desejo não-realizado, um tesouro jamais conhecido e procurado nas redondezas.


-Silêncio e amor são os melhores remédios que recomendo. Independente da decisão tomada, ame e dê à ele toda a sua confiança e amor!


-Meu frei! - Respondeu dona Rosaura que apesar dos conselhos, mantinha suas preocupações. - Agora que me lembro, ele teve uma semana atribulada, cheia de coisa pra fazer... Se ele não sonhou de repente com isso de promessa do pai dele, chamado, fada luminosa? Além disso, Pedro não me inventaria uma coisa dessas!


-Minha senhora, de sua boca os argumentos já se revelam. Se ele nunca foi de mentir, esteve acordado, só soube da promessa depois de adulto e sem você ter dito... Ela mesma se aproveitou e despertou-lhe um chamado pronto para ser ou não seguido por ele!


-Um chamado... Está bem, se é de Deus assim farei como o senhor disse.


Conselho dito, frei Salvador viu o relógio bater e teve de se retirar. Era a folga dos empregados e dona Rosaura pôde se levantar para encontrar e passar o tempo com o filho que estava bem ali quietinho diante do antigo retrato de Manoel Pedro Antunes, homem ruivo, barbudo, corpulento e distante que impunha certo respeito apesar da ausência. Do meu lugar, eu imaginava que o primeiro filho daquela senhora herdaria todas as características do pai até me encantar com dois corações de mãe e filho concordando suas decisões como se houvesse uma só...


...Uma só!


-E você ainda insiste nessa promessa?!


-E se não for cumprida, que será de nós? – Indagava Sua Majestade, o rei Hildegardo Camilo em mais uma discussão com sua esposa e rainha Verônica. - Veja querida, a espada que D. Domingos me garantiu após o baile, a rosa vermelha, a filha que tivemos... Tudo nos leva à realização daquilo que combinamos!


-Alexandre e Berenice já não são crianças, certamente recusarão essa ideia. E esse costume foi abolido por nós há oitenta anos!


-Eles sabem desse compromisso há tantos anos, justo agora recusariam? E também este deve ser um sinal para regressarmos as nossas tradições serruyanas!


-Como as mangas bufantes, ombreiras, botinas de couro e dragonas douradas de cinco quilos em seus trajes reais? – Respondia a rainha. – Pense bem, querido...


-Bem, algumas tradições serruyanas! E segundo o professor...


-Então darás ouvidos á ele ao invés de sua esposa, mãe de vossa filha!


-Mamãe, papai... Discutindo por mim outra vez?


Ei-la Berenice, a princesa-filha de dezesseis anos. Vestida de azul com bordadinhos brancos,feições delicadas que transpareciam certa inocência e melancolia, cabelos cacheados e castanho-claros com uma fita azul a lhe servir de enfeite; não fossem os olhos e a postura, poucos acreditariam que ela era a herdeira da mais bela e carismática das rainhas de Angustura, uma perfeita amazona que auxiliava os demais através de sua autoridade gentil. Tratada e querida com delicados mimos, a tímida princesinha parecia ter a felicidade em mãos mas só parecia.


-Oh filhinha! -Exclamava a rainha ao vê-la sair de seu quarto e escutar toda a discussão. - Perdoe-nos, apenas queremos o seu bem...


-Pequenina, saibas que é comum perder a cabeça pelo bem estar de nossos entes queridos! E nós queremos tanto o teu sorriso... - Mesmo duvidando se suas próprias palavras serviam de consolo para a filha, o rei tentava ajudar mas nada lhe surtia efeito e a princesa continuava cabisbaixa e tristonha.


- Nunca me verão sorrir. Nasci assim e assim ficarei...


-Berenice, não quer tomar sorvete e assistir o pôr do sol conosco nos jardins? Venha querido! - Pedia a rainha Verônica enquanto Berenice aceitava o convite, mas Sua Majestade já possuía outros compromissos pelo caminho.


-Vão à frente minhas queridas, aí vem o professor Odivelas!


Mãe e filha suspiraram e seguiram para os jardins enquanto o professor Odivelas se aproximava no corredor, um tanto ofegante até o monarca. Lorde inglês, baixinho de pele rosada de papel machê e óculos redondos, tomaram um navio para escapar de uma guerra e chegou ao palácio real de Angustura onde fez amizade com o rei Hildegardo Camilo que fez dele um afamado conselheiro real e tutor da princesa Berenice graças à sabedoria contida nele que cativava a todos (com exceção da rainha), além de ser um grande estudioso de história, inglês, cálculos e restauro de arquivos nas bibliotecas.


