Fanfics Brasil - Coisas que Acontecem à Noite Diário da Menina que Só Escreve à Noite

Fanfic: Diário da Menina que Só Escreve à Noite | Tema: Sexo, Sonhos, Adolescência


Capítulo: Coisas que Acontecem à Noite

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Eu costumava sonhar, noite após noite, com uma cidade abandonada. Percorria as ruas desertas de pés descalços, pisando a poeira de anos. Quando via alguma casa, o que era raro, a natureza havia crescido por dentro, como a fruta dentro da casca, fazendo ruir paredes, portas e janelas. Os animais selvagens bebiam água de chuva no que restara de uma sala de estar ou do quarto de um neném, alheios ao que existira ali antes deles. Nos meus sonhos, de tanto caminhar, perco as unhas dos pés, uma por uma, e meus dedos ficam em carne viva, tintos de sangue, como devem ter ficado os pés de Cristo na cruz, os católicos que me perdoem a comparação. Geralmente a longa caminhada me leva ao mar. A praia está cheia de cadáveres insepultos, deitados na areia, com os pulmões cheios de água salgada, sem ninguém para chorar por eles. Eu reconheço alguns mortos, outros não. É como se a humanidade toda coubesse naquela praia.


Eu me deito na areia - a única pessoa viva entre os mortos - e espero algo de terrível me acontecer, a mesma doença que contaminou todos os outros, a dor que deu fim à humanidade, coisa que nem a bomba conseguiu. Nada me atinge o coração. Sigo respirando o ar salgado da praia. A espera é insuportável. Com as mãos cruzadas sobre o peito, meu corpo me informa que não estou morta, a vida continua.


Ao longe, os cavalos correm livres pela orla do fim do mundo. E eu penso pela primeira vez que, num mundo livre dos homens, fosse eu a única sobrevivente, ninguém veria com maus olhos se eu tivesse filhos com os cavalos. Num mundo sem homens, nada mais seria proibido. Num mundo sem homens, eu não sentiria vergonha do meu cheiro ou do meu desejo. O sonho acabava aí - porque nem a utopia é capaz de produzir o milagre de um mundo sem homens - talvez só mesmo a bomba. Eu acordava molhada entre as pernas - molhada de água salgada, água do mar - e, ao sair na rua, para ir ao colégio ou comprar comida, as pessoas me olhavam sem saber que eu tinha um segredo em mim.


Quando fiz 17 anos, tinha vergonha dos meus pés. Achava que eram os pés de uma menina, nus, pequenos, sem cor, no corpo da mulher adulta que eu queria começar a ser. Eu era virgem, naquela época. Algo que, nos pés, eu tentava disfarçar pintando as unhas de vermelho. O feminino era uma ideia tão vaga para mim quanto a ideia de Deus. Eu comecei a reparar nos pés dos desconhecidos, pés brutos, pés sujos de areia, pés marcados pelas tiras de couro das sandálias, e, como as quiromantes fazem com as mãos, eu pensava ler o futuro nos pés dos homens. Mas o futuro nunca esteve ao meu alcance. A bem da verdade, eu lia outra coisa - lia sobre mim mesma - e foi nessa época que descobri, como quem descobre de repente um novo endereço dentro de si, foi nessa época que eu descobri o desejo.


Talvez meu corpo tenha sabido disso antes de mim. A princípio, não pude dar nome àquilo que meu olhar procurava nos corpos dos outros. Tampouco compreendia que fascínio a bruteza dos pés masculinos me causavam, a ponto de arrepiar a pele, eternamente naquele minúsculo intervalo entre o desejo e o nojo, o mesmo espaço do orgasmo. Pouco a pouco, caiu sobre mim como uma chuva a certeza de que não havia nada a entender. Clarisse Lispector disse quase tudo quando escreveu: a solução do enigma está na repetição do enigma. Não havia matemática para traduzir por que o bruto me fascinava. A resposta estava na própria pergunta, se mudasse de ordem: me fascinava porque era bruto. Aquilo que eu não era - por enquanto.


