Fanfics Brasil - Capítulo-01 RENASCER DE ANAHI

Fanfic: RENASCER DE ANAHI | Tema: AyA ,Anahi y Alfonso,Ponny


Capítulo: Capítulo-01

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Não somos apenas o que pensamos ser. Somos mais; somos também, o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos; somos as palavras que trocamos, os enganos que cometemos, os impulsos a que cedemos... ‘'sem querer’”


Sigmund Freud


 


 


 


 


 


ANAHI PORTILLA-


Eu o vi chegar, como acontecia todo fim de semana, há quase um mês.


 


E nunca vinha sozinho. Como das vezes anteriores, trazia em uma mão a coleira de seu lindo cachorro Golden Retriever, que tinha uma pelagem lisa e dourada, e na outra mão, um belíssimo buquê de flores. Eu não era especialista nem em flores nem em cachorros, mas conhecia aquela raça por ser comum para os cegos. Tinha visto em programas de televisão. Mas sobre as flores, só consegui perceber que eram uma mistura exuberante de cor de rosa, lilás e branco. Azaleias, talvez.


Ele nunca decepcionava. Aos sábados e domingos chegava e, não sei por que, eu já acordava cedo e sentava em um banco isolado do jardim, esperando-o. Havia algo encantador em ver um rapaz tão bonito e sério sempre com seu cachorro e suas flores. O cachorro era o mesmo, mas as flores nunca repetiam. Eram sempre maravilhosas, em uma explosão de cores que combinavam entre si.


Afastei uma mecha do cabelo comprido que o vento jogava em meu rosto, meus olhos acompanhando-o enquanto parava antes de chegar aos degraus da varanda e se abaixava para soltar o cachorro da coleira. Sempre fazia isso. Falava com o animal, acariciava sua cabeça, como se fizesse recomendações. Obediente, o Golden Retriever, balançava o rabo, olhando-o com uma espécie de adoração. Então, se virava e entrava na clínica, enquanto o cachorro ia arrumar um canto para deitar no jardim e o esperar.


Suspirei, após todo o ritual. Não sabia por que eu gostava tanto de observar aquilo. Talvez por que minha vida fosse só isso, sentar ali e olhar em volta, pensar, sondar minha mente e meu passado, passar pelas reuniões com psicólogos e psiquiatras, pelos encontros em grupos e toda a terapêutica da clínica. Mas entre tudo ou nada que compunha os meus dias, eu esperava aquelas manhãs, aqueles momentos. Só para olhar.


Daquela vez, o cachorro rompeu todo o ritual. Não foi se deitar. Ficou sentado, olhos fixos na porta por onde seu dono tinha sumido. Era como se estivesse prestes a ignorar as recomendações e segui-lo. Mas então, se ergueu, virou e caminhou sozinho, a boca aberta, uma parte da língua para fora. Parecia procurar algo para se distrair, quebrar sua rotina.


Como ainda era de manhã, o jardim não estava movimentado. Ele andou por lá, a brisa ondulando sua pelagem entre mel e dourada, as franjas sacudindo em cada passada. Como era lindo! E parecia inteligente, atento.


Não acreditei quando olhou para mim e deu uma parada, talvez me avaliando. Nós nos encaramos e, muito naturalmente, veio até mim como se sorrisse, os olhos escuros brilhando.


Fiquei imobilizada. Não tinha esperado aquilo e, por um instante, senti aquele incômodo que sempre me acometia quando alguém me fitava atento ou vinha para perto de mim. Era uma sensação quase sufocante de ameaça. Em geral, depois de alguns meses internada na clínica, sendo alvo de atenções, eu conseguia suportar aproximações. Mas não contatos. O toque era algo que eu evitava a todo custo.


Nem pisquei enquanto o cão parava ao lado do banco, balançando o rabo para mim, sentando-se sobre as patas de trás. Olhou-me animado, como se pedisse um carinho, algo de carente e carinhoso nos olhos aveludados. Eu só o encarei, tensa, esperando uma ação agressiva. Ele se lambeu e voltou a pendurar a língua, como se sorrisse.


Não paramos de nos olhar. Pensei em me levantar e sair dali, mas uma espécie de doçura e de fragilidade nele me tocou. Não me movi. E então, como se tivesse cansado de esperar uma atitude minha, abaixou levemente a cabeça e a esfregou em meu joelho.


Perdi o ar. Em algum lugar da minha mente embotada, gelei, pensei em um ataque. A sensação foi real demais e, embora a lembrança não tivesse forma nem clareza, eu a senti como um vislumbre do passado. E sabia ser. Tinha as inúmeras marcas no corpo para comprovar o que minha mente teimava em esquecer.


Minha garganta travou, um frio horrível se espalhou como a congelar meu sangue, bem devagar. Mas nada ruim aconteceu. O cachorro só apoiou sua cabeça lá, sobre a calça que cobria meu joelho, quietinho, acomodado, sereno. Fiquei olhando seu pelo, seus olhos piscando com preguiça, sua entrega silenciosa a uma estranha. E o entendi naquele momento. Ele se sentia sozinho. Como eu, a maior parte do tempo.