-Quais são as novas, meu caro Odivelas?


-Novas são as chances de nossa princesa sorrir finalmente! Passei uma longa e válida temporada na biblioteca, vasculhei todos os livros, documentos e manuscritos até chegar à este!


-Um texto manuscrito por... D. Carlos Maria de Serruya!


-O primeiro de nossos reis serruyanos! Este é o seu antigo diário de caça, com todas as espécies por ele capturadas e cuidadas em seu viveiro; dentre eles estava Abaruna, raro nativo de nossas florestas. Suas cores variam entre vermelho, dourado e laranja, tamanho superior ao da garça e penas excessivamente brilhantes. A última notícia desta espécie foi registrada há oito anos, quando revoou juntamente com doze araras vermelhas!


-A letra de D. Carlos é bonita, mas o que esse Abaruna tem a ver com minha filha?


- Seu místico e já comprovado poder de cura. Aqui ele nos descreve o dia em que sua esposa, a rainha Laura dos Anjos de Serruya amanhecera com fortíssimas dores que a medicina não pôde curar enquanto caçava. Ao retornar, trouxe-lhe Abaruna de presente e bastou sua presença para sanar todas as dores e devolver sorrisos à sua amada!


-Estou ligando os pontos, que relato interessante! Se houvesse alguém tão bravio como D. Carlos Maria para trazer esta ave à minha menina...


-Relato interessante, não? Quase um conto de fadas, onde um nobre cavaleiro se arrisca para trazer um pássaro como dote à sua amada princesa!


-Dote?! É isso! Meu caro Odivelas prepare o cerimonial e envie carta ao nosso Alexandre Fuas Nolasco. Este será o plano perfeito para que tudo ocorra como deve ser, e deve ser! - Respondeu o monarca com tamanha empolgação que derrubou o pobre Odivelas com um fortíssimo tabefe nas costas.


Nos arredores do palácio ficavam o quartel da Cavalaria Real, o palacete dos Fuas Nolasco e o salão de festas onde D. Alexandre Fuas Nolasco e seus jovens companheiros festejavam uma missão bem sucedida num vilarejo distante. Pobre frei Salvador! Cairia de susto ao reconhecer seu afilhado naquele robusto rapaz de olhos verdes, barba e cabelos castanho-avermelhados que sempre liderava as festas, jogos e missões e dos cavaleiros; todos o admiravam, queriam ser como ele e lhe rendiam toda a popularidade que adorava!


-Salve D. Alexandre! Lembra-se do último confronto com os Campineiros do Vento Norte? Saímos vitoriosos porque tivemos vossa senhoria na linha de frente!


-Como não lembrar? E quando nós livramos aquelas três mocinhas dos arruaceiros na Estrada Velha? - Comentava D. Alexandre entre um gole de vinho e outro. - Até ganhei este lencinho de uma delas!


-Que sua noiva não saiba disso! E que noiva hein? - Respondia outro cavaleiro que adorava provocá-lo. E quando a princesa Berenice virava assunto entre eles...


-Como Sua Majestade teve com nossa estimada rainha Verônica uma filha daquelas! Toda defeituosa, cheia de nhem-nhem-nhem e se desmanchando por tudo, não é meu caro?


-Ela não é defeituosa! - De repente, D. Alexandre bateu o punho na mesa para interromper a brincadeira. - Respeitem vossa Alteza ou sofrerão as conseqüências!


-Falou o primeiro que inventava apelidos e reclamava do casamento, que grande justiceiro! - E quanta vergonha ele sentia de suas próprias falhas com relação à princesa! Uma vez marcado daquele jeito por seus companheiros, d. Alexandre precisava mudar seus modos e cultivar em si as novas impressões adquiridas sobre ela no último verão. Ali conheceu seu mistério percebeu como ela estava linda em seu vestido florido de verão.


-Minha princesa... Tens um minuto para conversar?


-Pois não? Pensei que já tivesse ido com seu pai.


-Alteza, eu tenho algo a lhe dizer e espero que me entenda. Sinceramente não aceito o combinado estabelecido por nossos pais, por isso penso em não me casar devido ao absurdo da situação e nossa liberdade para escolher os nossos pares...


-Também tenho algo a lhe dizer. Guardei esse detalhe por muitos anos, e só agora meus pais permitiram que eu revelasse: Sou incapaz de sorrir!


