Fanfics Brasil - A Felicidade desconhecida A Felicidade desconhecida

Fanfic: A Felicidade desconhecida | Tema: felicidade, maldade, esperança e ansiedade


Capítulo: A Felicidade desconhecida

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A felicidade desconhecida


 


Ela era roliça, baixa e tinha cabelos extremamente lisos. Tinha pernas gordas, mas bem torneadas, enquanto nós ainda éramos consideradas magrelas demais para nossa idade. Como se não fosse o suficiente ter um corpo mais bonito do que o nosso, também era rica e todos os anos viajava para a Disney com sua família. Mas além de todas as características já mencionadas, ela possuía o que todas as meninas esfomeadas da escola gostariam de ter: uma mãe que fazia doces maravilhosos.


Ela parecia pouco ligar para os doces que sua mãe preparava, pois sempre falava que mal podia sentir o cheiro dos brigadeiros, cocadas e beijinhos que sua mãe confeccionava em sua loja. Mas nós todas passávamos o ano esperando por alguma festa para que pudéssemos degustar aquelas maravilhas que todos os dias ela tinha à mão. Esperávamos em vão, pois nunca éramos convidadas a entrar em sua casa.


Sempre que acreditávamos ter chegado a oportunidade de provar aqueles doces que só víamos nos catálogos da Sweet day, loja de sua mãe, ela dava uma desculpa dizendo que muitos alunos já haviam sido convidados e que não haveria espaço suficiente para todos. Essa justificativa era sempre acompanhada da promessa: " Pode deixar que lembrarei de trazer vários doces para a escola semana que vem”, que enchia meu coração de esperança e minha boca de água.


Por várias vezes acreditamos naquela promessa. Acho que acreditávamos apenas porque ter a esperança de poder comer aqueles doces era melhor do que encarar a realidade de não saber ao menos o gosto que tinham. Muitas vezes eu pensava: "Como é possível que ela nunca se lembre de cumprir a promessa? Seria por um talento natural para fazer maldade?".


Até que um dia ela decidiu direcionar toda sua maldade a mim, e como numa tortura chinesa, começou a ocupar a carteira do lado da minha e todas as manhãs tirar da lancheira 2 ou 3 brigadeiros e jogar na lixeira da sala dizendo:" não posso sentir o cheiro". Depois que jogava aquelas preciosidades fora, olhava para mim e perguntava:  "Você queria comê-los?... me desculpe! Amanhã trarei mais!"


Na manhã seguinte, embora suspeitasse que ela faria o mesmo, eu mantinha dentro de mim a esperança que aquela manhã seria diferente. Mas mais uma vez me iludi e o mesmo se repetiu. Minha vontade era correr até a lixeira e comer os brigadeiros com lixo mesmo, mas isso seria muita humilhação e poderia até me fazer mal.


 No dia seguinte algo diferente aconteceu, embora ela tivesse novamente jogado os doces na lixeira, me pediu que a acompanhasse até a loja de sua mãe onde haveria uma degustação dos novos doces lançados. Boquiaberta, respondi que iria acompanhá-la com certeza. Passei o dia sonhando com as guloseimas e tenho a sensação que nem estava presente em sala de aula, pois meu pensamento estava em outro lugar muito mais doce.


O sinal tocou e mal podia esperar para chegar à loja de doces. Caminhamos pelas ruas quentes de Pernambuco e em minha mente imaginava uma esteira de doces passando à minha frente. No entanto, o plano diabólico da filha da dona da loja de doces era ainda mais maldoso do que jogar os doces na lixeira todos os dias. Quando chegamos à porta da loja de sua mãe, ela olhou bem no fundo dos meus olhos e disse: " Me confundi! O dia da degustação foi ontem."


Quase desmaiei de tamanha frustração e mais uma vez a promessa vazia foi feita: " Pode deixar que amanhã eu levarei alguns doces para você".


E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia o quanto eu queria os doces, mas enquanto toda sua maldade não fosse colocada para fora, ela não pararia de me fazer passar vontade. Eu já começava a adivinhar que ela me escolhera para sofrer. Talvez isso a fizesse feliz... sei lá!


Todos os dias pareciam iguais, pois diariamente ela passou a me pedir que a acompanhasse até a loja de sua mãe para que eu finalmente tivesse a oportunidade de provar todos os doces de lá.


No entanto, aquele dia foi diferente, pois pela primeira vez eu percebi que logo perto da porta, que eu nunca havia cruzado, ficava a caixa registradora e uma senhora de óculos de armação marrom.


Enquanto ela me falava que mais uma vez havia se confundido sobre o dia da degustação, a senhora se levantou e veio até nós. Ao cruzar a porta de entrada, a senhora se dirigiu à menina roliça e de cabelos lisos e pediu explicações, pois havia alguns dias que percebia que chegávamos até a porta da loja de doces e eu me afastava com o olhar triste e desolado.


Houve uma confusão silenciosa e a senhora de óculos de armação marrom achava as justificativas da menina cada vez mais esquisitas. De repente a mulher voltou-se para a filha e disse: " Temos degustação de doces todos os dias e você sabe disso, pois come quase todos eles sozinha!" Percebi que o pior para aquela mulher não foi apenas descobrir a mentira de sua filha, mas sim descobrir que sua filha era capaz de fazer mal para alguém que não tivesse o problema com a balança que ela tinha.


Depois de alguns minutos em silêncio, a mulher se voltou para nós e disse para a filha: " De hoje em diante, você trará sua colega de classe aqui na loja e lhe servirá todos os doces que ela quiser comer e lembre-se que você está proibida de colocar qualquer um que seja em sua boca".


A menina ficou vermelha de tanta raiva, mas nada pôde dizer à sua mãe.


No dia seguinte, como havia sido combinado, acompanhei a menina até a loja em silêncio e chegando lá nada escolhi e por alguns dias tive o mesmo comportamento. Fingia que ainda não podia comer aqueles doces maravilhosos. Saía da loja com aquela sensação de ainda não saber quão deliciosos eles eram. Eu criava justificativas para não os comer ainda e parecia que de alguma maneira eu queria curtir um pouco mais aquela sensação de não saber. Aquela felicidade desconhecida passou a fazer parte de mim. Era como se o não saber fosse mais interessante do que simplesmente matar minha vontade de comer todos aqueles doces. Eu, surpreendentemente, não era mais aquela menina magra e desnutrida que ansiava por um brigadeiro ou uma cocada da loja de doces, mas sim uma mulher que tinha o poder da escolha e que tinha o total controle de suas vontades.


 



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Autor(a): adriana_pachini

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