Fanfic: felicidade inocente | Tema: felicidade inocente
FELICIDADE INOCENTE
Ela era magra, alta, rosto afilado e cabelos enrolados, só andava arrumadinha, unha bem-feitinha e sempre com um sorriso no rosto. Ela era de família de classe média, tinha uma casa de tijolos, um quarto só pra ela e muitos brinquedos. Com todas essas qualidades, porém, ela era muito oportunista. Só que minha inocência de criança não me permitia enxergar isso naquela “amiga perfeitinha”.
Quanto a mim, até que eu era bonitinha, magra, estatura média, cabelos lisos, só andava com roupas muito velhas, naquela época fazer as unhas era coisa de rico, que no meu caso, eu nem ousava sonhar fazer tal coisa.
Eu era de família de classe média baixa, ou talvez, a melhor expressão seja dizer que, eu era extremamente pobre, eu cresci em uma casa de taipa, sem nenhum saneamento básico, tipo, nenhum mesmo, nem banheiro lá em casa tinha, era só uma casinha de taipa na beira da estrada, vivíamos de doações e bicos que meu pai fazia, quase sempre passávamos fome, e não estou exagerando quando digo fome.
Se comida já era algo difícil quem dirá brinquedos, naquela época meu sonho era simplesmente o sonho de toda criança, sonhava com muitos brinquedos, na minha inocência de criança nem se passava pela cabeça que a situação em que vivíamos meu pai, minha mãe e meus sete irmãos era sofrimento.
Mas o que mais me marcou diante desse sofrimento, que no caso, em minha doce inocência de criança nem sabia que sofria, foi à maldade desta menina magra e perfeitinha que eu citei acima, pois me lembro das vezes em que ela se aproveitou da minha inocência, lembro-me de todas às vezes que eu fazia tudo que ela pedia, só pra ela me deixar brincar um pouco com suas bonecas, lembro que há dezoito anos, havia umas bonecas chamadas SUSY.
Gente! O meu sonho era ganhar uma boneca daquelas, eu também sabia que era um sonho impossível, pois quem iria notar uma menina extremamente pobre que ainda andava descalço e roupas velhas, por isso eu ficava na cola daquela menina perfeitinha, fazendo de tudo para agrada-la, só pra ela me deixar brincar um pouco com suas bonecas SUSY.
Mas aí veio à maldade do coração da perfeitinha, ela decidiu tirar proveito da minha situação, ela pedia pra eu fazer os trabalhos dela da escola, e os deveres de casa, em troca me deixaria brincar com seus brinquedos.
E naquele tempo eu não tinha acesso à internet, porque naquela época só tinha internet quem era rico, assim pensava eu, na época não tinha as facilidades que temos hoje através das mídias digitais, eu ficava o dia todo na biblioteca municipal pesquisando, na intenção de fazer um excelente trabalho pra ela, acreditando eu que teria recompensa imediatamente, lembro que quando eu terminava os trabalhos eu ia correndo para a casa dela pra entregá-la e pegar minha recompensa.
E ai vinha à desculpa, ela falava que já estava tarde, e pedia para eu voltar no outro dia para brincar. E eu voltava para casa desconsolada, no outro dia eu voltava com a mesma empolgação e inocência, achando que desta vez eu iria por as mãos naquelas bonecas SUSY.
Mas ai outra jogada, ela dizia que a mãe dela só a deixava brincar após ajudar nos afazeres de casa, e eu prontamente me oferecia para ajuda-la, assim terminávamos logo, ela com um sorriso no rosto concordava.
Eu varria, passava o pano, lavava até o banheiro dela, essa parte eu ate que gostava, pois sonhava em um dia morar numa casa com banheiro como aquele, queria muito saber qual a sensação de tomar banho no chuveiro, mas meu foco principal era de brincar, meu desejo era simplesmente brincar de boneca.
Mas quando acabávamos de limpar a casa, mais uma desculpa vinha, ela me dizia que a mãe dela já estava quase chegando do trabalho, e ela não gostava de outra criança na sua casa, eu ia embora devastada, e no outro dia eu ia lá e fazia tudo de novo, mas ela sempre me enrolava, às vezes eu ficava intrigada e pensava, será que e por maldade que ela me enrola, ou e só má sorte minha.
Resumindo, passei minha infância inteira implorando para outras crianças me deixarem brincar um pouco com seus brinquedos, mas essa perfeitinha foi a que mais me explorou, por isso a marquei em minha memória, porque eu achava que sofria porque não tinha uma SUSY, ou por não ter um quarto só pra mim com brinquedos.
Em fim, fiz doze anos comecei a entender a realidade de extrema pobreza em que eu vivia. E quando eu compreendi que eu não precisava mais só de uma simples SUSY pra ser feliz, e sim de comida e de um teto decente pra morar, deixei essa menina perfeitinha de lado e fui procurar trabalho.
E aquele grande sonho de brincar com as bonecas SUSY, mudou radicalmente, pois agora meu novo sonho era trabalhar para comer e ajudar minha família.
Pois, com o entendimento veio também às lembranças ruins, como a de quantas vezes eu vi minha mãe chorando quando eu dizia que estava com fome.
Então consegui meu primeiro emprego como doméstica, e assim pude pagar minha divida com minha mãe, pois me sentia culpada, ou o motivo do choro dela, enquanto eu só pensava em brincar, ela carregava sozinha a dor de não ter o que comer e oferecer e mim e meus irmãos.
Para finalizar, hoje tenho 28 anos nunca parei de trabalhar, até os dezoito trabalhei como doméstica, estudava a noite, concluir meu ensino médio, aos dezenove anos consegui meu primeiro emprego de carteira assinada como atendente, continuei estudando, fiz o ENEM consegui uma bolsa de 100%, curso letras, tenho um filho de 10 anos e tudo que eu exijo dele hoje e que estude muito, porque acredito que sai daquela vida através do estudos, a outra exigência simples, e que ele seja apenas criança e curta ao máximo a inocência.
E sim hoje posso dizer que sou realizada, não tenho tudo que quero, mas tenho tudo que preciso, hoje moro numa casa de tijolos, tenho banheiro dentro de casa, desde que eu comecei a trabalhar nunca me faltou comida, faço faculdade, tenho um filho lindo, e posso sim em datas especiais, levar ele numa loja e perguntar qual brinquedo ele quer, meu marido e um doce comigo, tenho meu próprio quarto, meu filho o dele, sempre ensino a ele a dividir o que tem com os que não têm.
Eu amo trabalhar, amo minha casa, amo meu banheiro, amo meu quarto, amo estudar e amo minha família.
Por inúmeras vezes as dificuldades da vida tentou me roubar essa sensação de felicidade, mas eu claro não deixei, me agarrei ate o ultimo fiozinho de esperança.
Porque acredito que a felicidade e algo que vem de dentro pra fora, eu sou grata por tudo que tenho, e não lamento pelo o que não tenho ou não tive, vivo o hoje, o ontem já foi, e o amanha a Deus pertence.
Hoje quando olho para traz, não sinto rancor, não sou traumatizada, não me sinto vitima. Sou apenas grata a Deus por tudo que ele me deu, sou grata pelo seu cuidado, graças ao seu amor, graça e misericórdia hoje estou bem, me sinto amada e guerreira.
Não tenho tudo que quero, mas acredito que tenho o que preciso pra ser feliz.
Reescrito por: Ana Claudia Barbosa Rodrigues
Autor(a): anaclaudiarodrigues
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