Fanfic: Filha do Mar | Tema: Percy Jackson
— Está na hora, Mel – disse Tritão, olhando sua meia-irmã com preocupação estampada no olhar.
— Você está bem, Tritão? Já procurou a Therapeftís? Talvez ela possa te medicar.
— Não, estou bem. É só que... Você tem mesmo que ir? Quer dizer... Minhas brincadeiras passaram do limite? Eu posso parar, se quiser. Posso ser... Aturável – respondeu corando.
— E essa palavra existe? - indagou Mel, enquanto guardava seu porta-retratos na mala, sem olhar para trás.
— Quem se importa? Não quero que vá por minha culpa. Sua presença aqui é... A coisa mais divertida que aconteceu em anos, e você é... - ele começou a ruborizar, mas fingiu não ligar pra isso, como se não tivesse o ego maior do que o palácio poderia aguentar. - Importante pra mim. Minha mãe não me deixa ter contato com meus irmãos, ou meio-irmãos...
Melanie o observou por alguns instantes, absorvendo as sensações agradáveis que invadiram seu quarto. Em todos esses anos, jamais pensara que um dia escutaria Tritão dizer isso. Ele nunca se deu bem com ela e jamais foi capaz de dizer que algo fosse importante, porque não sabia o significado da palavra "importante". Ela se sentiu impotente por não poder dar o reconhecimento que queria dar a ele, queria simplesmente abraçá-lo e dizer que tudo ficaria bem. Mas ela não poderia mentir desse jeito. Nada ficaria bem por muito tempo, ambos tinham ciência disso.
— Tritão, não estou indo por sua culpa. Quero dizer, você pode ser bem irritante quando quer, e exagera em algumas brincadeiras, é desordeiro... - começou a listar, mas ele a interrompeu:
— Sabe, eu ainda estou aqui... Bem aqui, Mel...
Ela sorriu e deu um beijo na bochecha do jovem Deus.
— Seria muito bom ter uma vida harmoniosa aqui com vocês. Treinarmos juntos, competirmos, lutarmos lada a lado, irmos juntos pro campo de batalha, ficar nas tavernas até altas horas e entrar de fininho para que Poseidon não note, tropeçar na mesma armadura todas as vezes, cumprirmos o castigo juntos, morrendo de ressaca, e fazendo mais bagunça do que limpeza... Não seria? – ela olhou sorrindo para os olhos azuis ciano do Deus que se transformou novamente em garoto.
— Seria mais que perfeito – respondeu ele animado.
— É, seria, sim... – Melanie pegou suas bagagens colocou a mão na maçaneta, deu de ombros e virou o rosto iluminado por lágrimas para Tritão – Mas nós somos Deuses, meu irmão. Não podemos nos dar ao luxo de sermos verdadeiramente felizes, de nos apaixonarmos ou fazermos estupidezes. Temos responsabilidades e obrigações. Temos um fardo a carregar. Nunca poderemos ter uma vida como essa que imaginamos agora – ela suspirou – O fardo de alguns, é bem maior que o de outros. Mas a maioria está começando a criar o fardo, você está dentre a maioria. Se quer um conselho, dê um tempo do mar. Visite Zeus, observe os humanos, o universo, o tempo. Descubra seus ideais e o fardo que quer carregar. Porque, acredite em mim, se você não escolher, outros o farão, e eles não terão compaixão. Adeus, Tritão – e Melanie saiu, fechando a porta atrás de si.
Vagarosamente, caminhou pelos corredores, sentindo o peso do próprio fardo escolhido há éons. Ela sabia, por experiência própria, que outros Deuses poderiam ser cruéis e que fardos são para todas as vidas que uma alma pode possuir.
O sangue quente corria rapidamente pelas suas veias, rosando sua pele morena. Não havia uma só noite em que ela não se arrependesse pelas escolhas que a levaram até ali. Como Hécate e Héstia lhe diziam, um fardo muito pesado foi posto em suas costas, e ela deveria encontrar um propósito dentro daquilo. A magia a ajudou em muitas ocasiões, mas ela não tinha ideia de como encontraria uma solução para isso tudo.
Ao chegar no topo das escadarias, Melanie avistou a figura de seu pai. Observou-o como tantas vezes antes o fizera, quase da mesma forma. Mil anos antes, ela o observou com afeto; cem anos antes, ela o observou com distância; quase cinquenta anos antes, ela o observou com raiva. Mas, naquele momento, ela o mirou cansada por ter que repetir a mesma história infinitas vezes; por todos que ela amava e se foram, sem que ela pudesse fazer nada; por tudo o que ela estava perdendo.