-Incapaz de sorrir?! Como assim, do que está falando?


-É de nascença. Sei que é estranho para ti, todos conseguem sorrir, mas para mim é um suplício! - Á medida em que o olhar de Berenice despertava novas lágrimas, D. Alexandre lamentava interiormente os próprios resmungos cultivados da infância e queria consolá-la de alguma forma, sem saber como até redescobrir o espelhinho e doar sua gentileza. Gentileza essa que não dependia de promessas, casamentos arranjados e espelhinhos dourados.


-Minha princesa, tome este espelhinho como sinal de minha gentileza para vós. De agora em diante, conte-me o que sente e virei ajudá-la pessoalmente ou por carta. Se eu não for teu marido, serei como um amigo ou irmão para ti!


-Oh, muito obrigada! Pelo visto não és tão inchado como dizem...


-Inchado, ah o que dizem de mim é ótimo!


-Minhas primas Augustino e Georgina que te chamam assim de inchado. Orgulhoso, cheio de si... Oh, perdoe-me! - Sem mais o que fazer, D. Alexandre teve de amparar a princesa que chorava novamente e revirou os olhos. "Por que você se culpa tanto e chora até por ter chorado? E porque meus sentimentos se confundem?


-Berenice você tem fé, não tem? Pois tenha e se um dia anunciarem que sua cura está em algum lugar e me mandarem, farei questão de buscá-la e assim verei o teu sorriso. Até lá, infeliz aquele que provocar sua alteza real!


-O que fazes por mim é tão bonito! Nem sei como agradecer... E se isso acontecer, te darei confiança e a certeza de que vais conseguir!


"Infeliz aquele que provocar sua alteza real... E eu era o primeiro deles!" Ao término da noitada, D. Alexandre foi o primeiro a se despedir dos amigos e reencontrar seus pensamentos enquanto cavalgava. Tantas festas ele participava e quase sempre retornava com uma lacuna insatisfeita em seu coração! Tinha todos os motivos para estar, sentir e se mostrar feliz com a vida que levava, o futuro promissor e as pessoas que lhe queriam bem, mas a felicidade em forma de sentimento se evaporava tão rápida como a água derramada no chão. Chegando em casa, ele amarrou o lenço de sua admiradora aos pés da cama e se assustou ao descobrir a espada real em seu colchão.


-Mais essa, de onde veio esta espada? Isso é brincadeira ou armadilha?!


-Gostou da surpresa? - Indagou D. Domingos ao abrir a porta do quarto. - Sua Majestade fez questão de lhe enviar a espada real para ajudar em sua expedição. E não se preocupe, Corre-Campo também receberá uma sela nova!


-Meu pai, que expedição é essa? Sabes que já não sou criança para ficar sem saber das coisas que me cercam!


-Vais me dizer que esqueceste de Vossa Princesa? Não é de hoje que os pais dela buscam a cura de sua enfermidade e pelo que soube, finalmente conseguiram! Além disso... - E D. Domingos contou sobre Abaruna e os planos de Sua Majestade, aos olhos arregalados de seu herdeiro. Se D. Alexandre soubesse disso um dia antes ou depois, certamente reclamaria antes de virar as costas e dormir enquanto metade desta história se perderia. Graças à Deus, aquele foi o dia!


-Meu pai, reúna os quatro melhores da Cavalaria Real e prepare a minha comitiva. Se me ordenam, partirei amanhã mesmo e sem demora!


-E decides assim tão rápido? Esta é a primeira vez que não me contesta... Ótimo sinal de amadurecimento! Assim queres, assim farei e tudo sairá como esperado!


-Por D. Carlos Maria, que há comigo? - Murmurava D. Alexandre. Certamente a espada era rica em seus detalhes e se apertasse bem os olhos veria um diamante brilhar mais que os outros. "Pelo visto não és inchado como dizem... Te darei confiança e a certeza de que vais conseguir!"


À noite, Pedro refletia sobre a experiência vivida naquela manhã, as coisas sentidas e a jornada futura; os empregados que aproveitavam a folga noturna estranhavam por ele preferir a solidão ao invés de papear e jogar petecas de vidro como sempre fazia. "É coisa minha gente, daqui a pouco tô de volta!" Ele dizia enquanto sentava junto à escadinha da varanda sob o olhar atento de dona Rosaura que cuidava para ninguém fosse incomodá-lo; era o momento dele!


