Fanfic: Mala Intención | Tema: Original
A vista da janela do ônibus era inexplicavelmente linda. Era possível ver o pôr do sol no horizonte fazendo contraste com os grandes latifúndios ociosos repletos de pasto com alguns míseros gados espalhados estrategicamente pelos terrenos, para evitar intervenção nas terras inúteis de grandes poderosos. Olho para o lado, e lá estava ele, dormindo de forma serena, quase como um bebê recém nascido. Respirei fundo e sorri com a leveza que estava sentindo. Pra ficar melhor, só se eu pudesse abrir a janela. Fito a paisagem sentindo uma paz imensa e escuto um barulho ao fundo do ônibus e começo a ficar levemente preocupada, olho pra trás, mas não havia ninguém em pé.
-ACORDA GAROTA ESTAMOS ATRASADAS! - ué? quem está atrasado pra onde? - TEMOS QUE SAIR EM MENOS DE UMA HORAAAAAA! - senti um saculejo e abri meus olhos de golpe e me deparo com o rosto de Monique me olhando com os olhos arregalados. Meu deus! Era apenas um sonho... Parece que alguém estava criando muitas expectativas para uma certa viagem...
-Bom dia pra você também amiga! Ou melhor, boa noite! - disse me lembrando de que ainda nem eram 4 da manhã.
A passagem para Porto Alegre era às 6h. O planejado era chegar lá uma da manhã. Sim, são 19 horas de viagem, sem contar com possíveis imprevistos. Temos que sair de casa às 5h, para dar tempo de chegar e sermos uma das primeiras da fila e conseguir pegar um lugar mais pro fundão.
Levantei da cama rápido antes que a Monique começasse a falar no meu ouvido de novo. Ela me apressa com razão, porque demoro muito pra me arrumar, mesmo que não me arrume, eu só demoro. Mesmo ela estando na minha casa com a namorada dela ela tem razão. Ela veio dormir aqui pra gente economizar cash de uber. Fui direto pro banho pra lavar meu cabelo. Imagina só, chegar uma da manhã em Porto Alegre, tendo que fazer ainda mais 9 horas de viagem até Punta Del Este. Imagina o cheiro de oleosidade?! Deus me livre o Diego me achar porca. Deus me livre EU mesma me achar porca! Tomei um banho não muito demorado e ainda dei um enxágue frio pra fechar os poros. Passei creme no rosto e óleo no corpo, pra ficar bem cheirosa. Finalizei o cabelo, botei uma calça de moletom cinza bem levinha e uma blusa apertada de alcinha preta sem sutiã. Mais confortável impossível. Botei um tênis da Olympikus com bastante talco pra não subir o futum quando eu tirasse o mesmo no transporte fechado. Não queria matar ninguém sufocado hihi. Botei um pouco de perfume e conferi se faltava algo de última hora que eu talvez fosse precisar usar durante a viagem. Lenço umedecido OK, Desodorante OK, Creme de cabelo OK, sabonete líquido OK, perfume OK, lanchinhos OK, chocolate OK, água OK ,toalha de rosto OK, óculos escuros OK, cremezinho pra passar quando começasse a suar OK. Bem, tudo OK. Saí do quarto e vejo Monique e Júlia me encarando enfadadas.
-Nossa! O que deu em vocês? Podem ficar felizes e relaxar um pouco? Afinaaal - disse sorrindo indo em sua direção e dando um abraço nelas - Hoje é um dia especial pra todas!
-É difícil relaxar sem saber se podemos pedir o uber já que são QUASE 5 DA MANHÃ! - Júlia falou com os olhos arregalados.
-Amigas, vou explicar pra vocês. - disse respirando fundo. - Esse horário é o horário de relaxar, o horário planejado. NÓS ESTAMOS DENTRO DO PLANEJADO. Parem com isso porra! - finalizei já chateada. Essas duas conseguem estragar o bom humor. Sempre conseguiram - Tá esperando o quê pra pedir o uber, Monique?
-Já pedi, vai chegar em 8 minutos. - já acalmou os ânimos. Sempre assim. Quando me deixam puta elas se acalmam.
Pegamos as malas. Cada uma levava uma mochila grande e uma pequena mala. Descemos as escadas do pequeno prédio familiar cujo eu moro e aguardamos o uber. Enquanto esperava acendemos um baseado na rua vazia, pra começar o dia animadas... o carro não tardou muito a chegar. Já dentro do carro, mandei uma mensagem pra Diego. Se não fosse eu a mandar, ele ia entrar na fila do ônibus sozinho.