Algo na aura de Poseidon chamou sua atenção, ela parecia agourenta, mesmo dentre o brilho costumeiro da divindade, parecia estar se enfraquecendo; prestes a... "Morrer" concluiu Mel espantada. "Não. Deve ser apenas impressão minha". Então olhou mais uma vez para a aura, e o brilho agourento havia desaparecido.
— Tudo bem, querida? - perguntou Anfitrite, repousando a mão no ombro da garota. - Você parece assustada... E... Seu irmão fez alguma coisa?
— Ahm... Não, tudo bem. Está tudo bem. Eu só estou... Distraída, sabe?
— Sei, claro. Se houvesse algo errado, você me contaria, não é mesmo?
— É claro. Mas não é nada, só uma leve... - Melanie suspirou e sorriu – Tontura.
— É claro... – Anfitrite abraçou a garota – Eu te amo como amaria a uma filha minha, Melanie. Você é muito especial para mim, acredite. É muitíssimo valiosa pra mim, não tenha dúvidas. Eu nunca minto. Esse é o truque. Lembre-se disso.
— Adeus, Anfitrite.
— Adeus, criança.
A semideusa desceu os degraus vagarosamente, pensando no que Anfitrite acabara de dizer. Ela nunca mentia e Melanie podia ter certeza disso, porque conseguia identificar quando divindades mentiam. Mas ela se perguntava por que essa Deusa a amava como uma filha, sendo que odiava os filhos de Poseidon que não possuíam seu próprio sangue. Era de seu conhecimento que Anfitrite guardava certo rancor por ela, mas em nenhuma das suas vidas ela demonstrou isso diretamente. Acreditava, portanto, que poderia confiar seus segredos à Deusa até que se provasse o contrário.
— Está pronta, querida? - Chamou Poseidon, parecendo muitíssimo animado com sua forma atlética e jovem que não ultrapassava trinta anos de idade.
— Claro, meu pai. Vamos logo, ou Dionísio terá mais coisas insignificantes para comentar, bem sabe como ele me irrita – respondeu Melanie, tentando parecer bem-humorada.
Juntos, Poseidon e sua filha entraram na carruagem que era puxada por cavalos marinhos azuis celeste, e se sentaram, cada qual no banco oposto ao do outro, ambos fingindo apreciar a paisagem que passava com certa rapidez através da janela, ambos absortos em pensamentos e questionamentos que os consumia noite e dia, ambos insatisfeitos com os seus próprios feitos, embora fossem orgulhosos demais para admiti-los.
Melanie, que tinha tantos traços divinos vindos de seu pai, se escondia debaixo de sua máscara constante de preocupação que cobria seu, agora, gelado coração. Ela não se permitia a um segundo sequer de diversão ou qualquer coisa diferente de seriedade. Os anos a castigaram por demasiado, e Poseidon constantemente se culpava por este fato. Não conhecia mais sua garotinha e temia que o tempo em que ela deixaria de ser apenas um "peixinha" estava chegando rápido demais; cedo demais...
Logo atracaram na praia dentro dos domínios do Acampamento Meio-Sangue e foram recebidos por uma comitiva completa de sátiros, dríades, náiades, pelo diretor do acampamento, Dionísio, o Deus das festanças, e um centauro muito simpático, diretor de atividades do acampamento, Quíron.
— Sejam bem-vindos! Espero que a viagem tenha sido boa – cumprimentou-os Quíron com uma breve reverência.
— Há quanto tempo, Quíron! - disse Melanie.
— Sim, foi uma excelente viagem, velho amigo. Mas vamos logo aos negócios, porque estou com um pouco de pressa – disse Poseidon, sem rodeios.
— Não muda nunca, não é? - riu Dionísio.
— Você também, senhor D - interveio rudemente Melanie.
— Pense o que quiser, princesinha. Eu sou autoridade aqui e você é paga para me respeitar, sendo uma garota com tão alto título.
— Minha função é manter a ordem, não importando quantos Deuses eu tenha que matar para isso. E suas festanças estão longe de ordenadas, Dionísio.
— Por que não vamos para a Casa Grande? - interrompeu Quíron, que foi ignorado com um aceno de mão de Dionísio.
O Deus do vinho se curvou para Melanie e tomou-lhe a mão, depositando um beijo nela.
— Seja bem-vinda, minha cara.
Melanie o encarou, satisfeita com a reverência e com a demonstração de respeito. Ela gostava de fazer com que Deuses que a desafiavam, mesmo com palavras, mostrassem respeito a ela, porque significava que ela era mais poderosa que eles.
