Fanfic: Teste Letras - Adaptação de " Felicidade Clandestina" | Tema: Coleção Harry Potter
Ela era magra, erguia de cabelos loiros lisos e sedosos. Tinha um busto enorme, e um corpo de dar inveja em qualquer menina da nossa idade, enquanto nós, ou eram achatadas de mais, ou gorada de mais, o que era o meu caso, gorda, baixa, cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Como se não bastasse todas as perfeições, ela possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de uma livraria.
Pouco aproveitava das oportunidades que tinha. E nós menos ainda: quando nossos aniversários chegavam, em vez de ao menos nos dar um livrinho barato, ela nos entregava em mãos cartões postais da loja do pai, ainda por cima era das paisagens do nosso próprio estado, já vista milhares de vezes.
Ela tinha um talento nato para a crueldade, pura vingança, mascava seu chiclete com barulho, nos olhava com ódio, nós que éramos as esquisitas desprovidas de beleza. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo, e eu, na minha ânsia pela leitura, deixava se humilhada e me submetia a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.
Até que chegou o dia em que ela acordou decidida a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía a coleção completa de Harry Potter, sabendo ela que sempre fui louca para ler essa coleção fez-me implorar novamente.
Era livros grossos, meu Deus, como eram lindos, cobiçava-os toda vez que passava na frente da biblioteca, eram livros de ficar vivendo com eles, comendo-os, dormindo-os e, completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o me emprestaria.
Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança e alegria, sonhadora, me imaginava com os livros em minhas mãos, sentindo-os, folheando-os, mergulhando e me embriagando em seu cheiro.
No dia seguinte fui a sua casa, literalmente correndo, mas a sensação era que flutuava. Ela morava em uma casa elegante, não me convidou para entrar, pois sabia de minhas origens humildes, olhando bem para os meus olhos, disse-me com sua voz mais maldosa que havia emprestado os livros para outra menina, e que voltasse no dia seguinte para buscar ao menos o primeiro livro da coleção. Boquiaberta, sai de vagar, mas a esperança ainda não havia me abandonado por completo, e assim sai pela rua a andar e pular, no meu modo estranho de ser. Mas dessa vez não cai, nem se quer tropecei uma vez nos meus próprios pés, era guiada pela promessa de ter ao menos um dos livros no dia seguinte, o amor pela leitura me guiou, andei pulando pelas ruas como sempre e não cai nenhuma vez.
Mal sabia eu que o plano secreto da filha do dono da livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu a porta de sua casa novamente, com um sorriso e o coração batendo descompassado, para ouvir a resposta calma de que o livro ainda não estava em seu poder e que eu voltasse no dia seguinte. E assim começou o meu drama do “dia seguinte”. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que sua tortura seria por tempo indefinido, era pura maldade, já estava começando a adivinhar que ela me escolhera para sofrer.
Eu ia diariamente a sua casa, esperança abalada, mas sem faltar um dia sequer. E ela sempre dizia debochada: o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você veio pela manhã, então o emprestei para outra menina. E assim dia após dia minha esperança se ia, estava sendo vencida pelo cansaço.
Chegou o dia em que resolvi tentar a ultima fez, quando estava a porta de sua casa ouvindo suas recusas costumeiras, apareceu sua mãe, para saber o que estava acontecendo, ela devia estar estranhando minha aparição diária em sua casa. Como ficamos mudas pediu explicações novamente a nós duas, e eu sem graça comecei a contar o ocorrido ente palavras entrecortadas e confusas. Para minha surpresa, sua mãe era boa, no começo ficou confusa e estranhou a atitude da filha, mas por fim, entendendo a maldade da filha, voltou-se para ela exclamando que os livros nunca sequer haviam saído de casa, ela nem se quer quis os ler! Que absurdo.
Horrorizada com a maldade da filha me contou que nos espiava em silencio e que desconhecia esse lado perverso nela, ficou tentada a saber o que a menina rechonchuda de cabelos cacheados fazia em pé a sua porta todos os dias. Foi então que finalmente ela se virou para sua filha, com voz firme e calma disse: você vai emprestar os livros agora mesmo para ela, sem reclamações. E se virando para mim disse: “E você fique com os livros por quanto tempo quiser”.
Essa frase, meu Deus, essas frase valia para mim mais do que me dar os livros “pelo tempo que quiser”, isso soa tão confiante, me encheu de felicidade. Não me lembro de ter agradecido, provavelmente sim, eu estava estonteante, quando peguei os livros. Como contar que consegui finalmente? Meu coração nem cabia no peito, segurava aquela coleção contra meu peito com as duas mãos, perdi a noção do tempo, não lembro quanto tempo levei para chegar em casa, com meus passos lentos e a mente viajando com a expectativa das magias entre as páginas em minhas mãos.
Chegando em casa, não comecei a ler de imediato. Fingi que não os tinha, só para depois ter a surpresa de tê-los. Havia sonhado tanto com esse dia, esperei tanto tempo, que algumas horas pareciam nada, então esperei, andei pela casa, comi pão com minha geleia favorita, voltava para eles, alisava as capas, abria-os por alguns instantes. Somente horas depois peguei o primeiro volume, A Pedra Filosofal, uma felicidade clandestina tomou conta de mim e assim o abri e aquelas primeiras linhas maravilhosas ganharam vida na minha imaginação, mergulhei em magia, era do jeitinho que imaginei. Como demorei em conseguir! Havia puro orgulho dentro de mim. Eu estava me sentindo a própria Hermione!
Eu sentada na rede, balançando-me com o livro aberto em meu colo, devorando-o em êxtase, não era mais uma menina com um livro, era uma mulher com seu amante.
Autor(a): mariana_ronsani_martins
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Loading...
Autor(a) ainda não publicou o próximo capítulo