-Pro fulano se tornar cavaleiro mais rápido ele tem que se mostrar e fazer algo grandioso pra todo mundo reconhecer. Se Estefânia deixar, aproveito a viagem e posso tentar, mas o quê? - E as idéias pipocavam; criar uma armadilha resistente para domar onças? Oferecer ao chefe da Cavalaria o resultado de uma boa pescaria? Trazer da floresta uma criatura até então desconhecida?


E pensar que certos planos conflitavam com o carinho sentido pelos animais. Caçar naquele tempo era um modo de sobrevivência para os humanos, mas isso custava tantos sacrifícios que feriam a natureza! Um bocejo aqui, uma coçada na cabeça ali e ele recordava certo dia da infância, quando avistou pela primeira e única vez o "bichão vermelho pegando fogo" no céu. Na estrada, frei Salvador lhe distraía com algumas histórias de gigantes, madrastas más, fadas luminosas como Estefânia, pássaros encantados e respondia às suas perguntas.


-Tio, posso ter um desses?


-Se souberes criar um pássaro como Abaruna e sua mãe não desmaiar quando o ver, isso e muito mais é possível! Como tudo que desejamos, tais desejos nos levam a diversos lugares e conseqüências por nós a serem assumidas!


-E eu posso voar que nem Abaruna? Queria tanto...


-"Porquê?", assim perguntam os que preferem respostas prontas às reflexões. Se aspiras grandes vôos, porque seriam impossíveis? Pois bem garotinho, conserve acesa esta aspiração e não permita ela seja apagada por ventos contrários. Pois existem aqueles que se divertem atentando contra os sonhos dos outros para compensar suas frustrações. Fuja deles!


-Abaruna... A-B-A-R-U-N-A! – Daquele dia em diante, o pequeno se divertia ao soletrar aquele nome, mesmo sem saber o significado. Certa vez, a hospedaria foi visitada por missionários jesuítas que a todo custo tentaram provar que "Abaruna" se referia à estranheza dos índios com a batina que eles usavam, mas Pedro jamais aceitou aquele disparate e preferiu os dominicanos como frei Salvador. Depois do "Bichão vermelho", Abaruna era sua palavra preferida.


Já crescido, ele se divertia ao recordar os ensinamentos do frade; dele ouvira muitas histórias ilustradas com ricas imagens e descrições, mas a lembrança de Abaruna sempre dominava sua imaginação povoada de florestas e igarapés. Ria da vez em que se jogara da mesa após pedir a Abaruna que lhe realizasse o desejo de ganhar asas e voar; na queda percebeu que sendo gente não poderia voar como desejava, mas de outra forma através dos sonhos e da busca por um destino diferente e mais bonito para ele e a mãe, que tanto precisava de sua ajuda. Meia-hora depois, um milagre o despertaria do quase-cochilo na varanda. Parecia que a lembrança se projetava de sua própria mente para a realidade e superava a frieza da noite com seu brilho caloroso. Cegava!


-Mas será possível? Num pode ser... O bichão vermelho!


De início, Pedro não soube se chamava a mãe para conhecer e provar a existência do bichão vermelho ou permanecia ali, contemplando a bola de fogo luminosa que tomava a forma dum maravilhoso pássaro a se destacar e bater suas asas alaranjadas; não importava se era o mesmo Abaruna da infância, um descendente ou ilusão, era a coisa mais bonita e desejada de sua vida que agora crescia e se aproximava de maneira nítida, luminosa e assustadora como se também o quisesse! E quando se aproximou para acariciá-lo, a voz maternal de dona Rosaura lhe despertou do transe.


-Pelo amor das chagas, meu filho! Que faz aí no meio do nada?!


-Mãe?! - Quando deu por si, Pedro estava zonzo, molhado de suor, sozinho e distante da varanda enquanto a mãe lhe socorria, temendo que ele estivesse com febre. – Mãezinha, eu... Ah que pena, acordei dum sonho tão bonito!



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Autor(a): Ginny Potter

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 2



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  • Magda Postado em 07/04/2019 - 15:41:35

    ah, eu tenho uma fic baseada em tvd com o casal vondy, caso vc se interesse de ler: https://fanfics.com.br/fanfic/24829/memorias-de-uma-vampira-diego-finalizada

  • Magda Postado em 07/04/2019 - 15:40:48

    oiie, leitora nova! se quer uma dica, nao posta tudo de uma vez nesse site. Vai postando ao pouco, uns capitulos por dia ou mesmo por semana, tudo de uma vez o proprio site não divulga mt ai vc perde a chance das pessoas verem. Beijito!!


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