Em seguida, todos rumaram em direção à Casa Grande, que parecia sempre a mesma desde a primeira vez que a semideusa pisara nela. Na varanda havia um garoto, um semideus. "É claro, um filho de Hades..." constatou a garota. Ele era alto e musculoso, seus cabelos negros caíam-lhe na testa, de forma que mal se dava para ver as sobrancelhas, e desciam até o ombro. Suas feições eram belas, ferozes e ameaçadores, seu sorriso sarcástico se somava à sua personalidade física.
— Nico, vá chamar Percy – gritou Quíron.
— Nico? - engasgou, espantada, Melanie "Oh, Zeus..." – Disseram-me que você tinha morrido. Como isso é possível?
— Me disseram que você tinha morrido, Melanie. Onde esteve?
— Ora, criança - bufou Dionísio - Não é hora para reencontrinhos amorosinhos...
— Dionísio, estou lhe avisando... - Melanie ergueu os punhos.
— Só pensei que estivessem com pressa, minha caríssima Melarie.
— É Melanie!
— Meranie, tanto faz.
— Vamos andar logo com isso. Ele tem razão, tenho umas coisas para resolver – Poseidon entrou na casa antes que mais alguém pudesse interromper.
Todos dentro da casa, então começaram uma reunião, tentando decidir como seria a melhor maneira para dar a notícia ao Percy. Nenhum deles sabia qual seria a reação do garoto e eles precisavam que ele compreendesse rápido, porque Poseidon insistiu que estava atrasado e não poderia esperar muito. Melanie apenas os ignorou. Há tempos sabia que o melhor era dar-lhe um choque e depois ser rude para que o choque fosse embora. Ela o estudava desde que era pequena demais para entender que um dia o conheceria pessoalmente, e que seus sonhos eram visões reais do que fariam juntos. Apesar de não poder vê-la, ela esteve presente em todas as suas missões, o salvou e enviou auxílio nas horas em que mais precisava. Ela conhecia o coração de seu irmão melhor do que o dela mesma. Estava certa do que iria acontecer e não permitiria que idiotas como esses Deuses a atrapalhassem.
— Mandou me chamar, Quíron? - disse uma voz que todos ali conheciam bem.
— Quero que conheça alguém, Percy. E olha... Isso vai ser meio difícil..., Mas... - começou Quíron, mas Melanie o interrompeu:
— Olá, Percy.
— Você... Quem é você?
— Quem acha que sou, Percy?
— Eu te vi. Você esteve lá, não esteve? No meu sonho.
Melanie balançou a cabeça afirmativamente.
— Então...
— Sim, aquilo foi real. Tudo que eu disse é verdade. Somos, Percy. Irmãos de sangue.
— Nossa... Nossa mãe sabe disso?
— Não - respondeu a garota com hesitação. - Nós... Fomos separados ao nascermos, porque, quando um dos Três Grandes tem gêmeos, o segundo a nascer se torna mais perigoso, poderoso e instável que o primeiro. Nasci logo depois de você, por isso fui confinada a... Hum... Provações - um quê de desprezo apareceu em sua voz ao pronunciar a última palavra.
— Eu sinto muito...
— Não sinta, Percy. Basta... Decidirmos como procederemos daqui pra frente.
— Espera. Deixa eu ver se entendi – indagou Poseidon, pensativo. - Vocês já se conhecem e já está tudo entendido?
— Basicamente isso, pai. Eu não quebrei nenhuma regra. Tenho poder suficiente para passar por cima das suas, se eu achar que devo, não tenho?
— É claro, mas...
— Então acha certo que esteja tudo resolvido antes da data estipulada por você, por conta da minha interferência, não acha?
— Eu... É... Sim, claro.
— Então está tudo perfeito, concordam? – ela olhou ao redor e todos balançavam a cabeça em sinal afirmativo. Por um breve instante, seu olhar cruzou com o de Quíron e ela pôde notar que havia algo que ele escondia, mas escondia muito bem. Não obstante, ela podia ver com clareza o que era, embora não estivesse certa de que era verdade. "Mas meus dons nunca falharam", pensou ela.
Autor(a): beupaodequeijo
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
— Ótimo. Como estão todos de acordo – riu Poseidon –, vou embora, porque estou atrasado. Adeus rapazes – ele fez uma rápida reverência - Melanie – a garota tomou a mão de seu pai, depositando um beijo suave e respeitoso – Chame-os amanhã apenas, querida. — É claro, meu pai - assentiu. ...
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