Consegui controlar meu nervosismo, mas não me movi. Puxei o ar para os pulmões, expirei, não deixei de me concentrar totalmente nele. Quando ergueu um pouco a cabeça, ainda encostado em mim, buscando meus olhos, eu vi ali seu pedido e entendi o que ele queria.


- Não posso ... – Murmurei, me justificando.


Continuou esperando e, oferecido, esfregou mais a orelha em meu joelho, só faltando suplicar por carinho. Contraí meus dedos sobre o banco, sentindo-os dormentes, quentes.


Primeiro, veio uma vontade de sair correndo. Ter qualquer pessoa perto demais de mim me dava pavor. Tocar em outro ser também. Até ali fui respeitada, ninguém me obrigou a nada. Eu falava quando era solicitada, participava dos grupos, mas sempre atenta ao meu espaço. E agora aquele cão vinha sem pedir permissão, sem se importar, apenas querendo um toque meu. Como os que o rapaz sempre dava nele antes de entrar na clínica.


Segundo, eu me acalmei, sem nem entender por que. Era estranho. Talvez fossem aqueles vídeos que passavam para a gente na clínica, de bebês. Eles aprontando, fazendo arte, rindo tanto, que acabavam despertando uma vontade de sorrir sem explicação. Eu sempre ficava mais equilibrada e leve depois daquelas sessões. E das conversas com Lara e com a doutora Rose, que me faziam recordar pequenos momentos da minha primeira infância. Quase que podia sentir o abraço da minha mãe quando era uma garotinha e a sensação de conforto e proteção.


Sabia que era apenas uma parte da minha vida, até os sete anos. Tudo que eu me recordava com clareza. Via as cicatrizes em meus pulsos, tinha conhecimento que estava ali por que tentei me matar. Como sabia que passei um tempo em estado catatônico, depois que fui salva. Quando tomava banho, sentia as marcas em meu corpo, embora evitasse olhá-las. Tudo isso não era novidade. Vislumbres de violência, cheiros de sangue, toques com muita dor, eram como pesadelos aprisionados dentro de mim. Existiam. Mas eu os sufocava. E não me lembrava deles. Sentia, mas não lembrava. Eu era apenas a Letícia agora e a menina até os sete anos de idade. Entre um e outro, havia uma lacuna. Que minha mente apagou.


Nas sessões, doutora Rose explicou que eu tinha Amnésia Dissociativa, devido a eventos traumáticos na minha vida, o que tinha me levado à tentativa de suicídio. Era um distúrbio de memória, no meu caso definido em dois tipos, um contínuo, pois eu não recordava de muitos eventos subsequentes aos meus sete anos; e outro sistematizado, pois embora eu lembrasse, por exemplo o que estudei na escola aqueles anos todos após os sete, eu tinha esquecido informações sobre minha família e determinada pessoa. Meu pai. Tinha selecionado o que recordar.


Quase sufoquei só em imaginar aquele homem. Meu pai. Minha mente se fechou, meu coração disparou, tudo pareceu virar um branco vazio e gélido. Mas então, o cachorro deu uma latida, como a me avisar que estava ali, exigindo mais atenção, tirando-me de meus doloridos devaneios. Olhei-o um tanto confusa e ele se animou, esfregando a cabeça em mim com mais empolgação.


- Pare ... – Murmurei.


Ele continuou. Tive pena de sua carência, de seu pedido mudo. Seu pelo parecia tão macio ... E se eu ...


Tentei ignorá-lo, um tanto nervosa. Continuei sem me mover e olhei para frente. Talvez, se eu fingisse que ele não estava ali, fosse procurar outra pessoa para acariciá-lo.


Foi uma disputa de forças, de vontades. Não o olhei, nem o toquei.


Mas fiquei consciente o tempo todo que estava ali.


Ele esperou, se esfregou, se lambeu. Por fim, pareceu se cansar. Mas não foi embora. Deitou no chão e sua cabeça foi repousar sobre meu pé esquerdo. Espiei-o, sem acreditar. Deu uma espécie de suspiro conformado e fechou os olhos, cochilando.


Era um folgado.


Não sei por que, tive vontade de sorrir. Relaxei um pouco, até que me acostumei com o calor e o peso em meu pé, sem poder tirar os olhos dele. E então começou a parecer certo estar ali e tê-lo junto a mim. Todo incômodo foi se esvaindo e foi minha vez de suspirar e me conformar. Se fosse sincera comigo, apreciar.


Não sei quanto tempo ficamos assim. Vi outros pacientes saindo da clínica para sessões em grupo ao ar livre, ou sozinhos, apenas para aproveitar a manhã. Uma brisa gostosa soprava, estávamos sob uma árvore frondosa e não fomos incomodados. Uma ou duas vezes, olhei para a varanda do casarão, esperando o rapaz alto e moreno, com cabelos cacheados sempre despenteados, sair e buscar seu cachorro. O que ele diria se soubesse que daquela vez não o esperou no gramado? O que faria se o visse perto de mim?