O primeiro menino com quem eu dormi me conheceu na praia. Eu o conheci descalço. Na terceira noite que passamos juntos, trancados no quarto, fazendo coisas de adulto em silêncio, assim como fazem todos os adolescentes, eu pedi para beijar os pés dele. Foi como arrancar-lhe o coração do peito e vê-lo bater miseravelmente na minha mão. Desde então, aprendi que os meninos tem medo do sexo, quando ele se torna um animal que eles mesmos não podem controlar. Meu primeiro namorado ficou mudo, enquanto eu ajoelhava e, à imagem de um cachorro, colocava o pé dele na minha boca. Eu sentia o dedo pulsando, vivo, contra o céu da minha boca. Não tinha gosto de nada, talvez de sal, mais nada. O menino ficou calado como um morto. Se aquele não foi o final do nosso namoro, foi o começo do fim.


Nem todo homem é capaz de preencher os lugares mais escuros de uma mulher.


Uma semana depois, eu escrevi meu primeiro conto em folha de caderno e, sem ser vista, coloquei dentro da mochila dele. Queria que ele me conhecesse um pouco mais por dentro. Que ele soubesse que, por baixo da minha pele de menina, por baixo das minhas sardas e dos meus cabelos, por baixo do meu perfume, das minhas roupas lavadas e passadas, havia toda uma mulher esperando a primavera de todas as coisas, uma mulher com cheiro de brisa. O conto não era biográfico, nada daquilo tinha acontecido comigo, talvez o conto fosse justamente o que eu estava esperando um dia acontecer.


No dia seguinte, o menino me devolveu as folhas e não falamos uma palavra sobre isso.


O conto escrito era algo assim:


Quando eu era menina, nem quinze anos ainda, eu tinha problemas para dormir. Ficava rolando na cama, de olhos abertos, com a calcinha molhada. No meio da noite, quando meus pais já estavam dormindo, eu escapulia do quarto, vestia uma roupa curta e saía pela cidade. Eu gostava de andar nas ruas do Rio de Janeiro, à noite, provocando o olhar dos homens mais velhos. Muitos deles pensavam que eu era puta e eu nunca disse a nenhum que eu não era. Perto do meu prédio, havia uma quadra de futebol, toda de concreto, onde os meninos do bairro costumavam jogar bola, madrugada adentro. Ao redor da quadra, as árvores coavam a luz dos postes e criavam a atmosfera sinistra de um lugar onde alguém poderia encontrar, a qualquer momento, um cadáver ou um casal de namorados sem roupa. Eu me sentava ali, no escuro, e assistia aos meninos jogando sem camisa. O suor escorria pelas dobras do abdômen, empoçando nos shorts, dando a ver o volume dentro dele. No escuro da pracinha, eu respirava aos pulos. Quando ninguém estava vendo, abaixava a calcinha até os joelhos. Eu era virgem, naquele tempo. Nunca tinha visto um pau, que dirá sentido um entre as minhas pernas nada além dos meus dedos. Os meninos do bairro me achavam muito novinha para estar na rua àquela hora e, a bem da verdade, eles pensavam que eu sofria de insônia, nem desconfiavam do que eu ficava fazendo aquele tempo todo no escuro. De todos os meninos da rua, eu preferia um que se chamava Rafael P. Ele devia ter uns 17 anos, era alto para a idade, jogava descalço e tinha pés grandes. Era nele que eu pensava quando estava no escuro.


Uma noite daquelas, depois da chuva, o campinho estava quase vazio. Cheguei lá por volta de uma hora da manhã. Na quadra, Rafael P. e um menino moreno, sozinhos, chutavam uma bola murcha um para o outro. Eu me sentei no escuro e minhas pernas tremiam. Aquela sempre fora a minha fantasia: encontrar Rafael sozinho (ou quase sozinho) na quadra. Costumava dizer para mim mesma que, se isso um dia acontecesse, eu deixaria de ser virgem ali, como quem atravessa uma fronteira e já não pode voltar a ser quem era antes. Naquela noite, algo falou por mim. Não era a minha voz. Eu me aproximei dos dois meninos na quadra. Rafael foi o primeiro a levantar os olhos. Ele não me disse nada. Eu também não sabia o que dizer.


O menino moreno sorriu. Só depois eu entendi o porquê. Minha calcinha estava molhada e, como a saia era curta, eles podiam ver quase tudo que a roupa não escondia. Rafael P. se aproximou e perguntou a minha idade. Eu menti. Disse que tinha 18. Ele sabia que eu não tinha. O menino moreno perguntou o que eu queria com eles. Eu respirei fundo e disse:
           - Quero que vocês me comam.


Eu podia sentir o sangue circular pelo meu corpo. Os meninos me olhavam como se eu fosse o próprio futuro, ali, aos pés deles:


- Como? - Perguntou o menino moreno, que era o mais falante de nós.