Bom dia flor do dia! Estamos no uber. A gente se encontra aonde?
Prontamente ele respondeu.
Bom dia. Na fila mesmo. Até XX
Grosso que chega doer... Mas fazer o quê? Chegamos às 5:30 no terminal rodoviário e fomos comprar um cafézinho pra viagem. Depois, entregamos as passagens pra conferir se estava tudo certo e fomos fazer a fila. 5:45 e nenhum sinal do bonito ainda. Estava quase na nossa vez de entrar.
Cadê você? - escrevi pra ele mas não obtive resposta.
5:55, dez minutos depois e ele ainda não havia chegado. Já estava começando a me preocupar... Será que ele desistiu? Será que aconteceu alguma coisa? Resolvi escrever mais uma mensagem, ainda sem receber a resposta da última que havia mandado.
Onde vc tá?
Havia sentado no último lugar na janela e guardei o lugar ao meu lado que dava pro corredor. Todos já haviam sentado e não tinha ninguém mais pra entrar. Todos com a mochila embaixo do banco e a mala guardada. Onde está esse homem meu deus? Às 6h em ponto o motorista entrou no ônibus e me desesperei. Monique me olhou com dó e Júlia já estava dormindo com a cabeça apoiada na janela. Me levantei de prontidão para ir pedir ao motorista que esperasse mais 5 minutos. Mas, antes de chegar ao corredor vejo cabelos pretos e armados subindo as escadas do ônibus.
-Posso entrar, motorista? - era aquela voz que eu conhecia. Suspirei de alívio.
-Já tava quase indo embora, hein? - disse o motorista levantando pra guardar a última mala de Diego que havia chegado. 3 minutos depois entra o motorista e atrás dele o Diego com um café na mão, uma grande mochila (a qual esbarrava em todos à medida que ele se aproximava, o que provocava olhares e sobrancelhas arqueadas), vestindo uma calça DE PIJAMA cinza e uma t-shirt da lacoste preta. Muito cafona, mas combinando comigo pelo menos.
-Pensei que você não vinha mais... - falei quando ele se sentou.
-Relaxa, gatinha. Sou um homem de palavra! - me deu um beijo na bochecha e tomou um gole de café. - Só tive uns contratempos na hora de sair.
-Ah sim. - respondi sem parecer me importar muito enquanto reparava em sua aparência. A camisa amassada, e a calça também, parecia estar tão confortável...tão...gostoso de pegar...e estava também de chinelo. Como alguém viaja de chinelo? Senti seu perfume doce... É, ele estava muito cheiroso, mas tão cheiroso que ia me dar dor de cabeça em menos de 2 horas. Pra quê esse perfume forte de manhã? Meu deus!
Olhei para janela enquanto observava o ônibus se afastar do terminal rodoviário e entrar na via expressa. Botei meu fone de ouvido pra ouvir um reggaeton. Quem diria! Eu estou mesmo indo fazer essa viagem? Nem parece que finalmente estou indo. Eu estou indo! Não tem mais volta! Estamos no ônibus e agora só paramos em Porto Alegre!! Sorri com muita adrenalina no meu peito. Olhei em volta e todos dormiam. Como eles conseguem? Não estão em êxtase? Olho para Diego e ele estava olhando pra mim. Pausei a música.
-Que foi, garoto?
-Nada. Você tá feliz assim só porque eu vim? - perguntou ele presunçoso. Suspirei. Esse é um dos motivos pelo qual esse homem é difícil de lidar. Ele parece que tem o rei na barriga, tudo gira à sua volta.
-Não, amor... - falei arqueando as sobrancelhas. - Eu estou feliz porque estou finalmente fazendo essa viagem que me propus há dois anos. É muita satisfação, cara! Mal posso esperar pra chegar e...
-Ai, Helena. Não começa com esses papos chatos não. - me interrompeu rindo e virando a cabeça pro outro lado. Ri de sua risada, mas consegui ver seu pescoço grosso e forte esticado. Tinha um roxinho ali. Agora entendi que contratempo foi esse que o fez se atrasar...
-Relaxa, não vou falar mais nada ok? Pode olhar pra mim já. - ele virou e me olhou com seus olhos grandes castanhos, ainda rindo.
-Você já fumou a essa hora da manhã? Tá com olho vermelho porquê? - mentira dele, não fico com olho vermelho.