Fiquei um tanto preocupada e receosa, mas não saí dali nem me afastei do cão. Para dizer verdade, nem me mexi, com medo de incomodá-lo.


 


De perder aquele contato inusitado e que não me deixava em pânico, mas estranhamente confortada.


Ele se moveu e ergueu a cabeça. Olhei-o na hora, enquanto voltava a se sentar e a me encarar naquela expressão alerta e pidona, novamente pronto para exigir sua cota de atenção. Veio mais perto, depositou o queixo em meu joelho e manteve os olhos nos meus, meio sonolento.


- Você é insistente. – Falei baixinho e isso o fez sacudir o rabo que mais parecia uma franja, contente.


Não sei o que me deu. Foi rápido e nem pude me dar conta do que fazia. Em segundos, eu tinha erguido a mão direita, como motivada por suas súplicas silenciosas ou sua companhia agradável, terna. Estremeci da cabeça aos pés quando mergulhei os dedos em seu pelo macio e abundante, na parte posterior da cabeça.


Senti vida e calor. Depois de apenas tocar objetos inanimados, aqueles pelos mornos pareceram comichar em meus terminais nervosos e espalhar uma sensação estranhamente gostosa dentro de mim. Deixei os dedos ali, enterrados entre a massa dourada, enquanto nos comunicávamos pelo olhar, calados, nos entendendo mais do que um dia julguei possível.


Ele pareceu sorrir de novo, a língua para o lado, piscando deliciado. Movi a mão, passei em sua pelagem, testei meus sentimentos naquele gesto tão surpreendente e novo para mim. Foi um mundo de descobertas e nenhuma delas me provocou pânico. Pelo contrário, me encheu de vivacidade, de uma esperança e algo novo que não soube nominar. Mas que me fez bem.


E assim eu o acariciei, cada vez mais. Sorri para ele. Quis saber seu nome, quis dizer algo bom, como uma tola. Mas apenas o senti e olhei, enquanto era retribuída, descia meus dedos por baixo de sua orelha, me arriscava em mais carinhos. Esqueci o mundo. Fiquei perdida naquele momento e naquelas sensações tão boas e prazerosas.


Então, suas orelhas se ergueram de repente e ele virou a cabeça, alerta, ligado em algo. Desperta por sua reação, segui seu olhar e me imobilizei quando vi o rapaz descer os degraus da varanda, sem suas flores, sozinho, a cabeça baixa. Havia algo como derrota em seu andar, sua postura. Ou talvez fosse apenas tristeza.


Imobilizei-me. Tive medo que me visse com seu cachorro, ainda mais quando ergueu o rosto bonito, afastou um cacho dos olhos e os passou em volta, buscando seu cão. O Golden Retriever levantou-se e na mesma hora eu o soltei, nervosa, meu coração disparando. Quase fui para o lado oposto, mas não consegui me mover, nem parar de olhar para o rapaz.


- Fred ... – Ele chamou alto, em uma voz grossa e meio rouca que chegou até mim e me surpreendeu. Era a voz de um homem feito, potente, segura.


O cachorro disparou correndo para ele, latindo, feliz da vida.


O rapaz se abaixou, tirando a coleira do bolso, enquanto recebia uma lambida grande no rosto. Contive o ar, esperei uma reprimenda, mas sua expressão carregada suavizou e ele abraçou o cão, ambos iluminados em cheio pelo sol da manhã naquele gramado muito verde. Falou algo, acariciou o animal e prendeu a coleira, somente então se levantando.


Pareciam bem satisfeitos um com o outro, amigos, íntimos demais. Quando o rapaz se afastou, o cachorro foi com ele, animado, balançando o rabo. Mas, como se não tivesse me esquecido completamente, virou o rosto para mim e latiu alto, em uma espécie de saudação. Ou agradecimento por ter feito companhia a ele. Ou apenas uma despedida. Depois seguiu com seu dono.


Não tirei os olhos deles. E me dei conta que não tinha precisado me preocupar.


Em nenhum momento o rapaz olhou para mim ou percebeu que eu estava ali. Para ele eu fui como tentava ser o tempo todo: invisível.


Não entendi por que aquilo fez meu peito se apertar.



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Autor(a): hittenyy

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 8



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  • carolraaj Postado em 03/01/2020 - 18:11:35

    Pfvr!!!! Postaa

  • carolraaj Postado em 03/01/2020 - 18:10:50

    Posta pfvr, continua!

  • carolraaj Postado em 03/01/2020 - 18:09:59

    Oiee eu gostei muito da historia, continua pfvr!!!!!

  • tinkerany Postado em 29/12/2019 - 02:37:06

    Olá

  • tinkerany Postado em 06/08/2019 - 13:24:13

    Olá! Continu

    • hittenyy Postado em 07/08/2019 - 00:49:26

      Já irei postar 😍

  • ranna_vondy Postado em 05/08/2019 - 11:25:18

    Continua por favor

    • hittenyy Postado em 07/08/2019 - 00:49:54

      Já vou terminar aqui o cap e irei postar❤


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