Fanfic: Floatown | Tema: Universo Steampunk
Floatown
Não se sabe desde quando se iniciou as tais das névoas. Mas se sabe que elas são instáveis, tem ciclos repetitivos e são em muitos aspectos, resultado da energia daqueles que moravam em Floatown desde que ela existe, e ao mesmo tempo, influenciam em seus comportamentos e tradições. Mas quem será que tinha vindo primeiro: a névoa ou as pessoas?
Essa pergunta talvez nunca fosse respondida mas o que se sabe é que não havia formas de não habitar a névoa dourada e preta que recobria toda a cidade. Desde suas árvores sem folhas, com caules pretos e galhos dourados, passando por suas mansões de madeira envelhecida e engrenagens de aço escurecido pelo tempo,e até às pessoas de aspecto constantemente sombreado escondidas atrás de seus trajes pomposos de renda preta, veludo escuro e couro reforçado, não havia sequer um relato, fotografia ou lembrança de que um dia existiu um céu limpo ou claro. A não ser nos sonhos dela, sempre que adormecia...em seu intimo, esperava que nunca acontecesse de que um dia ela acreditasse suficientemente neles a ponto de ir embora. Que sentido teria abandonar uma realidade palpavelmente suportável por uma esperança de mundo que aparentemente só existia em sua cabeça e provavelmente nem existia? A névoa era segura. E ninguém parecia entender sua inquietação interna que denunciava uma suspeita: seria aquele o único formato de vida?
Impregnada na natureza de todas as crianças que nasciam, repassada ao longo da vida à todos, e reforçada pelos chamados “vazios anciãos” no fim de suas vidas, a névoa era composta de todos aqueles que já se foram e que, no momento em que tinham suas pupilas douradas tomadas pela cor prateada, era sabido que o momento havia chegado e seus corpos virariam pó translúcido dourado, e se agregariam à grande fumaça. A cor dourada era pra aquele povo sua fortaleza: sinônimo de riqueza, extravagância e ambição como forma de expressar-se e carregada do poder de atrair todo tipo de atenção ao aspecto visual de quem a utilize. Entretanto, em um lugar onde o mecanismo de destaque era igualmente abusado por todos sem nenhum critério de unicidade, se tornava clara a inutilidade de um costume tão limitado e irritante baseado entre outras coisas, na competição pela melhor imagem que se consegue projetar. Talvez esse fosse um dos costumes daquele povo que mais a integrava e tornava claro sua essencial distinção de naturezas. Ela odiava, permanentemente e com muito afinco, a cor dourada e tudo o que ela representava. Mas o que de fato se pode fazer quando não se conhece outros mundos além do dourado? Ou pior: quando se sente que não se pertence ao presente mas não se conhece o próprio passado?
Seu mundo seria aquele para a sempre, pelo menos era o que tentava se convencer a cada vez que sonhava e acordava em prantos, quando estava em seu ateliê de poções, ou quando se tornava óbvia e insuportável a real dificuldade de conexão com os cidadãos de Floatown, ou quando seus pensamentos atraiam muitos intuítes. Pássaros que voam ao seu redor sempre que seus pensamentos te levam a caminhos nos quais você se “desvia de si”. O interessante é que eles nem sempre existiram na cidade, mas depois que eles apareceram tudo mudou. Sobretudo para ela, uma vez que ambos os seres tiveram seus caminhos cruzados com o da cidade, há muito tempo atrás, simultaneamente. E desde então são um termômetro que a mantém permanente em alerta sobre a névoa e suas capacidades limitantes. Sempre que um intuíte se aproxima e deixa suas penas pretas caírem sobre você, é um sinal de que deveria se recolher e apegar-se ainda mais à si, no caso dela seus feitiços e conhecimentos, uma vez que perder-se dentro de sua própria cabeça é talvez uma das formas mais clássicas da névoa te tornar pó dourado um dia e nós sabemos - e ela também em algum lugar - como esse enredo simplesmente teria que ser modificado pra ela. Afinal não se conhece forma mais mágica de mudar a realidade do que dentro da mente de uma bruxa.
Mas, felizmente ou infelizmente, teria que existir algo muito mais forte do que seu ódio por aquela cor ou a origem dele pra que ela sentisse - ainda que só por um momento - que era capaz de sair de dentro de si mesma e assumir de vez não ser um deles...quando se é uma bruxa sobrevivendo em uma cidade de engrenagens nebulosa, o que mais se pode fazer além de recriar o mundo em segredo? Talvez essa fosse a pergunta que mais a estagnava...colecionava penas de intuítes sempre que os tinha. De alguma forma, sentia que se anunciava o momento em que precisaria escolher descobrir de onde vinha sua real natureza, seu passado, e o que poderia fazer de seu futuro.
Nessas longas tardes de calmaria segura e nociva, as engrenagens da cidade e principalmente do relógio central pareciam girar cada vez mais rápido. Como nutria medo profundo de todas elas - e dado seu vício em se aproximar forçadamente daquilo que a assustava - aprendeu a saber muito bem o que isso significava...e só a ideia lhe causava arrepios.
Autor(a): ayala_
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