-Se mete na sua vida, meu filho. Uns transam de manhã, outros fumam. - respondi rindo olhando e apontando pro seu pescoço.
-Vamos dormir um pouco, vai. Sei que tá ansiosa, mas tenta botar uma música calma, porque eu vou dormir e você vai ficar sozinha. - pegou o fone, botou no ouvido e fechou seus lindos olhos. Me ignora demais! De qualquer forma, não tardei para fazer o mesmo e adormeci antes de apreciar a paisagem dos meus sonhos na estrada.
*FLASHBACK*
Acordo sentada na escrivaninha. Parabéns! Mais uma vez dormi estudando, e a aula que o youtube selecionou nem sequer sabia do que se tratava mais. Nossa, 3 horas da manhã e tenho que acordar as 5:30... Não aguento mais essa vida. Ainda bem que faltam 2 meses pra acabar o ano letivo.
Me espreguicei e deitei na cama, caí no sono em pouquíssimo tempo.
Acordei com o som do despertador estridente, como se tivesse dormido apenas há 10 minutos. E lá vamos para mais um dia torturante e cansativo!
Levantei, não lavei o cabelo mas passei um creme após o banho pra dar aquele brilho e malemolência do day after. Passei óleo corporal de açaí pra ficar bem cheirosa e com a pele sedosa. Sou viciada em cremes e óleos corporais! Não posso ver um que já tô comprando. Levo na mochila pra passar depois do almoço na escola e ficar cheirosa pra aula da tarde como se tivesse acabado de tomar banho. Fui para a cozinha já bem acordada, mas tomei um café preto puro com duas torradas. Meus pais sempre me dizem que café puro deixa o dente amarelo? Caguei! Não vou deixar de tomar.
Saí de casa para esperar o ônibus e não demorei muito a ver o letreiro de longe. Conhecia só pela cor! Quando se aproximou pude ver que estava lotado como sempre... Suspirei sem esperanças e subi mesmo assim, não tinha outra opção. Fui na frente mesmo, sentada no motor, o motorista já me conhece e me deixa ir ali. Não sei quem diz que vida de adolescente é fácil, porquê a minha definitivamente não é. Preciso estudar pra passar no vestibular, porquê se não passar, vou ter que trabalhar enquanto estudo tudo de novo. Minha meta é passar e trabalhar ano que vem, e estudar já com minha vaga garantida.
Em uma hora cheguei na escola e entrei na sala antes da professora, as luzes ainda estavam apagadas. Monique dormia e nem falei com ninguém, fui direto pra minha cadeira, a última, e fiz o mesmo que ela; dormi.
Acordei com um cutucão; -Bora amiga, levanta. Já é a prática de química.- Mal ouvi a palavra química e me levantei de relance e confusa. Oi? Eu perdi a primeira aula? Ninguém me acordou??
-Monique, por quê você me deixou dormindo? - perguntei mas ela nem respondeu e sim riu de mim. Não entendi qual é a graça. Ela sabe que eu tenho que me manter focada. Ia reclamar de novo, mas antes ela me interrompeu.
-Sua cara tá toda marcada! - disse ela rindo mais ainda. Outros alunos viraram e riram junto com ela. Ah sim, entendi. Peguei meu celular para ver o reflexo e ela estava certa. Uma linha vermelha bem no meio da testa. Molhei a mão e joguei água no rosto pra ver se diminuía. No decorrer da espera peguei minhas anotações sobre o relatório de química, enquanto a professora ainda não chegava.
-Qual foi, deixa eu ver o que você anotou aí! -disse a Monique tirando o papel da minha mão. Fiquei puta.
-Me dá! - peguei de volta - relaxa que eu vou fazer sozinha e botar seu nome, beleza? Não precisa se preocupar. - eu sempre fiz todos os trabalhos sozinha, prefiro isso do que ficar pendente dos outros.
-Você é ótima, por isso que eu te amo. - disse ela me abraçando de lado.
-Isso vai te custar algo...
-Um baseado, eu sei. Depois eu te dou. - riu e se afastou.
Continuei a leitura e a professora chegou, não me deixando terminar, pedindo para a turma se dirigir ao laboratório. Pegamos jaleco, estojo e caderno e fomos. Quando chegamos no laboratório, lá estava ele, o mesmo estagiário de ontem, sério, com seus olhos grandes e chamativos, olhando fixamente para umas vidrarias que estavam em cima da mesa. O tal do Diego...Sério? Quem consegue ser tão bonito assim essa hora da manhã? Dei uma risadinha e fui pra uma das bancadas livres.