- De quatro.


Eu nem sabia o que aquilo significava. Tinha ouvido num filme pornô. Mas funcionou como palavras mágicas. Pude ver o volume por baixo dos shorts de Rafael P. Ele estava de pau duro. O menino moreno tirou a minha blusa e, como estava sem sutiã, fiquei só de saia e calcinha na quadra. Ninguém mais por perto. A noite estava escura e silenciosa, neblina baixa, como um sonho.


- Você vai fazer o que a gente mandar?
O menino moreno abaixou as calças e mostrou o pau duro. Era um pau feio, com veias à mostra, a cabeça vermelha de fora. Eu não sabia o que fazer, então fiquei imóvel, esperando qualquer informação. O menino percebeu a minha indecisão e mandou eu ficar de joelhos. Eu fiquei. Lembro até hoje da pele dos meus joelhos no chão rachado da quadra. O menino moreno enfiou o pau dentro da minha boca. Ouvia os gemidos dele, feito uma música ao longe, e ficava cada vez mais molhada. De repente, ouvi outro ruído, mais próximo de mim, e abri os olhos. Ao lado do menino moreno, Rafael P. também tinha abaixado a cueca e batia punheta olhando para a cena, à distância, como se dela não participasse. O pau dele era grande e rosa, um animal em si próprio - e a porra já começa a brilhar na ponta, refletindo a noite de lua.


- Ela engole?


O menino moreno sacudiu os ombros. Ele tirou o pau da minha boca, todo babado. Rafael P. se aproximou de mim, com o pau duro para fora. Eu sabia o que ele queria. Mas eu queria mais. Abaixei a cabeça até o chão da quadra e lambi os pés dele, os pés descalços. Chupei o dedão e, naquele momento, eu tive meu primeiro orgasmo. Com o dedão de Rafael P. na minha boca. Lembro de sentir cada centímetro do meu corpo à flor da pele, lembro do gosto de ferro, lembro do gosto de sêmen.


O menino moreno pegou o boné e foi para casa.


Rafael P. olhou para os lados. Ninguém por perto. Ele me mandou tirar a saia. Eu tirei. Ele rasgou minha calcinha com as mãos e me mandou ficar de quatro na quadra. Eu obedeci. Apoiado pelos joelhos, ele meteu com força, como se soubesse que nunca mais aquilo aconteceria com ele novamente. Eu quase gritei de dor ou de prazer, não sei dizer qual dos dois. Ele me comia de quatro, como um animal, me segurando à força pelos cabelos. Eu gozava sem parar, incontáveis vezes, seguidamente. Mas ele não. Quando tirou o pau de dentro de mim, eu desarmei feito um brinquedo no chão da quadra, fiquei caída, sem forças, nua. Ele se pôs de pé. Eu não queria que ele fosse embora assim. Ele me mandou ficar parada, sem respirar. Eu sabia que aquilo não era possível para os seres vivos. Ele disse, não pediu, apenas disse que gozaria na minha cara, para marcar seu território, que eu deveria entender aquilo como um elogio. Eu fiz que sim. Ele tocou punheta até gozar, audivelmente, com um grito. Eu levei tudo no rosto. Era nojento, mas era bom. Era salgado. Eu nunca me esqueci. Se não fosse dele, eu não teria engolido. Depois disso Rafael P. colocou os shorts com pressa, calçou os chinelos deixados no canto da quadra e foi pegar a bicicleta. Saiu dali voando como um morcego. Eu fiquei sozinha.


Eu queimei o conto no tanque de casa, antes que algum adulto encontrasse. Na semana seguinte, o menino da praia - aquele que tinha tirado minha virgindade - ficou com febre e faltou cinco dias de colégio. Secretamente, eu pensava que o meu conto era a verdadeira febre, o motivo da repentina doença dele. No sábado, dia em que os namorados iam ao cinema ou pelo menos diziam que iam, ele me telefonou tarde da noite. Era um telefonema de despedida. O namoro terminou amigavelmente, porque o sexo o contaminara como uma doença mortal. Antes de desligar, ele não resistiu a si mesmo:


- Era verdade?


- Cada palavra.


Foram as últimas palavras que disse e ouvi dele.


 





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Autor(a): larissa_m.

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 1



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  • larissa_m. Postado em 18/02/2020 - 01:41:26

    A cada dois dias, um novo capítulo. Até breve, L.


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