A professora deu as instruções e depois pediu que cada grupo fosse a frente da sala fazer uma parte do experimento. Fomos as terceiras. Nosso dever era misturar a base em pó com um líquido que eu esqueci o que era. Diego estava à minha frente e eu estava com medo de fazer merda e passar vergonha.
-Vocês vão pegar uma colher disso - disse ele com sua voz grossa e rouca, demonstrando o movimento com a vidraria na mão - e botar aqui. Ok? - disse ele olhando pra mim. Fiquei nervosa mas não demonstrei, porque sempre sou muito extrovertida e engraçadinha. Não sou dessas meninas que ficam sem palavras, sabe?
-Pode deixar! - peguei da mão dele a colher e o pote com NaOH enquanto a Monique segurava o vidro com o líquido que eu esqueci o nome. Peguei uma colher rasa e derramei, ela misturou.
Não aconteceu nada.
Olhei indignada pra professora e pro estagiário, que me olhavam como se ainda faltasse fazer algo. Peguei mais base e botei no líquido. Ainda nada. Fechei a cara e olhei pra ele. Ao toque tirou os negócios da minha mão, pegou uma colher gorda e derramou no líquido. Começou a espumar. Que humilhação!
-Você disse que era só uma colher! - falei com a sobrancelha levantada rindo.
-Sim, mas uma colher cheia, não duas rasas como você fez. - ele respondeu rindo, o que me fez abrir ainda mais o sorriso.
Logo eu e Monique fomos nos sentar. E essa foi nossa primeira interação..
-Tu ficou vermelha. - ela falou baixinho.
-Jura? - duvido, foi tudo tão natural pra mim.
-Riu demais, amiga. Deu na cara! Mas relaxa que você não foi a única...- sinalizou com a cabeça Bianca, nossa colega de classe na sua vez de estar fazendo uma etapa do experimento na frente de todos. Ela ria com a mão na boca igual uma idiota. Meu deus...será que eu fiquei agindo assim na frente de todos? Logo fechei a cara e Monique riu.
Sem perder mais tempo, comecei a rascunhar o relatório. Não adiantou muita coisa porque a aula já estava prestes a acabar e a turma, como sempre, foi lavar as vidrarias. Antes de irmos embora a professora pediu uma selfie da turma. Já comentei que ela é uma fofa?
-Você vem, Diego? - chamou ela calorosamente.
-Não vou não, pode deixar que eu tiro a foto de vocês. - respondeu já mais sério, com sua cara mais "comum", pelo o que eu havia reparado.
-Também, né... com esse jaleco todo rasgado. - afirmou a Bianca, sem um pingo de noção. Olhei para a barra do jaleco dele, e percebi que de fato estava bem acabado. Subi o olhar e me deparei com manchas de amarelo, rasgado e alguns resquícios de queimadura (provavelmente advindas de acidentes de trabalho) torneavam seu corpo. Dei uma sorrisinho. Mesmo assim, ele ficava lindo com esse jaleco de veterano de guerra. Quando cheguei ao fim de seu jaleco, em seu tronco, olhei pro seu rosto, que me olhava fixamente. Desviei o olhar. Que vergonha, deve ter achado que eu o estava secando!
Tudo isso aconteceu em um milésimo de segundo e logo a foto foi tirada e fui pegar meus materiais. Quando fui pegar o estojo, minha caneta caiu e abaixei para pegar, mas sem dobrar as pernas porque meu jeans apertado não permite. No momento em olhei pra trás, Diego estava olhando pra mim. Ótimo! Deve ter pensado que eu estava tentando seduzir ele. Já chega de olhares desconcertados por hoje! Ao invés de virar o olhar, fiquei olhando firme até ele olhar pra outro lado. E ele olhou. Sorri. Monique me puxou e eu saí do transe, rumo à próxima aula.
-Amiga...- ela disse sem terminar a frase.
-Não vou nem falar nada...- respondi e continuamos a caminhar.
Aquele dia de aula passou bem rápido. Quando cheguei em casa antes do fim da tarde, falei com meu pai e subi as escadas pra ir mais um dia estudar até dormir. Tirei a roupa, abri o computador e entrei no Instagram para ver as notificações.
Diego Gahan pediu para seguir você
Suspirei. É...até que o dia hoje não foi tão torturante assim...
*FIM DO FLASHBACK*
Autor(a): macarenah
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).